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12/03/2009
Contributos para Uma Resposta Ecologista

NOTA INTRODUTÓRIA

O Conselho Nacional do Partido Ecologista“Os Verdes”, com base no que foi definido na 10ª Convenção Nacional Ecológica, apontou a utilidade de sistematizar a reflexão que temos feito sobre o mundo, sobre a nossa sociedade e sobre a importância do projecto ecologista.

Este texto incorpora, assim, a leitura ecologista da realidade em que vivemos e os contributos ecologistas para dar resposta aos problemas existentes.

Que mundo temos? Que mundo queremos? A resposta a estas questões é determinante para elucidar a nossa interpretação sobre a actualidade e para clarificar os objectivos que temos, o projecto que empreendemos, o caminho que estamos dispostos a percorrer para garantir uma boa relação da humanidade com a Natureza e da humanidade entre si. Em suma, o que entendemos ser um mundo e uma sociedade de justiça.

Como nos definimos? Como nos relacionamos com os outros na sociedade? Que meios adoptamos para prosseguir os nossos objectivos? A resposta a estas questões define a nossa identidade, a nossa postura, a nossa essência ecologista.

Trata-se, evidentemente, de um texto sempre inacabado, porque ele é elaborado à luz da realidade actual, e será sempre passível de enfrentar mudanças e de sofrer alterações em função das circunstâncias. Traduz, contudo, no momento actual o pensamento ecologista e a vivência que “Os Verdes” escolhem desenvolver para contribuir para um mundo melhor, livre de domínios e onde a igualdade, o respeito e a solidariedade marquem o percurso da humanidade.


1. UM MUNDO EM CRISE – É POSSÍVEL UM MUNDO MELHOR

A preservação da Terra é condição essencial para garantir a sobrevivência da humanidade e de todas as espécies que, com aquela, habitam neste Planeta que nos acolhe e onde se gera vida.

É este imenso habitat que está ameaçado. E quando a Natureza está ameaçada, a humanidade, que é dela parte integrante, corre perigos. Se hoje se colocam riscos e evidências de destruição progressiva do Planeta, eles devem-se, sem dúvida, a causas antropogénicas e a modelos de organização criados e impostos entre a humanidade.

O (ab)uso de recursos naturais situa-se globalmente 25% acima do que o Planeta suporta, tendo em conta a (in)capacidade de auto-regenaração desses recursos, o que significa que, a este ritmo de produção e consumo, a humanidade precisaria, a breve prazo, de 1,5 Planeta para sobreviver, e a longo prazo de muito mais.

Mas, no mundo, o consumo de recursos naturais não é idêntico: a biocapacidade dos EUA é de 4,7 hectares per capita, porém na realidade utiliza 9,6 hectares per capita (mais do dobro), enquanto um africano só beneficia de 1,1 hectares. Se todo o mundo utilizasse o modelo produtivo dos EUA, seriam necessários 5 Planetas para aguentar este ritmo de destruição.

Em cada ano são destruídos no mundo cerca de 13 milhões de hectares de floresta – só na Amazónia são destruídos mais de 3 milhões de hectares por ano, o que representa uma média de cerca de 9 mil campos de futebol por dia. Esta destruição, bem como a devastação de ecossistemas com vista, por exemplo, à construção, o aumento significativo de focos de poluição e a captura intensiva de espécies, levou a que nos últimos 30 anos se perdesse à volta de 30% da biodiversidade no Planeta. Desta desflorestação resulta, ainda, uma grande responsabilidade no agravamento das consequências dos gases com efeito de estufa devido à função de sumidouro que as florestas representam, havendo, assim, menos base para proceder à recaptura de dióxido de carbono (CO2).

O problema das alterações climáticas agrava-se também devido ao elevado consumo energético nos países industrializados, muito sustentado na queima de combustíveis fósseis, e à densificação do uso do transporte individual, especialmente nos grandes centros urbanos. Apesar de acordos internacionais, como a Convenção Quadro para as Alterações Climáticas (1992) e o subsequente Protocolo de Quioto (1997), as emissões de gases com efeito de estufa, com particular relevância o CO2, não param de aumentar, chegando a atingir anualmente o lançamento para a atmosfera de 25 biliões de toneladas em todo o mundo.

Os efeitos deste aquecimento global do Planeta estão estudados e estimados para o próximo século. Se não se inverter esta tendência, o mundo confrontar-se-á, a prazo, com um aumento de temperatura significativo, que pode chegar a mais 6ºC num só século; a elevação do nível do mar, devido ao degelo das regiões glaciares, anulará áreas significativas onde hoje se concentram muitas actividades económicas (como as zonas costeiras); os riscos de desertificação dos solos serão muito maiores, as áreas produtivas diminuirão; as doenças hoje associadas a climas tropicais alastrar-se-ão; os picos climáticos de chuvas torrenciais e de secas extremas serão mais recorrentes e prolongados. O aquecimento global não tem apenas aspectos ambientais gravosos, mas também sociais e económicos, que não são de menor relevância.

A superfície de água doce no Planeta tenderá a diminuir. 460 milhões de pessoas, mais de 8% da humanidade, vive em áreas de real escassez de água. Estima-se que neste século 3,5 biliões de pessoas, cerca de 50% da população mundial, possam vir a enfrentar problemas de falta de água. O recurso água, de tão precioso que é à vida, ameaça, assim, constituir um dos maiores focos de conflito entre Estados neste século.

O modelo de produção e consumo dos países mais ricos devasta todo o mundo ao nível da depredação de recursos naturais e da intensificação da poluição. Com efeito, os países mais pobres, aos quais é negada a capacidade de subsistência, vêem-se muitas vezes obrigados a devastar amplas áreas e fontes de recursos naturais para os ceder aos países ricos, para liquidar parte das dívidas que os estrangulam e que os mantêm totalmente dependentes. Outras vezes, são verdadeiros depósitos de lixo dos países ricos. Não restam dúvidas que a injusta repartição de riqueza é um dos factores que contribui significativamente para a devastação da Natureza - para garantir os frenéticos comércio e consumo dos países ricos, associados ao princípio da competitividade, que os leva a dominar os mercados, e por via de mecanismos de protecção que só o seu dinheiro pode manter para compensar os baixos custos de comercialização de bens, impedem que os países mais pobres possam produzir e comercializar os seus produtos, garantir a sua sustentabilidade e sair da miséria em que se encontram os seus povos.

Com efeito, 850 milhões de pessoas no mundo estão a ser condenadas à fome perpétua. 1000 milhões de pessoas no mundo vivem com menos de 1 dólar por dia. 1500 milhões de pessoas vivem com 1 a 2 dólares por dia. Resulta, assim, que 40% da população mundial vive em pobreza extrema.

Em cada ano morrem 10,7 milhões de crianças no mundo antes de completar os 5 anos. A cada hora que passa, mais de 1200 crianças morrem no mundo – a pobreza é a principal causa. Mais de 1000 milhões de pessoas não têm acesso a água potável. As doenças transmitidas pela água imprópria representam a morte de 3900 crianças por dia.

Estes são apenas alguns números, que representam a “vida” de milhões de seres humanos, que demonstram o estado do Planeta e que traduzem tragédias que o capitalismo globalizado (o modelo) causa e agrava.

O fosso entre países mais ricos e países mais pobres mantém-se, com esta realidade dramática e vergonhosa. “Inventaram-se” ajudas ao desenvolvimento, sempre por cumprir, criaram-se auxílios, pelo Banco Mundial e pelo FMI, que só serviram para endividar continuamente os países pobres, instituiu-se uma Organização Mundial do Comércio que serve os interesses dos países ricos. Foram criados os Objectivos do Milénio em 2000, com metas definidas, para 2015, de negação da pobreza. Hoje é perceptível que a falta de vontade política de os concretizar tem impedido acções concretas para os atingir, sendo hoje evidente que as metas aí expressas não serão cumpridas. As palavras solidariedade e igualdade não encontram tradução no capitalismo.

O neoliberalismo (o instrumento do modelo) aprisionou seres humanos, populações, povos a uma eterna pobreza. Esta é a prisão para onde a lei do mercado, a lei do mais forte e do salve-se quem puder, empurra milhões e milhões de seres humanos. Esta realidade é o suporte do neo-liberalismo, é o pressuposto do sucesso do mercado financeiro, do poderoso mercado de capitais: o pressuposto da concentração de riqueza numa minoria de pessoas riquíssimas significa a negação da sobrevivência e de rendimentos a uma vastíssima maioria.

Hoje estamos a sentir a auto-falência deste modelo, que encheu os bolsos ao sistema financeiro, o qual com a ânsia desmesurada de obter mais e mais lucros se estrangulou na sua própria estratégia. Este facto, iniciado com o “subprime” nos EUA, e rapidamente alastrado a outras economias no mundo, veio demonstrar o quão injusto é o capitalismo e a forma como não há pudor em generalizar a pobreza e o desemprego para salvar os bancos e os mais ricos.

O que tem resultado deste sistema dominante é que 40% da população do mundo representa 5% do rendimento mundial, enquanto os 10% mais ricos da população do mundo representam 54% do rendimento mundial. As 500 pessoas mais ricas do mundo são detentoras de riqueza superior à de 416 milhões de pessoas pobres do planeta. Os 20% mais ricos detêm 75% do rendimento mundial e os 20% mais pobres detêm 1,5% do rendimento mundial.

O poder económico, com o nome das multinacionais e do sistema financeiro, devasta o que for preciso para garantir o seu sucesso: a exploração dos homens e mulheres, mas também a delapidação dos recursos naturais, a destruição da biodiversidade e da sustentabilidade do Planeta.

A sua apropriação da gestão dos recursos naturais é, de resto, uma ambição que têm para garantir o poder – deter para gerir de acordo com as suas presunções de enriquecimento e não para servir a humanidade, e, ademais, para tornar a humanidade dependente dos seus serviços (que chega à ambição de gerir bens tão essenciais à vida como a água ou a alimentação) o que lhes garantirá sempre mais e mais riqueza.

Por isso, a globalização que criaram lhes serve tão bem – o mercado local, regional ou nacional não lhes serve: querem o mundo nas suas mãos, um mundo uniformizado, homogeneizado e subordinado aos seus interesses. Por isso, procuram anular os pequenos e médios produtores, recusam o princípio da soberania alimentar dos povos, a produção local e diversificada de acordo com as características de cada região, o que permitiria a sobrevivência alimentar de muitos povos, garantiria a qualidade e a diversidade de produtos a comercializar, garantiria trabalho para tantos homens e mulheres e, certamente, permitiria uma mais justa repartição de riqueza entre nações.

A homogeneidade alimentar, a destruição da diversidade (de que a introdução de organismos geneticamente modificados – OGM - nas culturas e na alimentação são um exemplo bem elucidativo de mais um passo que se dá nesse sentido) traduz-se num pressuposto do neo-liberalismo com vista a dominar e a reter dependências nos detentores do mercado. E na senda da produção em larga escala, que não chega a toda a humanidade (não por falta de formas de a fazer chegar), mas apenas aos que podem comprar nesse mercado, a qualidade dos produtos vai dando lugar a escândalos alimentares, com graves repercussões na saúde pública, como a doença das vacas loucas, os frangos com dioxinas, os peixes com mercúrio, ou a produtos tão pouco nutritivos e tão calóricos que já transformam a obesidade numa das doenças mais relevantes dos consumidores dos países ditos desenvolvidos.

O problema do excesso de consumo (seja ao nível alimentar, energético ou outros) nos países mais ricos tem vindo a tornar-se verdadeiramente insustentável e a gerar, de há muito, problemas decorrentes. A produção tem que estar ao serviço das necessidades reais das pessoas e não ao serviço de necessidades artificialmente criadas para servir interesses do poder económico e que, para além de tudo o mais, só geram desperdício.

A resolução destas situações requer uma alteração do paradigma actualmente criado de estilos de vida, onde o apelo ao consumo é quase doentio. Impõe-se uma nova forma de viver, com hábitos mais saudáveis, os quais se reflectem também na preservação de recursos naturais (seja, a título de exemplo, na alimentação, privilegiando a produção local, seja na alteração das formas de mobilidade, privilegiando a utilização dos transportes públicos e dos modos suaves de transporte, como a bicicleta), e num ordenamento do território pensado em função desses novos estilos de vida e, portanto, mais harmonizados com a valorização dos espaços naturais.

Só com estes progressos e neste caminho será possível garantir que o sistema económico não esteja submerso nos seus próprios interesses, mas que esteja, sim, ao serviço do bem estar da humanidade, gerando mais qualidade de vida e uma mais justa repartição da riqueza regional, com reflexos para uma maior abertura de oportunidades para as diversas populações.

O poder económico garante também o domínio de todos os instrumentos fundamentais para atingir os seus objectivos, incluindo o poder político (recusa modelos políticos que não assegurem a sua expansão e apoia os modelos e projectos políticos que estejam do seu lado) – os EUA serão o exemplo paradigmático desta afirmação e o mais perigoso pela potência que constituem. Subordinando tudo e todos aos seus interesses económicos, têm-se arrogado donos do mundo, lançam ameaças, violam direitos humanos, ditam regras internacionais, procuram dominar organizações internacionais, apontam armas, fazem a guerra e matam quantos forem precisos para fazer valer o seu poder. O recurso à guerra como forma de apropriação de recursos naturais e de meios de produção, como o caso do petróleo, para permitir o domínio político e geo-estratégico de regiões férteis nesses recursos, tem que ser altamente condenável. A paz é um direito dos povos e um pressuposto para o desenvolvimento; as lógicas de domínio são uma ameaça aos povos e ao equilíbrio do Planeta.

Mas o poder económico garante, ainda, o domínio de outros instrumentos como também a influente comunicação social (cuja detenção está cada vez mais concentrada em grandes grupos económicos), um instrumento determinante para formatar a consciência dos povos, produzindo o que for preciso para que estes aceitem a “inevitabilidade” da realidade que o poder económico constrói, com o rosto do poder político, que para esta lógica até é salutar que encontre alternância, mas sempre entre projectos políticos semelhantes e que não ponham em causa as determinações, os interesses e os privilégios dos interesses económicos de grande escala.

Os defensores deste modelo procuram associá-lo em permanência à ideia de liberdade dos indivíduos. Liberdade, dizem, que o poder político só garante demitindo progressivamente os Estados de assegurar serviços públicos e, consequentemente, deixando uma multiplicidade de funções entregues e sob o domínio do poder económico.

Mas de que liberdade falamos? Da liberdade das multinacionais, das transnacionais e dos grandes grupos económicos e financeiros poderem pôr e dispor a seu bel prazer dos recursos e do património da humanidade? De deterem a terra, a água e o ar? Que liberdade é essa que nos devasta o Planeta e que apropria os seus recursos naturais nas mãos de uma pequena minoria? Invocam a liberdade, mas arrasam direitos humanos; afinal de que liberdade gozam os prisioneiros da pobreza? De que liberdade gozam os que sobrevivem da exploração do seu trabalho, dos que vivem na precarização laboral ou dos que vivem no desemprego? De que liberdade gozam os que não têm acesso a direitos tão básicos como a educação ou a saúde? Que liberdade é essa que talha a informação social que nos chega à sua exacta medida? Que liberdade é essa que gere o conhecimento, as provas científicas e as novas tecnologias, costurados à medida precisa dos interesses do poder económico? Que liberdade é essa que põe em causa a participação e os direitos democráticos? De que liberdade permitem gozar quando silenciam e eliminam espaços e momentos de intervenção e participação dos cidadãos, de movimentos e organizações? Ou quando arrasam a privacidade dos cidadãos, concentram informação e jogam com o medo das pessoas garantindo-lhes uma incerteza quanto ao futuro para as desmobilizar de intervir? Este modelo que se impõe no mundo é, afinal, bem visivelmente privativo de liberdade!

Dirão provavelmente alguns: mas o mundo é assim, a globalização enraizou-se, o capitalismo não tem alternativa, tudo isto é inevitável. Não é possível aceitar esse conformismo e afirmamos que tantos e tantos movimentos e lutas empreendidas por esse mundo fora têm provado que vale a pena contestar, agir e exigir políticas e modelos alternativos que garantam os direitos dos povos. Se todos tivessem acreditado que a ditadura fascista era uma inevitabilidade para Portugal, o 25 de Abril não teria sido uma realidade; se todos tivessem acreditado que o apartheid era uma inevitabilidade, não tinha sido vencido; se a devastação ambiental e a opressão das mulheres fosse uma inevitabilidade, nunca teria vingado o movimento Cinto Verde no Quénia, entre tantos e tantos exemplos que aqui poderiam ficar expressos.

O que é inevitável é agir por um mundo melhor!


2. UM PAÍS ASSOCIADO À CRISE – DESPERTAR PARA UMA SOCIEDADE MELHOR

Portugal viveu a mais longa ditadura da Europa. Foram 48 anos de fascismo, de opressão de um povo, onde houve lugar à censura, à repressão da criatividade e da liberdade, à prisão política e ao assassinato de tantos homens e mulheres, associados a práticas de tortura hediondas, à guerra, onde morreram tantos jovens. Salazar e Marcelo Caetano protagonizaram esses tempos de horror.

Foi a força de acreditar que era possível mudar que levou o Movimento das Forças Armadas a concretizar a aspiração e a dar frutos à resistência de tantos homens e mulheres que nunca desistiram de construir um país democrático, e que empreenderam essa luta durante décadas. Foi, assim, conquistada a liberdade e a dignidade do povo português, com a revolução dos cravos, em 25 de Abril de 1974.

O 25 de Abril abriu a porta deste país para uma grandiosa e fascinante oportunidade de progresso e de desenvolvimento, cujos direitos e instrumentos foram consubstanciados na Constituição da República Portuguesa de 1976. A concretização de direitos tão elementares como o acesso à saúde, à educação, à cultura, ao desporto, ao trabalho com direitos, à existência e à utilização de infra-estruturas colectivas, são exemplos de conquistas que só Abril tornou possível.

Como é que, então, este país viu, de há cerca de 30 anos a esta parte, desperdiçadas oportunidades tão magnânimes de combater injustiças sociais, de promover o bem-estar do povo e de garantir padrões ambientais que promovessem a sustentabilidade do desenvolvimento?

A resposta está ligada ao modelo que, quer o PS quer o PSD, os quais se têm alternado no Governo nestas décadas, têm prosseguido. Estes partidos têm demonstrado a sua equivalência na prossecução de políticas neoliberais que levam a cimentar profundas injustiças sociais, bem como a descurar objectivos de conservação da Natureza e de elevação de parâmetros ambientais.

Afinal, olhando para a realidade nacional, não é difícil perceber quem têm sido os verdadeiros destinatários que o PS e o PSD, quando estão no Governo, têm escolhido para beneficiar das suas políticas: o grande poder económico e financeiro encontra-se sempre de boa saúde, enquanto os micro e pequenos empresários e a população em geral se ressentem das políticas prosseguidas.

Ainda hoje, como há décadas, continuamos a ouvir o PS, agora no Governo (mas com o aval completo do PSD), sustentar que, para garantir o crescimento, a peça estruturante é criar melhores condições para o progresso dos grupos económicos e financeiros, porque, dizem eles, daqueles é que advirão melhores condições de vida para o povo. Então questionemo-nos! Se é assim, porque é que, em todos estes anos, a banca, os grandes grupos económicos e as famílias mais ricas de Portugal, continuam, mesmo em tempo de recessão ou de estagnação económica, a acumular lucros e fortunas incalculáveis, enquanto o desemprego e o endividamento das famílias se mantêm a níveis elevadíssimos e os nossos concidadãos que vivem no limiar da pobreza já somam mais de 2 milhões? Porquê? A resposta é óbvia – porque para uns acumularem riqueza outros perdem-na, chegando ao ponto de não conseguir garantir os mínimos para a sobrevivência das suas famílias. Não é por acaso que os níveis de emigração recomeçam a elevar-se - eles devem-se justamente à grande dificuldade de conseguir oportunidades no país e à necessidade de busca de melhores condições de vida no exterior.

O problema é, pois, de uma profunda injustiça na redistribuição da riqueza existente – em Portugal o fosso entre os 20% mais ricos e os 20% mais pobres é dos mais profundos ao nível europeu e o risco de pobreza é também dos mais elevados.

De resto, basta olhar para esta crise económica, esta falência do capitalismo, em que estamos mergulhados, para perceber como o poder político tem sido tão ágil em dar a mão, apoio e garantias de toda a ordem aos bancos, e de como tem sido tão poupado e tão ligeiro nos apoios às micro, pequenas e médias empresas e às famílias, fomentando, o desemprego, concretizando opções de fragilização e precarização do trabalho, e promovendo a degradação das condições de vida da generalidade dos cidadãos. As opções são claras, mas profundamente erradas para gerar justiça e qualidade de vida.

Era ao Estado que caberia promover uma melhor e mais justa redistribuição da riqueza, designadamente através de um sistema fiscal que tributasse em função das efectivas margens de riqueza, de lucro e de rendimento. Porém, o que acontece, por exemplo a nível fiscal, é que a banca continua a pagar uma taxa real de IRC muito mais baixa do que qualquer pequena ou média empresa (apesar de serem estas micro, pequenas e médias empresas que representam o grosso da criação de emprego no país – mais de 90%), mais valias de operações financeiras continuam isentas de tributação e, enquanto isso, os sucessivos Governos decretam baixos salários, aumentos de impostos constantes para os cidadãos, designadamente impostos indirectos, e taxas a propósito de tudo e de nada, para arrecadarem mais receitas, a partir de quem menos as tem.

É por isso que não podemos continuar a permitir que nos iludam com uma receita que já deu provas, de tão provada que está, que não consegue promover a justiça social.

É por isso que devemos exigir do Estado que assuma o seu papel de promotor dessa justiça e condenar a lógica que PS e PSD têm seguido de progressiva desresponsabilização do Estado e de privatização de sectores tão importantes para o desenvolvimento como os transportes, a energia, a água, a saúde, a educação, entre outros – os grupos económicos que detêm estes sectores vão acumulando lucros fenomenais e promovem a gestão desses sectores em proveito dos bolsos dos administradores e accionistas, por quem esses lucros são repartidos. Quanto aos cidadãos em geral, esses, vão assistindo ao encarecimento desses serviços.

Na mesma senda se orienta a precarização de padrões ambientais neste país. Tantas oportunidades perdidas! O ambiente, não constituindo oportunidade de negócio para o poder económico, sempre foi tido como um sector secundário da programação política, e a negligenciar por via de sucessivos desinvestimentos públicos, ao mesmo tempo em que a permissividade do poder político para a delapidação dos recursos naturais e o próprio desincentivo ao aproveitamento dos nossos recursos endógenos atinge níveis preocupantes. Daí resultou um país desequilibrado, onde as desigualdades territoriais também marcam a falta de oportunidades de desenvolvimento, um litoral completamente fustigado pelos índices de erosão, de construção e pela pressão humana; um interior despovoado e inactivo, entregue aos flagelos típicos do abandono, como os fogos florestais, e votado à futura desertificação. A produção desregrada e a produção elevadíssima de resíduos, com consequência visíveis na contaminação de solos e linhas de água a níveis preocupantes, também é marca da falta de políticas vocacionadas para a protecção ambiental, tal como a criação de áreas protegidas instituídas apenas em decretos, mas desprotegidas pela ausência de políticas sérias de conservação da natureza, a degradação da qualidade do ar especialmente nos grandes centros urbanos, a ainda tão incipiente falta de alternativa à dependência energética do petróleo, muito elevada com uma associada ineficácia energética, só para dar alguns exemplos.

É esta inactividade e lenta política em prol da defesa ambiental e de elevados padrões de qualidade de vida, designadamente no que diz respeito ao sector da energia e dos transportes, que nos levou a criar uma tendência de incapacidade para respeitar os objectivos do protocolo de Quioto, em cujo período de cumprimento nos encntramos (2008-2012) e que nos mantém neste momento, por opção dos sucessivos Governos, dependentes do comércio de emissões e de investimentos em países terceiros, pagando uma elevada factura no exterior.

O ambiente só se tem tornado objecto de primeira linha na orientação política quando constitui uma oportunidade de negócio para o poder económico. Por isso, as soluções apresentadas não são as que servem os verdadeiros interesses ambientais e das populações, mas sim os interesses dos grupos económicos, multinacionais e afins (exemplos disso são a co-incineração como o grande negócio das cimenteiras, a privatização/concessão privada da água e a construção de barragens como negócio em ascensão de diversos grupos económicos, a generalização da produção de OGM como o negócio das multinacionais do sector agro-alimentar, a construção de empreendimentos, ao abrigo dos PIN (Projectos de Interesse Nacional) para servir o mercado das construtoras e do turismo de elite, e mesmo a pressão para introdução da energia nuclear no país já fez balançar o Governo por orientação de grupos económicos interessados nessa oportunidade de negócio).

Tudo soluções que, curiosamente ou não, a União Europeia apoia e fomenta – com o paradigma da defesa do ambiente, que tantas vezes secundarizou, por exemplo com a Política Agrícola Comum (PAC), ou com a integração do nuclear no mix energético financiado pela comunidade, o que a União Europeia tem promovido é a entrega de novas oportunidades de negócio, de novos mercados a multinacionais que vão devorando a apropriação de serviços e bens (como fez por exemplo com os OGM ou com a água).

Se acrescentarmos a esta estratégia instrumentos que a União Europeia quer ver implementados, como a flexigurança, que facilita inequivocamente os despedimentos e a precarização do trabalho, os grandes grupos económicos têm asseguradas condições para pôr e dispôr de bens e de mão de obra a seu bel prazer e as pessoas vão sendo transformadas em marionetas dos interesses que aqueles visam prosseguir.

A União Europeia, que deveria ser uma comunidade de solidariedade e de cooperação entre Estados, vai, ao invés, fomentando desigualdades à sua escala e inviabilizando assim uma efectiva convergência real entre os diferentes Estados Membro. Subordinada aos interesses dos grandes Estados (como a Alemanha, França, Itália, Reino Unido), a PAC privilegiou nas suas opções de financiamento o desenvolvimento agrícola daqueles, em detrimento de outros países como Portugal (cuja dependência alimentar do exterior era de aproximadamente 25% em 1986, ano em que entrámos para a então CEE, e que atinge hoje os 75%); enquanto os grandes Estados ganharam novos mercados dentro da União, Portugal foi perdendo capacidade e actividade produtiva, perdendo, consequentemente, grande parte da sua autonomia e fomentando dificuldades sociais; o Pacto de Estabilidade e Crescimento (PEC), o qual não tem em conta a realidade concreta de cada país, procurou impor metas que para Portugal funcionaram como instrumento estagnador do desenvolvimento, designadamente com a opção de sucessivos Governos de quebra do investimento público em nome de um défice limitado, como se para a União Europeia e para o Governo as pessoas não fossem mais do que números; e o próprio alargamento comunitário foi feito, do ponto de vista orçamental, à custa dos países que apresentam maiores dificuldades, dado que os maiores países recusaram suportar o financiamento do alargamento, recaindo esse ónus sobre o apoio que deveria ser prestado aos Estados que estão mais longe da convergência.

Para além disso, a União Europeia, tutelada pelos maiores países que a integram, não confiante na soberania e no poder de decisão de cada um dos seus Estados e dos seus povos, vai transferindo continuamente poderes e competências, outrora de âmbito nacional, para a esfera comunitária (numa verdadeira lógica federalista) para que seja certo e seguro que o rumo político não se afasta dos interesses que pretende seguir, utilizando o que for preciso para impor essa rota.

Que outra leitura pode ter a insistência num Tratado Europeu, que requeria uma unanimidade, mas que foi rejeitado pelos povos da França e da Holanda, ficando, portanto, completamente falido? Contudo, o debate que os eurocratas promoveram, de seguida, foi sustentado na seguinte ideia: nós queremos esta Constituição, precisamos dela para prosseguir o nosso caminho e para implementar (leia-se impor) as nossas políticas – como vamos então convencer aqueles que disseram não, a dizer sim? Foi assim que impediram a realização de mais referendos sobre o Tratado Europeu, à excepção da Irlanda onde ele é obrigatório constitucionalmente. O povo irlandês disse, então, “Não” ao Tratado Europeu. Mas as elites europeias não desistem, acham que têm que mandar mais do que os povos e querem impor um “sim” onde o povo disse “não”. É esta a democracia que a União Europeia oferece. É esta a postura que um poder tão afastado dos cidadãos promove. Mas é esta a democracia que também o Governo português, qual fiel e exímio aluno europeu, acolhe e aplaude, enviesado em desculpas que não convencem, porque são demasiadamente insustentáveis!!

É nesta lógica que os portugueses, em concreto, devem estar atentos ao afastamento dos centros de decisão, o que torna sempre mais difícil a eficácia dos mecanismos de participação e de fiscalização das tomadas de decisão.

E para além desta atenção particular, é preciso que os portugueses estejam clara e perspicazmente atentos à forma como o poder joga hoje com o medo e com as ameaças como factor dissuasor da participação dos cidadãos, e fundamentalmente da contestação das populações. A precarização e a consequente insegurança no trabalho, a facilitação do rápido despedimento, a intromissão na vida privada das pessoas, a exigência de identificação, pelas forças de segurança, das pessoas e movimentos que participam em acções de protesto, quantas vezes levando à rápida constituição dessas pessoas como arguidos, funcionam como factor intimidatório de protestos contra a política do Governo, funcionam como instrumentos para calar, para silenciar a oposição social a políticas nefastas. É inaceitável que decorridas mais de 3 décadas sobre o 25 de Abril, se assista hoje a tamanha forma de controlo e quantas vezes de intimidação sobre os cidadãos.

Para além desta restrição na participação, PS e PSD, de há muito, procuram entendimentos para proceder a uma reforma do sistema político-eleitoral que restrinja o sistema de representação, designadamente nas autarquias e na Assembleia da República, à presença destes dois partidos, diminuindo substancialmente, ou anulando mesmo, a representação de outros partidos que no actual sistema eleitoral proporcional têm, por vontade expressa dos eleitores, assento nos órgãos representativos das populações. A conseguir esse objectivo, PS e PSD, nas suas semelhanças de actuação política e convergências constantes, anularão o pluralismo democrático, anularão a representatividade de uma vasta parte da população portuguesa, anularão vozes e propostas de alternativas políticas e de oposição à sua corrente e ganharão, artificialmente, maior espaço de manobra para implementação das suas políticas, assumindo que se alternarão, e que, de vez a vez, cada um desses partidos prosseguirá e continuará a sustentar o actual modelo. É também contra esta hegemonia que os portugueses se devem impor e assegurar que o pluralismo político é base, pressuposto e fundamental ao nosso sistema democrático e que qualquer golpe nesse pluralismo constituirá um recuo inaceitável na nossa democracia e no processo de denúncia de medidas e de apresentação de propostas alternativas no país.


3. A RESPOSTA VERDE

a) ECOLOGIA – UM PROJECTO DE TRANSFORMAÇÃO SOCIAL
Nós, Verdes, condenamos esta lógica. Nós, Verdes, entendemos que nada disto é inevitável, que tudo isto pode ser alterado, assim os povos se organizem, o defendam e o exijam, e por isso recusamos o conformismo.

Por isso, também, recusamos qualquer tentativa de restrição da participação dos cidadãos, ou a tentativa de limitar a intervenção dos cidadãos ao voto. Entendemos que num lugar de democracia representativa, a qual só o é se garantir a maior pluralidade de forças com representação e expressão social, há espaço bastante para que se pratique e se incentive a democracia participativa, a organização de exigências, de respostas e de alternativas que se possam fazer ouvir e estar presentes no que toca a processos de decisão.

Somos portadores de uma ideologia que se sustenta num projecto de transformação da sociedade com o objectivo de promover justiça social, de valorizar aquilo que é a base e a sustentação da vida - a Natureza - e que coloque, de uma vez por todas, a economia e o conhecimento científico ao serviço da humanidade.

É nesse sentido que entendemos urgente uma inversão de valores políticos: os critérios sociais e ambientais não devem ser definidos em função dos objectivos económicos, antes devem ser os critérios económicos definidos em função dos objectivos sociais e ambientais.

Assim, nós Verdes, temos uma visão muito completa do desenvolvimento, que à política cabe empreender, em todas as suas dimensões: social, ambiental e económica, todas convergentes na promoção da qualidade de vida de todos, numa sociedade onde não haja excluídos e onde a espécie humana se relacione em harmonia com a Natureza, garantindo a sua auto-regeneração, por forma a que as gerações presentes e futuras não fiquem privadas de recursos naturais imprescindíveis à vida.

As questões ambientais ganharam uma dimensão cada vez mais presente na componente política, mundial e nacional, desde os anos 70, e fundamentalmente nos anos 80, graças sobretudo às, então, já perfeitamente visíveis consequências nefastas da delapidação dos recursos naturais e dos níveis de poluição traduzidos já em sérias mazelas do ponto de vista da saúde pública.

Conferências das Nações Unidas como a de Estocolmo (1972), a do Rio (1992), ou a de Joanesburgo (2002) apontaram caminhos e foram também, especialmente a última, momentos de frustração pela confirmação do insucesso dos compromissos e metas traçados em relação à resolução de problemas globalizados de ambiente. Na verdade, todos os documentos saídos destas conferências, sendo positivos nos seus objectivos, acabam por lidar com uma contradição que não conseguiram sanar até aos dias de hoje – sabendo e reconhecendo que o modelo político e económico que impera no mundo é a causa de tantas das problemáticas ambientais, devido, entre outras causas, à sobre-exploração de recursos naturais, devido aos modos intensivos de produção, ao excessivo consumo dos países industrializados e à fome à escala de massas nos países não industrializados, não propõem alteração a esses modelos, antes procuram soluções neles enquadradas, modelos esses que depois levam à frustração de compromissos que não aceitam cumprir, mas que aceitam que a bem da humanidade conste, tão só, em documentos que relegam para a história, mas que, entretanto, vão fazendo as manchetes dos jornais e abrindo noticiários.

Antes, em 1987, e já numa perspectiva de preparação da Conferência do Rio, o relatório da Comissão Mundial do Ambiente e do Desenvolvimento das Nações Unidas, conhecido por relatório Brundtland, afirmava, entre tantas outras verdades, que “a causa e o efeito mais importantes dos problemas globais de ambiente são a pobreza”, que “muitos dos caminhos do progresso actuais provocam o aumento do número de pobres e de pessoas vulneráveis e, ao mesmo tempo causam a degradação do ambiente”, mas não ia ao cerne da origem desses problemas, não pondo em causa o modelo capitalista e o seu instrumento neoliberal. No fundo, pedia apenas mais consciência ambiental do poder político, com directrizes e objectivos interessantes, e em termos organizativos sugeria que os Governos nacionais dotassem de mais poder os seus ministérios do ambiente. Num modelo ao serviço do poder económico, que instrumentaliza a humanidade consoante os seus interesses, estas pretensões minimalistas só podem gerar frustrações. É neste relatório que aparece pela primeira vez definido o conceito de “desenvolvimento sustentável”, o qual não surge como conceito de ruptura com o sistema, mas apenas minimizador da sua agressividade.

É com enquadramento nesta preocupação, em relação ao meio ambiente, que se generalizam os mais diversos movimentos ambientalistas. Mas o problema é se se ficam pela exigência da minimização de malefícios ambientais no mesmo modelo político, social e económico. O problema é se apenas olham as questões ambientais de forma isolada e as separam dos modelos políticos e económicos, para justamente lhes criar a facilidade de não se pronunciarem sobre a necessidade de romper com o sistema causador de verdadeiros dramas ambientais, assumindo assim uma postura conformista.

É que é nessa lógica integradora do sistema, que se generaliza em projectos políticos, por exemplo, o ambientalismo económico, que tão bem em Portugal se vê caracterizado na acção do PSD e do PS, que a partir de uma determinada altura começam a manifestar preocupações ambientais e a consagrá-las nos seus programas, mas enquadrando na sua prática política as preocupações com o ambiente em função das oportunidades de negócio que a resolução, ou a aparente resolução, dos problemas ambientais pode constituir para uma economia de mercado. Realçam permanentemente a ideia de que o ambiente e a economia não são incompatíveis, demonstrando depois que assim é desde que as intervenções ambientais não constituam obstáculo à prossecução dos objectivos dessa economia de mercado, e se dessa aparente defesa dos valores ambientais puderem resultar novos negócios, tanto melhor, nessa sua visão.

Nós, Verdes, não somos adeptos de uma ecologia minimalista, à qual poderemos designar de ambientalista, em vez de ecologista, para poderem ser bem diferenciadas. Ou seja, não somos adeptos de uma intervenção pelo ambiente que tenha como objectivo manter e reforçar o sistema dominante, minimizando apenas, até onde for possível, as suas consequências ambientais. Somos verdadeiramente ecologistas, porque negamos o modelo causador destes graves problemas ambientais, porque defendemos um projecto de transformação social, com vista à criação de uma sociedade estruturalmente respeitadora dos seres humanos e dos valores naturais; assumimo-nos como um projecto que visa romper com esta lógica predominante, queremos um novo modelo político, económico, social e ambiental que promova aqueles valores.

Por isso, defendemos uma ordem internacional que se deixe de hipocrisias em relação à situação que se passa nos países pobres e que permita que aqueles se possam organizar para produzir e que tenham mecanismos justos para comercializar os seus bens, gerindo, eles próprios, as riquezas do seu território. A produção local e a capacidade de os comercializar são factores determinates para garantir a soberania e a sobrevivência dos povos.

Defendemos uma ordem internacional onde os EUA ou o G8 deixem de ditar regras como se o mundo e o poder de decisão tivesse de estar subordinado à vontade destes países e aos interesses que protagonizam, rejeitando a sua lógica de domínio de regiões geo-estratégicas em termos de recursos naturais.

Defendemos um mundo de solidariedade, de paz e de cooperação entre Povos e Estados, onde se garanta o direito de cada povo a construir o seu próprio destino e que pugne pela harmonia do Planeta, também com o objectivo de respeito pela humanidade.

E para tudo isto se poder concretizar, temos consciência que nos países ditos desenvolvidos é preciso criar uma orientação económica e uma pedagogia social e política que assuma a necessidade de criar novos estilos de vida, uma nova forma de vivência ecológica, onde a produção e o consumo se façam em função das necessidades das populações e não dos interesses das multinacionais, onde os recursos naturais, como os solos e a água, sejam preservados de modo a garantir a sua apropriada utilização, negando a sua actual delapidação. Destes estilos de vida ecológicos resultarão, sem dúvida, melhor ambiente, mais saúde pública, melhor desenvolvimento e, simultaneamente, mais descentralização, dinamização e diversificação nas actividades produtivas sustentáveis, mais emprego e melhores condições de vida para as populações.

Esta breve síntese, demonstra a nossa particularidade, que nos permite distinguir de outros projectos que também pugnam pela transformação da sociedade, dada a importância que damos à dimensão ambiental, como um dos pilares estruturantes do desenvolvimento, não de uma forma isolada, mas de uma forma integrada, como deixámos expresso.

Com efeito, enquanto “Os Verdes” forem vistos apenas como um “partido do ambiente”, rótulo que, de resto, os nossos opositores nos querem atribuir, não serão tidos como um partido político que olha atentamente todas as dimensões da sociedade e da política, e corremos o risco de sermos tidos como um projecto simpático, até necessário, pelas denúncias que somos capazes de fazer, mas simultaneamente como incapazes de promover e propor o desenvolvimento em todas as suas dimensões, ou até como opositores ao desenvolvimento pela focalização exclusiva nas questões ambientais. Compete-nos, então, demonstrar que tocamos todas as dimensões do desenvolvimento, mas que as questões ambientais são, para nós, um pilar determinante desse desenvolvimento.


b) ECOLOGIA – UM PROJECTO DE ESQUERDA
Uma doutrina, como a ecologia, que exige justiça social e ambiental, que tem como pressuposto o fim da exploração dos seres humanos e da delapidação dos recursos naturais, que nega a concentração de riqueza e a generalização da pobreza, que repudia todas as formas de discriminação de género, xenófoba e racial, que considera que a defesa do ambiente passa pela garantia de condições dignas de vida a todos os seres humanos e pela gestão dos recursos naturais em função das necessidades reais dos povos, garantindo a auto-regeneração da natureza (e não em função dos lucros das multinacionais) que, para isso, entende que a existência de serviços públicos, da responsabilidade do Estado, é determinante para garantir que a sua gestão é feita em função das necessidades públicas e não dos interesses privados, que para isso também defende que a aproximação dos poderes às populações é determinante, que considera que a participação pública e colectiva é um mecanismo essencial para garantir a exigência dessa justiça, que considera que a liberdade e a democracia no plano político são pressuposto essencial para essa participação, caracteriza-se necessariamente e indubitavelmente como uma doutrina de esquerda.

Esta questão da diferenciação entre esquerda e direita não é de somenos importância nos dias de hoje. Porque é de valores que se trata, e sem valores desarmamo-nos ideologicamente e consequentemente despimos de coerência a nossa acção. Porque é de uma visão da sociedade que se trata e da perspectiva de como ela é e de como deveria ser: a defesa do modelo que hoje impera e do seu neoliberalismo é traçada pela direita e serve os valores da direita.

Nós, ecologistas, somos um projecto de esquerda e, por termos essa génese, temos obrigação de alertar para o facto de que a definição de um projecto como de esquerda não se fazer por rótulo, mas sim pela tradução dessa caracterização e desses valores na prática dos projectos políticos. É por isso que devemos alertar para o facto de o PS, não obstante gostar de se rotular de esquerda, estar a prosseguir uma linha política que se enquadra na perfeição à direita – serve os interesses do grande poder económico e financeiro, prossegue uma lógica de menos Estado, promove uma política social da caridade e não da solidariedade, generaliza a bolsa de pobreza, olha para o ambiente numa lógica de oportunidades de negócio.

Uma esquerda conformada com os princípios de direita, uma esquerda resignada, não é uma verdadeira esquerda, porque não colhe nem aplica os seus princípios e não promove a transformação da sociedade, entrando facilmente na lógica da continuidade. Uma esquerda envergonhada entre a contradição da sua prática política ao longo dos anos e o seu rótulo, na prática afasta-se do desejo de mudança social e aproxima-se dos princípios de direita.

É esta denúncia que, enquanto verdadeiro projecto de esquerda, “Os Verdes” não podem deixar de fazer, nem podem permitir que se dilua um entendimento de princípios de esquerda e de direita, como se já não houvesse valores e os projectos políticos andassem todos a rumar num mesmo sentido. Este entendimento de diluição só serve a quem não se sente bem na sua definição, ou a quem já perdeu o norte da sua definição.

Nós, Verdes, estamos bem sólidos, convictos e determinados no reforço do nosso projecto de esquerda e na defesa nos nossos valores de esquerda.

c) OS VERDES ORGANIZADOS
A organização é, no fundo, a arrumação da casa de um projecto. É a forma de dotar todas as suas estruturas das funções para que foram criadas, para que sejam funcionais e eficazes, por forma a fazer cumprir os objectivos desse projecto em colectivo. Se o colectivo se organizar terá mais capacidade, se viver desorganizado perderá estrutura e força de decisão e intervenção.

É, por isso, determinante que todos os órgãos constituídos funcionem com a regularidade determinada e que nas suas reuniões sejam feitas avaliações políticas e que sejam traçados objectivos a concretizar. Para isso, importa que todos os membros desses órgãos se consciencializem que são elementos imprescindíveis da estrutura a que pertencem.

Para além das estruturas nacionais, importa que “Os Verdes” fortaleçam a sua organização descentralizada, por forma a envolver amigos a um nível organizacional diferente, e criando uma iniciativa de acção mais aproximada das problemáticas concretas ao nível das diferentes regiões do país.

A experiência, recentemente accionada pelos Verdes, de promoção regular de campanhas nacionais, que passam por intervenção em inúmeras localidades do país, tem provado que este contacto intenso e presencial, com as populações, é determinante para ganhar mais aderentes para este projecto e para fazer crescer o conhecimento deste partido.

Para além da sua organização interna, “Os Verdes”, que protagonizam um projecto de transformação social, devem procurar formas de dar mais força a esse objectivo.

A política de alianças tem sido um princípio assumido por vários partidos ecologistas (como por exemplo em França, na Alemanha, em Espanha, em Portugal)

É evidente que esta política de alianças só tem cabimento ser olhada em função da realidade concreta de cada país e em função da forma como se posicionam os partidos verdes nesses países.

Por exemplo, os Verdes franceses assumiram no início dos anos 90 que isolados conduziriam a ecologia política à impotência e, por isso, fizeram uma opção de afirmar os seus valores comuns com os partidos de esquerda oriundos do movimento operário e determinaram que deveriam ousar prosseguir políticas de alianças com outros partidos de esquerda. Foi nesse contexto que se coligaram com o PCF e com o PS francês.

Em Portugal, “Os Verdes” também têm feito uma opção de política de alianças, com forças políticas que entendemos convergir connosco num desejo e num processo de melhoria das condições de vida na sociedade e que têm dado provas disso mesmo. Tocados nesse objectivo comum, de grande importância (de rejeição do modelo dominante, de rejeição de uma sociedade dominada pelo poder económico, de desejo de garantir justiça social e de promover a sustentabilidade do desenvolvimento), a razão de ser destas alianças sustenta-se também na capacidade de respeitar as diferenças de cada projecto. No fundo, o objectivo tem sido o de criar uma plataforma mais alargada que assume um processo de mudança social, congregando forças diferentes.

Nesse sentido, temos mantido sucessivas coligações eleitorais com o Partido Comunista Português (PCP) e com a Associação Intervenção Democrática (ID). Estamos crentes que a CDU tem permitido, ao nível eleitoral, que pessoas que não integram directamente nenhum destes projectos, se revejam numa plataforma mais alargada de defesa de uma sociedade diferente.

A CDU tem já, como tal, garantido um património de lutas comuns em defesa dessa sociedade mais justa, com provas realizadas, designadamente ao nível autárquico, mas também em inúmeras acções e propostas que em conjunto se têm encontrado para dar resposta a problemas concretos da nossa sociedade.

Para além disso, a CDU tem permitido aos Verdes uma representação institucional (nomeadamente na Assembleia da República) que isoladamente dificilmente conseguiríamos atingir (relembremos que o BE só conseguiu eleger deputados depois de terem fundido a UDP, PSR e Política XXI – estes optaram por uma fusão de partidos, abdicando da identidade própria de cada um).

“Os Verdes” têm eleito, já há vários anos, 2 deputados à Assembleia da República e diversos mandatos autárquicos, alguns dos quais de candidatos que encabeçaram as listas da CDU. Essa presença dos Verdes em órgãos representativos das populações tem também permitido uma visibilidade pública da acção deste Partido (mesmo com toda a discriminação da comunicação social) e uma participação política muito relevante com a apresentação de propostas que traduzem a aplicação dos objectivos do nosso projecto e traduzindo no debate político matérias profundamente relevantes para o esclarecimento político.

À pergunta que muitas vezes se coloca - porquê com o PCP? -, depois do que ficou dito, a resposta parece óbvia. Porque o PCP tem assumido um papel transformador da sociedade, descomprometido com os interesses instalados e permanentemente interveniente na contestação e na alternativa a respostas políticas nefastas.

Importa também relembrar que na cidade de Lisboa, “Os Verdes” já estiveram coligados com o PS. Aí a realidade era diferente, era a vontade que partia de um quadro de partidos políticos alargado, profundamente descontente com a política que a direita promovia há anos no concelho, e que concordou aliar-se num projecto coordenado para a cidade de Lisboa. Ao fim de uns anos foi a lógica de domínio, de que o PS tem dificuldade em libertar-se num quadro de coligação, que desfez essa mesma coligação, permitindo que, de seguida, a direita retomasse o poder em Lisboa.

Importa daqui retirar uma ilação – as coligações só funcionam com o respeito por cada parte integrante e nunca quando há uma lógica de domínio de uma parte sobre qualquer outra, porque esse domínio torna-se insustentável para quem é a ele sujeito – por isso a CDU tem perdurado e funcionado com o desejo e o respeito de todas as partes.

Ainda numa óptica de convergência de lutas, “Os Verdes” devem identificar claramente objectivos concretos e pontuais que nos permitam definir com quem nos queremos associar para os alcançar nos mais diversos momentos, seja com associações de defesa do ambiente, sindicatos, estudantes, etc. E não devemos esquecer que os nossos aliados naturais estão necessariamente nas lutas concretas e são aqueles que sentem as consequências dos problemas reais – as populações.


“Os Verdes” assumiram também uma óptica de convergência ao nível internacional com a nossa família verde (assumindo as diversas divergências políticas que tantos verdes têm com tantos verdes ao nível europeu). Nesse sentido integrámos a Coordenadora Europeia dos Partidos Verdes (existente desde 1984), que se transformou a partir de 1993 na Federação dos Verdes Europeus e recentemente (em 2004) no Partido Verde Europeu. Integramos também o movimento internacional Global Greens (criado em 2001), como plataforma de entendimento dos partidos verdes de todo o mundo e, por fim, mas não menos importante, mantemos relações especiais com os Verdes dos países lusófonos, nomeadamente com os do Brasil.


O que é importante referir é que qualquer convergência que promovamos para o desenvolvimento dos nossos objectivos, para reforçar a nossa intervenção, tem que ser sempre baseada na afirmação do nosso projecto e da nossa identidade e na recusa de, por qualquer circunstância, perdermos ou ferirmos esses projecto e essa identidade. Por isso, é imprescindível que estes estejam perfeitamente claros e esclarecidos em cada Verde.

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