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Moção de Ação Política
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18/11/2018
I - A IMPORTÂNCIA DO PROJETO ECOLOGISTA


Compreender o mundo e a sociedade onde nos inserimos é um imperativo para quem age por princípios de justiça social e ambiental e trilha caminhos que conduzam à felicidade de todos quantos habitam neste Planeta Terra. O Partido Ecologista Os Verdes junta um conjunto de pessoas que têm em comum este desejo de construir um mundo melhor e uma sociedade onde a igualdade de oportunidades, a solidariedade e a democracia sejam plenas.
O Partido Ecologista Os Verdes tem como matriz os ideais ecologistas, sustentando o seu pensamento e a sua ação na harmonia e na sustentabilidade do desenvolvimento, na plena convicção de que a solidariedade intrageracional e intergeracional é um instrumento estruturante para salvaguardar o Planeta e o bem-estar de todos quantos nele habitam.

a)    Contexto mundial
Num mundo onde o capitalismo é a fonte de acumulação incessante de riqueza numa pequena minoria, à custa das mais diversas formas de abuso de uma larga maioria de seres humanos e da delapidação de recursos naturais a um ritmo acelerado e muito para além do limiar de sustentabilidade da Terra, o projeto ecologista é absolutamente necessário para combater este modelo e para garantir um processo de transformação que assegure um desenvolvimento económico, social e ambiental diferenciador e respeitador da vida com dignidade e da Natureza.
O capitalismo sempre foi, é e será gerador de desigualdades estruturantes e está geneticamente ligado à exploração, que promove a fome, a pobreza, o tráfico de seres humanos, o trabalho sem direitos, a descartabilidade de quem trabalha, assim como a degradação ou a utilização descontrolada de património natural, como a água, as florestas ou os solos. Tudo a troco da obtenção do máximo lucro para uma minoria. Se atendermos ao facto de a economia mundial ser essencialmente controlada por cerca de 150 multinacionais e de cerca de 1% da população mundial deter 50% da riqueza mundial, enquanto 70% de pessoas em idade ativa detém apenas 2,7% da riqueza mundial, percebemos bem o que significa a injusta repartição da riqueza.
Por outro lado, 12% da população mundial não tem acesso a água potável, 92% vive confrontada com níveis de poluição atmosférica acima dos padrões considerados adequados pela Organização Mundial de Saúde. Além disso, a desflorestação no mundo continua a um ritmo bastante elevado, a destruição de biodiversidade galopa, com a consequente extinção de espécies e de habitats naturais, sendo que, para esta realidade, concorre também o fenómeno das alterações climáticas intensificado pela emissão global sobretudo de dióxido de carbono, adveniente da queima de combustíveis fósseis, e de metano, fundamentalmente proveniente de um sistema de produção pecuária super intensiva. Com tudo isto a salvaguarda da alimentação, da saúde, da vida de muitos seres humanos e de outros seres vivos fica cada vez mais comprometida.
É neste quadro que os apetites das multinacionais se lançam ferozmente para deter recursos tão essenciais como, por exemplo, a água, procurando a privatização da sua gestão, de modo a mercantilizar e a controlar aquele que é um bem essencial a todas as formas de vida e que, de tão imprescindível, ameaça mesmo ser um dos potenciais fatores de conflito entre Estados. A escassez deste recurso, agravada por cenários de seca e de desertificação como consequência das alterações climáticas, não pode levar os Estados a prescindir da gestão pública de um recurso determinante para o desenvolvimento.
O capitalismo procura empoderar as multinacionais e os grandes grupos económicos, em todos os domínios estratégicos, de modo a ganhar lucro e poder. O que se passa ao nível da produção alimentar é bem elucidativo desse objetivo: as multinacionais procuram controlar o que se produz, procuram o desempoderamento das comunidades camponesas, procuram submeter os pequenos agricultores ao que elas determinarem que se produz, procuram que o mundo dependa delas ao nível alimentar. Para esse efeito, precisam de garantir a globalização e também que as políticas agrícolas definidas pelo poder político não se desenvolvam no sentido de assegurar a soberania alimentar dos povos. É nesse objetivo que se enquadram os tratados de livre comércio, como o TTIP ou o CETA, garantindo um mercado global para as multinacionais do setor agroalimentar. Também a generalização dos OGM visa o controlo alimentar por parte das multinacionais, como a Monsanto, através do domínio da tecnologia e de sementes patenteadas. A relocalização da produção e do consumo é determinante para garantir maior sustentabilidade da produção alimentar, cuja dimensão social e ambiental requer a interiorização do conceito de agroecologia e também de um comércio justo que se adeque às necessidades das populações, à garantia de bons padrões alimentares e ao combate ao desperdício alimentar.
Uma outra dimensão estratégica para o desenvolvimento, que o setor privado procura controlar, é o da energia. Cerca de 577 milhões de habitantes dos países mais pobres não têm acesso a eletricidade e em países mais ricos, devido ao preço elevado que têm de pagar pela eletricidade, muitos cidadãos com baixos rendimentos ficam privados deste serviço essencial. Em Portugal 52% da fatura da eletricidade corresponde a impostos e taxas, incluindo rendimentos que as eletroprodutoras têm assegurados para obter lucros exorbitantes. A privatização e a liberalização do setor energético geraram aumento do preço da energia tomando estes recursos como uma fonte de negócio e de investimentos subsidiados.
O capitalismo promove sempre a concentração de capitais numa minoria à custa da exploração e da opressão de uma larga maioria, designadamente através da generalização dos baixos salários, do trabalho precário e da ameaça do desemprego. A insegurança das pessoas e o medo quanto ao seu futuro é uma arma que o capitalismo usa para manter o domínio do grande poder económico e a submissão de quem vive à custa dos rendimentos do seu trabalho. Agregando essa vertente ao domínio de aspetos determinantes para o desenvolvimento, como os recursos naturais, a evolução tecnológica, a energia, a educação, a saúde oua alimentação, o capitalismo conquista um poder desmesurado para o grande poder económico. Garantir um poder político que se submeta a esta lógica, que seja subserviente deste poder económico, para que a construção de quadros legais e de promoção de políticas gerais e setoriais auxiliem o seu domínio, é um propósito que o sistema capitalista trata de assegurar. Para o efeito, são usados, por exemplo, os órgãos de comunicação social de massas, numa grande maioria já detidos por grandes grupos económicos, que selecionam a mensagem, silenciam as vozes mais inconvenientes aos seus propósitos e, recorrentemente, moldam as notícias de forma a influenciar a perceção pública dos acontecimentos. O direito a uma informação isenta, garante de pluralidade e respeitadora dos profissionais do jornalismo é determinante, como determinante é a existência de um poder político que não seja submisso aos grandes interesses económicos e que sirva os interesses dos povos e a boa gestão dos recursos naturais, numa lógica de desenvolvimento harmonioso e equilibrado, à dimensão da salvaguarda do Planeta em que vivemos.
A propaganda das guerras que são espoletadas, exímia em amputar partes da realidade e tantas vezes reproduzida e bastante mediatizada com títulos iguais em todo o mundo, tem como objetivo formar uma ideia na opinião pública que encubra os verdadeiros objetivos desses conflitos. Com efeito, a procura de influência e apropriação de recursos naturais em várias regiões do Planeta, tem levado a ingerências e guerras com o efetivo objetivo de detenção do domínio geopolítico das áreas mais ricas em recursos, expropriando povos inteiros das suas terras e sujeitando-os às condições mais desumanas e cruéis. Veja-se a hipocrisia de como os EUA, depois de terem financiado e disponibilizado armamento ao Daesh, desestabilizam a Síria, numa guerra arquitetada e financiada a partir do exterior. Foi também essa fúria de domínio que levou os EUA, com os seus aliados da NATO, a promover guerras como as do Iraque e da Líbia.
As atitudes hegemónicas e imperialistas por parte do Governo dos EUA revelam-se de forma extrema com a aceitação do reconhecimento de Jerusalém como capital do Estado de Israel, contra a grande maioria do Conselho das Nações Unidas e com as consequências nefastas para o povo palestiniano que essa posição está a tomar. Os Verdes não aceitam essa declaração unilateral e mantêm o seu total apoio ao Estado da Palestina, à defesa dos direitos do povo palestiniano, à coexistência pacífica dos dois Estados e ao respeito pelas resoluções das Nações Unidas, nomeadamente no que se refere às fronteiras entre ambos os Estados.
A NATO não constitui mais do que uma aliança belicista, cujos reais objetivos colidem em absoluto com o princípio da promoção da paz. Os Verdes defendem a abolição da NATO e consideram que Portugal não deve continuar a participar neste organismo que promove a guerra e a destruição de várias regiões do Planeta.
No quadro atual, o mundo está cada vez mais militarizado e violento, emergem inúmeros conflitos, a violência continua a destruir vidas e povos inteiros. Perante a ameaça de novas agressões, os princípios da Carta das Nações Unidas e o direito internacional estão sistematicamente a ser ignorados e a ser postos em causa. Os Verdes não podem aceitar esta situação e rejeitam qualquer instrumentalização da ONU.
É hora de travar orçamentos exorbitantes e crescentes para a guerra. É hora de travar a corrida ao armamento e de eliminar definitivamente as armas nucleares, que são uma enorme e grave ameaça sobre a humanidade, um potencial de morte e destruição generalizadas e de libertação deradiações que permanecem por gerações.
Estima-se que existam cerca de 15 mil ogivas nucleares no mundo. Torna-se cada vez mais urgente exigir o fim deste armamento, bem como o fim dos testes nucleares com vista à produção de armamento, porque só assim será possível assegurar que essas armas não serão usadas, bem como garantir a paz, a solidariedade entre os povos, a segurança e a própria sobrevivência de todas as formas de vida no Planeta.
A convergência de vontades na ação para um Mundo de paz deve ser uma prioridade e para tal, será fundamental que Portugal ratifique oTratado de Proibição das Armas Nucleares promovido pela ONU, dando expressão à aspiração dos povos por um mundo livre de armas nucleares.
O compromisso dos Verdes é com uma nova realidade baseada em soluções pacíficas para a resolução de conflitos e num papel ativo na defesa da paz mundial, cumprindoos princípios da Carta das Nações Unidas. Este deve ser também o compromisso assumido pelo Estado português, em consonância com os vários compromissos nacionais e internacionais que assumiu, bem como em integral respeito pela Constituição da República Portuguesa.
A fúria do capitalismo faz-se sentir na União Europeia em várias facetas bem vincadas, como o neoliberalismo e o militarismo.
Os portugueses vivenciaram essa realidade, designadamente com a intervenção da Troika em Portugal, com o total conluio do Governo, onde Fundo Monetário Internacional, Comissão Europeia e Banco Central Europeu aplicaram políticas de massacre social e da pequena economia, num processo que as instituições europeias teimavam em manter, com a inadmissível chantagem, já na presente legislatura, traduzida na ameaça de corte de fundos comunitários.
Velhas soluções que acabam por aprofundar problemas como os decorrentes da austeridade, com sérias repercussões nas desigualdades sociais e num quadro laboral muito frágil para os trabalhadores, ao mesmo tempo que são impostas políticas obsessivas com o défice, numa zona euro que privilegia as grandes economias, e numa União Europeia, em geral, que cria políticas comuns (como a agrícola) que tem liquidado a capacidade produtiva de países como Portugal para alargar o mercado das potências como a Alemanha e a França e fortalecer o domínio das grandes multinacionais. Tudo isto resultando num acelerado processo de perda de soberania e de capacidade de decisão por parte dos Estados-Membro, afastando os centros de decisão dos cidadãos e aumentando o défice democrático. Uma fúria capitalista bem expressa na adesão a tratados como o CETA ou o TTIP. Por outro lado, a União Europeia investe no militarismo, como acontece através do Mecanismo Europeu de Cooperação Estruturada Permanente, em complementaridade com a NATO, com vista à criação de um exército comum, que em nada serve os povos e retira soberania aos Estados.
É neste quadro que os povos de diversos Estados-Membro têm sentido um verdadeiro divórcio em relação às elites europeias, atestando a sua incapacidade (leia-se falta de vontade) de não promover, nem priorizar políticas sociais efetivamente eficazes. Não é por acaso que tantas vezes, povos de Estados da União Europeia quando foram chamados a pronunciar-se sobre o processo de construção europeia, através de referendo, disseram «não», como aconteceu em França, na Irlanda ou na Holanda, tendo estes povos depois sido sujeitos a sérias ameaças que levaram à repetição da realização dos referendos, até o resultado ser «sim»! Agora, o caso do Reino Unido representa uma clara consequência da contestação dos povos às políticas europeias, tendo decidido, em referendo, a sua saída da União Europeia. Estão, entretanto, a decorrer as negociações relativas ao Brexit, com uma enorme chantagem por parte das instituições europeias.
A União Europeia tem, também, promovido uma política profundamente desumana no que aos refugiados diz respeito. Trata-se de pessoas, de famílias, de crianças, de mulheres e de homens que arriscam a vida a lutar pela sua sobrevivência, que abandonam o seu país devido a guerras, a situações de verdadeiradestabilização e insegurança, com a mão dos EUA e o apoio da União Europeia, como nos casos do Afeganistão, da Líbia ou da Síria, entre outros. A situação é de tal modo dramática que o mar Mediterrânico já foi designado como o «mar da morte».
Desde o acordo da UE com a Turquia, até às mais recentes expressas recusas, por parte de Itália e de Malta, de acolherem refugiados, está no terreno a União Europeia fortaleza, que barra a entrada de migrantes, promove a militarização e a repressão e contribui, de forma vergonhosa, para o crescimento do racismo, da xenofobia, da intolerância e da expansão da extrema-direita. É uma situação bastante preocupante, que não pode deixar nenhum democrata indiferente.
É fundamental uma reforma da política de migração, baseada no respeito pelos direitos humanos, na solidariedade, no combate às causas da imigração em massa e no respeito pela independência dos povos.
Os Verdes alertam também para o facto de as alterações climáticas constituírem um risco de formação de um elevado número de refugiados e de migração de populações, tendo em conta os efeitos devastadores previsíveis para as sociedades humanas (assim como no que respeita à sobrevivência de outras formas de vida) com efeitos cada vez mais visíveis e catastróficos, revelados através de extremos climáticos, como secas prolongadas, enxurradas, e também através de efeitos como a desertificação de solos, a elevação dos níveis do mar ou o crescimento do risco de doenças. A mitigação das alterações climáticas, estabelecida pelo Acordo de Paris, requer ações e investimento por parte dos Estados no sentido de diminuir a emissão de gases com efeito de estufa, mas requerem-se também medidas de adaptação ao fenómeno já em revelação. É nesse sentido que os Verdes denunciam a atitude do maior emissor per capita de gases com efeito de estufa, os EUA, que se desvincularam do Acordo de Paris e, assim, contribuem para acentuar um problema global.

b)    Contexto nacional
Em Portugal, o 25 de abril de 1974 abriu as portas a um país onde o povo, oprimido por 48 anos de ditadura fascista, tinha finalmente a oportunidade de viver em democracia, construir um plano de igualdade de oportunidades real e usufruir de direitos fundamentais básicos, de liberdades e de garantias individuais e coletivas – valores que foram traduzidos na Constituição da República Portuguesa de 1976.
A verdade, porém, é que sucessivos Governos do PS, PSD e muitas vezes com a participação do CDS, foram, ao longo dos anos, subvertendo muitos desses valores de abril e tomaram como prioridade política o enraizamento do capitalismo, promovendo uma submissão do poder político ao poder económico, e até mesmo a promiscuidade entre os dois. A privatização de setores fundamentais ao desenvolvimento do país, que deixaram de estar sob o controlo do Estado para passarem para o jugo privado (como na área da energia, dos transportes ou das comunicações), assim como as benesses e apoios dados pelo Estado aos privados (em detrimento do setor público) para mergulharem em áreas bastante apetecíveis, por serem imprescindíveis, como a saúde ou a educação, são bem exemplo de como tantas vezes se sacrificaram os interesses e as necessidades das populações para dar lugar ao enriquecimento de grandes grupos económicos.
Simultaneamente, as opções de investimento público não foram para a melhoria progressiva de áreas fulcrais como a educação, a saúde, o ambiente, a mobilidade ou a justiça, mas sim para obras megalómanas, onde se encaixam os inúmeros quilómetros e quilómetros de autoestradas, e a betonização do país, enquanto se definhou a atividade produtiva, como a agricultura, onde se rendeu a floresta aos interesses económicos da pasta de papel, onde se encerraram quilómetros de linhas ferroviárias, e consequentemente, onde se despovoou um interior cada vez mais anulado pelo poder político.
Enquanto isso, a pressão sobre o litoral foi sendo cada vez mais intensa, a construção na nossa costa proliferou, a produção de resíduos aumentou substancialmente, os carros inundaram as cidades quando a rede de transportes públicos não deu resposta às necessidades de mobilidade dos cidadãos, a incúria em relação a focos de poluição de recursos hídricos abundou, as áreas protegidas foram territórios alargados aos apetites de interesses privados, afetados também pelos parcos recursos humanos e meios financeiros para a conservação da natureza e da biodiversidade.
Este caminho não era uma inevitabilidade, constituindo sim uma opção política clara dos partidos que se alternaram no poder (PS, PSD, CDS) e que nunca demonstraram ser alternativa política, porque as opções políticas foram sempre idênticas. Em bom rigor, deram sempre lugar apenas a uma alternância de partidos no poder. Para reservarem esse poder para si próprios inventaram o conceito de «arco da governação» onde, segundo eles, só estes três partidos cabiam, procurando convencer que as eleições legislativas serviam para eleger um primeiro-ministro e não o conjunto de deputados para a Assembleia da República (ideia, de resto, repetida até à exaustão pelos órgãos de comunicação social e por comentadores, com objetivos bem definidos – que os eleitores considerassem que só valia a pena votar ou escolher entre quem consideravam que poderia vir a ser primeiro-ministro).
A situação política que se vive hoje em Portugal veio demonstrar claramente a importância de os eleitores votarem nas eleições legislativas com a consciência de que estão, efetivamente, a eleger 230 deputados para o Parlamento e que a correlação de forças políticas que se estabelece na Assembleia da República, em resultado da escolha dos eleitores, é que é determinante. Nesse sentido, sempre afirmámos que quanto maior a força parlamentar dos partidos que constituem a CDU, mais determinantes seríamos sempre nas políticas a desenvolver no país.
Nas últimas eleições legislativas, em 2015, os eleitores retiraram a maioria parlamentar ao PSD e ao CDS e os partidos que se tinham comprometido com uma mudança de políticas ficaram, em conjunto, com a maioria dos assentos na Assembleia da República. Logo que conhecidos os resultados eleitorais, e em respeito pela palavra dos eleitores, foi na própria noite eleitoral que a CDU assumiu as suas responsabilidades e desafiou o PS a assumir também as suas. Não fora a determinação da CDU, em respeito pela opção dos cidadãos, e não se teria quebrado o ciclo de desastre económico e social que se tinha vivido nos quatro anos anteriores, de Governo PSD/CDS. A questão não estava, contudo, em aceitar um Governo do PS que gerasse a alternância do costume, mas sim em exigir que o próximo Governo fosse capaz de romper com a lógica de empobrecimento que estava a ser imposta ao país.
Os cortes salariais, os cortes nas pensões, os cortes nos apoios sociais, o enorme aumento de impostos para os cidadãos são exemplos da brutalidade das políticas do anterior Governo PSD/CDS que geraram mais pobres e mais fragilidades económicas e sociais. Paralelamente, a privatização de empresas fundamentais (como a EDP ou os CTT), a quebra a pique de investimento público em áreas fulcrais, e o definhamento das pequenas atividades económicas, geraram um país mais dependente, levaram inúmeros cidadãos a emigrar, aumentaram imenso os níveis de desemprego, levaram ao encerramento de milhares de micro, pequenas e médias empresas. E que não se pense que estas opções políticas eram transitórias e que resultaram apenas do memorando que PS, PSD e CDS assinaram com a Troika. Em bom rigor, a pretexto da crise, estas opções encaixavam todas na lógica neoliberal dos partidos que formavam Governo, e o então Primeiro-Ministro deixou tudo bem claro quando afirmou perentoriamente que os portugueses tinham de se consciencializar que os salários não voltariam a ser os que tinham sido em 2011, ou quando, despedindo inúmeros professores, os convidou a emigrar em busca de emprego. Enquanto se dizia que o país não tinha dinheiro e se liquidava a capacidade de o país gerar riqueza, para injetar nos bancos nunca faltou dinheiro, nem para pagar os agiotas juros da dívida, recusando sempre a sua renegociação, nem se queixavam de falta de receitas quando se tratou de baixar significativamente os impostos para as grandes empresas. Entretanto, na área ambiental o desinvestimento público era notório, enquanto tudo era estudado e moldado para formar área de negócio para o setor privado (desde os resíduos, à gestão das áreas protegidas, à construção de barragens, até à entrega do setor da água a privados, que chegou a ser anunciada pelo então Ministro das Finanças, Vítor Gaspar).
Foi esta continuidade de políticas que os cidadãos rejeitaram nas eleições legislativas de 2015 e foi a criação de condições para quebrar este ciclo desastroso que a CDU assumiu em primeira linha e a dianteira.
Viabilizou-se, assim, um Governo minoritário do PS, que teria como obrigação reverter um conjunto de medidas tomadas pelo Governo PSD/CDS, mormente no que respeita à devolução de rendimentos às famílias, à garantia de direitos aos cidadãos e à necessidade de investimento público, tudo com impacto real positivo na economia do país e na atividade produtiva. PEV, PCP e BE assinaram, bilateralmente, com o PS, três posições conjuntas que, não fechando o âmbito dos entendimentos possíveis, determinava alguns mínimos a cumprir, onde era possível uma convergência sobre questões urgentes e imediatas que dessem resposta aos problemas mais emergentes do país. A posição conjunta assinada entre o PEV e o PS, para além de um conjunto de medidas que constam também das demais posições conjuntas, acrescentou uma série de compromissos importantes, na área da conservação da natureza, da floresta, dos recursos hídricos, da energia, dos transportes, em particular da ferrovia, entre outras determinações como, por exemplo, a rejeição da diminuição das contribuições para a segurança social por parte das entidades patronais, ou a rejeição de qualquer privatização.
A14ª Convenção do Partido Ecologista Os Verdes realiza-se três anos após as últimas eleições legislativas, no momento em que decorrem as negociações para o próximo Orçamento do Estado, e no último ano da legislatura que está a decorrer. Impõe-se, assim, fazer uma avaliação das soluções encontradas, no quadro da atual situação parlamentar e governativa.
Nesse sentido, os Verdes orgulham-se de terem proposto e de terem contribuído para viabilizar um conjunto de medidas fulcrais para repor o respeito, a dignidade e condições de vida às famílias portuguesas, designadamente com o fim dos cortes nos salários e nas pensões, com o aumento de valores de apoios sociais e de pensões de reforma, com o fim da sobretaxa de IRS, com o aumento da progressividade no IRS, com a reposição nos 13% da taxa do IVA na restauração e com o descongelamento da progressão nas carreiras da função pública. Esta melhoria do rendimento das famílias, tal como o PEV sempre afirmou, teria inegavelmente consequências no bem-estar dos cidadãos e também numa maior dinamização da economia, designadamente ao nível das micro, pequenas e médias empresas. Por seu turno, essa dinamização da economia interna traria frutos ao nível da criação de emprego e da diminuição progressiva dos insustentáveis níveis de desemprego. Foi, efetivamente, o que se veio a verificar.
Para além da reversão de políticas inaceitáveis de empobrecimento dos cidadãos, impostas pelo anterior Governo, os Verdes sempre consideraram que era preciso atuar em áreas onde se estavam a fomentar problemas estruturais no país e, por isso, deram o passo decisivo para que isso acontecesse, com grande insistência e perseverança junto do Governo. Por exemplo, ao nível da floresta era fundamental estancar o crescimento exponencial das extensas monoculturas de eucalipto, as quais têm impacto significativo ao nível da perda de biodiversidade e ao nível da propagação e da dimensão que os fogos florestais atingem. Gerar uma floresta mais resiliente ao drama dos incêndios florestais, bem como mais multifuncional e diversificada foi um dos grandes objetivos que os Verdes tiveram quando negociaram com o Governo a alteração ao regime de arborização e rearborização, aprovado pelo Governo PSD/CDS, com a responsabilidade direta da então Ministra da Agricultura, Assunção Cristas, e que havia ficado conhecido como a lei da liberalização dos eucaliptos.
Também ao nível da mobilidade, os Verdes insistiram junto do Governo PS para que se reforçasse o investimento na ferrovia e para que se tomasse este meio de transporte como estratégico e também como um efetivo contributo para a coesão territorial – a luta que o PEV travou para a reposição do transporte diário de passageiros na linha do Leste foi uma vitória para as populações, para as instituições e para as empresas da região. Os Verdes batalharam também muito, junto do Governo, para que fosse instituído um desconto, sem condição de recursos, e, portanto, generalizado a todos os destinatários, do passe sub 23 e do passe 4-18,e também para que todos os contribuintes possam deduzir, em sede de IRS, a totalidade do valor do IVA gasto com a compra de passes sociais, de modo a incentivar a utilização do transporte coletivo, um desígnio determinante para que as cidades fiquem menos sobrecarregadas de automóveis e para contribuir para a diminuição de emissões de CO2.
Outra questão que ficará inegavelmente ligada à ação dos Verdes junto do Governo, foi a inversão que se fez ao nível da conservação da natureza, seja sob o aspeto do investimento público, seja sob o aspeto de mais meios humanos que têm vindo a ser reforçados desde o Orçamento do Estado para 2016, e que são recursos fundamentais para prevenir e combater a poluição e outras formas de agressão aos nossos recursos naturais e coletivos. Sempre dissemos que não se podem prestar bons serviços públicos sem recursos humanos adequados, e, por isso, o PEV tem feito uma efetiva pressão junto do Governo para se contratarem mais profissionais também nas escolas (designadamente auxiliares de ação educativa e assistentes técnicos) e nas unidades de saúde (designadamente médicos, enfermeiros, técnicos de diagnóstico) estando os Verdes a dar grande prioridade ao objetivo de garantir médico de família para todos os utentes, bem como de generalizar o acesso à saúde oral a mais centros de saúde.
Há outras áreas onde o PEV também deu um contributo decisivo para alteração de paradigma, como o fim do abate de animais em centros de recolha animal, e outras áreas que foram introduzidas na agenda política pela mão dos Verdes e cujo acompanhamento temos feito, de modo a pressionar para a concretização da execução necessária, como a intervenção em edifícios públicos com amianto.
Estes exemplos são bem demonstrativos de opções políticas que foram tomadas por direta pressão e influência dos Verdes. E que não haja ilusões – se o PS tivesse uma maioria absoluta não teria tomado, nem aprovado uma boa parte das medidas que veio a aceitar. De resto, basta ver como muitas destas medidas foram «arrancadas a ferros», ou a forma como o PS tentou desrespeitar o que na posição conjunta assinada com os Verdes estava determinado, por exemplo em relação ao fim da sobretaxa do IRS ou ao impedimento de diminuir a TSU para as entidades patronais. O PEV manteve-se sempre, contudo, numa postura de seriedade e de integridade e também de perseverança.
Não deixa, contudo, depois de ser curiosa a forma como o Primeiro-Ministro e outros membros do Governo, exaltam a importância da aprovação de medidas propostas pelo PEV, e que, primeiro, de tudo argumentaram para não aceitar, e vêm reconhecer os efeitos positivos da sua aprovação. Que não haja ilusões – o PS sozinho não teria sido diferente do que foi o PS em muitas outras governações e não teria revertido muitas das decisões nefastas tomadas pelo anterior Governo e que vieram a ser revertidas por influência de uma correlação de forças no Parlamento que fez depender o Governo de uma convergência nalgumas questões centrais.
Não admira, assim, que ao longo desta legislatura o PS tenha vindo a demonstrar como se constitui, muitas vezes, um travão a medidas necessárias ao desenvolvimento do país. Veja-se a sua recusa em aceitar as propostas dos Verdes relativamente, por exemplo, à fixação das 35 horas de trabalho alargada ao setor privado, ou a uma política fiscal incentivadora de investimentos domésticos em poupança energética, de modo a tornar o parque habitacional mais eficiente do ponto de vista energético.
Muitas vezes, especialmente no que concerne a investimento público, como exigimos na área da cultura, o grande argumento do Governo é a necessidade de cumprir a meta do défice. É, contudo, uma falácia – desde logo, este país já provou a receita da obsessão com o défice, que nunca deu bom resultado, mas, por outro lado, o Governo, já por dois anos consecutivos, ultrapassa a própria meta que estabeleceu para o défice, retirando recursos financeiros importantes para o país – só em 2016 foram 1400 milhões de euros que se poderiam ter investido e em 2017 mais 800 milhões de euros. Ora, no exemplo que demos, na área da cultura, especialmente no apoio às artes, o que os agentes culturais e o PEV propunham ao nível de investimento eram 25 milhões de euros! Percebem-se, assim, algumas das más opções do Governo PS! Má opção do Governo é também a irredutibilidade que tem demonstrado em não contabilizar todo o tempo de serviço efetivamente prestado para a valorização e reposicionamento da carreira dos professores e de outras profissões que se encontram nas mesmas circunstâncias. O argumento da falta de dinheiro não colhe, quando se coloca o défice abaixo do previsto, quando se disponibiliza sempre dinheiro para a banca, quando se recusa o fim de certas parcerias público-privadas (com grandes encargos para o Estado e boas benesses para as empresas privadas), quando se disponibilizam mais recursos financeiros para a NATO, ou quando se insiste no pagamento de juros agiotas de uma dívida que urge renegociar.
Deve, neste quadro, ser denunciada também a forma como o Governo PS tem procurado recolher o apoio do PSD em matérias como a descentralização ou a alteração à legislação laboral. É o PS a mostrar uma parte da sua essência de desresponsabilização do Estado, por um lado, e, por outro lado, de reforço da posição das entidades patronais em relação aos trabalhadores. Esta procura de apoio à direita é, na perspetiva dos Verdes, inaceitável e merece o nosso maior repúdio.
Em suma: se é verdade que nesta legislatura se têm conseguido ganhos significativos para os cidadãos e para o país, porque o PS foi puxado pela esquerda, também é de realçar que o PS sozinho não teria permitido muitas dessas conquistas, e também é verdade que o PS não consegue deixar de deambular e de, de uma forma ou de outra, acabar sempre por negociar algumas estratégias com a direita.
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