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12/05/2000
Sobre os Impactes e controlo da extracção de areia no rio Tejo.
OS VERDES QUESTIONAM GOVERNO SOBRE

Impactes e controlo da extracção de areia no rio Tejo

Reunião Plenária N.º 65, de 12 de Maio de 2000

 

O Sr. Presidente (Mota Amaral): — Srs. Deputados, da ordem do dia de hoje constam perguntas ao Governo, sendo a primeira formulada pela Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, do Grupo Parlamentar Os Verdes, sobre os impactos e controle da extracção de areia no rio Tejo, que será respondida pelo Sr. Ministro do Ambiente e Ordenamento do Território, que já se encontra presente e a quem cumprimento.

Tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, em primeiro lugar, gostaria de referir que, desde Dezembro do ano passado, o Grupo Parlamentar Os Verdes tem insistido na resposta a esta questão em sessão de perguntas ao Governo. Portanto, até que enfim que o Ministério do Ambiente e Ordenamento do Território se digna responder a esta matéria. Na nossa perspectiva, seguramente, deu tempo para fazer algum trabalho de casa!

Sr. Ministro, a ver pelas determinações do Decreto-lei n.º 46/94, de 22 de Fevereiro, relativo ao regime jurídico de utilização do domínio hídrico, não passaria pela cabeça de ninguém encontrar aquilo que se vê ao longo do rio Tejo, nomeadamente de Abrantes a Lisboa, no que respeita à extracção de areias.

Como diria um então porta-voz do Partido Socialista para o ambiente em tempo de oposição, hoje Ministro do Ambiente e do Ordenamento do Território, existe um país legal e um país real e um nada tem a ver com o outro.

O referido Decreto-Lei acautela a integridade do leito relativamente às extracções de areia, a estabilidade das margens, a preservação da fauna e da flora, o planeamento das actividades de extracção de areia, como a intervenção de desassoreamento e muitas outras questões. Ao referido Decreto-Lei todos os Srs. Deputados têm seguramente acesso, pelo que me dispenso de o citar, mas a realidade nua e crua é que provavelmente alguns desconhecerão.

Penso que qualificar a prática de exploração de areia no Tejo como criminosa e bárbara não é um exagero nem um fundamentalismo ecologista. Não há concelho ribeirinho que não tenha uma extracção, quando não mais do que uma. Aliás, a primeira pergunta que gostaria de fazer ao Sr. Ministro é a seguinte: qual o número de extracções licenciadas, neste troço do rio Tejo?

Os camiões partem, ininterruptamente, carregados de toneladas de areia, sem qualquer controlo da quantidade das areias extraídas; as «lagartas» chegam a cortar os rios de lés a lés, criando uma verdadeira fronteira metálica com perigos daí inerentes para os seus utilizadores; para a sucção das areias são utilizados motores com uma potência brutal, que chega a atingir 500 a 600 cavalos e são utilizados jactos para remover as areias por motores com igual potência, atingindo a rocha do fundo do leito e quebrando a camada de areia sedimentada sobre a mesma.

Feita mais ou menos a caracterização da situação, gostaria que, para além do número exacto das explorações, o Sr. Ministro nos informasse acerca de quantas foram as explorações sujeitas a estudo de impacte ambiental ou de incidência ambiental, como determina a lei, e quantas foram sujeitas a inquérito público.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro do Ambiente e do Ordenamento do Território, dispondo, para o efeito, de 3 minutos.

O Sr. Ministro do Ambiente e do Ordenamento do Território (José Sócrates): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada, agradeço a pergunta, justamente porque nos dá oportunidade de nos referirmos a um dos pontos em que o Estado deve fazer mais, sendo, portanto, uma das nossas prioridades fazer cumprir a lei.

Uma das orientações do Ministério, tendo em consideração que o desenvolvimento legislativo ambiental é recente, é, justamente, fazer com a lei ambiental seja cumprida; todavia, o domínio das extracções de areias é uma das áreas onde tem sido mais difícil cumprir. Desde 1994 que temos um decreto-lei em vigor sobre a matéria e, de facto, a realidade tem demonstrado que tem sido de difícil aplicação.

Mas, como dizia, a orientação do Ministério é fazer aplicar este Decreto-Lei. Como? Em primeiro lugar, cumprindo o que consta do Decreto-Lei, já que todas as explorações de areia nos rios devem ser feitas ou por concessão ou, então, através de concurso público.

Como sabe – e este facto já é conhecido nos diferentes meios (aliás, a seguir responderei a uma pergunta que tem que ver com o facto de o Ministério do Ambiente e do Ordenamento do Território ter proibido o funcionamento de uma empresa) –, vamos fazer um concurso público (e vamos começar pelo Tejo) para a extracção de areias, o qual não pôde ser feito antes de ter sido realizado um estudo sobre os locais que deveriam ser objecto de exploração. É que a questão técnica é essencial, porque o que se tem passado é que dificilmente se pode comprovar tecnicamente que os locais onde estão a ser exploradas areias são aqueles locais dos rios onde é necessário fazer essa operação. Portanto, nesse sentido foi feito um estudo pelo LNEC (Laboratório Nacional de Engenharia Civil).

Como a Sr.ª Deputada referiu, a seguir a este estudo, é preciso desenvolver agora os estudos de incidência ambiental para cada um desses locais, por forma a definir rigorosamente, no caderno de encargos do concurso público, as obrigações que cada exploração deve ter em cada um desses sítios. Esse estudo de incidências ambientais, que está previsto na legislação, como referiu, está a ser feito e contamos tê-lo concluído durante o mês de Junho, o que quer dizer que nesse mês lançaremos o concurso público para o Tejo. Com o lançamento deste concurso para a regulamentação e para a atribuição de licenças no Tejo, criaremos um sistema coerente e uniforme, que será depois aplicado a todas as outras direcções regionais.

A situação é, por um lado – não hesito em dizê-lo –, de desconformidade com a lei existente e, por outro lado, de ausência de certezas técnicas quanto ao resultado do interesse público da exploração de areias. Não há qualquer certeza sobre se o que se está a fazer contribui para o desassoreamento dos rios, se se está a explorar areia nos sítios correctos. Por isso é que vamos começar pelo Tejo, já no próximo mês.

Julgo, portanto, estar em condições de lhe dar boas notícias neste domínio.

O nosso objectivo e a nossa determinação, nestes seis meses, foram fazer com que este sector, tradicionalmente muito difícil, passasse a cumprir todas as normas legais previstas justamente no diploma de 1994, que citou. Seis anos já é suficiente para fazermos aplicar a lei.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): — Para pedir esclarecimentos adicionais, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, dispondo, para este efeito, de 2 minutos.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, quem o ouviu falar terá ficado com dúvidas sobre quem teria estado no governo aquando da anterior legislatura. É que, ao que parece, só agora, o Governo do Partido Socialista, segundo as palavras do Sr. Ministro, acordou para este grave atentado e crime ecológico que acontece no Tejo, situação que foi conhecida na passada legislatura, tendo graves consequências em termos de ecossistema e da própria vivência do rio.

Sobre a inexistência de certeza, que o Sr. Ministro referiu, em relação às acções de desassoreamento das extracções de areia, pergunto: e quanto à fiscalização? Ela é completamente inexistente não só em relação em relação a esta matéria como a outras. Aliás, sabe-se perfeitamente que algumas explorações funcionam ilegalmente, no sentido de que extraem muito mais areia do que aquela que estão autorizadas a fazer. Portanto, o que há – e permita-me a expressão – é uma inexistência de fiscalização quanto a esta matéria fundamental, e a isso o Sr. Ministro não se referiu.

Gostaria de colocar uma última pergunta ao Sr. Ministro.

Os planos de bacia também têm uma função fundamental no planeamento das extracções de inertes. Sr. Ministro, já pensou quanto custaram ao Tejo os sucessivos atrasos no que diz respeito aos planos de bacia, nomeadamente ao plano de bacia do Tejo? Gostaria de saber o que é que o Sr. Ministro tem a dizer sobre esta matéria.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): — Para pedir esclarecimentos adicionais, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel de Castro, dispondo, para o efeito, de 1 minuto.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, corrigido o facto de este problema não existir há seis meses mas, como bem sabe, há seis anos, havendo um desajuste entre a lei e a realidade, sabendo da situação caótica — porque evidentemente a gravidade da situação é tão grande que ninguém a pode ignorar — e admitidas as imensas dúvidas sobre os impactes, a verdade é que a extracção está a ser feita.

Pergunto: o Governo admite ou não, desde já, impor uma moratória, ou seja, suspender todas as extracções até ter um conhecimento científico que lhe permita decidir diferentemente e, eventualmente, vir a conceder licenciamentos para extracção em determinados locais? É que as etapas que há para cumprir seguramente demoram meses e, do nosso ponto de vista, não se pode «queimar» mais tempo.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Muito bem!

O Sr. Presidente (Mota Amaral): — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro do Ambiente e do Ordenamento do Território, dispondo no máximo de 10 minutos para responder ao conjunto das questões, mas faço-lhe notar que já foram gastos 3 minutos.

Faça favor, Sr. Ministro.

O Sr. Ministro do Ambiente e do Ordenamento do Território: — Sr. Presidente, vou ser breve, já que nada há de novo nestas últimas perguntas a não ser a questão da suspensão.

Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, fui honesto consigo, não pintei o sector de cor-de-rosa, disse exactamente o que se passava e estou de acordo com a necessidade que referiu de, neste domínio, fazer aplicar a lei e disse, aliás, que esta era a principal preocupação do Ministério do Ambiente e do Ordenamento do Território. No entanto, não posso é ser «preso por ter cão e preso por não ter».

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Ninguém disse isso!

O Orador: — Não posso ser «preso» por ser honesto e dizer a verdade e, por outro lado, ser também «preso» pelo facto de não haver resultados.

Além disso, como a Sr.ª Deputada sabe, os esforços do Governo neste domínio não começaram nos últimos seis meses mas, sim, desde 1997, porque foi finalmente nesse ano que se começou a actuar. Foi nesse ano que foi encomendado o estudo ao LNEC, que nos permite, neste momento, saber exactamente quais os locais onde pode e deve ser feita a exploração de areia, a benefício do Tejo e do interesse público.

Falta-nos, agora, complementar o estudo das incidências ambientais que, como lhe disse, está muito próximo do fim e, finalmente, lançar o concurso público. Vai ser uma grande novidade! As principais vozes de descontentamento, as principais vozes dos interesses económicos ligados a esta matéria, já se começaram a fazer ouvir contra o concurso público, contra a excessiva regulamentação, etc., mas vamos enfrentar esses interesses e vamos fazer aquilo que, embora já devesse ter sido feito há muitos anos, sem o correspondente estudo técnico da matéria, era muito difícil avançar, e desde 1997 que estão a ser feitos esses estudos.

Quanto aos planos de bacia, devo dizer que só vão estar prontos em Dezembro de 2000 e não podemos esperar por eles, como algumas pessoas disseram, para, depois, fazermos o que devemos fazer. Não! Vamos avançar com o concurso público já este ano, no Verão, e, se estivermos em condições de o lançar em Junho, não deixaremos de o fazer. Se não poder ser, será em Julho, já que, e concordo com as Sr.as Deputadas, a situação é urgente.

Finalmente, não me parece que seja necessário suspender as explorações de areia. Se os estudos técnicos demorassem ainda mais dois anos, poderíamos pôr essa hipótese. Como estamos a dois meses de lançar um concurso público, não nos parece haver motivo para a suspensão. Repito, se os estudos demorassem anos, poderia ser uma hipótese, mas a verdade é que o que queremos fazer pode fazer-se nos próximos dois meses e por isso não nos parece haver qualquer vantagem em tomar uma medida tão radical como essa. Se a tivéssemos tomado em 1994, era outra situação, mas a verdade é que não a tomámos e não vamos tomá-la agora, a dois meses de, finalmente, começarmos a pôr as coisas em ordem no Tejo.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): — Srs. Deputados, vamos passar à segunda pergunta agendada para hoje, sobre a extracção de areias na Praia do Ribatejo pela empresa Sarcil, Lda., a qual vai ser formulada pelo Sr. Deputado Herculano Gonçalves e será também respondida pelo Sr. Ministro do Ambiente e do Ordenamento do Território.

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