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17/03/2000
Sobre Projectos no Parque Natural de Sintra-Cascais
OS VERDES QUESTIONAM GOVERNO SOBRE

Projectos no Parque Natural de Sintra-Cascais

Reunião Plenária N.º 44, de 17 de Março de 2000


O Sr. Presidente (João Amaral): — ...Vamos passar à segunda pergunta, relativa a um tema conexo ou semelhante, ou seja, sobre os projectos urbanísticos no Parque Natural de Sintra-Cascais e que vai ser respondida pelo mesmo Secretário de Estado.

Tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): — Sr. Presidente, vou formular a pergunta sobre os planos urbanísticos de uma forma sintética. Julgo que é bom voltar a frisar do que é que estamos a falar. Estamos a falar, em primeiro lugar, do Parque Natural Sintra-Cascais e daquilo que se passa nele há anos, que é o verdadeiro escândalo nacional. Em segundo lugar, estamos a falar de um parque natural que está a saque, um parque onde, diariamente, são cometidos crimes contra a natureza, um parque que foi criado para conservação da natureza e onde é o betão quem mais ordena.

Parece-me que temos de falar disto. Não vou lembrar o que é que Os Verdes, no tempo do PSD, fizeram contra quem permitiu algumas coisas. Vou falar dos últimos cinco anos e do que se passa no parque natural, vou falar de um plano de ordenamento de 1994 que, como o Sr. Secretário de Estado bem sabe, já podia ter sido revisto, de acordo com a própria regra que define, mas o Governo não o fez. Aliás, recordo que, nesta Câmara, quando criticámos o PSD pelas possibilidades que não estavam já adquiridas mas que abria, em 1994, o Partido Socialista, secundando as nossas críticas, disse que se fosse governo, iria de imediato suspender aquilo. Viu-se!...

As perguntas concretas que lhe faço, Sr. Secretário de Estado, têm a ver, portanto, com algumas das promessas feitas, no dia 23 de Fevereiro, pelo Sr. Ministro José Sócrates, em visita acompanhada pelos responsáveis pelos municípios de Sintra e de Cascais. Concretamente, foi dito o que era óbvio, ou seja, que o Abano não ia avançar, não havia nenhum licenciamento feito e que não haveria mais ilegalidades no parque, isto é, não iria ser construído mais nada e iriam ser suspensas todas as construções, para além daquilo que eram direitos adquiridos. Ora, como algumas das coisas que foram construídas dentro do parque são manifestamente ilegais, ou seja, os seus licenciamentos carecem de sustentabilidade, visto que, pura e simplesmente, não cumprem a legislação, pelo que deviam ser anulados, e como há uma afirmação muito clara sobre esta matéria, pergunto-lhe o que é que se modificou.

Quanto ao segundo aspecto, que diz respeito ao Abano, o Governo escuda-se. Lembro que a possibilidade de construção do Abano estava prevista em 1994 e o respectivo licenciamento é de 1997. Ora, quem estava em 1997 no governo já não era o Partido Social Democrata mas o Partido Socialista. Assim sendo, pergunto-lhe, em relação a estas afirmações e às coisas concretas, o que é que aconteceu de diferente desde 23 de Fevereiro.

O Sr. Presidente (João Amaral): — Tem a palavra, para responder, o Sr. Secretário de Estado do Ordenamento do Território e da Conservação da Natureza. Dispõe de 3 minutos.

O Sr. Secretário de Estado do Ordenamento do Território e da Conservação da Natureza: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Isabel Castro, compreendo que, quando o Governo está em condições de apresentar iniciativas, a resposta possível da oposição é dizer que veio tarde. Concordo consigo no sentido de que teria sido possível rever o plano de ordenamento do Parque Natural Sintra-Cascais mais cedo. O Abano foi um erro. Estou em condições de lhe dizer, sem nenhum problema, que foi um erro não ter iniciado a revisão do plano de ordenamento do Parque Natural Sintra-Cascais mais cedo.

A Sr.ª Maria Santos (PS): — Muito bem!

O Orador: — Mas, Sr.ª Deputada, apesar dessa sua preocupação em fazer transferir a nossa discussão para governos anteriores ser um caminho possível, estou aqui para lhe prestar esclarecimentos sobre aquilo que é a política do Governo que integro.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Há quatro meses!

O Orador: — E este Governo que integro tem uma política que mudou tudo no Parque Natural Sintra-Cascais. Não foi uma visita que o Sr. Ministro fez ao Parque Natural Sintra-Cascais, pois este Governo iniciou um processo de revisão do plano de ordenamento, tendo uma inspecção, já iniciada, no terreno; o Governo vai aprovar uma resolução, em Conselho de Ministros, que estabelece, exactamente, a suspensão das regras do plano de ordenamento nas áreas de turismo e que interdita a construção naqueles locais que lhe indiquei, tais como cabo Raso, Riba Longa, Pêgo, Autodril, Praia das Maçãs e Fontanelas; houve uma vistoria conjunta do parque e da Câmara de Cascais em relação a algumas construções ilegais, como as da Casa da Guia, sobre as quais decorre uma ordem de demolição, emitida pela Câmara de Cascais, cujo prazo termina, justamente, hoje.

É isto que está a mudar no Parque Natural Sintra-Cascais. Se a Sr.ª Deputada me pergunta se nada mudou, só lhe posso responder que os factos falam por si. Está tudo a mudar no Parque Natural Sintra-Cascais e, ao mudar aí, está a mudar na política de ambiente e de ordenamento do território do País, porque estamos, desta forma, a passar um sinal, uma mensagem, que, como lhe dizia no início, serve de paradigma para aquilo que está a acontecer no resto do País.

Quanto ao Abano, em relação ao qual a Sr.ª Deputada me pergunta se não podíamos, pura e simplesmente, anular a decisão já tomada, já disse que estamos perante uma situação em que existe uma licença emitida, um alvará de construção. Mas tudo é possível e até se pode expropriar o terreno; desde que se indemnizem os proprietários, tudo é possível.

No caso do Abano, estamos a falar, — como a Sr.ª Deputada não ignora —, dos solos mais valiosos do País, pelo que uma intervenção, nessas condições, implicava, inevitavelmente, uma indemnização muito vultuosa. Esta situação não tem nada que ver com a que ocorreu no Meco, onde não anulámos nenhum alvará mas pedimos a suspensão de eficácia de um alvará, dentro do prazo que existe para essas iniciativas, que teve seguimento pela iniciativa do Ministério Público. No caso do Abano, a situação é completamente diferente, isto é, estamos a falar de um alvará em relação ao qual essa iniciativa, de facto, já não é possível.

O Sr. Presidente (João Amaral): — Sr. Secretário de Estado, peço-lhe que conclua.

O Orador: — Voltarei ao tema em intervenções posteriores.

O Sr. Presidente (João Amaral): — Estão inscritos, para pedidos de esclarecimento adicionais, os Srs. Deputados Isabel Castro, Luís Fazenda, Rui Gomes da Silva, Joaquim Matias e Francisco Torres.

Tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro, que dispõe de 2 minutos.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): — Sr. Presidente, serei breve e clara nas perguntas, esperando que o Sr. Secretário de Estado responda, porque ainda não o fez. Embora tenha usado quase 8 minutos, fugiu a uma questão muito concreta que formulei em relação ao ex-director do Parque. Pedia-lhe, portanto, que fosse telegráfico, tal como vou ser em relação às perguntas, para perceber o que é que mudou desde 23 de Fevereiro.

Se foi dito que era tudo ilegal e que não haveria mais construções ilegais, as pergunta que gostaria de fazer são precisas.

Em primeiro lugar, quanto à Quinta da Marinha, está em construção um campo de golfe, que obriga a avaliação do impacte ambiental, mas, durante este lapso de tempo, nada aconteceu, pelo que gostaríamos de saber o que foi e será feito para travar esta construção, que é manifestamente ilegal.

Quanto à Casa de S. José, na Quinta da Guia, a questão do embargo que o Sr. Secretário de Estado está a colocar, não valia a pena, visto que já estava colocada antes de 23 de Fevereiro. Neste sentido, gostaria de saber quanto tempo mais é que vão estar à espera para, não tendo sido cumprido o embargo, se proceder à demolição.

A terceira questão diz respeito à Casa Disneylandia, que é mais um licenciamento ilegal, na Quinta da Felicidade, e cuja ordem de embargo não vemos que tenha sido cumprida. Assim sendo, pergunto se o Governo se resigna e se vai permitir que se mantenha esta situação ilegal.

Por último, vamos à questão do Abano. Quanto ao Abano, trata-se de direitos adquiridos porque o Partido Socialista, na Câmara Municipal de Cascais e no Governo, permitiu que houvesse autorização de construção em 1997, escudando-se, portanto, no tal «mal» que é o plano de ordenamento de 1994. A pergunta concreta que lhe faço e esta: o que aquele plano previa e autorizava, como limite máximo, era 60 000 m2 de área de construção. O que está a ser construído é manifestamente mais. Gostaria de saber que levantamento topográfico foi feito para verificar a área que está a ser construída. Em segundo lugar, estamos a falar da Rede Natura 2000, o que significa obrigação de estudo prévio especial de avaliação do impacte ambiental. Ora, estes dois procedimentos têm cobertura legal e, até agora, o Governo ainda não os efectuou.

O Sr. Presidente (João Amaral): — Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda, para um pedido de esclarecimento adicional.

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, deixou implícita uma culpa política a assacar à anterior equipa governativa. Ora, que saibamos, houve «dança» de pastas mas não há efectiva responsabilização política por parte do Governo. Assim, podemos aceitar essa autocrítica, não podemos é viver numa situação de impunidade política em que «a culpa morre solteira».

O caso torna-se mais surrealista quando ouvimos que o Sr. Deputado Francisco Torres já está a prever manifestações, em que se incluirão Deputados do Partido Socialista, apelando à sociedade civil para revogar uma decisão do Governo.

Não compreendemos que não haja responsabilização política do Executivo quando se mantêm os anteriores detentores de pastas, embora noutras, alteradas, e quando, da parte de Deputados da bancada que apoia o Governo, se assiste ao apelo à sociedade civil para resolver o que o Governo não resolve. Deve concordar, Sr. Secretário de Estado, que, para um membro de um partido da oposição, esta é uma situação difícil de entender. Não é que V. Ex.ª não tenha premiado, absolvido e partilhado responsabilidades, dispensando responsabilidades a outros, mas, faço-lhe uma pergunta.

Disse que, em sede orçamental, seria uma irresponsabilidade avançar com indemnizações para fazer face à questão dos direitos adquiridos no âmbito do parque natural, em concreto quanto à questão do Abano, tendo-se refugiado no argumento de que se trata de terrenos muito valiosos. Ora, pela nossa parte, não temos a menor noção de qual seria a importância de uma indemnização desse género — e já várias vezes lhe foi feita a pergunta sobre isso — para permitir que, de uma forma responsável, alguém tivesse avançado com a inscrição de tais importâncias em sede orçamental. Aliás, faço notar que, tanto quanto sabemos, não foi tomada qualquer iniciativa nesse sentido por parte de Deputados do Partido Socialista, em sede de Orçamento.

Ora, se é importante a existência de uma frente bastante ampla em defesa da natureza, também seria importante que o Partido Socialista fosse mais transparente e, pelo menos, resolvesse esta questão existencial, política, a que estamos a assistir.

O Sr. Presidente (João Amaral): — Tem a palavra o Sr. Deputado Rui Gomes da Silva.

O Sr. Rui Gomes da Silva (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, a minha pergunta é recorrente em relação a esta matéria e, aí, também em relação ao que acaba de dizer o Sr. Deputado Luís Fazenda.

Em primeiro lugar, Sr. Secretário de Estado, devo dizer-lhe que fala-se muito da Casa da Guia como sendo um pequeno exemplo do que é a política do Governo. Ora, dir-lhe-ia que, em vez de olhar para a Casa da Guia — e acho que deve fazê-lo! —, deveria era preocupar-se com o PDM para Cascais, que o PS fez aprovar, e com o escândalo urbanístico que ocorre, neste momento, em Cascais.

A pergunta que vou fazer-lhe é muito directa e, Sr. Secretário de Estado, exige uma resposta igualmente directa.

O Sr. Secretário de Estado disse que «o Abano foi um erro». Se foi um erro, então, pergunto se o que, a partir de agora, posso ler nas suas palavras é que foi um erro da anterior Ministra do Ambiente, Dr.ª Elisa Ferreira. Sim ou não? E escusa de dizer-me que «talvez», que «há outros diplomas assinados por outros ministros». Responda-me que, então, foi um erro do anterior governo do Partido Socialista, foi um erro da Ministra Elisa Ferreira. Isto que fique muito claro.

Mais uma vez, Sr. Secretário de Estado, é preciso que isto fique muito claro: o senhor está nesse lugar há pouco tempo; o PS, infelizmente para o País, já está há tempo demais no Governo.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Presidente (João Amaral): — Para um pedido de esclarecimento adicional, tem a palavra o Sr. Deputado Joaquim Matias, para o que dispõe de 2 minutos.

O Sr. Joaquim Matias (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, a questão de fundo que se coloca nesta matéria é a da política de ordenamento do território e de salvaguarda dos direitos ambientais. Essa política deve ser executada com instrumentos de planeamento e gestão do solo, que deverão ser elaborados de forma participada, inclusive pelas autarquias locais e pelas populações. Mas a referida política também passa pela aplicação desses instrumentos. É que, ao elaborar-se instrumentos sem os aplicar e sem conferir às autarquias locais e às populações o direito da respectiva fiscalização, corre-se o risco de os mesmos não passarem de planos no papel.

A questão principal que se coloca em relação a esta matéria é a de saber se o direito de transformação do solo é ou não direito público e deve ou não prevalecer sobre os actos administrativos e sobre erros administrativos — e também os há! — que, por vezes, permitem a ocorrência de situações desastrosas.

É nesse sentido que, na próxima semana, a Assembleia vai discutir um projecto de lei, apresentado pelo Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português, no qual se propõe que as licenças de construção e as de urbanização e loteamento possam ser sujeitas a conformidade com os instrumentos de gestão territorial.

Posto isto, Sr. Secretário de Estado, entende ou não que os instrumentos de gestão territorial devem prevalecer sobre os actos administrativos?

Segundo, considera ou não correcto que as licenças de construção ou de loteamento, concedidas ao abrigo de um acto administrativo, ou, até, de um erro administrativo activo ou de uma omissão, podem e devem ser sujeitas a conformidade com os planos de ordenamento e gestão do território que estejam em vigor, caso os interessados, a Administração Pública ou mesmo as populações assim o entendam?

O Sr. Presidente (João Amaral): — Tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Torres, também para um pedido de esclarecimento adicional.

O Sr. Francisco Torres (PS): — Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, permita-me agradecer-lhe mais uma vez a sua vinda a esta Câmara, o facto de ter respondido aos Srs. Deputados que o interrogaram sobre esta questão, que é importante, e, ainda, que reconheça que, tal como já adiantou, há uma nova filosofia neste domínio.

Aliás, ficou bem demonstrado que o Governo não se importa de analisar friamente esta questão sem quaisquer complexos e reconhece que o plano de ordenamento poderia ter sido revisto, e mais cedo. Simplesmente, a actual equipa chegou ao Governo e decretou a suspensão, não tendo eficácia os actos que poderiam ter sido aprovados. Portanto, estamos perante uma actuação diferente que salvaguarda todos os empreendimentos — Raso, Autodril, etc. — relativamente aos quais o Sr. Secretário de Estado deu garantia nesse sentido.

Aproveito para anunciar, Sr. Presidente, Srs. Deputados, que, na passada semana, deu entrada na Comissão de Assuntos Europeus um projecto para apreciação e resolução sobre a Rede Natura 2000 e o QCA. Se o mesmo for aprovado na próxima reunião da Comissão, com certeza virá cá o Sr. Ministro do Ambiente e do Ordenamento do Território, ocasião em que discutiremos o acompanhamento destas questões por parte da Assembleia da República.

É que, como referiu a Deputada Helena Roseta, a Assembleia tem uma obrigação nesta matéria, nomeadamente no que toca à discussão dos direitos adquiridos.

Dirijo-me agora ao Sr. Deputado Luís Fazenda, pois não resisto a comentar palavras que proferiu.

É claro que vários Deputados desta bancada irão participar num movimento cívico, até porque, ao virem para aqui, não perdem os seus direitos de cidadania. Mas não participaremos em movimentos cívicos no sentido de revogações dos actos do Governo, vamos ajudar à consciencialização de que, tal como a Assembleia da República, a sociedade civil não deve fugir às suas responsabilidades, como acontece neste caso. Nomeadamente, por exemplo no caso do Abano, até poderá pôr-se em tribunal — não o fazendo o Governo, várias associações cívicas podem fazê-lo —, o que não põe em causa as dotações do Estado.

Aproveito para dizer-lhe, Sr. Deputado, que se não apresentámos propostas de alteração em sede orçamental, nomeadamente no que toca a indemnizações de qualquer ordem, foi porque reconhecemos — e esse é um debate que temos de fazer — que, no actual processo de desenvolvimento, há poucos recursos para muitas necessidades.

Como dizia, temos de fazer esse debate para saber se não valerá a pena gastar um pouco mais hoje para evitar gastos futuros ainda maiores.

O Sr. Presidente (João Amaral): — Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Ordenamento do Território e da Conservação da Natureza.

O Sr. Secretário de Estado do Ordenamento do Território e da Conservação da Natureza: — Sr. Presidente, Srs. Deputados, começo por agradecer as várias perguntas que me dirigiram.

Em primeiro lugar, vou ao encontro do que disse o Sr. Deputado da bancada do Partido Comunista quando afirmou que a questão de fundo é uma questão de ordenamento do território.

Devo dizer que estou perfeitamente de acordo consigo. O que está em jogo no Parque Natural Sintra-Cascais é uma política de ambinte e de ordenamento do território. Essa é realmente a questão de fundo, e o Sr. Deputado tem toda a razão.

O que acabo de afirmar faz com que a Sr.ª Deputada Isabel Castro, provavelmente, tenha menos razão quando procura reduzir esta questão tão importante da gestão do Parque Natural Sintra-Cascais às responsabilidades de alguém que exerceu anteriormente funções de director do mesmo.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): — Não é nada disso!

Não percebeu, mas eu explico!

O Orador: — Digo isto porque a verdade é outra, e já agora aproveito para esclarecer a Sr.ª Deputada.

O projecto do Abano, hoje tão controverso, é um projecto cuja localização foi aprovada em Março de 1996. Essa aprovação teve um parecer favorável do Parque Natural Sintra-Cascais, na altura dirigido por uma outra pessoa que não a que referiu nesta Câmara.

As intervenções posteriores, no ano de 1997, a que a Sr.ª Deputada se refere, têm que ver com o que não são certamente os problemas graves do projecto do Abano.

O problema do projecto do Abano é a sua localização. É isso que se discute hoje em dia, por causa da classificação do sítio como fazendo parte da Rede Natura 2000. Portanto, há que saber se deve construir-se ali um campo de golfe, se deve haver ali uma área de turismo e recreio. Eu próprio já disse o que penso sobre isso. Já disse que considero que é um erro. Mas, repito, o problema é o da localização, a qual foi decidida em 1996.

Não estamos a discutir as fachadas nem a momentosa questão de saber se são ou não 60 000 m2 de área de construção…

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): — A área é indiferente?!

O Orador: — O problema é o da localização.

De facto, em 1997, as intervenções posteriores das autoridades do Parque sobre este projecto do Abano dizem respeito apenas ao projecto de execução e não têm a ver com a localização.

É por isso, também, que, quando se coloca a questão da Rede Natura 2000, se estabelece um equívoco.

É que, em 1996, quando foi aprovada a localização do projecto do Abano, ainda não estava aprovada a Lista Nacional de Sítios e, portanto, ainda não era aplicável àquela zona o regime da Rede Natura 2000.

Assim, quando a Sr.ª Deputada diz que tinha de ser feito um estudo de impacte ambiental ao abrigo do regime da Rede Natura 2000, está a apenas a confundir o que é a intervenção da Administração Central a propósito da aprovação da localização do empreendimento com um outro aspecto, que se coloca noutra sede, que é o da aprovação do projecto de execução, que tem a ver com índices de construção, com fachadas.

Ora, digo-lhe com sinceridade que, em relação ao Abano, o problema não é o de saber se o hotel projectado tem mais um ou menos um piso, se a fachada é mais ou menos bonita, mas, sim, saber se, naquele local, aquele empreendimento deveria ter lugar. É isso que se discute em sede de localização. É essa a questão que se colocou em 1996.

Os Srs. Deputados insistem em que eu faça uma avaliação política sobre o governo anterior quanto às responsabilidades políticas. Ora, já disse o que pensava sobre a possibilidade de se ter feito mais cedo a revisão do plano de ordenamento. Mas, Srs. Deputados, seria uma situação a todos os títulos invulgar, duplamente invulgar, primeiro, que fosse o governo posterior a fazer um juízo político sobre o governo que o antecedeu, em segundo lugar, que esta Câmara pretendesse substituir-se ao que foi o juízo popular resultante de eleições sobre o modo como decorreu a gestão do anterior governo.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): — Essa é boa! É preciso ter «lata»!

O Orador: — Como já referi, essa questão transitou em julgado; houve eleições e o governo anterior foi julgado. Agora, estou eu aqui para responder pelo actual Governo a que pertenço e estou aqui para dizer que estamos a fazer coisas no Parque Natural Sintra-Cascais.

Aliás, registo, Srs. Deputados, que ninguém ousou dizer que não são acertadas as medidas que estamos a tomar no âmbito do Parque Natural Sintra-Cascais. De um lado, vieram dizer-nos que «talvez tenham chegado tarde», de outro disseram-nos que talvez possamos fazer mais. Respondo que sim, que talvez possamos fazer mais. Estamos aqui para trabalhar e com certeza vamos fazer mais. Mas, Srs. Deputados, nunca ninguém fez tanto em tão pouco tempo no Parque Natural Sintra-Cascais. Esta é uma afirmação que não vi desmentida, nem vejo que alguém tenha condições para desmentir.

Em relação ao caso específico do anterior director do Parque Natural Sintra-Cascais, a Sr.ª Deputada fez uma pergunta directa e não quero que diga que fugi a ela. Assim, respondo que o responsável pelos planos de ordenamento da orla costeira do litoral sou eu, Sr.ª Deputada. Eu respondo pelos planos de ordenamento da orla costeira e pelas intervenções do Governo em defesa do litoral.

Portanto, Sr.ª Deputada, se pretende reduzir estas questões a um funcionário do Instituto de Conservação da Natureza, julgo que vai por mau caminho e não ao encontro das questões de fundo, que são as questões da articulação entre os valores do ordenamento do território e do ambiente no Parque Natural Sintra-Cascais.

Foi-me feita a pergunta de qual a avaliação que posso fazer dos valores dos terrenos do Abano para que os Srs. Deputados possam considerar uma proposta orçamental. Esta seria uma situação a todos os títulos curiosa, isto é, que nós pudéssemos vir aqui, exactamente no dia seguinte à aprovação do Orçamento, reabrir a discussão orçamental.

Não vou prestar esse favor aos promotores do Abano, de vir fazer aqui, na Assembleia da República, uma declaração pública sobre a avaliação dos terrenos a que eles teriam direito em caso de indemnização. Admito, acredito, tenho a certeza, de que essa pergunta foi feita com intenção de facilitar a vida aos promotores do Abano num processo de indemnização que, posteriormente, possam deduzir contra o Estado, mas o que tenho a dizer é que não vou prestar esse favor aos proprietários, fazendo aqui uma avaliação sumária sobre o que pode valer aquele terreno em sede de avaliação.

Digo mais: estamos vigilantes, o que é uma coisa diferente. Aquilo que, provavelmente, os Srs. Deputados pretendiam é que nós viéssemos vir aqui anunciar que anulámos uma decisão — de resto, a decisão final nem sequer é do Ministério do Ambiente e, portanto, juridicamente, não a podíamos tomar nesses termos — de aprovação da localização proferida pela Direcção-Geral do Turismo em 1996. O rigor que usámos no Meco permitiu fazer o que ali fizemos, sem que hoje os promotores do Meco tenham um pedido de indemnização contra o Estado deduzido nos tribunais portugueses. Isso surpreenderá, certamente, esta Câmara, mas a verdade dos factos é que tal só foi possível porque essa intervenção foi feita com grande rigor e com grande sentido de responsabilidade.

Mas, repito, também estamos vigilantes no caso do Abano. O que é que isso significa? Significa que existem, por exemplo, requisitos da localização que foi proferida que podem determinar, caso não venham a ser cumpridos, a caducidade. Estamos, pois, a acompanhar a situação do projecto do Abano. Se dissemos que ele era um erro, tal afirmação não é, com certeza, compatível com dizer-se que, pura e simplesmente, fechamos os olhos e que vamos facilitar o desenvolvimento daquele empreendimento. Vamos acompanhar essa situação com grande sentido de responsabilidade, e é também este grande sentido de responsabilidade que eu queria pedir aos Srs. Deputados em relação àquelas situações.

A Sr.ª Deputada Isabel Castro questionou-me sobre os actos praticados pelo Governo desde 23 de Fevereiro. Mais uma vez, temos uma singularidade neste debate parlamentar: por um lado, querem que eu venha aqui responder por aquilo que foi a actuação do Governo anterior, mas quando me disponho a responder pela intervenção de quatro meses deste Governo os Srs. Deputados dizem: «Não, não pode responder por estes quatro meses, só queremos que responda pelo período que vai de 23 de Fevereiro até ao dia de hoje, dia 17 de Março». Sobre o resto do tempo os Srs. Deputados não querem ouvir falar!

Srs. Deputados, tenho a dizer-vos que não aceito esse jogo. Estou aqui para responder por estes quatro meses de governo, que são de uma intervenção firme em relação ao Parque Natural Sintra-Cascais.

Poderia repetir as iniciativas, mas elas, hoje, saltam à vista de toda a gente: um plano em revisão, suspenso, uma inspecção no Parque, medidas de interdição — é isto que está a acontecer no Parque. E o que posso dizer, em particular, quanto a outros projectos singulares a que a Sr.ª Deputada Isabel Castro se referiu, é que vamos olhar com firmeza para eles.

Vamos também — vou agora ao encontro de uma pergunta da Sr.ª Deputada Maria Santos —, no quadro da revisão do plano de ordenamento, ter rigorosamente em conta aquilo que são os valores ambientais que os estudos da Rede Natura 2000 permitiram revelar naquele Parque. É também por isso que revemos o plano de ordenamento do Parque Natural Sintra-Cascais, e o melhor que podemos fazer para salvaguardar esses valores naturais próprios da Rede Natura é adoptar, imediatamente, medidas preventivas. Foi exactamente isso que fizemos no Parque Natural Sintra-Cascais.

Outras situações de duvidosa legalidade, Sr.ª Deputada, serão certamente, investigadas pela inspecção que determinámos — é para isso que ela serve —, e se elas revelarem situações de ilegalidade não hesitaremos em recorrer aos meios legais para reagir.

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