|
13/11/2019 |
Debate com o Primeiro Ministro (salário mínimo, serviços públicos, aeroporto do Montijo, lítio) - DAR-I-005/1ª |
|
Intervenção do Deputado José Luís Ferreira - Assembleia da República, 13 de novembro de 2019
Sr. Presidente, o Sr. Primeiro-Ministro reafirmou que a política de rendimentos é uma das prioridades deste Governo, mas consideramos que essa prioridade devia começar a ser materializada já.
No entanto, Sr. Primeiro-Ministro, a julgar pela proposta que hoje anunciou relativamente ao salário mínimo nacional para 2020, consideramos que começa com pouco na afirmação dessa prioridade. Um salário mínimo de 635 € em 2020 continua a ser injusto, baixo e, sobretudo, não permite às pessoas fugirem do risco de pobreza.
Ainda assim, Sr. Primeiro-Ministro, queria ter a garantia do Governo de que não haverá quaisquer contrapartidas para as entidades patronais pelo aumento do salário mínimo nacional, seja através da TSU (taxa social única), seja através de qualquer outro instrumento que empurre esses custos para o contribuinte.
Depois, Sr. Primeiro-Ministro, a situação dos serviços públicos em geral, e em particular na saúde e na educação, que, aliás, são dois pilares fundamentais do Estado social, é muito pouco recomendável e a situação tende a agravar-se se o Governo não começar a olhar para os serviços públicos com «olhos de ver» e com a máxima urgência. Por isso, deixamos este alerta, porque é preciso, de facto, olhar para os serviços públicos, que tendem a entrar numa situação verdadeiramente insustentável.
Tenho mais duas perguntas para lhe fazer, Sr. Primeiro-Ministro. Uma delas é sobre o aeroporto do Montijo, não para lhe falar do desastre ambiental que representa essa decisão, não para lhe falar dos impactos que isso vai causar ao nível da saúde das populações se o aeroporto for para a frente, mas para lhe falar de um requisito legal.
Sr. Primeiro-Ministro, a lei obriga a que a construção de um aeroporto esteja dependente de uma apreciação prévia de viabilidade por parte da Autoridade Nacional da Aviação Civil (ANAC), o que, aliás, decorre do Decreto-Lei n.º 186/2007. Sobre a apreciação prévia de viabilidade que é feita pela ANAC, diz-nos o n.º 3 do artigo 5.º desse diploma legal que «constitui fundamento para indeferimento liminar a inexistência do parecer favorável de todas as câmaras municipais dos concelhos potencialmente afectados».
Ora, Sr. Primeiro-Ministro, como é público, nem todas as câmaras municipais emitiram parecer favorável à construção do aeroporto do Montijo, o que significa que o regulador fica sem qualquer margem de manobra para poder deferir o requerimento de viabilidade para a construção do aeroporto do Montijo. Uma vez que este ato do regulador constitui um ato administrativo vinculado, o Governo terá naturalmente de se conformar com essa decisão da ANAC. Ou seja, sem o parecer favorável de todas as câmaras potencialmente afetadas, a ANAC não poderá dar «luz verde» à construção do aeroporto, e, como as Câmaras da Moita e do Seixal deram parecer desfavorável, isso significa que não haverá aeroporto no Montijo.
Sr. Primeiro-Ministro, pergunto: como é que o Governo vai «descalçar esta bota»? A mim, nem me passa pela cabeça que o Governo altere o Decreto-Lei como forma de passar por cima das câmaras e das populações. Por isso, pergunto como é que o Governo vai dar resposta a este problema.
Para terminar, Sr. Primeiro-Ministro, a propósito do lítio, ouvimos o Governo falar muito da riqueza do subsolo, mas ouvimos o Governo falar pouco das riquezas do solo e até da água. Como é feita a céu aberto, a exploração do lítio em subsolo provoca, naturalmente, fortes impactos ao nível tanto dos solos como da água. Recordo que, em Montalegre, só a prospeção — e só estamos a falar da prospeção — já secou três nascentes e deixou a aldeia de Rebordelo sem água.
O que pergunto, Sr. Primeiro-Ministro, é se julga que o solo e as águas também devem ser considerados nessa equação ou se apenas devemos olhar para o subsolo.