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Intervenções na AR (escritas)
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04/08/2020
Debate do Estado da Nação – DAR-I-077/1ª

Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: A Sessão Legislativa, que caminha para o fim, fica marcada, sobretudo, pela crise sanitária que se instalou entre nós.

É uma crise que rapidamente se transformou, também, numa crise social e económica, com a pobreza a ganhar proporções preocupantes, como atestam os pedidos de ajuda das famílias; com milhares de pessoas a perder o seu emprego e outras tantas que continuam a ver os seus rendimentos substancialmente reduzidos face à situação de layoff à qual, contra sua vontade, foram remetidas; e com milhares e milhares de micro e pequenas empresas a viver numa verdadeira situação de angústia e de incerteza, onde os magros apoios tardam a chegar.

Face a este cenário, o Governo foi, ao longo dos últimos meses, procurando dar respostas, algumas das quais acompanhadas por Os Verdes, mas foi o Orçamento Suplementar que se apresentou como instrumento mais global de resposta à crise. Um Orçamento, contudo, que insiste na manutenção do corte de rendimentos aos trabalhadores que estão em layoff, ao mesmo tempo que não excluiu os grandes grupos económicos do alargamento do prazo para reporte de prejuízos fiscais, que recusa a criação de um fundo de tesouraria para as pequenas empresas, mas que não impede a distribuição de dividendos entre os acionistas das grandes empresas, e que se mostra incapaz de valorizar as componentes ambientais, como a reciclagem, enquanto contributo para a dinamização da economia e para a criação de postos de trabalho.

Mas esta crise também nos mostrou, ou confirmou, alguns factos que importa ter em conta no nosso futuro. Mostrou, desde logo, a importância do Estado social e, muito em particular, o papel absolutamente imprescindível do Serviço Nacional de Saúde e dos seus profissionais no combate a esta pandemia. Por isso, para o futuro, importa ter esta lição bem presente, por forma a que o SNS não continue a sofrer do subfinanciamento ao qual foi remetido durante décadas e a que os seus profissionais sejam devidamente valorizados.

Esta crise veio também confirmar algo que Os Verdes andam há muito, e de forma constante, a reivindicar: é absolutamente imperioso que nos viremos para a nossa produção, para a produção nacional. É preciso trabalhar a sério para recuperar a nossa soberania alimentar, apostar na pequena agricultura e fazer sair do papel o Estatuto da Agricultura Familiar, dinamizar os circuitos de proximidade e os mercados locais, como forma de potenciar o escoamento dos produtos. Apostar na nossa produção será uma aposta ganha, com reflexos a nível da nossa economia, a nível da nossa soberania alimentar, do combate às assimetrias regionais e do abandono do mundo rural e, até, a nível da prevenção de incêndios florestais, porque onde há pessoas, há menos incêndios. Mas só haverá pessoas no mundo rural se forem criadas as condições para que os produtores possam produzir e vender os seus produtos a preços justos.

E é preciso apoiar as micro e pequenas empresas, a espinha dorsal da nossa economia. Aliás, estes apoios terão de se prolongar muito para além da crise, porque estas empresas dependem muito da procura interna e esta, como sabemos, vai demorar tempo a chegar aos níveis desejados, dada a perda de rendimentos e do poder de compra da generalidade das famílias.

Mas esta pandemia deveria, ainda, levar-nos a questionar a forma como produzimos e como consumimos neste modelo de crescimento, cujas políticas assentam na exploração dos recursos naturais de forma assustadoramente insustentável, como se não houvesse amanhã.

Quanto ao resto, a Nação não se liberta de males antigos e de modernos vírus.

Esbocemos o retrato: quando os bancos dão prejuízo, o Estado continua a chamar os contribuintes a pagar e, quando dão lucro, os banqueiros dividem o bolo; o Novo Banco continua a ser um sorvedouro de recursos públicos; as multinacionais escolhem localizações para a construção de importantes infraestruturas, como é o caso do aeroporto no Montijo; as áreas protegidas são transformadas em depósitos de plástico, como sucede no Parque Natural do Sudoeste Alentejano; a exploração de recursos naturais, como o lítio, está envolvida em processo nebulosos e sem atender aos impactos ambientais e à qualidade de vida das populações; a produção intensiva de olival ou de amendoal continua a inundar a nossa paisagem, sobretudo a alentejana; a remoção do amianto nas escolas é, dizem os autarcas um embuste e o silêncio do Sr. Primeiro-Ministro à pergunta que Os Verdes hoje formularam deixa-nos ainda mais preocupados; a aposta na ferrovia continua a ser uma promessa e limitada apenas à ligação Lisboa-Porto; empresas de transporte em layoff e os transportes públicos com dificuldades em cumprir as regras de saúde pública; a descarbonização da economia e as medidas de combate às alterações climáticas continuam a ser remetidas para o futuro; e o bloco central ressuscitou para fazer o funeral dos debates quinzenais.

Por fim, uma novidade, um vírus moderno: o Governo pondera alterar uma lei com o objetivo exclusivo de passar por cima dos pareceres das câmaras municipais que não concordem com o Governo, no propósito de fazer a vontade à multinacional Vinci.

 Vou terminar, Sr. Presidente.

O que esperamos é que o País desconfine do ponto de vista da saúde, mas também do ponto de vista dos direitos de quem trabalha, da valorização salarial, dos valores ambientais e do respeito pelas decisões do poder local, quer agradem ao Governo, quer não agradem.

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