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09/01/2020 |
Debate, na generalidade, do Orçamento do Estado para 2020 - DAR-I-021/1ª |
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1ª Intervenção – pedido de esclarecimento
Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, não podemos deixar de assinalar que estamos perante um Orçamento do Estado preenchido de boas intenções e de muitos compromissos, que não sabemos se se realizarão, nem como, mas que é realmente um Orçamento de continuidade, como gosta de afirmar. Continuidade do compromisso com Bruxelas em ser bom aluno dos cortes no investimento, apesar de a escola pública estar tão necessitada de investimento a todos os níveis. Um Orçamento de continuidade de promessas do investimento no ambiente, na sustentabilidade, na adaptação e mitigação das alterações climáticas.
No entanto, «palavras, leva-as o vento», Sr. Primeiro-Ministro. Como explica que, na proposta de Orçamento do Estado para 2020, se fale da exploração sustentável de recursos minerais, nomeadamente de lítio? Estamos a falar de que tipo de sustentabilidade? Da destruição dos solos, que são a subsistência das populações, que são património agrícola da humanidade e que contribuem para a produção de produtos únicos e também eles classificados?! Da destruição do acesso à água — um bem essencial —, que ficará comprometido com a exploração, visto que só na prospeção em Morgade já secaram nascentes?! A que sustentabilidade se refere o Governo?
Sustentabilidade é as populações de Montalegre e de Boticas manterem-se nas suas terras, mesmo quando lhes fecham as escolas, quando lhes retiram os postos dos CTT, quando o transporte público coletivo é raro e o direito à mobilidade é desrespeitado. Sustentabilidade é travar o secretismo em que este processo continua envolvido, que só pode trazer desconfiança e descrédito.
Sr. Primeiro-Ministro, quais são as nove áreas em que serão lançados concursos públicos para prospeção e exploração de lítio e minerais associados? É que pedidos há muitos, e continuaram a aumentar depois do anúncio feito pelo Sr. Ministro do Ambiente destas tais nove áreas. Continuamos perante um processo nada democrático em que as populações não são envolvidas nem ouvidas. Não basta a promessa de que a exploração dos recursos minerais trará criação de emprego, mais população e o desenvolvimento do interior. Não passam de palavras que o vento levará.
Onde estão os pareceres que indicam que não haverá impacte ambiental negativo? A prospeção e a exploração dos recursos minerais do nosso País, nomeadamente do lítio, não podem ser ditadas pelos mercados ou pelas grandes multinacionais para grande prejuízo das populações e dos ecossistemas. O Governo tem de zelar pelos direitos das populações e pela defesa e proteção dos valores naturais do País. De que sustentabilidade fala o Orçamento do Estado se a prospeção e a exploração serão feitas por empresas privadas que têm apenas em vista os grandes lucros?
Por fim, Sr. Primeiro-Ministro, pergunto: de que sustentabilidade — ou até milagre! — estamos a falar, ao nível do desenvolvimento económico, se o preço do lítio no mercado mundial baixou quase para metade?
2ª Intervenção – pedido de esclarecimento
Sr. Presidente, Sr. Ministro Pedro Nuno Santos, o Sr. Primeiro-Ministro disse anteriormente que este Orçamento do Estado é melhor do que qualquer um dos últimos quatro anos. Não admira, porque parte das verbas previstas neste Orçamento vêm da não execução do Orçamento anterior, como por exemplo ao nível da não aquisição de material circulante ou, ainda, da não eliminação do amianto nos edifícios públicos.
O Programa do Governo falava muito do combate às alterações climáticas e do desenvolvimento do interior. Ora, como é sabido, a mobilidade ferroviária desempenha nestas duas matérias um papel fundamental. Não nos parece que este Orçamento venha fortificar o impulso da Legislatura passada, na qual se verificou um virar de página e em que o contributo de Os Verdes foi inegável.
Na anterior Legislatura, foi posto um ponto final sobre o encerramento de linhas da ferrovia, nomeadamente com a simbólica reabertura da Linha do Leste aos passageiros e com a contratação de mais trabalhadores para a EMEF, hoje fundida de novo com a CP. Saudamo-lo, mas sublinhamos que falta agora a contratação de mais trabalhadores, tão necessários e sobretudo agora com a abertura de concursos para aquisição de material circulante.
Nesta Legislatura, para além da resposta necessária aos problemas do transporte ferroviário nas áreas metropolitanas, esperava-se um reforço desta orientação, nomeadamente através de um claro aumento da verba para a modernização das linhas complementares, ou seja, as linhas que servem o interior, as áreas fora do grande eixo Norte/Sul.
Os Verdes temem que o Governo não tenha apenas adiado, como fez nos últimos quatro anos, mas que desta vez tenha mesmo esquecido a eletrificação da Linha do Alentejo e da Linha do Leste, a construção do Ramal de Portalegre, a reposição da Linha do Corgo e da Linha do Tâmega, a reabertura da Linha do Douro até Espanha, a reposição de uma mobilidade ferroviária na Lousã e o fim da modernização da Linha do Oeste.
Sr. Ministro, os ingredientes e as vitaminas continuam a faltar para dar uma «energia de ferro» a um caminho de ferro que é uma resposta fundamental para servir as populações, para combater as assimetrias regionais, para promover um turismo distribuído pelo País e para reduzir as emissões de CO2.
O compromisso anunciado por Portugal de combate, adaptação e mitigação das alterações climáticas deve assumir forma mais concreta e objetiva. Não podemos fazer omeletes sem ovos e, por isso, é impensável que, sem investimento, se consiga atingir o objetivo da descarbonização até 2050.
Durante anos, a aposta foi a do desinvestimento no transporte público coletivo, retirando o direito à mobilidade dos cidadãos. Por isso, no presente, o investimento se apresenta tão primordial e necessário.
Os primeiros passos foram dados na última Legislatura, mostrando que, apesar de a proposta «ter barbas», ela manteve-se necessária ao longo dos anos e, mesmo que os «Velhos do Restelo» indicassem que não era possível, aí temos o Programa de Apoio à Redução Tarifária nos Transportes Públicos (PART), que não só traduz a opção pelo transporte público como permite um maior conforto na economia das famílias portuguesas, permitindo sobretudo que se dê um grande avanço nas políticas de adaptação às alterações climáticas.
É urgente o investimento nos transportes públicos coletivos, mas o desenvolvimento da ferrovia é prioritário e, por isso, questionamos se estas promessas de mais material circulante, que trará mais horários e mais conforto para os cidadãos, não serão apenas mais palavras que o vento levará.