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Intervenções na AR (escritas)
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26/06/2020
Debate sobre a situação dos trabalhadores e ACT – DAR-I-065/1ª

Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, Sr.ª Ministra do Trabalho, como consequência de várias décadas de opções que apostaram em políticas de baixos salários e que procuraram institucionalizar a precariedade como regra nas relações laborais, temos hoje uma situação muito mais agravada em que as grandes empresas, aproveitando-se até da pandemia, não perderam tempo para aprofundar substancialmente a exploração de quem trabalha, procurando reduzir as pessoas a meras peças descartáveis, de usar e deitar fora, ou a simples máquinas que se ligam e desligam conforme dá jeito às entidades patronais.

O resultado está à vista de todos. Aliás, no dia em que a rede europeia anti pobreza lança o alerta, convém lembrar que o problema da pobreza, que ganhou uma dimensão muito preocupante com esta pandemia, não é alheio a estes abusos das grandes empresas, às políticas de baixos salários e à precariedade laboral que continua a persistir à nossa volta e tende a ser encarada como uma coisa normal, o que é ainda mais preocupante.

Os relatos desses abusos não param de chegar e permitem-nos fazer uma leitura fiel daquilo que se está a passar no País, com milhares de trabalhadores a viverem situações verdadeiramente dramáticas. Quando falamos de trabalhadores com vínculos precários, então, o cenário é ainda pior. E o pior de tudo é que muitas destas empresas estão a receber apoios do Estado, o que torna o cenário ainda mais revoltante.

Sr.ª Ministra, a pandemia não pode ser olhada como uma oportunidade de potenciar os lucros à custa do acentuar da exploração de quem trabalha e muito menos pode inibir o Estado de exercer a sua função de garantir os direitos de quem trabalha e, nesta matéria, a Autoridade para as Condições do Trabalho tem um papel absolutamente decisivo. A Autoridade para as Condições do Trabalho tem de ser encarada como um instrumento fundamental para que o Estado consiga dar cumprimento à sua função de garantir os direitos de quem trabalha e, também, o respeito pelas normas legais.

Por isto, Sr.ª Ministra, tenho duas questões para lhe colocar sobre a Autoridade para as Condições do Trabalho. A primeira é para saber se considera que a ACT está dotada dos meios técnicos e humanos suficientes para poder desenvolver devidamente as suas atribuições. A segunda é para lhe perguntar se nos consegue dar informações sobre o número de processos abertos neste período relativos a incumprimentos legais ou violações da lei por parte das entidades patronais que tenham recebido apoios do Estado. Uma vez que, do ponto de vista geral, a Sr.ª Ministra já o referiu quando interveio da tribuna, limito-me a perguntar quantos processos foram abertos por abusos e violação da lei por parte de empresas que tenham recebido apoios públicos estatais.

2ª Intervenção

Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Nesta circunstância, queria aproveitar para saudar o Partido Comunista Português por ter agendado para hoje esta interpelação ao Governo, porque se é verdade que a proteção, os direitos e os salários de quem trabalha são sempre assuntos oportunos, no contexto em que vivemos, onde se assiste a uma espécie de confinamento dos direitos de quem trabalha, com as grandes empresas que, sem qualquer pudor, procuram fazer tábua-rasa dos direitos dos trabalhadores, naturalmente que estas matérias assumem mais atualidade e de mais oportunidade se revestem.

Face ao que está a passar-se, esta Assembleia não pode ficar indiferente, assobiar para o lado, fingir que nada se passa e que está tudo bem, porque não está. Todos os dias nos vão chegando denúncias de abusos por parte de grandes empresas, testemunhos na primeira pessoa e que nos dão a ideia da real dimensão dos problemas, com milhares de trabalhadores a viver situações verdadeiramente dramáticas: despedimentos a toda a hora, redução dos salários, alterações unilaterais de horários e o consequente corte nos subsídios de turno e de trabalho noturno, imposição de férias forçadas, inibição do exercício de direitos, como o de maternidade ou paternidade, e por aí fora. É a lei da selva a imperar no reino do vale tudo!

Quando falamos dos trabalhadores com vínculos precários, então o cenário é ainda mais preocupante. Milhares de trabalhadores com contratos a prazo, trabalhadores em período experimental, falsos recibos verdes e trabalhadores em empresas de trabalho temporário de um dia para o outro ficam sem trabalho e sem qualquer meio de subsistência, e o mais grave é que muitas destas empresas estão a receber apoios do Estado, e algumas delas até com o descaramento de terem a sua sede fiscal em paraísos fiscais. Não pode ser!

Ora, a pandemia não pode ser transformada numa oportunidade para confinar os direitos e, sobretudo, não pode fragilizar o papel do Estado na sua função de garantir os direitos de quem trabalha. Por isso, Sr.ª Ministra, o que se impunha era dizer a essas empresas, sem quaisquer rodeios: «Meus senhores, acabou o recreio! Quem abusou faça o favor de devolver os recursos que recebeu do Estado, que recebeu do contribuinte. Quem violou as leis laborais assuma as consequências no plano legal. Quem reduziu salários que os devolva aos trabalhadores lesados. Quem procedeu a alterações unilaterais de horários com o objetivo de cortar nos subsídios de turno ou de trabalho noturno que acerte devidamente as contas. E quem despediu indevidamente que reintegre».

É isto que se impõe. E já que a Sr.ª Ministra não respondeu às questões que lhe coloquei na fase de perguntas, a propósito da Autoridade para as Condições do Trabalho, espero que o possa fazer numa próxima vez que usar da palavra nesta Assembleia.

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