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Intervenções na AR (escritas)
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09/07/2020
Debate sobre Matéria Penal – DAR-I-070/1ª

Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O CDS escolheu a matéria penal para o seu agendamento potestativo. Para o efeito, apresenta-nos três iniciativas legislativas, ou para agravar a moldura penal para crimes já previstos e, portanto, já tipificados no Código Penal ou para a criação de novos tipos de crime.

Propõe, ainda, recomendar ao Governo aquilo que todos sabemos que o Governo está constitucionalmente impedido de fazer, porque se trata de matérias reservadas à Assembleia da República.

Ainda assim, o CDS propõe recomendar ao Governo que altere a qualificação do perigo relativamente ao crime de propagação de doença, deixando de ser um crime de perigo concreto para passar a ser um crime de perigo abstrato. E, nesse caso, o CDS até nem esconde o objetivo que move esta alteração: facilitar a prova, facilitar a incriminação.

Para além disso, recomenda, ainda, ao Governo que aumente a moldura penal atualmente prevista para este crime.

Ou seja, tudo espremido o que o CDS-PP propõe é o seguinte: novos crimes, molduras penais agravadas para crimes já tipificados no Código Penal e a simplificação de prova para incriminar e recomendar ao Governo que faça aquilo que ele não pode, por si só, fazer, como já foi aqui referido.

Mas estas propostas do CDS não surpreendem porque, no fundo, são respostas a problemas que estão em sintonia com aquilo que o CDS-PP nos foi habituando ao longo do tempo.

Quando as fragilidades da capacidade do Estado em dar a resposta adequada aos problemas do País vêm ao de cima, a solução do CDS está no Código Penal.

Assim foi sempre que fomos confrontados com a gravidade e a dimensão dos incêndios florestais e assim é agora face a esta ameaça coletiva que paira sobre todos nós. Crimes, agravamento de molduras penais e até alterações ao Código Penal para facilitar a produção de prova, com o objetivo exclusivo de ser mais fácil incriminar.

Numa altura como a que vivemos, face à pandemia da COVID-19, é justo referir que as forças e serviços de segurança tiveram uma importância absolutamente decisiva para o cumprimento das regras. E tiveram muita importância não só no que diz respeito à fiscalização das atividades comerciais mas também no que se refere ao controlo de fronteiras e em muitas, muitas outras operações.

E nós até concordamos com o CDS, quando refere que é necessário dignificar estes profissionais, mas entendemos que não é pela via penal que se dignifica a profissão de agente das forças e serviços de segurança.

A dignificação destes profissionais passa pela criação de condições para que possam desenvolver as suas funções e as suas responsabilidades, nomeadamente com a disponibilização dos meios técnicos necessários e adequados. Passa, ainda, pela contratação de mais efetivos, porque a falta de pessoal está a colocar em causa as folgas destes profissionais e até mesmo as suas férias.

A dignificação destes profissionais passa pelo descongelamento total das carreiras dos agentes, com salários justos e com o pagamento integral das horas de trabalho, porque o que está a acontecer agora é que há profissionais que trabalham 150 a 300 horas por mês, sem qualquer compensação remuneratória.

Portanto, a nosso ver, é por aqui que devemos caminhar, se, de facto, quisermos dignificar a profissão de agente das forças e serviços de segurança e não através de alterações ao Código Penal para agravar as penas ou as molduras penais e muito menos para criar mecanismos com vista a facilitar a prova com o objetivo de tornar a incriminação mais fácil.

Sobre o agravamento de penas, vale a pena recordar que é praticamente pacífico entre a doutrina que o agente do crime, na generalidade dos casos, age independentemente da moldura penal prevista para aquela conduta, que muitas vezes, aliás, quando age, nem tem sequer presente a verdadeira dimensão dessa moldura penal.

Quanto à alteração da qualidade do perigo, de concreto para abstrato, no crime de desobediência, que o CDS propõe, quero dizer o seguinte: ainda que seja o legislador — e aqui o legislador é a Assembleia da República e não o Governo, como o CDS-PP sabe muito bem — que decide que determinadas ações devem ser consideradas crime, mesmo que não produzam risco efetivo ou dano, a motivação do CDS para esta alteração é, no mínimo, estranha num Estado de direito democrático.

O que o CDS-PP quer é que o crime de propagação de doença passe a ser um crime de perigo abstrato, apenas com um único propósito: simplificar a prova para facilitar a incriminação. E este é um caminho perigoso, porque, agora, mudamos a qualidade do crime para ser mais fácil incriminar e, depois, o que virá? O fim da presunção da inocência?

O fim das garantias de defesa dos arguidos? Não, Os Verdes não querem este caminho e, portanto, vão votar contra as três propostas que o CDS-PP hoje nos traz para discussão.

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