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18/06/2020 |
Debate sobre Preço Pago ao Produtor e Pescador – DAR-I-062/1ª |
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Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O desequilíbrio de forças entre todos os agentes que intervêm na cadeia alimentar, da produção até ao momento em que se torna acessível ao consumidor final, é uma evidência, sendo que o produtor, em particular o pequeno produtor, é, sem dúvida, o elo mais fraco de toda esta cadeia.
Os produtores reclamam que lhes paguem preços justos pelos bens alimentares que produzem e para os quais precisaram de investir. E quantas vezes são os pequenos produtores agrícolas obrigados, por uma questão de sobrevivência, a vender os seus produtos abaixo do preço de produção para poderem escoá-los e para não terem prejuízos ainda mais dramáticos?
Esta situação evidenciou-se bastante com a pandemia da COVID-19. A redução drástica da procura, devido ao encerramento de grande parte da restauração, mercados públicos e pequeno comércio, e as dificuldades impostas ao nível das vendas diretas, resultaram em sérias dificuldades no escoamento dos produtos, muitos dos quais perecíveis.
A necessidade imediata de escoar a produção fez com que muitos pequenos produtores ficassem nas mãos de especuladores sem escrúpulos, que se aproveitam deste período dramático para esmagar ainda mais os preços, deixando os agricultores entre a espada e a parede.
Por outro lado, o encerramento dos circuitos tradicionais de escoamento dos produtos agrícolas e de pescado vieram agravar exponencialmente a concentração do comércio a retalho nas grandes superfícies, que, para além de criarem inúmeras dificuldades no acesso por parte dos pequenos e médios agricultores e para colocar o peixe da pesca artesanal, contribuíram para esmagar, ainda mais, os preços ao produtor.
Enquanto o valor dos produtos pago aos produtores/pescadores, de que são particulares exemplos os produtos hortícolas e o pescado, caiu consideravelmente, o mesmo não se repercutiu no preço final a pagar pelo consumidor, que viu até aumentado o preço de alguns bens alimentares de primeira necessidade.
É, assim, com legitimidade que os consumidores têm vindo a reclamar, devido aos elevados preços que têm de pagar para ter acesso a vários géneros alimentícios.
Quem ganha, então, no meio de toda esta cadeia comercial, se o produtor recebe pouco e o consumidor paga muito? Quem perde, já se percebeu. Quem ganha são os intermediários entre o produtor e o consumidor final, que obtêm margens de lucro que tornam todo este processo injusto e inaceitável — «a margem da ganância», como lhe chamaram.
No momento em que se incentiva o consumo de produtos locais e nacionais, para efeitos de diminuição da pegada ecológica e para dinamizar a atividade produtiva do País, o PEV, que há muito defende essa prática, considera que, no mínimo, o consumidor tem o direito de ser informado sobre o preço pago na origem, para percecionar a amplitude do valor na origem e aquele que efetivamente irá pagar.
O consumidor final tem o direito de poder fazer escolhas conscientes, sobre o que quer consumir e em que condições quer consumir. À Assembleia da República compete criar todas as condições para que os consumos se tornem responsáveis, «sócioconscientes» e «ecoconscientes». E para que isso aconteça, a informação, o esclarecimento, é o mínimo que se deve garantir.
É com esse objetivo que o Grupo Parlamentar de Os Verdes apresenta o presente projeto de lei, criando a obrigatoriedade de as grandes superfícies comerciais, para além de indicarem o preço de venda dos produtos alimentares e piscícolas, apresentarem também, ao consumidor, o preço de compra ao produtor ou pescador.
2ª Intervenção
Sr. Presidente, peço desculpa porque pensei que não tinha de me inscrever.
Fico feliz por saber que o CDS vai votar a favor do Projeto de Lei de Os Verdes.
Srs. Deputados, a agricultura e as pescas são os principais suportes da alimentação e os bens alimentares não podem ser confundidos com quaisquer outros, porque são fundamentais à sobrevivência. A alimentação é um direito humano e a produção alimentar ocupa um lugar estratégico em termos de soberania.
O setor alimentar está dominado por meia dúzia de grandes empresas de distribuição que concentram o circuito de distribuição/comercialização, obtendo margens de lucro escandalosas, sufocando os produtores, pagando preços baixíssimos à produção e vendendo a preços exorbitantes aos consumidores, uma concentração que obrigou ao encerramento de milhares de mercearias e minimercados, reduzindo os pontos de venda para os pequenos produtores.
Com a epidemia de COVID-19, a grande distribuição optou por trabalhar a sua imagem, promovendo campanhas publicitárias para explorar a maior sensibilidade dos consumidores neste período difícil, passando a mensagem de um alegado apoio a quem trabalha a terra e cria animais, como se de uma esmola aos agricultores se tratasse, ao mesmo tempo que se insiste no esmagamento dos preços pagos à produção. Ora, os pequenos e médios agricultores, os pescadores e o País não podem ficar reféns da grande distribuição que monopoliza e determina tudo. É impossível aos pequenos e médios produtores sobreviverem com o valor que lhes é pago pelos grandes distribuidores e com os prazos tardios de pagamento.
Defender a pequena agricultura, muita dela de âmbito familiar, permite o desenvolvimento da economia local e permite garantir a nossa soberania e o caminho para a sustentabilidade. Para além da produção e do consumo local serem a garantia de termos no prato alimentos mais saudáveis, os circuitos curtos de distribuição garantem uma pegada ecológica menor e contribuem para a descarbonização, para o combate ao desperdício alimentar e para a segurança da qualidade do produto. Mas para isso é necessário proibir práticas comercias desleais nas relações entre os produtores e as grandes cadeias de distribuição…
… e definir preços mínimos na origem que acompanhem a evolução dos custos de produção. É isto que Os Verdes propõem.