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Intervenções na AR (escritas)
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17/03/2020
Debate sobre Presidência do Conselho da UE – DAR-I-039/1ª
Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Ministro, pelo que ouvi da sua intervenção, estamos de acordo que a proposta de quadro financeiro plurianual prejudica os interesses de Portugal. Por isso, a nosso ver, deve ser rejeitada com toda a firmeza pelo Governo português.

De facto, esta proposta significa um corte de 12% das verbas destinadas à coesão económica e social relativamente à verba do atual quadro financeiro. Ou seja, agrava ainda mais o corte previsto na proposta original da Comissão Europeia com um dado ainda mais preocupante, que é o facto de esse agravamento incidir sobre o Fundo Social Europeu e sobre o Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional.

A proposta é, portanto, muito prejudicial para Portugal e para os países ditos da coesão e apenas dá resposta às exigências ou aos interesses das principais potências da União Europeia e, por isso, deve ser encarada como inaceitável pelo Governo português.

Mais, Sr. Ministro: se, eventualmente, houver atrasos na aprovação, na programação ou até mesmo na execução das verbas desse quadro e esses atrasos forem, de alguma forma, utilizados como mecanismo de pressão sobre os países mais dependentes dessas verbas, como é o caso de Portugal, o Governo português não pode ceder a essas chantagens e deve, a nosso ver, não só rejeitar essas pressões como também não abdicar de nenhum mecanismo ao seu dispor para defender os interesses do nosso País, incluindo o direito de veto.

Gostaria, Sr. Ministro, que se pronunciasse sobre esta matéria, sobretudo se a proposta se mantiver.

Na semana passada, a Comissão Europeia apresentou a sua proposta sobre a designada «lei climática europeia». Pretende-se, com esta lei climática, transformar o objetivo da União Europeia da neutralidade carbónica em 2050 — que era, digamos, uma intenção — num imperativo legal, com vista a ter expressão legislativa nos ordenamentos jurídicos de cada um dos Estados-Membros. É uma intenção com vista a dar seguimento ao compromisso político de tornar a Europa no primeiro continente com neutralidade carbónica até 2050.

Segundo a Comissão, a transição para o novo modelo será gradual e justa — e nós vamos aguardar para ver o que vai acontecer, sobretudo no que diz respeito à sua justiça —, mas, ao que parece, haverá acordo para avançar de imediato com uma avaliação aprofundada do impacto desta transição económica e energética, o que implicará, naturalmente, uma revisão dos objetivos da redução das emissões para 2030.

Ora, do que conhecemos desta lei climática europeia, ela não reflete algumas das preocupações que constam do Pacto Ecológico Europeu, para além de apontar para metas pouco ambiciosas e, sobretudo, por faltarem medidas concretas no curto prazo.

Ainda assim, interessava saber a posição do Governo português sobre esta lei climática europeia, pelo que peço ao Sr. Ministro que se pronuncie em relação a esta matéria.

2ª intervenção

Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Dois dos eixos da atual Presidência, em termos de prioridades, apontam para «uma Europa em desenvolvimento» e para «uma Europa que liga», mas quando olhamos à nossa volta o que vemos na Europa é pouco desenvolvimento e até uma regressão ao nível do combate à pobreza. Se dúvidas houvesse, bastaria olhar para o estudo da Eurofound, recentemente apresentado, sobre a pobreza de quem trabalha. Segundo esse estudo, um em cada dez trabalhadores na média da União Europeia está em risco de pobreza.

Ora, um dos anunciados propósitos da Estratégia 2020 é exatamente o combate à pobreza e à exclusão social. Mas, à semelhança do que é habitual na União Europeia, tratou-se apenas de mais um anúncio «para inglês ver» ou, melhor, «para europeu ver» e os trabalhadores europeus continuam a ser empurrados para situações de profunda privação material, de pobreza e de exclusão social.

E se é verdade que a taxa de desemprego baixou, também é verdade que os empregos criados não respondem ao essencial, de forma a permitir que as pessoas escapem da pobreza.

As novas relações laborais que se foram estabelecendo são absolutamente precárias, com uma proteção mínima, quando existe, e, quanto ao salário, é quase sempre o salário mínimo que acaba por imperar.

Ou seja, o desenvolvimento, enquanto prioridade, continua a ser apenas um anúncio «para europeu ver».

Quanto ao outro eixo — «uma Europa que liga» —, basta atender ao que se passa com a política da União Europeia para as migrações, para ficarmos devidamente esclarecidos sobre a importância que é dada a este eixo.

A União Europeia assinou um acordo com o Governo da Turquia, em março de 2016, para travar o acesso dos refugiados imigrantes ao território europeu. Ou seja, a União Europeia não construiu um muro, mas alugou uma porta que se pretendia fechada. E os resultados estão à vista: a porta abriu e a União Europeia está agora na expectativa de que as autoridades turcas cumpram as obrigações que assumiram para terem acesso a um financiamento de 6000 milhões de euros, que é o preço da porta fechada. Ou seja, «a Europa que liga» é, afinal, a Europa que compra portas para fechar e aluga fortalezas para levantar.

São estas as prioridades da União Europeia: uma Europa que se alimenta de anúncios e intenções.

3ª intervenção

Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Como Os Verdes têm vindo a afirmar, a União Europeia continua de costas voltadas para os interesses dos povos europeus, pois há muito que a sua grande preocupação deixou de ser os cidadãos e passou a ser a banca e os banqueiros.

Se já há muito que a União Europeia removeu do seu vocabulário conceitos tão importantes como o de «solidariedade», agora, prepara mais um golpe nas políticas de coesão, que vai ter efeitos muito negativos numa economia como a nossa, em que os fundos comunitários assumem um papel decisivo. Por isso, esperamos a mais firme oposição do Governo português à proposta para o quadro financeiro plurianual. Aliás, esta proposta só vem confirmar que as causas sociais e, também, muitas causas ambientais cada vez representam menos para a União Europeia.

Por um lado, o reforço do caminho de militarização da União Europeia, ligado à obsessiva criação de um exército comum, num quadro de serviço à NATO, é mais um exemplo da secundarização das matérias sociais. A cumplicidade e até a participação da União Europeia em intervenções militares de agressão e ingerência nas últimas décadas…

… demonstram bem a lógica e as consequências desta política belicista. É um caminho que em tudo se distancia da promoção da paz, a mesma promoção da paz que, curiosamente, representou o objetivo inicial da atual União Europeia e que está na sua origem, com a criação da CECA, a Comunidade Europeia do Carvão e do Aço, como forma de controlar as principais matérias-primas indispensáveis à guerra. Esta União Europeia, que começou por ser construída com o objetivo de promover a paz, está agora transformada num sujeito ativo no que diz respeito ao financiamento militar.

Por outro lado, a perspetiva do incremento desta componente militar implica o aumento da despesa com meios de defesa ou, melhor, de agressão, retirando capacidade de investir em áreas fulcrais para o bem-estar e para a melhoria das condições de vida dos povos dos Estados-Membros.

É neste contexto que surge a designada Cooperação Estruturada Permanente, com o objetivo de reforçar o domínio militar, implicando, entre outras questões, a intensificação de capacidades e equipamentos militares, uma maior despesa nesta área, a disponibilização de mais unidades de combate e por aí fora.

Mas esta não é nenhuma prioridade para os povos da Europa,…

… nem nenhuma necessidade para o povo português, apesar de ser um negócio muito apetecível para a indústria militar, na qual, por exemplo, a Alemanha e a França têm interesse convocando os demais Estados-Membros a financiá-la.

Para além disso, a Cooperação Estruturada Permanente representa mais um passo significativo para a perda de soberania dos Estados e para a concentração do poder de decisão nas grandes potências da União Europeia, a nível da política externa e militar.

Por isso, Os Verdes continuam a considerar que a Assembleia da República deveria ter-se oposto à adesão do nosso País à Cooperação Estruturada Permanente, indo ao encontro dos interesses do povo português, nomeadamente defendendo uma Europa onde o desemprego e a pobreza deem lugar à solidariedade, que consiga criar efetivos laços de coesão social, onde o serviço às grandes multinacionais dê lugar ao desenvolvimento sustentável, com solidariedade entre os povos e entre os cidadãos, e onde a construção do arsenal de agressão dê lugar a instrumentos de progresso que promovam a paz.

Foi exatamente com esse propósito que Os Verdes apresentaram, em 2017, uma iniciativa legislativa para que esta Assembleia recomendasse ao Governo a não adesão de Portugal à Cooperação Estruturada Permanente. Sucede que essa proposta, como, de resto, outras, de outras bancadas, mas no mesmo sentido, não tiveram acolhimento por parte do PS, do PSD e do CDS.

Seria, a nosso ver, um excelente contributo para a promoção da paz na Europa e no mundo, mas essas bancadas não o entenderam assim.

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