|
23/04/2020 |
Debate sobre Prolongamento do Estado de Emergência – DAR-I-046/1ª |
|
Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro e demais Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Como referimos quando esta Assembleia discutiu a declaração do estado de emergência e como reafirmamos na sua primeira renovação, o essencial do combate a esta ameaça coletiva não estava dependente da declaração do estado de emergência.
A nosso ver, o Governo dispunha de todos os instrumentos jurídicos para adotar as medidas necessárias com vista a fazer frente a esta crise, dentro do quadro legal normal e sem necessidade de impor quaisquer restrições do ponto de vista dos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos. E, se assim o considerámos tanto na discussão inicial da declaração, como na primeira renovação, assim continuamos a considerar hoje.
É verdade que estamos diante de uma ameaça coletiva, cuja complexidade e dimensão são ainda muito imprevisíveis. É verdade que a situação excecional que vivemos continua a exigir medidas excecionais e urgentes para reforçar ou dotar os serviços de saúde dos meios necessários para fazer frente a um problema com esta gravidade. Mas também é verdade que não foi necessário o estado de emergência para permitir que as entidades prestadoras de cuidados de saúde pudessem proceder à aquisição de equipamentos, de recursos e de serviços com mais celeridade e à margem do processo burocrático normalmente exigido.
Também não era necessário o estado de emergência para que não houvesse obstáculos, do ponto de vista orçamental, que impedissem os serviços de adotar as medidas necessárias para enfrentar o problema de frente e com toda a determinação.
A necessidade do reforço do Serviço Nacional de Saúde nada tem a ver com o estado de emergência.
Por outro lado, se recuarmos no tempo, percebemos facilmente que as medidas mais importantes neste combate, do ponto de vista da propagação do coronavírus, foram assumidas fora do estado de emergência, até mesmo antes de ele ser decretado. Refiro-me ao encerramento das escolas e ao confinamento voluntário dos portugueses — as crianças deixaram de ir à escola mesmo até antes das orientações das autoridades, muitos adultos não ficaram à espera das recomendações para ficarem em casa e muitos restaurantes encerraram ou começaram a tomar medidas mesmo antes de as recomendações se terem generalizado.
E nem sequer foi preciso que a Direção-Geral da Saúde viesse publicamente reconhecer que os portugueses estavam a respeitar as orientações não só relativas à quarentena voluntária, mas também de resguarde e ao necessário distanciamento social, porque todos nós percebemos esse facto, o que mostra, aliás, que os portugueses têm plena consciência do que é prioritário e do que está em jogo.
Neste contexto, é preciso dizer que a declaração do estado de emergência ou a sua renovação não impediu os abusos por parte de muitas empresas, sobretudo das grandes, que continuam a aproveitar-se da situação e a despedir trabalhadores, a terminar contratos a termo antes do tempo, a proceder a despedimentos sumários, a denunciar contratos durante o período experimental ou até mesmo a impor ou forçar o gozo de férias aos trabalhadores. Abusos, também, quando procuram engordar os seus lucros à custa desta ameaça coletiva, através da especulação de preços não só de materiais de proteção individual, como também de outros produtos, sobretudo alimentares.
A declaração do estado de emergência ou a sua renovação nem sequer conseguiu garantir que todas as empresas que preencham os requisitos legais tenham acesso às linhas de crédito, deixando nas mãos dos bancos a faculdade de decidir esse acesso, mesmo que as empresas preencham os critérios legais.
Aquilo que seria um contributo decisivo para a sobrevivência das micro, pequenas e médias empresas e libertá-las do poder discricionário que os bancos continuam a ter e a fazer uso, mesmo em períodos como o que vivemos, não foi conseguido com o estado de emergência.
De resto, nem é necessário referir a importância que as micro e pequenas empresas representam no nosso País e para a nossa economia, apesar do sufoco que estão a atravessar.
Sr. Presidente, Sr.as Srs. Deputados: Para Os Verdes sempre esteve muito claro que uma coisa são as medidas de contenção, necessárias e imperativas, outra coisa bem diferente é a declaração ou a manutenção do estado de emergência. Aliás, não é por acaso que ouvimos as autoridades de saúde, os especialistas e até a comunidade científica defender a necessidade de manter as medidas de contenção, mas não os ouvimos defender ou recomendar o estado de emergência ou o seu prolongamento. E de quem defende, como Os Verdes, que as medidas a tomar numa situação desta natureza deveriam ter um mínimo de suporte técnico não se poderia esperar o voto favorável nem à declaração do estado de emergência, nem ao seu prolongamento.
Consideramos que, no imediato, é necessário prosseguir com as medidas de contenção, sem prejuízo de admitirmos, até, ser a altura de se começar a ponderar e a discutir a forma, o tempo e o alcance de eventuais alívios, naturalmente faseados e equilibrados e desde que se garantam todas as condições de segurança aos cidadãos, mas sempre com a convicção que nos tem norteado neste processo: nós não confundimos medidas de contenção com o estado de emergência…
Vou terminar, Sr. Presidente.
Como eu estava a dizer, nós não confundimos medidas de contenção com o estado de emergência, porque uma coisa são as medidas de contenção e outra, bem diferente, é o estado de emergência.
Mesmo assim, e aplicando aqui o princípio da precaução, Os Verdes vão abster-se neste novo pedido de autorização de renovação do estado de emergência.