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Intervenções na AR (escritas)
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25/05/2020
Declaração Política (COVID19) – DAR-I-052/1ª
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Portugal encontra-se novamente mergulhado numa crise com efeitos em todos os setores de atividade e em todas as dimensões das nossas vidas. Depois de se ter pedido aos cidadãos que se confinassem em casa e tendo a generalidade dos cidadãos respeitado essa orientação — muito, aliás, com um enorme sacrifício pessoal, porque implicou uma perda substancial dos seus rendimentos —, é tempo de começar a gerar alguma normalidade e de encontrar respostas de políticas públicas que estejam à altura de um país desenvolvido e comprometido em gerar qualidade de vida e bem-estar às pessoas.
Diz-nos o bom senso que é preciso aprender com os erros do passado e por isso, hoje, mais do que nunca, se exige um Estado interventivo, proativo e determinado nos investimentos necessários, desde logo que não coloque a cegueira do défice à frente das respostas necessárias de que os cidadãos precisam e que são fundamentais ao desenvolvimento do País.
Por outro lado, desta crise podemos, apesar de tudo, tirar algumas conclusões e olhar para ela como uma oportunidade de repensar as prioridades que têm norteado as nossas vidas, a forma como vivemos, produzimos e consumimos e a forma como nos relacionamos com a natureza.
Em primeiro lugar, percebemos que, quanto mais fortalecido estiver o Serviço Nacional de Saúde (SNS), mais adequada será a resposta a crises como aquela que estamos a viver. Portanto, desta crise sai reforçada a necessidade de se investir a sério no SNS e na valorização dos seus profissionais.
Ficou também claro que temos de nos virar para a produção nacional e recuperar a nossa soberania alimentar, não apenas porque é determinante para reduzir a pegada ecológica, mas também porque, em tempos como aqueles que vivemos, é preciso que os países estejam em condições de assegurar resposta aos seus cidadãos.
Por isso, é necessário potenciar a agricultura familiar, de pequena escala e biológica, dar vida ao estatuto da agricultura familiar e fazer renascer os mercados de proximidade e os pequenos circuitos de distribuição, que são fundamentais até para que os agricultores possam escoar os seus produtos.
É preciso reequacionar o papel do Estado na economia e colocar a banca ao serviço do relançamento da economia, em vez de se continuarem a transferir recursos públicos para apoio à banca privada, recursos esses que são indispensáveis para o desejável relançamento da economia.
É tempo também de avaliar as parcerias público-privadas e de colocar um fim na brutal imoralidade que os paraísos fiscais representam. São milhões e milhões de euros que podem e devem ser canalizados para combater a pobreza, para garantir os apoios às famílias que perderam os seus rendimentos com esta crise e para apoiar as pequenas empresas, para que estas também possam dar o seu contributo no relançamento da economia.
Mas é tempo, também, de reequacionar este modelo económico, que assenta na exploração desenfreada dos recursos naturais, que potencia elevados riscos para a saúde e que promove fortes impactos ambientais, para além de aprofundar de forma dramática as desigualdades sociais. É preciso inverter as premissas, porque, afinal de contas, é a economia que existe para servir as pessoas, não são as pessoas que existem para servir a economia.
Portanto, quando falamos dos objetivos da economia, a discussão tem de assentar no bem-estar das pessoas, na repartição justa da riqueza por todos produzida, na conciliação da vida profissional com a vida familiar, no combate às assimetrias regionais e no estabelecimento de uma relação de harmonia e de equilíbrio com a natureza.
A crise climática, a assustadora perda de biodiversidade e o uso insustentável de recursos naturais não podem deixar de estar presentes nas preocupações de hoje, porque, certamente, vão exigir maiores desafios amanhã. Também por isso esta pandemia não pode servir de desculpa para reduzir o investimento em áreas determinantes para garantir o equilíbrio ecológico, como seja a conservação da natureza ou o setor dos transportes.
Vejamos: durante estes dias, os índices de poluição baixaram consideravelmente, sobretudo porque as deslocações pendulares deixaram de se realizar massivamente. Ora, estes dados vêm reforçar a necessidade e a oportunidade das propostas de Os Verdes relativamente à aposta séria nos transportes públicos a preços socialmente justos, para que possam representar uma verdadeira alternativa à utilização diária do automóvel particular.
Por isso, Os Verdes insistem na necessidade de reforçar os horários e o material circulante, aumentando a oferta de transportes públicos, dotando o País de uma maior cobertura, com maior incidência na ferrovia, alargar a abrangência do passe social, mas também favorecer a utilização de modos de transportes suaves ou ativos, nomeadamente com a implementação de uma rede nacional de ciclovias, com ligação entre municípios e regiões.
Olhemos, pois, para esta crise como o ponto de viragem nas nossas prioridades e questionemos aquilo que fomos aceitando como normal, nomeadamente, o modelo económico que faz depender a sua sobrevivência da exploração desenfreada dos recursos naturais; a possibilidade dada às grandes empresas que, produzindo os seus lucros no nosso País, colocam a sua sede fiscal na Holanda para não pagarem impostos cá; um sistema fiscal que permite que uns possam viver em paraísos fiscais, para a generalidade viver num verdadeiro inferno fiscal; um modelo em que os banqueiros dividem os lucros quando os bancos dão lucro, mas que chama os contribuintes a pagar a irresponsabilidade dos banqueiros quando os bancos dão prejuízo.
Não pode ser! Há muita coisa errada nisto tudo!
Por isso mesmo, dizemos: que esta crise sirva, pelo menos, para nos interrogarmos sobre estas e outras injustiças e imoralidades e sobre a relação que estabelecemos com o planeta.
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