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11/12/2019
PROJETO DE LEI N.º 161/XIV/1ª - Proíbe a caça à gralha-preta, exclui esta espécie da Lista de Espécies Cinegéticas e procede à alteração ao Decreto-Lei nº 202/2004, de 18 de agosto
A gralha-preta (Corvus corone) é uma ave da família dos corvídeos de porte grande, com relativa abundância em Portugal continental. É uma espécie residente que pode ser avistada durante todo o ano, tem uma ampla distribuição em praticamente todo o país e em todos os tipos de habitats, não sendo invulgar observá-las em meio urbano.

É uma ave oportunista que se alimenta de grande variedade de alimentos, desde insetos, aves e pequenos mamíferos a bagas e frutos. São também animais necrófagos, sendo fácil observar gralhas junto às estradas onde se alimentam da carne de animais atropelados, desempenhando por isso um importante papel sanitário de limpeza e contenção de possíveis doenças.

Para além do importante papel que as gralhas desempenham no combate e controlo de pragas de ratos, são elas próprias presas frequentes de águias de porte médio ou grande, como a águia de bonelli, evitando os ataques às aves domésticas ou de capoeira.

Ao nível mundial, a gralha preta tem uma distribuição ampla em todo o hemisfério norte desde a Europa até ao extremo oriente, sendo bastante comum e não correndo risco de extinção. Aliás, no Livro Vermelho dos Vertebrados de Portugal, tem estatuto de conservação pouco preocupante (LC). Estes factos não justificam a sua inclusão na lista de espécies cinegéticas. Afinal estamos a falar de uma espécie sem qualquer interesse gastronómico e que, ainda por cima, não representa, comprovadamente, qualquer perigo, nem do ponto de vista da segurança, nem da saúde pública, nem do ponto de vista dos ecossistemas do nosso país.

A preservação da biodiversidade e da função que as espécies desempenham nos ecossistemas gera-nos a responsabilidade de atuar para que os estatutos de proteção, mesmo que com graus diferenciados, não se cinja aos animais domésticos, fundamentalmente o cão e o gato, ou às espécies em vias de extinção.

Na verdade, a responsabilidade que, enquanto humanos, nos é imputada no sentido de valorizar a biodiversidade, convoca-nos a alargar o horizonte das nossas preocupações às espécies não ameaçadas de extinção nos nossos dias, e a recusar sem quaisquer reservas, a teoria ou a ideia caduca e, nos dias de hoje, desprovida de qualquer sentido, de que tudo o que mexe pode ser caçado.

Por isso mesmo, Os Verdes, não negando a importância cultural e económica que a atividade cinegética assume no meio rural, não pretendem colocar em causa a sua existência com a presente iniciativa legislativa, mas entendem que esta atividade deve cingir-se ao abate de espécies com valor gastronómico.

Bem sabemos que em discussões sobre esta matéria é muitas vezes convocado o argumento do controlo de populações de espécies. Mas, no entendimento dos Verdes, o controlo da população não pode servir de base para manter a gralha-preta entre as espécies cinegéticas, até porque a haver necessidade de controlo de populações, ela deve fazer-se sob a vigilância ou determinação de órgãos que devem ter como preocupação central a erradicação de ameaças à biodiversidade, desde logo o Instituto para a Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF). Se o controlo de população de espécies é uma responsabilidade do Estado, deve ser o Estado e só o Estado a concretizar esse controlo.

Neste contexto, o Projeto de Lei que o Partido Ecologista Os Verdes agora apresenta procura estabelecer um mecanismo de proteção adequado para a referida espécie, sem colocar em causa aquilo a que se poderia chamar a verdadeira caça, que, aliás, nunca por nunca, e sobretudo nos dias de hoje, poderá significar atingir um animal pelo simples prazer de matar.

Assim, com o objetivo de retirar a gralha preta da lista de espécies cinegéticas, o Grupo Parlamentar Os Verdes apresenta, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o seguinte Projeto de Lei:

Artigo 1º
Objeto
1 – A presente Lei proíbe a caça à gralha-preta (Corvus corone).
2 – Para efeitos do disposto no número anterior, a presente Lei procede à alteração ao Decreto-Lei nº 202/2004, de 18 de agosto, que estabelece o regime jurídico da conservação, fomento e exploração dos recursos cinegéticos, com vista à sua gestão sustentável, bem como os princípios reguladores da atividade cinegética.

Artigo 2º
Interdições
Excecionando os casos a que se refere o artigo 3º da presente Lei:
1 - É interdita a caça à gralha-preta (Corvus corone), não podendo esta espécie ser considerada cinegética.
2 - É ainda interdita a captura ou o abate de espécimes de gralha-preta em qualquer altura do ano, assim como a destruição dos seus ninhos ou perturbação dos seus locais de repouso.

Artigo 3º
Correção de efetivos populacionais
Verificando-se a necessidade de se proceder à correção de efetivos populacionais de gralha-preta, a respetiva correção só poderá ocorrer nas seguintes condições:
1 - A existência de censos consistentes, reconhecidos pelo organismo que tutela a Conservação da Natureza, que comprovadamente revelem um excesso populacional que possa pôr em causa o equilíbrio dos ecossistemas ou constituir perigo para a saúde pública;
2 - As correções populacionais só poderão ser efetuadas por pessoal técnico do organismo que tutela a Conservação da Natureza, por processos definidos pela equipa técnica e em cada situação;
3 – O organismo que tutela a Conservação da Natureza deverá providenciar os meios humanos, materiais e financeiros necessários para o regular acompanhamento da dinâmica das populações de gralha preta no sentido de melhor aferir da necessidade de proceder às ações previstas no número anterior.
Artigo 4º
Lista de espécies cinegéticas
É retirado da lista de espécies cinegéticas constante do Anexo I do Decreto-Lei n.º 202/2004, de 18 de agosto, a gralha-preta (Corvus corone).

Artigo 5º
Alterações ao Decreto-Lei nº 202/2004, de 18 de agosto
O artigo 96.º do Decreto-Lei n.º 202/2004, de 18 de agosto, passa a ter a seguinte redação:

«Artigo 96.º
Caça ao gaio e à pega-rabuda
1 — A caça ao gaio e à pega-rabuda pode ser exercida de salto, à espera e de cetraria.
2 — A caça a estas espécies pode ser permitida nos meses de agosto a fevereiro, inclusive, sem prejuízo do disposto no n.º 4.
3 — É permitida a utilização de negaças na caça à pega-rabuda.
4 — Em terrenos cinegéticos não ordenados, nos meses de agosto, setembro, janeiro e fevereiro, a caça a estas espécies só é permitida à espera e de cetraria e apenas nos locais e nas condições estabelecidos por edital da DGRF.»

Artigo 6.º
Contraordenações
Constituem contra-ordenações a caça, o abate deliberado e a captura de espécimes de gralha-preta, em qualquer altura do ano, assim como a destruição dos seus ninhos ou perturbação dos seus locais de repouso, salvo as situações previstas na presente lei.

Artigo 7.º
Regime sancionatório
É aplicado à presente Lei o regime sancionatório previsto no Capítulo XI do Decreto-Lei nº 202/2004, de 18 de agosto.

Artigo 8.º
Regulamentação
O Governo procede à regulamentação e adaptação do regime cinegético, nomeadamente o previsto no n. 2 do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 202/2004, de 18 de agosto, tendo em conta as presentes alterações à Lei, no prazo máximo de 30 dias a contar da data da publicação da presente Lei.

Artigo 9.º
Entrada em vigor
O presente diploma entra em vigor no dia seguinte à sua publicação.

Acompanhe aqui a evolução deste Projeto de Lei.
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