Pesquisa avançada
 
 
Projetos de Lei
Partilhar

|

Imprimir página
22/12/2020
PROJETO DE LEI N.º 611/XIV/2.ª - Repõe a duração de 90 dias para o período experimental para trabalhadores à procura do primeiro emprego e desempregados de longa duração (Alteração à Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro)
EXPOSIÇÃO DE MOTIVOS

A Lei n.º 93/2019, de 4 de setembro, procedeu a um conjunto amplo de alterações à legislação laboral, alterando o Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, e respetiva regulamentação, e o Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de Segurança Social, aprovado pela Lei n.º 110/2009, de 16 de setembro.

Foi através dessa lei, que alterou o artigo 112.º do Código do Trabalho, que o período experimental foi alargado de 90 para 180 dias para desempregados de longa duração e para quem esteja à procura do primeiro emprego, trazendo mais precariedade, insegurança e desproteção aos trabalhadores.

Importa referir que para os trabalhadores que exerçam cargos de complexidade técnica, elevado grau de responsabilidade ou que pressuponham uma especial qualificação, bem como os que desempenhem funções de confiança, se mantêm os 180 dias de período experimental, como a legislação já determinava.

Ou seja, passou a ser possível submeter desempregados de longa duração e jovens à procura do primeiro emprego a um período experimental de 180 dias, durante o qual estão sujeitos a denúncia por parte do empregador, sem invocação de justa causa, nem direito a indemnização.

Com efeito, esta medida não promove o emprego, não combate a precariedade e nem está sequer fundamentada a necessidade de um período tão prolongado de experiência, apesar de o Governo ter feito crer que traria benefícios para os trabalhadores, sendo, na verdade, uma forma de compensar as entidades patronais.

A realidade é que não era evidente que a duração do período experimental até então era insuficiente para criar entre a entidade empregadora e o trabalhador as necessárias condições de segurança e certeza para estabelecer uma relação laboral estável e duradoura.

Obviamente, há um reconhecido interesse em o trabalhador conhecer o trabalho concreto que vai desenvolver, assim como em a entidade empregadora conhecer o trabalhador com quem vai desenvolver uma relação de contrato sem termo. Todavia, as medidas atualmente em vigor são especialmente vantajosas para a entidade patronal, podendo os trabalhadores ficar, assim, reféns de uma espiral de precariedade, que pode ser levada ao extremo se começar a haver abuso do período experimental de seis meses e as pessoas foram enviadas sistematicamente embora.

Um período à experiência deve servir para a entidade empregadora e o trabalhador se conhecerem e poderem concluir se pretendem, ou não, prolongar o vínculo laboral. Não deve servir para discriminar consoante o tipo de trabalhador.

Em muitas situações o cenário pode ser este: seis meses numa empresa a suprir necessidades que são permanentes, à experiência, sem um vínculo. São 180 dias de insegurança, de incerteza, que podem terminar de um momento para o outro, sem aviso prévio, sem fundamentação para o despedimento e sem qualquer compensação.

Acresce ainda o facto de serem considerados jovens à procura do primeiro emprego aqueles que nunca tenham prestado a sua atividade através de um contrato sem termo. Quer isto dizer que um trabalhador pode ter tido vários empregos a prazo, o que, aliás, até é bastante frequente, mas enquadra-se, aos olhos da lei, no conceito de “à procura do primeiro emprego”, sujeitando-se a meio ano à experiência, perpetuando a precariedade.

A verdade é que não se consegue justificar como é possível que um jovem à procura do primeiro emprego tenha de estar 180 dias à experiência, quando outro trabalhador, exatamente na mesma função, tem um período experimental de 90 dias.

O facto de submeter estes trabalhadores a um período experimental de seis meses, mesmo que seja para funções indiferenciadas, levanta questões no campo da igualdade, pois não se vislumbram razões para esta diferença no tratamento dos trabalhadores em relação aos restantes.

De resto, a Proposta de Lei n.º 136/XIII, que veio dar origem à Lei n.º 93/2019, de 4 de setembro, argumentava que esta medida visava «ser um estímulo à contratação sem termo de trabalhadores à procura de primeiro emprego e de desempregados de longa duração, subtraindo-se ao elenco de motivos para contratação a termo certo esta categoria específica de pessoas e ao mesmo tempo, de forma coerente e articulada, incluiu-se esta categoria específica de pessoas no período experimental de 180 dias».

Segundo o Governo, visava «diminuir as resistências dos empregadores em celebrarem um contrato de trabalho a sem termo em que decorra primeiro um período experimental que possibilite às partes ponderar a viabilidade da situação laboral criada e a sua própria vontade, agora já esclarecida por uma experiência real de trabalho».

Ora, uma medida que prevê um período experimental de 180 dias para trabalhadores à procura do primeiro emprego e desempregados de longa duração em nada contribui para a promoção de direitos e de segurança no trabalho, e não deve ser vista como uma compensação, uma moeda de troca para que se limitem os contratos a prazo para jovens e desempregados de longa duração, alteração também efetuada através da Lei n.º 93/2019, de 4 de setembro.

Na verdade, essas alterações feitas ao artigo 140.º do Código do Trabalho, referentes à contratação a termo, podiam perfeitamente ocorrer sem qualquer alteração ao período experimental.

Por um lado, diminui-se a duração dos contratos a termo mas, por outro, alarga-se o período experimental. É o que se chama dar com uma mão e tirar com outra. Facilmente se percebe que esta alteração vai no sentido contrário de outras medidas já aprovadas para combater a precariedade e que ficam, agora, esvaziadas, numa clara contradição.

Não é admissível que um dos argumentos apresentados seja o facto de os contratos de trabalho a termo resolutivo, provavelmente, estarem a ser utilizados como “falso período experimental”.

Saliente-se que a Constituição da República Portuguesa consagra, no Artigo 58.º, o direito ao trabalho, incumbindo ao Estado promover a execução de políticas de pleno emprego e, no artigo 53.º, a garantia da segurança no emprego.

Recorde-se que já em 2008 o Tribunal Constitucional considerou inconstitucional o alargamento do período experimental para 180 dias e, com esta alteração, fomos novamente confrontados com os mesmos objetivos, apenas com a diferença de agora ser aplicado a trabalhadores à procura do primeiro emprego ou desempregados de longa duração e, na altura, era a trabalhadores indiferenciados.

A este propósito, no âmbito da revisão de 2019 do Código do Trabalho, em concreto em relação à alteração período experimental, o Partido Ecologista Os Verdes, juntamente com o PCP e o BE, entregou no Tribunal Constitucional um pedido de fiscalização sucessiva.

Sintetizando, esta medida apresenta-se desadequada e até contrária aos objetivos a que, alegadamente se propõe.

Face ao exposto, e não obstante a necessidade imperiosa de alterar outras medidas igualmente gravosas em matéria laboral, o Grupo Parlamentar do Partido Ecologista Os Verdes propõe, através do presente Projeto de Lei, que, para já, o período experimental regresse às condições estabelecidas antes da entrada em vigor da Lei n.º 93/2019, como forma de reforçar os direitos dos trabalhadores.

Assim, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o Grupo Parlamentar do Partido Ecologista Os Verdes apresenta o seguinte Projeto de Lei:

Artigo 1.º
Objeto

A presente Lei procede à alteração da Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, de modo a estabelecer a duração de 90 dias para o período experimental para trabalhadores à procura do primeiro emprego e desempregados de longa duração.

Artigo 2.º
Alteração à Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, que aprova a revisão do Código do Trabalho

O artigo 112.º da Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, na sua redação atual, passa a ter a seguinte redação:

«Artigo 112.º
[...]

1 – […]
a) […];
b) 180 dias para os trabalhadores que exerçam cargos de complexidade técnica, elevado grau de responsabilidade ou que pressuponham uma especial qualificação, bem como os que desempenhem funções de confiança;
c) […].
2 – […]
3 - ]…].
4 - O período experimental, de acordo com qualquer dos números anteriores, é reduzido ou excluído, consoante a duração de anterior contrato a termo para a mesma actividade, ou de trabalho temporário executado no mesmo posto de trabalho, ou ainda de contrato de prestação de serviços para o mesmo objecto, com o mesmo empregador, tenha sido inferior ou igual ou superior à duração daquele.
5 - …].
6 – […].»

Artigo 3.º
Entrada em vigor

A presente Lei entra em vigor 30 dias após a sua publicação.


Assembleia da República, Palácio de S. Bento, 22 de dezembro de 2020
Os Deputados,
José Luís Ferreira
Mariana Silva

Acompanhe aqui esta iniciativa
Voltar