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05/04/2021
PROJETO DE LEI N.º 776/XIV/2.ª - ESTABELECE AS CONDIÇÕES DE PROIBIÇÃO DE ACAMPAMENTO E APARCAMENTO DE VEÍCULOS
(ALTERAÇÃO DO ARTIGO 50.º-A DO CÓDIGO DA ESTRADA, APROVADO PELO DECRETO-LEI 114/94, DE 3 DE MAIO E REPUBLICADO, EM ANEXO À LEI 72/2013, DE 3 DE SETEMBRO)

EXPOSIÇÃO DE MOTIVOS

O Decreto-Lei n.º 102-B/2020, de 9 de dezembro, veio alterar o Código da Estrada e legislação complementar, transpondo a Diretiva (UE) 2020/612 e, através do Artigo 3.º, estabelece a proibição de pernoita e aparcamento de autocaravanas, medida que entrou em vigor a 8 de janeiro de 2021.

Desta forma, ao Código da Estrada foi aditado o Artigo 50.º-A que determina a proibição de pernoita e aparcamento de autocaravanas ou similares fora dos locais expressamente autorizados para o efeito. Considera, assim, aparcamento «o estacionamento do veículo com ocupação de espaço superior ao seu perímetro» e pernoita «a permanência de autocaravana ou similar no local do estacionamento, com ocupantes, entre as 21:00 horas de um dia e as 7:00 horas do dia seguinte».

No entanto, esta proibição surge sem que exista qualquer explicação ou fundamentação na respetiva exposição de motivos.

Relativamente a este assunto importa recordar que a intenção de avançar com este género de proibição na utilização das autocaravanas não é uma novidade, é um tema já bastante antigo.

Recorde-se até que o Governo, no âmbito da pandemia de COVID-19 e num regime excecional e temporário, proibiu as autocaravanas de estacionar nos parques e zonas de estacionamento de acesso às praias, avançando depois para a possibilidade de permanecerem nos locais especificamente designados para estes veículos pelas entidades gestoras dos parques e zonas de estacionamento, entre as 07h00 e as 21h00. Agora, com a aplicação do Decreto-Lei n.º 102-B/2020, de 9 de dezembro, essa proibição veio tornar-se uma realidade independentemente do contexto pandémico.
Esta alteração, além de não estar devidamente justificada no referido Decreto-Lei, representa vários problemas, nomeadamente por aduzir algumas dúvidas e confusão nas interpretações possíveis, desde logo porque todos os lugares de estacionamento são adequados para veículos ligeiros, desde que estes estejam devidamente estacionados e sem realização de acampamentos, quer estejam com ou sem ocupantes.

Saliente-se que uma autocaravana com peso bruto igual ou inferior a 3.500 quilogramas e com lotação não superior a nove lugares, incluindo o do condutor, pertence à classe de veículos ligeiros de passageiros com a homologação europeia de categoria M1.

O novo artigo do Código da Estrada peca por levar a interpretações dúbias porque pode referir-se apenas a veículos que, além de terem um espaço habitacional, são classificados como autocaravanas, sendo, assim, a legislação exclusivamente aplicada a esse grupo mais restrito. Nesse caso, esta alteração instituiu regras diferenciadas de permanência nos parques de estacionamento, não permitindo que os veículos ligeiros de passageiros denominados autocaravanas e os seus condutores possam gozar dos mesmos direitos atribuídos aos veículos da mesma categoria e tipo.

Por outro lado, a legislação poder-se-á referir a qualquer veículo que apresente um espaço habitacional, podendo, assim, ser incluído no conceito apresentado. Isto, se tivermos em consideração o conceito de autocaravana referido no próprio diploma que refere que autocaravana ou similar é «o veículo que apresente um espaço habitacional ou que seja adaptado para a utilização de um espaço habitacional, classificado como 'autocaravana', 'especial dormitório' ou 'caravana' pelo Instituto da Mobilidade e dos Transportes, I. P.».

Além disso, a legislação refere «permanência», um conceito muito pouco claro neste contexto e que o próprio diploma não esclarece. Estabelece ainda a proibição da permanência nos locais de estacionamento, ou seja, nos locais apropriados para o efeito, portanto para a permanência de viaturas, desde que não tenham ocupantes.

Ou seja, a lei, mantendo-se como está, obriga a que as pessoas que fazem uma longa viagem na autoestrada não possam sair numa área de serviço e descansar, como fazem muitos condutores e como até é recomendado por uma questão de segurança. Quem conduz uma autocaravana, caso não encontre um local autorizado para o efeito, não poderá descansar em áreas de descanso, exceto se essas áreas permitirem expressamente que o faça com aquela viatura.

Desta forma, a solução para os autocaravanistas é pernoitar exclusivamente em parques de campismo e caravanismo. É ainda oportuno recordar que existem extensões de centenas de quilómetros onde não existe um único lugar de estacionamento que permita expressamente a pernoita de autocaravanas.

Esta medida pode ainda significar que uma autocaravana pode estar estacionada num local apropriado para esse efeito, por exemplo numa via pública, desde que respeite as regras de estacionamento do Código da Estrada, mas os seus ocupantes não podem estar no seu interior entre as 21h da noite e as 7h da manhã seguinte, independentemente de estarem acordados ou a dormir.

É obviamente compreensível a proibição do aparcamento, ou seja, o estacionamento do veículo com ocupação de espaço superior ao seu perímetro, fora dos locais expressamente destinados para esse efeito.

O Partido Ecologista Os Verdes também não é alheio à preocupação que deve haver com questões de saúde pública, de segurança rodoviária e de proteção e preservação de zonas protegidas. No entanto, esta medida implementada através do Decreto-Lei n.º 102-B/2020, de 9 de dezembro, não dá propriamente resposta a alguns desses problemas, nomeadamente o da segurança rodoviária, subsistindo sérias dúvidas em relação à sua proporcionalidade e justiça.

Não está sequer em causa a necessidade de haver regras e fiscalização. Noutros países europeus também existe legislação sobre esta matéria, mas ou não são especificadas exclusivamente as autocaravanas, podendo estas estacionar nas mesmas condições que os demais veículos, ou determinam limitações relacionadas com a proteção de espaços naturais, com a proibição de campismo na via pública e de despejo de resíduos orgânicos e águas em estradas e áreas públicas fora dos sistemas de disposição sanitária, assim como em caso de obstrução. Neste contexto, importa também ter em consideração as particularidades de cada zona e auscultar as autoridades locais, nomeadamente as autarquias.

O autocaravanismo é uma expressão de turismo itinerante e da natureza e é um sector em crescimento, sendo necessário estabelecer algumas medidas para garantir a sua sustentabilidade e responsabilidade, o respeito pela saúde pública, pela segurança, pelo ordenamento, pelo ambiente e pela sociedade no geral. Deste modo, não se compreende de que forma o Código da Estrada, tal como se encontra redigido o seu artigo 50.º -A ajuda a alcançar esses objetivos.

Face ao exposto, o Partido Ecologista Os Verdes entende que é vantajoso proceder à alteração do artigo 50.º-A do Código da Estrada, por forma a que este se torne mais claro, mais justo e mais adequado à realidade do autocaravanismo, evitando atropelos aos direitos e interpretações arbitrárias e desproporcionais.

Assim, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o Grupo Parlamentar do Partido Ecologista Os Verdes apresenta o seguinte Projeto de Lei:

Artigo 1.º
Objeto
A presente Lei procede à alteração ao Artigo 50.º- A do Código da Estrada, no sentido de revogar a proibição de pernoita e aparcamento de autocaravanas e de estabelecer as condições de proibição de acampamento e aparcamento de veículos.

Artigo 2.º
Alteração ao Artigo 50.º-A do Código da Estrada
O Artigo 50.º-A do Código da Estrada, aprovado pelo Decreto-Lei 114/94 de 3 de maio e republicado em anexo à Lei 72/2013, de 3 de setembro, passa a ter a seguinte redação:

«Artigo 50.º- A
Proibição de acampamento e aparcamento de veículos

1 - Sem prejuízo do disposto nos artigos 49.º e 50.º, são proibidos o acampamento e o aparcamento de veículos fora dos locais expressamente autorizados para o efeito.
2 - Para efeitos do disposto no número anterior, considera -se:
a) «Aparcamento» - a imobilização do veículo, em local de estacionamento, com ocupação de espaço superior ao seu perímetro;
b) «Acampamento» - utilização de acessórios de imobilização sem apoio das rodas no solo, despejo de águas sujas ou limpas ou prática de atividades domésticas, com recurso a acessórios da viatura, no seu perímetro exterior.
3 - Quem infringir o disposto no n.º 1 é sancionado com coima de (euro) 60 a (euro) 300, salvo se se tratar de acampamento ou aparcamento em áreas da Rede Natura 2000 e áreas protegidas, caso em que a coima é de (euro) 120 a (euro) 600€.»

Artigo 3. º
Entrada em vigor
A presente Lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.

Assembleia da República, Palácio de S. Bento, 5 de abril de 2021

Os Deputados,

José Luís Ferreira
Mariana Silva

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