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28/09/2020
PROJETO DE LEI Nº 544/XIV/2ª - INQUÉRITO NACIONAL SOBRE O DESPERDÍCIO ALIMENTAR EM PORTUGAL

O Partido Ecologista Os Verdes (PEV) tem colocado, regularmente, na agenda política a problemática do desperdício alimentar. Exemplo disso foi a apresentação de um conjunto de iniciativas parlamentares que resultaram em orientações para o Governo cumprir – veja-se o Projeto de Resolução nº 1506/XIII (Combater o desperdício alimentar para promover uma gestão eficiente dos alimentos), que deu origem à Resolução da AR nº 65/2015, de 17 de junho, ou os Projetos de Resolução nº 582/XIII (Participação pública para a estratégia nacional e para o plano de ação de combate ao desperdício alimentar) e 583/XIII (Diagnóstico sobre o desperdício alimentar), os quais concorreram para a Resolução da AR nº 13/2017, de 7 de dezembro.

Em cumprimento da Resolução da AR nº 65/2015, de 17 de junho, o Governo criou a Comissão Nacional de Combate ao Desperdício Alimentar (CNCDA), através do Despacho nº 14202-B/2016, de 25 de novembro. O primeiro objetivo estabelecido para esta Comissão é «proceder ao diagnóstico, avaliação e monitorização sobre o desperdício alimentar a nível nacional». Com efeito, essa é uma das tarefas que o PEV considera urgente concretizar e na qual tem insistido recorrentemente junto do Governo.

A verdade é que em Portugal não existe um conhecimento aproximado, quando mais rigoroso, daquela que é a realidade concreta do desperdício alimentar nas várias fases da cadeia alimentar. O estudo que existe, e que se assume, ele próprio, como uma estimativa, resultou do Projeto de Estudo e Reflexão sobre o Desperdício Alimentar (PERDA), publicado em 2012. Ora, passados 5 anos sobre a iniciativa dos Verdes que resultou na aprovação da primeira Resolução da Assembleia da República sobre a temática, e volvidos 4 anos sobre a criação da CNCDA, ainda não existe um diagnóstico em Portugal sobre a dimensão do desperdício alimentar.

Mais, de acordo com o Relatório de Progresso da Estratégia Nacional e do Plano de Ação de Combate ao Desperdício Alimentar (de dezembro de 2019), verifica-se que, pese embora algumas iniciativas tomadas pelo Instituto Nacional de estatística (INE) e pelo Gabinete de Planeamento, Políticas e Administração Geral GPP), ainda se está em fase de auscultação sobre a possibilidade de obtenção de dados, considerando-se que, na generalidade, os contributos têm sido insuficientes.

Sabendo que não é tarefa fácil, designadamente tendo em conta a dimensão de operadores e agentes das diferentes fases da cadeia alimentar, é, contudo, caso para dizer que tarda a obter-se, em Portugal, um conhecimento efetivo sobre a dimensão do desperdício alimentar. Nestas circunstâncias, é preciso, na perspetiva dos Verdes, assumir que esta é uma questão importante e que devem ser criados os meios necessários para obter esse conhecimento. Em suma, é preciso dar urgência a esta resposta.

Esta urgência decorre de circunstâncias para as quais o PEV tem alertado, tais como:

a)      Do ponto de vista ambiental é doloroso que sejam esbanjados recursos naturais para produzir bens alimentares que depois acabam no lixo. Os impactos ambientais das diferentes fases da cadeia alimentar (e.g. degradação do solo, saturação de recursos hídricos, perda de biodiversidade, produção de resíduos, gasto de energia, emissão de gases com efeito de estufa) poderiam ser significativamente reduzidos se não se verificassem altos níveis de desperdício.

b)      Do ponto de vista social é angustiante que se deitem literalmente fora um conjunto significativo de alimentos que poderiam contribuir para satisfazer necessidades básicas alimentares de uma parte da população. A injusta repartição da riqueza e as políticas de empobrecimento repercutem-se de uma forma inaceitável no acesso aos bens fundamentais para satisfação das mais elementares necessidades da população.

Tal como o PEV tem sublinhado, o primeiro passo necessário para combater as perdas alimentares é ter consciência de que o problema existe. O segundo passo é perceber com rigor qual a sua dimensão e quais as suas causas. Conhecidos os fatores que geram o desperdício, ficam criadas as condições para a definição de objetivos e metas para pôr fim ao problema de forma eficaz. Realça-se, também, que o sucesso da aplicação de medidas para cumprimento dos objetivos depende do forte envolvimento da sociedade e de todos os agentes implicados.

Assim sendo, o PEV propõe, através do presente Projeto de Lei, que se realize um inquérito nacional ao desperdício alimentar, que tenha em conta que aqui se englobam alimentos destinados ao consumo humano que acabaram por ser inutilizados em quantidade ou em qualidade, e que estas perdas alimentares se dão em todas as fases da cadeia alimentar (na produção, no processamento, no armazenamento, no embalamento, no transporte, na disponibilização nos pontos de venda e no consumo).

De realçar que, na fase de uma crise pandémica, em que nos encontramos, o PEV opta por não estabelecer prazos para a conclusão do inquérito proposto, uma vez que ele se deve realizar quando a vida da generalidade dos portugueses estiver normalizada. Até lá é urgente, contudo, definir os termos em que esse inquérito decorrerá e preparar todo o processo para que ele seja implementado no terreno assim que houver condições objetivas. Por outro lado, registamos que um inquérito desta natureza implica meios humanos no terreno em grande dimensão, podendo daqui resultar um contributo importante para o envolvimento de muitos portugueses (nomeadamente jovens) que se encontram em fase de dificuldade na sua vida, devido às barreiras criadas pelas medidas de resposta à pandemia, com impacto social e económico muito sério.

Tendo em conta o que ficou referido, o Grupo Parlamentar Os Verdes apresenta, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o seguinte Projeto de Lei:

 

Artigo 1º

Objeto

A presente Lei determina a realização de um inquérito nacional sobre o desperdício alimentar, doravante designado de Inquérito, com vista à recolha de dados que permitam obter um diagnóstico realista sobre o nível de perdas alimentares em Portugal.

 

Artigo 2º

Âmbito

O Inquérito incide sobre agentes que atuam nas diversas fases da cadeia alimentar, designadamente produção, processamento, armazenamento, embalamento, transporte, distribuição, venda e consumo.

 

Artigo 3º

Responsabilidade pelo Inquérito

1 - Compete à Comissão Nacional de Combate ao Desperdício Alimentar (CNCDA), criada pelo Despacho nº 14202-B/2016, de 25 de novembro, determinar o procedimento metodológico e efetivar a organização da realização do Inquérito.

2 – O tratamento dos dados obtidos através do Inquérito é da responsabilidade do Instituto Nacional de Estatística.

3 – O estabelecido nos números anteriores não prejudica a possibilidade de envolvimento de outras entidades, a determinar pela CNCDA.

 

Artigo 4º

Calendarização

1 - O Governo determina a data e o prazo para a realização do Inquérito e assegura o seu devido financiamento.

2 - A definição dos termos da realização do inquérito, prevista no nº 1 do artigo 3º, deve estar concluída 6 meses após a entrada em vigor da presente Lei.

 

Artigo 5º

Relatório de divulgação do resultado do Inquérito

1 - Quando finalizado o Inquérito e após o tratamento dos respetivos dados, nos termos do artigo 3º, é elaborado um relatório que apresente as conclusões de forma sistematizada, clara e objetiva.

2 - O relatório referido no número anterior é da responsabilidade da CNCDA e é remetido por esta ao membro do Governo que tutela a área da alimentação.

3 - Após a sua receção o Governo remete o relatório à Assembleia da República e define os termos de realização de uma discussão pública, a abranger todos os interessados, sobre o conteúdo do relatório.

 

Artigo 6º

Regulamentação

O Governo regulamenta a presente Lei no prazo de 3 meses, após a sua entrada em vigor.

 

Artigo 7º

Entrada em vigor

A presente Lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.


Acompanhe aqui esta inicitiva.
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