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05/01/2021 |
PROJETO DE LEI Nº 616/XIV/2ª - DETERMINA UMA DISTÂNCIA MÍNIMA ENTRE O EXTREMO DE CULTURAS AGRÍCOLAS PERMANENTES SUPERINTENSIVAS E OS NÚCLEOS HABITACIONAIS |
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Exposição de motivos
O olival tradicional está a ser substituído por olival intensivo e super intensivo, o qual visa aumentar substancialmente a quantidade de azeite a produzir. Este está a alastrar em larga escala, sobretudo na região do Alentejo.
Ocorre que os impactos do olival intensivo e, sobretudo, do superintensivo são muito significativos a diversos níveis. Estamos a falar de culturas que podem abarcar cerca de 2000 árvores por hectare, com distanciamentos muito curtos entre elas.
Desde logo, trata-se de culturas bastante exigentes em termos de gasto de água. Numa altura em que o país necessita urgentemente da implementação de medidas concretas que gerem eficácia no âmbito da vertente da mitigação das alterações climáticas, mas também na vertente da adaptação a esta mudança do clima, torna-se absolutamente inaceitável continuar a permitir que o modelo de agricultura que está a ser implementado assente exatamente no oposto áquilo que é necessário ao nível do uso de água.
Um caminho que está a erradicar completamente a cultura tradicional, a fazer com que ela nem seja sequer economicamente viável, para dar lugar às culturas superintensivas, de regadio, que são altamente dependentes de água e que são consumidoras de uma vasta quantidade de água, um bem que deve ser usado regradamente e que tem tendência para se tornar mais escasso no processo de mudança climática.
Outra consequência efetiva da proliferação do olival superintensivo prende-se com a saturação dos solos. Sobretudo no Alentejo, onde estudos concretos sobre os efeitos das alterações climáticas a médio e longo prazo já demonstraram que os riscos de seca extrema são por demais evidentes e, consequentemente o risco de desertificação e empobrecimento de solos, estão a alastrar-se culturas que promovem o esgotamento de solos e que ao fim de 20 a 25 anos os deixam inaptos para a agricultura.
Para além das questões referidas, o olival superintensivo é «encharcado» de uma quantidade enorme de pesticidas, o que gera um nível de poluição muito significativo, havendo o risco de os seus efeitos se fazerem sentir, em termos de consequências patológicas, daqui a uns anos. Para já, as populações queixam-se do facto de sentirem diretamente a degradação da qualidade do ar, quando conseguem perceber que inalam os químicos lançados para as culturas. Um outro nível de preocupação demonstrada pela população é a contaminação de solos e lençóis freáticos, a partir da utilização massiva desses químicos.
O que aqui se referiu concretamente sobre o olival estende-se a outras culturas permanentes superintensivas, como o amendoal, que estão a expandir-se numa área bastante alargada.
Na legislatura passada, os Verdes questionaram, em Plenário da Assembleia da República, o Primeiro Ministro sobre esta preocupante questão ambiental, ao que o chefe do executivo respondeu que o Governo está a aguardar um estudo sobre os impactos destas culturas. Porém, esta resposta mais parece um chutar de bola para a frente, porque, entretanto, estas culturas continuam a intensificar-se e a crescer em termos de área. O problema agrava-se, portanto.
O Partido Ecologista Os Verdes tem acompanhado o problema das culturas permanentes superintensivas, constatando o seu brutal crescimento e ouvindo atentamente as preocupações das populações. Para além do alerta e da denúncia necessários, o PEV faz propostas concretas no sentido de mitigar os efeitos deste problema, mas também no sentido de o reverter. Por isso, apresentamos projetos, na Assembleia da República, que visam implementar, designadamente, as seguintes soluções:
• Colocar um fim nos subsídios às culturas intensivas e superintensivas;
• Impedir a colheita mecanizada noturna de azeitona, com vista à preservação da avifauna;
• Criação de selo para identificação das embalagens contendo azeite com proveniência no olival intensivo.
Quanto ao presente Projeto de Lei, tem como objetivo estabelecer uma distância mínima de 300 metros, entre o extremo da cultura agrícola super intensiva e os núcleos habitacionais, de modo a minimizar os impactos das pulverizações e utilização de pesticidas e adubos para a qualidade de vida das populações.
Conscientes de que essa regra obriga a reajustar a área do olival e amendoal super intensivo já instalada, estabelece-se um período de adaptação às novas regras de 6 meses, mas toma-se claro partido pela valorização de melhores padrões ambientais e pela garantia de bem-estar dos cidadãos.
As alterações climáticas exigem-nos medidas eficazes, que não acrescentem vulnerabilidades às já existentes no nosso território. Por outro lado, devemos aprender com os erros do passado e, de uma vez por todas, compreender que a dimensão económica não se pode sobrepor, especialmente a qualquer preço, à dimensão ambiental dos processos de desenvolvimento. Esta questão das culturas agrícolas permanentes superintensivas é bem um exemplo de como a visão económica de curto prazo pode comprometer a segurança ambiental, também ela com repercussões bastante fortes de âmbito social e económico, de médio e longo prazo.
Assim, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o Grupo Parlamentar Os Verdes apresenta o seguinte Projeto de Lei:
Artigo 1º
Objeto
A presente lei determina a existência de distâncias mínimas entre os limites das culturas agrícolas permanentes superintensivas e os núcleos populacionais.
Artigo 2º
Definições
Para efeitos da presente lei, entende-se por:
a) Culturas agrícolas tradicionais – que comportam até 300 árvores por hectare;
b) Culturas agrícolas intensivas – que comportam até 1000 árvores por hectare;
c) Culturas agrícolas superintensivas – que comportam mais de 1000 árvores por hectare.
d) Núcleos populacionais – zonas de presença regular de população, incluindo zonas de habitação, de funcionamento de equipamentos públicos ou instalações empresariais.
Artigo 3º
Distâncias mínimas
1 - Entre a extrema da cultura agrícola super intensiva, e os núcleos habitacionais deve observar-se uma distância mínima de 300 metros.
2 - A regra estabelecida no número anterior aplica-se às culturas agrícolas já instaladas e a instalar.
Artigo 4º
Regime contraordenacional
1 - A violação do disposto no nº 1 do artigo 3º da presente lei constitui contraordenação punível com coima, cujo montante mínimo é de € 2.500 e o máximo de € 40.000.
2 – O levantamento dos autos e a instrução dos processos de contraordenação são da competência da DRA, em cuja área de atuação haja sido praticada a infração.
Artigo 5º
Disposições transitória
1 - Os agricultores que já tenham instalado culturas agrícolas superintensivas à data da entrada em vigor da presente lei, ficam obrigados a notificar por escrito, no prazo de 15 dias, a DRA da área de localização da exploração agrícola em causa
2 - Para efeitos do nº 2 do artigo 3º, é estabelecido um período de 6 meses, a contar da entrada em vigor da presente lei, para adaptação de todas as culturas instaladas.
Artigo 6º
Monitorização e avaliação
O Governo garante, a partir da entrada em vigor da presente lei:
a) a monitorização contínua dos impactos ambientais e para a saúde pública das culturas agrícolas permanentes super intensivas.
b) A avaliação da eficácia das distâncias mínimas estabelecidas pela presente lei, para efeitos ambientais, bem como da saúde e qualidade de vida das populações.
Artigo 7º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.
Assembleia da República, Palácio de S. Bento, 5 de janeiro de 2021
Os Deputados,
José Luís Ferreira
Mariana Silva
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