Pesquisa avançada
 
 
Projetos de Resolução
Partilhar

|

Imprimir página
16/01/2020
PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 193/XIV/1ª. - Adoção dos mecanismos necessários com vista a impedir a compra do Grupo Media Capital pela Cofina, assim como a impedir conglomerados na área da comunicação social
No início de 2019 vieram a público manifestações de interesse da Cofina S.G.P.S., S.A. na compra do Grupo Media Capital, S.G.P.S., S.A.

Posteriormente, em outubro, foi apresentado na Autoridade da Concorrência um formulário de notificação prévia de uma operação de concentração de empresas, através da qual a Cofina se propõe adquirir o controlo exclusivo da Media Capital, por via da aquisição à Promotora de Informaciones, S.A. (PRISA) da totalidade do capital social da Vertix, S.G.P.S., S.A., sociedade comercial que, por sua vez, é titular de ações representativas de 94,69% do capital social e dos direitos de voto da Media Capital, assim como foi lançada a Oferta Pública de Aquisição (OPA) que abrange ações representativas dos restantes 5,31% do capital social deste grupo.

Nesse sentido, a Cofina propõe-se pagar 181 milhões de euros pela Media Capital, assumindo ainda a sua dívida de 75 milhões, pelo que a operação está avaliada em cerca de 255 milhões de euros.

A Media Capital, proprietária dos seguintes ativos - TVI, TVI24, TVI Ficção, TVI Reality, TVI África, TVI Internacional, Rádio Comercial, M80, Rádio Cidade, Smooth FM, Vodafone FM1, www.maisfutebol.iol.pt, iol.pt, Plural Entertainment, Empresa de Meios Audiovisuais, Empresa Portuguesa de Cenários - está à venda desde 2010 e já teve vários candidatos à sua compra. Mais recentemente, a Altice pretendeu adquirir este grupo, mas o negócio não se concretizou.
Por sua vez, a Cofina detém, entre outros, os seguintes ativos: CMTV, Correio da Manhã, Record, Jornal de Negócios, Destak, Sábado, Máxima, TV Guia, mundouniversitario.pt, www.flash.pt, passatempos.xl.pt e também parte (33,33%) da VASP - Distribuição de Publicações, SA.

Importa relembrar que a comunicação social é um pilar da democracia, apesar de muitas vezes subestimado ou esquecido. Tem um papel fundamental na informação e na construção de formas de pensar e de agir, cuja influência é potenciada pelas novas tecnologias da informação e da comunicação.

Logo, com esta operação não estamos apenas perante um mero negócio ou uma simples questão económica. O grupo que daí nascesse seria o principal player nos media em Portugal, com um volume de negócios anual combinado superior a 270 milhões de euros e presença em todos os segmentos.

Desta forma, a compra da Media Capital pela Cofina representaria riscos na já preocupante situação da propriedade dos media em Portugal, que se caracteriza pela concentração num reduzido número de grupos económicos ligados ao grande capital.

De facto, há vários riscos inerentes ao negócio, entre eles o agravamento da concentração dos media, com o domínio da quase totalidade dos principais meios de comunicação social por um grupo económico; o potencial controlo absoluto do mercado de trabalho no sector, com risco elevado de condicionamento da liberdade de expressão e de emprego; o risco de degradação das condições de trabalho dos jornalistas e da propagação de práticas de desregulação e desrespeito pelo trabalho, entre outros.

Apesar disso, a Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC), a Autoridade Nacional de Comunicações (ANACOM) e a Autoridade da Concorrência (AdC) mostraram-se favoráveis à referida operação.

Efetivamente, a ERC emitiu um parecer (Deliberação ERC/2019/295, de 30 de outubro de 2019) cuja decisão é de não se opor à operação de concentração relativa à aquisição do controlo exclusivo do Grupo Media Capital pela Cofina, mas teve um voto contra precisamente devido aos riscos daí inerentes.

Não obstante esta decisão, a ERC indica algumas ressalvas sobre o desenho final do mercado de comunicação social que resultaria da concretização do negócio.

Nesse sentido, e no âmbito da apreciação da operação, a ERC refere o seguinte: «Mais relevantes são os riscos para o pluralismo que podem advir da concentração de propriedade ou da alteração da estratégica programática/editorial, no sentido de uniformização temática de conteúdos de forma transversal aos vários mercados de produto» e «Verifica-se, portanto, como maior risco, a possibilidade de condicionamento da opinião pública e de limitação dos direitos dos cidadãos à informação, na medida em que uma só empresa poderá passar a deter, simultânea e cumulativamente, o segundo serviço de programas generalista mais visto em Portugal, o segundo grupo de rádio mais ouvido em Portugal, o maior jornal diário distribuído em Portugal, as duas maiores plataformas de comunicação social em termos de reach multiplataforma e o segundo e terceiro sites de media mais visitados em Portugal».

A ERC refere ainda que a operação poderá conduzir ao encerramento de órgãos de comunicação social da empresa resultante do processo, além de referir como risco a lesão da independência dos jornalistas e da sua capacidade de trabalho, decorrente de estratégias de otimização de recursos humanos e materiais, e, bem assim, da autonomia editorial.

A ANACOM refere não se identificarem mercados de comunicações eletrónicas potencialmente afetados pela operação em causa, não suscitando questões concorrenciais relevantes nos mercados de comunicações eletrónicas.

Por outro lado, o Sindicato dos Jornalistas, que se constituiu como parte interessada no negócio, comunicou à Autoridade da Concorrência a sua opinião desfavorável argumentando com o potencial impacto na pluralidade e na qualidade da informação que pode comprometer a liberdade de imprensa, além de ter preocupações relativamente à preservação dos postos de trabalho nos órgãos de informação detidos por ambos os grupos.

Por norma, este tipo de fusões tem-se traduzido em cortes de pessoal e emagrecimento de redações, sendo imperioso assegurar os direitos dos profissionais.

Recorde-se que, na primeira década deste século, a Cofina absorveu vários meios de comunicação e entrou em vários grupos com posições no seu capital. Não será também de ignorar que tem havido cortes na Cofina, sendo que a 31 de dezembro de 2010 os custos com o pessoal da Cofina estavam nos 40 milhões de euros e em 2018 situavam-se nos 27,6 milhões de euros.

Se é verdade que há sempre preocupações inerentes a um processo de mudança de acionistas, nesta situação em concreto os receios são acrescidos, constituindo esta operação mais um passo na concentração monopolista no sector da comunicação social.

É ainda de salientar que a proteção do pluralismo dos media tem sido uma preocupação recorrente do Parlamento Europeu, que tem instado a Comissão Europeia, desde os anos 90, a propor medidas concretas no sentido de salvaguardar esse princípio.

Em 2017, o Media Pluralism Monitor examinou o pluralismo nos meios de comunicação social nos Estados-Membros da União Europeia, cujos resultados mostraram estagnação ou deterioração geral nas áreas abrangidas por esta monitorização e confirmaram que nenhum país analisado é livre de riscos de pluralismo dos media.

Importa relembrar que a Constituição da República Portuguesa estabelece no Artigo 38.º vários pressupostos para a liberdade de imprensa, assim como determina no Artigo 39.º, a propósito da regulação da comunicação social, vários princípios, entre eles, a não concentração da titularidade dos meios de comunicação social.

Face ao exposto, a compra da Media Capital pela Cofina pode agravar significativamente a situação de um sector estratégico para o país, conflituando com a Constituição da República Portuguesa e podendo ter impactos negativos na pluralidade, na qualidade da informação e até na situação dos profissionais de ambos os grupos.

Nesse sentido, e uma vez que não se trata de uma mera operação económica, o Governo deverá, no cumprimento da Constituição da República Portuguesa, desenvolver as diligências necessárias para impedir que esta operação se concretize, pois trata-se de assumir uma responsabilidade política, importando, por isso, garantir a liberdade de expressão, a diversidade e o pluralismo nos vários sectores da comunicação social, bem como o direito dos cidadãos à informação, evitando outros conglomerados que se possam vir a concretizar.

Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, os deputados do Partido Ecologista Os Verdes, apresentam o seguinte Projeto de Resolução.

A Assembleia da República recomenda ao Governo que:

1. Recorra aos mecanismos necessários com vista a impedir a compra do Grupo Media Capital pela Cofina.

2. Recorra aos mecanismos necessários com vista a impedir a criação de conglomerados na área da comunicação social que põem em causa a igualdade, a liberdade e o pluralismo.

3. Promova as medidas necessárias com vista a eliminar a degradação das condições de trabalho, a instabilidade e a precarização dos jornalistas e de outros trabalhadores da comunicação social que se encontrem nessa situação.

Acompanhe aqui a evolução deste Projeto de Resolução.
Voltar