Pesquisa avançada
 
 
Projetos de Resolução
Partilhar

|

Imprimir página
27/05/2020
PROJETO DE RESOLUÇÃO Nº 477/XIV/1ª. - PELO ESCOAMENTO E FIXAÇÃO DE UM PREÇO MÍNIMO A PAGAR AO PRODUTOR E PELO COMBATE ÀS PRÁTICAS DESLEAIS NAS RELAÇÕES COMERCIAIS ENTRE A GRANDE DISTRIBUIÇÃO E OS FORNECEDORES DE PRODUTOS ALIMENTARES

A agricultura e as pescas são os principais suportes da alimentação, e os bens alimentares não podem ser confundidos com quaisquer outros, porque são fundamentais à sobrevivência. A alimentação é um Direito Humano e a produção alimentar ocupa um lugar estratégico em termos de soberania.

Um país, como o nosso, com uma política alimentar tão dependente das importações, tem uma enorme fragilidade, seja porque fica nas mãos de especulação internacional que determina o preço dos bens alimentares, seja por outras situações que possam conduzir ao encerramento das fronteiras e/ou limitar as importações, questão para a qual o país foi seriamente alertado a propósito da pandemia provocada pelo SARS-Cov-2.

Para além da agravante do país depender significativamente do estrangeiro para alimentar a sua população, o setor está dominado por meia dúzia de grandes empresas que concentram o circuito de distribuição/comercialização nas grandes superfícies, as quais obtêm margens de lucro escandalosas, sufocando os produtores nacionais pagando preços baixíssimos à produção e vendendo a preços muitas vezes exorbitantes aos consumidores. Estes grupos constituem-se igualmente como grandes importadores de produtos alimentares.

A concentração da distribuição/comercialização em grandes cadeias, para além de esmagar o preço aos produtores, conduziu, ao longo dos anos, ao encerramento de milhares de pequenos estabelecimentos a retalho no setor alimentar, tais como mercearias e minimercados, criando claras disfunções a montante, levando a que os pequenos e médios agricultores reduzissem consideravelmente os pontos de venda para o escoamento dos seus produtos.

A eclosão da pandemia da Covid-19 no nosso país veio demonstrar claramente os desequilíbrios existentes na distribuição/comercialização alimentar. O encerramento de grande parte da restauração, mercados públicos e pequeno comércio, e as dificuldades impostas ao nível das vendas diretas, vieram conduzir a uma concentração exponencial do comércio a retalho nas grandes superfícies, o que tem criado inúmeras dificuldades no acesso aos mercados por parte dos pequenos e médios agricultores.

Face às dificuldades de escoamento, o Governo pediu às grandes superfícies e cadeias de distribuição para reforçarem as suas encomendas junto dos produtores locais, ajudando a fazer o escoamento dos seus produtos. Contudo, as empresas da grande distribuição estão mais preocupadas com os seus lucros do que propriamente com os problemas dos agricultores.

Trabalham, no entanto, a sua imagem, quando promovem campanhas publicitárias para explorar a maior sensibilidade dos consumidores neste período difícil em que vivemos, passando a mensagem do alegado apoio a quem trabalha a terra e cria animais, através do escoamento da produção nacional, como se se tratasse efetivamente de ajudar os agricultores. Todavia, as supostas ajudas mais não são do que campanhas para esmagar o preço dos produtos.

Ora, os pequenos e médios agricultores, os pescadores e o país não podem ficar reféns da grande distribuição, que monopoliza e determina tudo. Os resultados têm-se visto, com claros desequilíbrios, com sérias dificuldades de entrada dos pequenos e médios produtores nestas cadeias, pela reduzida dimensão e capacidade financeira dos produtores, sobretudo decorrente do esmagamento crónico do preço dos produtos. É impossível aos pequenos e médios produtores sobreviverem com o valor que lhes é pago pelos grandes distribuidores e com os prazos tardios de pagamento.

Estas atividades agrícolas e piscatórias já por si acarretam um grau de incerteza muito grande, com riscos económicos, sobretudo quando estão dependentes de fatores alheios aos produtores e pescadores, como sejam as condições meteorológicas ou de carácter biológico.

Defender a pequena agricultura, muita dela de âmbito familiar, permite o desenvolvimento da economia local, garantir a nossa soberania e o caminho para a sustentabilidade. Para além da produção e do consumo local serem a garantia de ter no prato alimentos mais saudáveis, os circuitos curtos de distribuição garantem uma pegada ecológica menor e contribuem para a descarbonização, para o combate ao desperdício alimentar e para a segurança da qualidade do produto.

No sentido de defender a agricultura familiar, em 2018 foi aprovado o Projeto de Resolução n.º 1493/XIII do PEV (Apoio à agricultura familiar como forma de garantir a gestão e manutenção do espaço rural) que, contribuiu para dar origem à Resolução da Assembleia da República n.º 138/2018. Esta Resolução, entre várias medidas, recomendou ao Governo a regulamentação e a fiscalização da atividade das grandes superfícies, nomeadamente quanto aos preços praticados e aos prazos de pagamento aos fornecedores, bem como a aplicação de quotas mínimas para comercialização de bens agroalimentares de produção nacional e local.

Tendo em consideração a concentração do setor alimentar em meia dúzia de grandes empresas, não é suficiente fazer, como o Governo, pedidos às grandes distribuidoras para gerarem alguma sensibilidade social e ambiental. É determinante criar mecanismos eficazes para evitar que a médio e longo prazo a nossa agricultura e a nossa pescas venham a definhar, cavando ainda mais a nossa dependência alimentar face a outros países. Urgem medidas para valorizar e defender a produção alimentar sustentável.

Se antes os problemas enunciados já eram evidentes, com a pandemia da Covid-19, foi demonstrada a maior necessidade de implementar medidas para impedir o esmagamento dos preços, que passam, sobretudo, por atenuar as assimetrias de poder negocial entre a grande distribuição e os produtores, impedindo as práticas comerciais abusivas por parte das grandes cadeias.

Ora, a regulamentação tem de passar pela proibição de práticas comercias desleais nas relações entre os produtores e as grandes cadeias de distribuição e na definição de um preço mínimo na origem que acompanhe a evolução dos custos de produção, invertendo a tendência dos últimos anos em que os custos de produção aumentam consideravelmente, enquanto que o valor pago pelos produtos em natureza tem vindo a descer.

O poder negocial entre o produtor e as grandes superfícies é desequilibrado, levando, por essa via, a condutas menos próprias, senão mesmo ilegais, pelo menos imorais, impostas de forma unilateral como por exemplo o pagamento tardio (a 90 dias), cancelamento de encomendas em cima da hora, exigência de descontos e pagamentos pelas perdas dos produtos perecíveis, entre outras práticas que estão instaladas no setor da grande distribuição.

No seguimento do exposto, tendo em conta que é premente tomar medidas para defender as atividades agrícolas e piscatórias, o Partido Ecologista Os Verdes considera fundamental que seja garantido o preço mínimo dos produtos agrícolas e do pescado a pagar aos agricultores e pescadores, sendo também fundamental pôr fim às práticas comerciais desleais das grandes empresas de distribuição para com os produtores. É com os propósitos referidos que o Grupo Parlamentar Os Verdes apresenta o seguinte Projeto de Resolução:

 

Ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, a Assembleia da República delibera recomendar ao Governo que:

1- Tome medidas eficazes para impedir as práticas desleais nas relações comerciais entre as grandes empresas de distribuição e os fornecedores de produtos alimentares, nomeadamente quanto ao pagamento a preço justo de produtos em natureza ou de primeira transformação.

 

2- Estabeleça o preço mínimo dos produtos agrícolas e pescado de forma a impedir o estrangulamento dos preços pagos ao produtor, ouvindo previamente as organizações representativas dos setores.

 

3- Crie os mecanismos necessários para escoar com urgência os produtos, a preços justos, da pequena e média agricultura e agricultura familiar, que se encontram sem mercado, ou com dificuldade de mercado, devido à pandemia da COVID-19.

Acompanhe aqui esta iniciativa.

Voltar