O jacinto-de-água (Eichhornia crassipes) é considerada uma das plantas invasoras aquáticas mais problemáticas e mais resistentes do mundo, afetando em particular o nosso país. O Decreto-Lei n.º 92/2019, de 10 de julho, define espécie invasora como uma espécie exótica cuja introdução na natureza ou propagação num dado território ameaça ou tem um impacto adverso na diversidade biológica e nos serviços dos ecossistemas a ela associados, ou tem outros impactos adversos.
Oriundo da América do Sul, o jacinto de água tem uma enorme capacidade de reprodução vegetativa, a partir de rizomas ou pequenos fragmentos, ou através da grande produção de sementes, que são viáveis por 20 anos. Ao fim de algumas semanas esta espécie lança novos rebentos que se podem expandir e colonizar outras áreas. Num mês um único indivíduo é capaz de produzir 50 a 70 novas plantas.
Estas plantas propagam-se sobretudo em cursos de água com pouca corrente, em lagoas de água doce, canais de irrigação, charcos, regolfos de barragens e outras zonas húmidas com abundância de nutrientes, especialmente azoto, fósforo e potássio. Estes nutrientes advêm sobretudo dos fertilizantes aplicados na agricultura ou de descargas de efluentes industriais e domésticos, em particular devido às debilidades do tratamento de águas residuais pelas ETAR’s. Ao contrário da maioria das espécies nativas, o jacinto-de-água tolera grandes níveis de poluição, desde logo contaminação das águas por metais pesados.
Em Portugal e na Europa, esta planta foi introduzida inicialmente para fins ornamentais, devido à beleza inquestionável das suas flores, todavia devido aos seus impactos na biodiversidade a importação, cultura, multiplicação, venda transporte ou posse foi proibida no nosso país desde 1974, através do Decreto-lei n.º 165/74, de 22 de Abril, figurando na lista de espécies classificadas como invasoras pelo Decreto-Lei 565/99, de 21 de dezembro, entretanto revogado, bem como pelo Decreto-Lei n.º 92/2019 de 10 de julho.
Esta espécie exótica fora do seu habitat natural tornou-se invasora visto que não encontra no ecossistema predadores, como é o caso da capivara na Bacia Amazónica, que limitam e equilibram a sua população.
Os jacintos-de-água sendo uma planta flutuante desloca-se facilmente com o vento e com as correntes da água, formando densos tapetes que cobrem completamente a superfície da água, pela massa compacta de folhagem, e conduzem facilmente à alteração dos biótopos e ao desequilíbrio do ecossistema aquático, com consequências nefastas para a fauna e flora, em particular devido à redução de oxigénio e à impossibilidade de entrada da luz solar.
A sombra provocada pelo jacinto-de-água ao diminuir a luz disponível, reduz a fotossíntese inibindo o crescimento do fitoplâncton, o que, por sua vez, reduz a densidade populacional do zooplâncton, e o desenvolvimento de outras plantas, afetando a cadeia alimentar. Para além da redução de alimento, a redução da oxigenação pode colocar em causa a sobrevivência dos organismos aquáticos, nomeadamente dos peixes. A depleção de oxigénio pode ser agravada pela decomposição das plantas, quando estas morrem.
Ao nível da flora esta espécie interage com a vegetação nativa e pode reduzir significativamente a densidade populacional de espécies endógenas através da sombra e da competição por recursos essenciais. Por exemplo, no Baixo Mondego, da zona do Poço da Cal (Montemor-o-Velho) o jacinto-de- água está a comprometer os últimos exemplares de nenúfar-amarelo (nuphar luteum) identificados em toda a bacia hidrográfica do Mondego.
As repercussões do jacinto-de-água vão também para além dos custos ambientais e do desequilibro dos ecossistemas. A proliferação desta espécie causa danos a nível económico, social, cultural e de saúde pública. Os densos tapetes de jacintos-de-água podem comprometer a navegabilidade de pequenas embarcações, a pesca, a realização de atividades lúdicas e desportivas como a canoagem, a natação, a pesca desportiva, a prática balnear, entupimento de canais de rega, tubagens, bombas de extração de águas, a captação de água para consumo, a irrigação dos campos agrícolas, entre outros.
Esta espécie tem se alastrado por vários cursos de água nacionais, de norte a sul, em particular no rio Cávado, Ave, Douro, Vouga, Mondego, Pateira de Fermentelos, Barrinha de Mira, Tejo e os seus afluentes, sobretudo o Soraia, Guadiana, entre outros. Para além do excesso de nutrientes nestes rios e lagoas, em resultado da poluição, as temperaturas elevadas e a seca que têm assolado o nosso país, em consequência das alterações climáticas, e, por conseguinte, reduzindo consideravelmente os caudais, propiciam condições ecológicas para a proliferação desta espécie invasora.
A proliferação do jacinto-de-água está a constituir-se como uma ameaça ambiental grave para os cursos de água do país, exigindo-se medidas efetivas de controlo mesmo que as intervenções sejam difíceis e onerosas pois as operações de remoção desta espécie são sobretudo mecânicas ou mesmo manuais.
Perante esta gravidade ambiental algumas entidades e municípios têm tomado medidas no sentido do seu controlo e remoção como é o caso do município de Águeda e da Empresa de Desenvolvimento e Infraestruturas do Alqueva (EDIA). Contudo, embora importantes são ações circunscritas a um determinado território quando se exigiria uma ação consertada a nível nacional.
Na Pateira de Fermentelos, há vários anos que a autarquia de Águeda adquiriu uma ceifeira-aquática, que embora eficaz, a quantidade de sementes que germinam, uma vez que a planta não foi definitivamente eliminada, tornam, porém a “luta” inglória, afetando não só esta lagoa como também se propagam para jusante empurrados pelo vento e com as correntes da água afetando igualmente a ria de Aveiro.
A Pateira de Fermentelos uma das maiores lagoas naturais da Península Ibérica podendo atingir mais de 5 km2 estende-se pelos concelhos Águeda, Oliveira do Bairro e de Aveiro, ou seja, integra a bacia hidrográfica do Rio Vouga (Baixo Vouga).
Esta lagoa, reveste-se de grande importância para as populações locais a nível socioeconómico, paisagístico, cultural e turístico, mas também em termos ecológicos, botânicos, zoológicos e hidrológicos, sendo desde 2012 reconhecida como Zona Húmida de Importância Internacional pelo Comissariado Internacional da Convenção de Ramsar.
No caso do Guadiana os jacintos-de-água, que terão proliferado a partir de Espanha, tornaram-se também uma autêntica praga na barragem do Alqueva e respetivos cursos de água afluentes. A entidade gestora da Albufeira (EDIA) tem vindo a tomar medidas de resolução, nomeadamente através da colocação de barreiras, ações de vigilância e remoção manual e da aquisição de uma embarcação anfíbia. Esta máquina designada capivara, nome que advêm do predador natural desta espécie, movimenta-se na água e em terra, que permite a recolha e o corte desta espécie atuando, sobretudo nas margens.
A maquinaria adequada à remoção do jacinto-de-água, como é o caso da ceifeira adquirida pelo município de Águeda é escassa, sendo muitas vezes emprestada a outras entidades. Embora seja positiva a cooperação e a entreajuda a cedência pode comprometer atempadamente a remoção desta espécie.
Há investigadores especializados em plantas invasoras que consideram fundamental que após a utilização da maquinaria, em particular antes dos empréstimos, que esta seja limpa e desinfetada de modo a evitar a proliferação noutras áreas até porque o jacinto-de-água reproduz-se a partir de pequenos fragmentos.
O novo Decreto-Lei n.º 92/2019 de 10 de julho, que assegura a execução, no ordenamento jurídica nacional, do Regulamento (UE) n.º 1143/2014, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 22 de outubro de 2014, veio entre outros estabelecer a responsabilidade do ICNF, pelo desenvolvimento, manutenção e funcionamento de um sistema de vigilância para a recolha e o registo de informações sobre a ocorrência de espécies invasoras, com o intuito de evitar a sua propagação.
Este sistema de vigilância passa por pela implementação de um sistema de informação geográfica, acessível e aberto ao público através de plataforma eletrónica, dos focos potenciais de invasões biológicas, bem como pela gestão e coordenação da informação disponibilizada pelo público e organizações interessadas e difundir essa informação entre os pontos focais da rede de alerta a criar de acordo com o respetivo decreto-lei.
O artigo 28º do Decreto-Lei n.º 92/2019 (planos de controlo, contenção ou erradicação), refere que as espécies constantes na Lista Nacional de Espécies Invasoras com ocorrência verificada no território nacional, como é o caso do jacinto-de-água, devem ser objeto de planos de ação nacionais ou locais com vista ao seu controlo, contenção ou erradicação. Refere também que, no caso dos planos nacionais, estes são promovidos pelas entidades competentes em razão da matéria, em articulação com o ICNF, I. P., e aprovados pelo governo.
Estes planos de ação, de acordo com o n.º 5 do respetivo artigo, definem prioridades de atuação de acordo com a gravidade da ameaça e o grau de dificuldade previsto para a erradicação, contenção ou controlo das espécies em causa e devem incluir medidas proporcionais ao impacto ambiental causado e adequadas às circunstâncias específicas de cada território e espécie, com base numa análise de custos e benefícios, compreendendo tanto quanto possível, a recuperação dos ecossistemas degradados, danificados ou destruídos e a prevenção de novas introduções.
Assim e considerando que:
A proliferação de jacintos-de-água está a reduzir a biodiversidade endógena e a comprometer o equilibro do ecossistema, igualmente com grandes repercussões a nível económico, social e cultural;
A própria legislação já prevê a elaboração de planos de ação de espécies constantes na Lista Nacional de Espécies Invasoras;
As alterações climáticas podem acentuar a proliferação do jacinto-de-água, devido às altas temperaturas e baixos caudais associados ao excesso de nutrientes das águas;
A melhor época para a remoção do jacinto-de-água, que começa a crescer a partir dos fragmentos que sobreviveram ao inverno, é o início da Primavera pelo facto do número de indivíduos serem ainda reduzidos.
O Partido Ecologista Os Verdes considera absolutamente imprescindível recomendar ao governo com carácter célere e prioritário a elaboração de um plano de ação para o controlo do jacinto-de-água e a respetiva recuperação dos ecossistemas afetados, onde esteja entre outros identificadas as áreas prioritárias e contemplados apoios às autarquias locais, designadamente para a aquisição de maquinaria adequada à remoção desta espécie.
Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, os deputados do Partido Ecologista Os Verdes, apresentam o seguinte Projeto de Resolução:A Assembleia da República recomenda ao Governo que:
1 - Elabore um plano de ação, de âmbito nacional, para controlo e monitorização do jacinto-de-água;
2 - Identifique urgentemente zonas prioritárias, em particular onde o jacinto-de-água, esteja a comprometer gravemente o equilíbrio do ecossistema e a presença de espécies raras;
3 - Realize e promova, com carácter de urgência, ações para a remoção do jacinto-de-água e para a recuperação dos ecossistemas afetados;
4 - Envolva as Câmara Municipais e as Juntas de Freguesia no processo de monitorização desta invasora aquática criando uma rede cooperação e partilha de conhecimento;
5 - Disponibilize às autarquias os meios necessários para o combate à proliferação do jacinto-de-água, nomeadamente através de apoios à aquisição de maquinaria adequada;
6 - Crie um manual de boas práticas para disponibilizar às diversas entidades envolvidas no controlo desta espécie invasora;
7 - Estabeleça regras para a limpeza e desinfestação da maquinaria, de forma evitar a propagação de fragmentos de jacintos-de-água.
8 - Assegure que as operações de remoção do jacinto-de-água, especialmente realizadas através de maquinaria, sejam acompanhadas por técnicos especializados deforma a salvaguardar a biodiversidade nativa e espécies raras.
Acompanhe aqui a evolução deste Projeto de Resolução.