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02/02/2021
PROJETO DE RESOLUÇÃO Nº 907/XIV/2.ª - Pela Valorização da Investigação Científica e pelo Fim da Precariedade Laboral que atinge os Bolseiros de Investigação
Entre 2009 e 2018, de acordo com dados estatísticos da Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT), o investimento em Investigação & Desenvolvimento (I&D) com origem em fundos do setor do Estado conheceu um recuo de cerca de 10%. No que respeita o indicador de “intensidade em I&D” Portugal está, de acordo com dados do Eurostat, entre os seis países da UE onde se registou uma diminuição na atribuição de verbas públicas nesta área na última década.

Em 2019 Portugal investiu em Ciência 1,41% do PIB, enquanto que a média europeia se situa em 2,19%. Há 10 anos a “intensidade em I&D” em Portugal era de 1,58% do Produto Interno Bruto (PIB).

Em 2020, num ano particularmente exigente pelos condicionalismos criados pelas medidas de contenção da Covid-19, os investigadores portugueses das mais diversas áreas assumiram um papel determinante na abordagem à pandemia, quer ao nível da compreensão do vírus quer na adaptação e instrumentalização dos cuidados a desenvolver ao nível hospitalar. O reconhecimento dos investigadores portugueses e das unidades de investigação tem provado, dentro e fora do contexto da pandemia, os mais elevados níveis de excelência, com equipas reconhecidas a nível internacional incluindo a colaboração com equipas prémio Nobel. Um reconhecimento fruto da rigorosa formação, do empenho e inter-relação da comunidade científica ao nível global.

Sucede porém que muitos investigadores portugueses, ou formados em Portugal, confrontados com grandes níveis de incerteza face à sua estabilidade profissional, decidam otimizar os seus conhecimentos, ideias inovadoras e de vanguarda noutro país onde existam garantias de continuidade da atividade científica e dos projetos desenvolvidos, pelo que assistimos cada vez mais a uma fuga de “cérebros”, de conhecimento formado e aprimorado em Portugal e que teria potencial para contribuir para a competitividade do Sistema Científico e Tecnológico Nacional (SCTN) .

E se por um lado, a FCT tem garantido taxas de aprovação na ordem dos 40% nos concursos de bolsas individuais de doutoramento, apostando, portanto, na formação avançada, por outro lado ao nível do financiamento de projetos I&D as taxas de reprovação rondam os 95%.

Tal significa que no último concurso de financiamento para apoio de projetos de Investigação Científica & Desenvolvimento Tecnológico (IC&DT), dos 5847 projetos de candidatura de investigação científica submetidos à avaliação e financiamento pela FCT, apenas 312 candidaturas foram financiadas, representando uma taxa de aprovação de 5,3%. Entre estas candidaturas, estão equipas que captaram investimento, formaram doutorados, produziram conhecimento e artigos científicos, mas que agora ficaram sem financiamento.

Também no Concurso Estímulo ao Emprego Científico Individual (CEEC) - 3.ª Edição da FCT as taxas de aprovação ficam muito aquém das necessidades do mercado de trabalho e das expectativas criadas ao nível laboral para os investigadores doutorados a quem o Estado proporciona formação avançada. Em 2020, das 3648 candidaturas validadas apenas 300 foram alvo de financiamento, representando uma taxa de aprovação do emprego científico de 8,2%.

Na prática, Portugal tem apostado na formação avançada de doutorados, pese embora a distância que separa a realidade nacional da média europeia (Portugal tem em média 5 doutorados em cada 1000 habitantes, sendo a média da OCDE de 9,9). No entanto, o subfinanciamento da Ciência e do Ensino Superior tem conduzido à frequente emigração forçada dos investigadores doutorados, cujo trabalho em Portugal está excessivamente dependente de financiamento da FCT ou de programas-quadro pouco regulares e imprevisíveis, tanto mais que a oportunidade de integração na carreira de investigação é mínima.

A precariedade laboral que atinge os bolseiros de investigação científica é perpetuada pelo atual modelo de financiamento da Ciência e da Investigação. A ausência de investimento e oportunidade de integração na carreira científica, a desproteção social dos bolseiros face aos colegas com contratos de trabalho que integram empresas e unidades de investigação, o desperdício de recursos humanos, tempo e dinheiro investido na preparação de candidaturas solidamente alicerçadas em trabalho já desenvolvido ou que urge desenvolver, a descontinuidade ao nível das linhas de investigação e da organização das equipas de investigadores, todos estes são fatores de desvalorização da Ciência que importa reverter em abono da qualidade da atividade científica desenvolvida em Portugal.

Os Verdes entendem que os apoios da FCT que hoje sustentam uma parte significativa, mas demasiadamente escassa, do emprego científico e dos projetos I&D têm de ser convertidos em contratos de trabalho, em trabalho com direitos, em investimento sólido e de continuidade, tanto mais que foram já feitos investimentos pela FCT na formação avançada de doutorados, constituindo profissionais pioneiros nas suas áreas e criativos altamente qualificados que o Estado deve procurar impulsionar e manter no SCTN.

Além do mais a sujeição a avaliação para efeitos de financiamento pela FCT, a um painel de jurados internacionais, expõe um conjunto de ideias inovadoras que correm o risco de “fuga” e desenvolvimento fora do país.

Porém, face à ausência de um modelo de financiamento capaz de promover a contratação e integração efetiva e o trabalho com direitos para os investigadores doutorados, e assumindo que os apoios da FCT para Projetos I&D e os apoios para o Emprego Científico não constituem garante de qualidade e continuidade da atividade científica desenvolvida em Portugal, Os Verdes reconhecem o valor para a comunidade científica da atribuição de financiamento pela FCT para apoiar projetos I&D, pelo que o PEV considera que não é aceitável que a FCT mantenha taxas de aprovação irrisórias, quando a mesma fundação promove a excelência dos investigadores doutorados.

Os Verdes apelam a que o Governo intervenha no sentido de exigir a maior transparência e a uniformização dos critérios de avaliação das candidaturas, bem como uma maior celeridade na atribuição das verbas de financiamento.

Os Verdes, através deste Projeto de Resolução, exortam o Governo a estabelecer metas concretas que se traduzam numa expressiva integração dos investigadores em carreiras de investigação.

Ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, a Assembleia da República recomenda ao Governo:

1. O Estabelecimento de metas concretas para os próximos dois anos, em diálogo com associações representativas dos investigadores doutorados e bolseiros de investigação científica, com o objetivo de aumentar a integração de investigadores doutorados em carreiras de investigação, substituindo gradual e objetivamente os CEEC em contratos de trabalho.

2. A definição da regularidade na atribuição de verbas com origem no financiamento público para a FCT, a médio e longo prazo.

3. A regularização dos vínculos precários dos investigadores no Ensino Superior e na Ciência ao abrigo do PREVPAP, dando cumprimento à Resolução do Conselho de Ministros nº 52/2020, publicada a 1 de julho e ao Despacho n.º 9023/2020 de 21 de setembro.

4. A transparência e uniformização dos critérios de avaliação e aumento das taxas de aprovação do financiamento dos CEEC.

5. A Transparência e uniformização dos critérios de avaliação e aumento das taxas de aprovação dos projetos de I&D.

6. A definição de critérios para garantir celeridade na atribuição de bolsas de doutoramento e das verbas de financiamento dos CEEC e projetos I&D.

7. A elaboração de Relatórios Anuais pela FCT relativos à atribuição de bolsas e financiamentos dos CEEC e projetos I&D, contribuindo para uma maior transparência dos processos de apoio através de financiamento público.

Assembleia da República, Palácio de S. Bento, 2 de fevereiro de 2021.

Os Deputados
Mariana Silva
José Luís Ferreira

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