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Intervenções na AR (escritas)
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29/04/2020
Sessão Solene do 25 de Abril – DAR-I-048/1ª

Sr. Presidente da República, Sr. Presidente da Assembleia da República, Sr. Primeiro-Ministro e demais Membros do Governo, Sr. Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, Sr.as e Srs. Deputados, Valorosos Capitães de Abril, Sr.as e Srs. Convidados:

Aqui estamos hoje para falar de Abril, porque hoje é dia de falar de Abril. É dia de evocar essa madrugada, tudo o que nos trouxe, tudo o que semeou e tudo o que nos permitiu sonhar. É dia de evocar essa madrugada e tudo o que nos trouxe, tudo o que semeou, tudo o que nos permitiu sonhar.

E, mesmo em tempos como os que vivemos, aqui estamos.

Aqui estamos, porque hoje também é dia de não deixar desvanecer a importância que a liberdade e a democracia representam para nós, enquanto povo e enquanto País.

Aqui estamos, como estivemos para decidir medidas de combate à crise.

Aqui estamos, como estivemos para discutir o estado de emergência e os seus prolongamentos.

Aqui estamos, como iremos estar nas próximas semanas para discutir novas medidas de combate a esta ameaça coletiva que sobre nós paira.

E aqui estamos, respeitando escrupulosamente todas as regras de saúde pública e sem retirar elevação ao que se pretende assinalar hoje na Assembleia da República.

Aqui estamos para falar da Revolução dos Cravos. Dessa madrugada que semeou esperança, que devolveu dignidade a um povo vigiado, perseguido e silenciado, que convocou a liberdade e a democracia para o nosso destino coletivo e que nos trouxe a paz e nos ensinou a valorizar as preocupações com a justiça social, com o combate à pobreza e com a necessidade de preservar os recursos ambientais.

Para trás, ficaram a ditadura, a PIDE (Polícia Internacional e de Defesa do Estado), a censura, a perseguição, a tortura e a guerra colonial.

Para trás, ficaram um País a preto e branco e um povo obrigado ao cinzentismo de ideias com travo a mofo; um País onde a mortalidade infantil imperava e o analfabetismo reinava, porque a saúde e o ensino eram luxos de rico.

Para trás, ficaram um povo triste e um País sombrio.

É por isto e por muito mais que importa dizer: «Fascismo nunca mais!»

Mas falar da Revolução dos Cravos é falar da coragem dos Capitães de Abril, que, nessa madrugada, saíram dos quartéis para sacudir aquele «presente» e arquivar o tal passado, para nos darem outro futuro e outro caminho.

É falar da resistência e da coragem de tantos homens e mulheres que lutaram por um País onde a riqueza produzida fosse por todos distribuída e os recursos naturais por todos sustentavelmente partilhados.

Não posso, por isso, deixar de saudar, em nome do Partido Ecologista «Os Verdes», os Capitães de Abril e os homens e mulheres que lutaram por um País livre. Uns e outros fizeram História, não só porque foram capazes de dar corpo ao sentir de um povo inteiro, mas também por tudo quanto Abril nos trouxe. E trouxe muito!

Desde logo, o Serviço Nacional de Saúde (SNS), que representou um enorme passo em termos de civilização, mas também uma porta que se abriu para os portugueses no acesso aos cuidados de saúde. Com o SNS, conseguimos melhorar os indicadores de saúde em Portugal, melhorar a saúde e a qualidade de vida dos portugueses. Foi o SNS que permitiu que a taxa de mortalidade infantil passasse para valores abaixo da média europeia.

Desde a sua criação, a estrutura do SNS tem-se mantido, apesar de ter sido fortemente fragilizada pelos Governos do PSD de Cavaco Silva e pela Lei de Bases de 1993, que veio abrir o mercado da saúde aos privados, e de ter sido enfraquecida ainda pelos cortes do Governo de Passos Coelho e Paulo Portas e por um subfinanciamento de décadas de Governos do PS, do PSD e do CDS.

Ainda assim, aí o temos, a servir de escudo a esta pandemia, a assumir um papel absolutamente decisivo e insubstituível neste combate. E, sem grande esforço, podemos fazer uma ideia de como seria lidar com o novo coronavírus se não tivéssemos o nosso SNS.

É por isso que nunca é demais sublinhar a importância do Serviço Nacional de Saúde e dos seus profissionais e alertar para a necessidade do seu reforço e da valorização dos homens e das mulheres que, corajosamente, continuam na linha da frente deste combate e que merecem todo o nosso reconhecimento.

Nesta circunstância, queria endereçar também, em nome do Partido Ecologista «Os Verdes», as mais sentidas condolências às famílias das vítimas que não resistiram ao novo coronavírus e uma palavra ainda a todas as pessoas que continuam a trabalhar para garantir que, apesar de tudo, o essencial não falta e o País não para de todo.

É justo registar também a forma como os portugueses estão a encarar o problema, o que tem representado um pilar fundamental para construir a resposta, que tem de ser coletiva. Tem de ser coletiva, mas já percebemos que a solidariedade europeia é apenas conversa fiada.

Na verdade, a postura da dita «União» acaba por traduzir a dimensão da natureza solidária da União Europeia e o significado da União: é o «salve-se quem puder» no reino do «vale tudo». E, apesar do foguetório do Eurogrupo, nem há solidariedade nem fundos adicionais.

Ainda assim, que maio represente o início de uma caminhada de regresso à normalidade, uma caminhada que se adivinha longa e que o bom senso recomenda que seja progressiva e cautelosa.

Enquanto ecologistas, o que esperamos é que «depois do adeus», isto é, depois de se achatar a curva desta pandemia, nos viremos para outros achatamentos e para outras curvas.

Porque é preciso achatar a curva das desigualdades, sobretudo a pensar nos milhares de trabalhadores que ficaram sem trabalho e nos que viram os seus rendimentos substancialmente reduzidos com esta crise.

É necessário achatar a curva da distribuição da riqueza produzida, dos salários, da injustiça fiscal e da imoralidade dos paraísos fiscais.

É preciso achatar a curva da ausência do interesse público em decisões como as respeitantes à localização de aeroportos.

É imperioso achatar a curva do tratamento entre os bancos e os contribuintes. Hoje, pedimos aos bancos o favor de serem sensatos e recordamos que receberam milhões de euros dos portugueses, mas, ontem, ninguém nos pediu sensatez. O dinheiro saiu dos nossos salários e das pensões diretamente para os bancos e ninguém nos lembrou de qualquer exemplo de ajuda dos bancos, até porque ela nunca existiu.

É também necessário achatar a curva dos desequilíbrios ambientais.

É imperioso achatar a curva da crise climática e da perda de biodiversidade ou do uso insustentável dos recursos naturais.

Impõe-se um regresso à razão e uma aproximação aos valores de Abril.

Termino com um «até já», porque, às 15 horas, das janelas e das varandas de cada um, vamos cantar a Grândola, em defesa do ambiente, em defesa da saúde, mas também para lembrar que o 25 de Abril não está de quarentena.

Viva o 25 de Abril!

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