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Intervenções na Ar (Escritas)
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14/05/2015
Alteração do Código Cooperativo
Intervenção do Deputado José Luís Ferreira
Alteração do Código Cooperativo
- Assembleia da República, 14 de Maio de 2015 –

1ª Intervenção
Sr.ª Presidente, Sr. Deputado José Manuel Canavarro, não temos qualquer dúvida sobre a importância que o setor cooperativo e social desempenha nos nossos dias, mas também não temos qualquer dúvida sobre a necessidade de o Governo respeitar a Constituição, que estabelece expressamente a obrigação do Estado na promoção e no fomento cooperativo, que, como sabemos, nem este Governo, nem os anteriores, o têm feito, quer no que diz respeito à promoção, quer no que diz respeito ao fomento cooperativo. Aliás, podemos até dizer «bem pelo contrário».
O PSD e o CDS apresentam-nos uma proposta sobre a revisão do Código Cooperativo, mas, Sr. Deputado, esta proposta acaba por se resumir ao ressuscitar das propostas que o PSD apresentou há 20 anos e que foram rejeitadas por motivos de ordem constitucional.
Portanto, uma parte substancial das propostas que o PSD hoje apresenta foi rejeitada por violar a Constituição, a lei fundamental do País, e, como tal, parece-nos que há um esforço de insistência, em jeito de atirar o barro à parede para ver se cola.
Pretende-se, de novo, fragilizar o princípio da gestão democrática das cooperativas e consagrar a existência de membros investidores. É exatamente sobre esta matéria que a minha a pergunta incide.
Sr. Deputado, como é possível assegurar o cumprimento do princípio da gestão democrática pelos membros, nomeadamente o princípio que estabelece que os membros têm iguais direitos de voto, ou seja, um membro, um voto, como estabelece a iniciativa no artigo 3.º, com a consagração do voto plural, previsto no artigo 41.º?
Se o PSD e o CDS, na verdade, pretendem afirmar o princípio da gestão democrática das cooperativas, se pretendem mesmo assegurar que os membros tenham iguais direitos de voto, se pretendem realmente assegurar o princípio de um membro, um voto, a pergunta tem de ser feita: o que é que faz o artigo 41.º na vossa iniciativa?
Sr. Deputado José Manuel Canavarro, não podemos querer uma coisa e, ao mesmo tempo, o seu contrário. Não faz sentido! É por isso que gostaria que o Sr. Deputado nos explicasse como é que se faz esta compatibilização do artigo 41.º com o princípio consagrado no artigo 3.º.


2ª Intervenção
Sr. Presidente, apesar da boa vontade expressa nas intervenções do PSD e do CDS, de facto, temos muitas razões para duvidar das motivações dos autores desta iniciativa. Vou dizer porquê.
Na anterior Legislatura, o PSD apresentou um projeto de revisão da Constituição no qual propunha a revogação de normas constitucionais importantes nesta matéria. O projeto de revisão constitucional do PSD propunha a revogação, por exemplo, do artigo 82.º, cujo n.º 4 se refere ao setor cooperativo e social, e propunha também a eliminação do n.º 3 do artigo 85.º, que diz respeito ao apoio do Estado ao setor cooperativo. Portanto, quem propõe remover a relevância constitucional do setor cooperativo não está, certamente, muito preocupado com o setor cooperativo.
Quem retira apoios ao setor cooperativo, colocando-o em pé de igualdade com as empresas sem ter em conta as suas especificidades, não pode, certamente, estar muito preocupado com o setor cooperativo.
Quem desenha condições de acesso, como rácios de autonomia financeira, de rentabilidade, e outros, no acesso a fundos comunitários, que são absolutamente desadequados à realidade cooperativa, não pode estar muito preocupado com o setor cooperativo.
Quem, como o PSD e o CDS, no Governo Durão Barroso, permitiu a abertura desregulada das superfícies comerciais, provocando o encerramento de muitas lojas de comércio tradicional e de proximidade, onde se encaixam as cooperativas, não pode estar preocupado com o setor cooperativo.
Portanto, as preocupações do PSD e do CDS, neste projeto de lei, merecem-nos as maiores reservas relativamente às suas motivações e objetivos. E os elementos que mais nos afastam desta proposta são, precisamente, a consagração da possibilidade do voto plural e dos membros investidores.
Sobre o voto plural parece-nos que, de facto, se pretendemos assegurar a gestão democrática, deve manter-se, com natureza imperativa, o princípio de um membro, um voto, e se as cooperativas são organizações de pessoas e não de capitais não pode ser a posse desses capitais a determinar as decisões das cooperativas.
As cooperativas são formadas por pessoas que pretendem cooperar entre si, querem trabalhar em conjunto, querem cooperar, e, por isso, constituem uma cooperativa. Se assim não fosse, constituiriam uma qualquer outra pessoa coletiva, que não uma cooperativa.
Quanto à possibilidade de membros investidores, o que nos parece é que se pretende descaraterizar a própria natureza das cooperativas. Na verdade, os membros investidores acabam por ser sujeitos que não vão participar na atividade da cooperativa, ou seja, os membros investidores não vão cooperar, vão, apenas e tão só, investir.
Para concluir, queremos dizer que esta proposta, com a introdução do voto plural e com a possibilidade dos membros investidores, choca com os próprios alicerces da organização e com os fundamentos da sua existência, mas também com os valores e princípios cooperativos e, em consequência, acaba também por chocar com os princípios da nossa Constituição, que acolheu esses mesmos valores. Portanto, se o PSD e o CDS querem mesmo o consenso, terão de abandonar, pelo menos, a ideia do voto plural e da existência de membros investidores.
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