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Intervenções na Ar (Escritas)
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15/04/2015
Apresentação de iniciativas do PEV de promoção da natalidade e discussão de outros projetos sobre a mesma matéria
Intervenção da Deputada Heloísa Apolónia
Apresentação de iniciativas do PEV de promoção da natalidade e discussão de outros projetos sobre a mesma matéria
- Assembleia da República, 15 de Abril de 2015 –

1ª Intervenção (pedido de esclarecimento)
Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Luís Montenegro, talvez devesse começar por agradecer o desejo de bom trabalho que dirigiu a todos os Deputados mas, se me permite, vou devolver com o desejo de bom senso no debate que vamos travar daqui para a frente, relativamente a esta matéria.
Para perceber desse bom senso, Sr. Deputado, gostava de lhe fazer uma pergunta que considero crucial. Gostava de perceber se, na opinião do Sr. Deputado, as condições económicas das famílias têm ou não a ver com a realidade da natalidade.
O Sr. Deputado encolhe os ombros e talvez a resposta que queira dar seja: «olha que coisa mais óbvia!» Muito bem! Estamos de acordo.
O Sr. Deputado diz que «é tal e qual». Então, quero dizer o seguinte: os senhores têm passado, de facto — temos de o reconhecer! —, a Legislatura toda a falar de natalidade, mas também têm passado a Legislatura toda a retirar condições económicas às famílias. Qual é a coerência deste discurso e desta prática, Sr. Deputado?! É isto que vai ter de explicar.
Agora, o Sr. Deputado, no à parte que fez, confirmou que o Governo, durante toda a Legislatura, tem andado a dar machadadas atrás de machadadas relativamente ao desígnio — foi assim que caracterizou — da natalidade, e isto merece, naturalmente, uma explicação política, Sr. Deputado.
Depois, há outras questões relativamente às vossas propostas que merecem, talvez, alguma explicação.
Os senhores não olham para a questão do horário de trabalho, não olham para a necessidade de adequação do horário de trabalho ao acompanhamento familiar. Não, vão para o horário das creches. As crianças ficam mais tempo nas creches e os pais pagam mais. É essa a solução que trazem ao País. Mas esta é uma questão que temos de discutir, naturalmente. Estou aqui a fazer uma primeira apreciação e a pedir-lhe uma reação.
Depois, os Srs. Deputados do PSD não pensam na dignificação dos salários, pensam em cortar salários — meio tempo, menos salário! E as condições económicas das famílias, Sr. Deputado?!
Julgo que é também em torno desta questão que temos de discutir seriamente e promover o nosso trabalho.

2ª Intervenção (apresentação de iniciativas)
Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados e, se me permitem, gostaria de me dirigir em particular ao Sr. Deputado Luís Montenegro: O debate que hoje aqui estamos a ter não é uma coisa à parte dos debates quinzenais e de outros debates que vamos fazer. É que o que é importante é para integrar não só no debate quinzenal mas também neste.
Creio que o Sr. Deputado estava mesmo com o desejo pleno de que aqui não se falasse nas condições económicas, porque, sobre condições económicas, os senhores têm muitas contas a prestar quanto ao desígnio da natalidade, e isso deve ser aqui debatido, Sr. Deputado.
Por outro lado, os senhores desregularam até mais não o horário de trabalho e, depois dessa desregulação, desse alargamento absurdo do horário de trabalho, querem compensar com os horários das creches. Devemos pensar se, de facto, esse é o caminho correto e é todo esse debate que aqui temos de fazer. E os senhores, por mais que não queiram, Sr. Deputado Luís Montenegro, também têm de ouvir e debater.
Sr.as e Srs. Deputados, Os Verdes consideram que há um ponto de partida importante para este debate:  se atendermos ao número médio de filhos por mulher, concluímos facilmente que o índice de fecundidade real é significativamente inferior ao índice de fecundidade desejada.
Daqui retira-se facilmente uma conclusão: há muitas famílias que não têm filhos não porque não queiram mas porque entendem que não podem, que não têm condições para o efeito.
Ora, aquilo a que se tem vindo a assistir, e todos nós o verificamos, é que também os jovens, hoje, ganham autonomia cada vez mais tarde porque não têm condições para se sustentar autonomamente e, naturalmente, para constituir uma família com segurança, com todo o projeto que pode resultar da constituição de uma família.
Mais dados: o INE garante-nos que o risco de pobreza é mais significativo nas famílias com filhos, e muitos outros dados vão aqui ser, naturalmente, revelados neste debate, mas tudo isto nos obriga a ligar a taxa de natalidade — cá está! — às condições de subsistência e à política de rendimentos.
Ora, como o Governo não tem feito outra coisa que não seja retirar rendimentos às famílias, conclui-se que tem promovido uma política antinatalidade. Julgo que isto também tem de ficar extraordinariamente claro.
Sr.as e Srs. Deputados: Este não é o primeiro debate que, nesta Legislatura, se faz sobre natalidade. No ano passado, em 18 de junho, Os Verdes trouxeram ao Plenário da Assembleia da República um debate sobre a natalidade, com um projeto que estabelecia os princípios orientadores de uma política de incentivo à natalidade.
Através deste projeto, propúnhamos garantir segurança e adequação dos horários de trabalho; propúnhamos garantir salários dignos e combater a precariedade; propúnhamos criar condições para diminuir a emigração, e nós sabemos, Sr.as e Srs. Deputados, que muitos jovens vão constituir família lá fora, porque saem do País; propúnhamos a proibição determinante do despedimento de mulheres grávidas, em todas as circunstâncias; propúnhamos a criação de uma rede pública gratuita de creches; propúnhamos a reposição do abono de família, entre tantas outras medidas extraordinariamente importantes para incentivar a natalidade.
O PSD e o CDS chumbaram este projeto que Os Verdes trouxeram à Assembleia da República e, na nossa perspetiva, esse chumbo significa que não querem ir ao centro da questão. E eu acho que isso também já ficou, hoje, aqui patente: não querem ir às questões centrais! E o debate perde, desta forma.
Sr.as e Srs. Deputados: Para este debate sobre a natalidade, Os Verdes entenderam não trazer o projeto apresentaram no ano passado e que foi chumbado, mas concretizar algumas medidas nele estabelecidas, ou algumas das recomendações que aí eram feitas. Então, decidimos criar três projetos de lei, centrados em três áreas: educação, saúde e transportes.
Propomos, assim, através de um projeto de lei, a desmaterialização dos manuais escolares, para garantir a sua gratuitidade. Como sabemos, as famílias portuguesas que têm filhos na escola têm brutais gastos com os manuais escolares — têm um peso muito significativo os gastos dos manuais escolares.
Sr.as e Srs. Deputados: É tempo de pensar que os orçamentos familiares podem ser ajudados com a gratuitidade efetiva dos manuais escolares e a desmaterialização dos mesmos pode levar-nos a esse objetivo, assim queiramos todos trabalhar nesse sentido.
Outro contributo para a questão da ajuda aos orçamentos familiares é o projeto de lei que Os Verdes aqui trazem relativo à matéria dos transportes, ou seja, a reposição do passe escolar.
O facto de se terem retirado os descontos nos passes escolares aos estudantes veio sobrecarregar mais os orçamentos familiares e fazer essa reposição de descontos para todos os estudantes é determinante para todas as famílias portuguesas.
O outro projeto de lei que Os Verdes aqui trazem prende-se com o setor da saúde e determina que a cada criança que nasça seja atribuído um médico de família. É que, Sr.as e Srs. Deputados, é preciso garantir segurança no acompanhamento das crianças na área da saúde e sabemos como muitas vezes é difícil esse acompanhamento, não apenas por questões económicas mas também pela disponibilização dos próprios serviços de saúde.
São estas, Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, as propostas que Os Verdes aqui trazem, como contributo para este debate.

3ª Intervenção (pedido de esclarecimento)
Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Teresa Caeiro, para quem não queria fazer deste debate uma guerrilha partidária… Acho que vou aconselhar a Sr.ª Deputada a olhar para o contributo que deu para o efeito!
 Mas a sua ação ficará com a Sr.ª Deputada, como bem disse.
Sr.ª Deputada, não sei se por guerrilha partidária entenderá, eventualmente, que alguém, neste debate, chame a atenção para as responsabilidades substanciais que o Governo tem sobre as políticas anti natalidade que foram desenvolvidas.
Sr.ª Deputada, os cortes salariais terão ou não influência nesta matéria? O aumento de impostos terá ou não influência nesta matéria? O desemprego altíssimo tem ou não influência nesta matéria? A precariedade tem ou não influência nesta matéria? O aumento do horário de trabalho, sim ou não, tem influência nesta matéria? Ou seja, a Sr.ª Deputada não considera que estas políticas implementadas pelo Governo criaram às famílias condições para uma maior insegurança no futuro? Portanto, têm diretamente a ver com as suas opções sobre a natalidade.
Por isso, quando analisamos os índices de fecundidade, é normal que nestas condições propiciadas pelo Governo o índice de fecundidade desejado seja inferior, muito inferior aos índices de fecundidade real. Mas não é por aqui, Sr.ª Deputada, não é por este caminho.
Gostava também que a Sr.ª Deputada me dissesse se considera ou não que é impossível arredar o debate sobre a natalidade do debate sobre as políticas familiares. Acho que a Sr.ª Deputada considera que não é possível arredar ou separar, porque não é mesmo possível!
Então, talvez seja importante neste debate que a Sr.ª Deputada, que é do CDS, relembre a todo o País o que é o visto familiar e que impacto teve essa vossa proposta.
É importante que falemos de tudo. E para que não entremos aqui em guerrilhas partidárias, vou fazer um apelo muito direto à Sr.ª Deputada: gostava que se pronunciasse sobre as propostas que Os Verdes trazem, hoje, aqui, a este debate e que já anunciei na minha intervenção, para também perceber qual é a sensibilidade da maioria sobre as mesmas.

4ª Intervenção (pedido de esclarecimento)
Sr. Presidente, retomando o que já tinha iniciado, Sr.ª Deputada Inês Teotónio Pereira, a propósito das questões que referiu, nós sabemos que a crise da natalidade não se deve única e exclusivamente aos últimos anos, mas, Sr.ª Deputada, temos de ser sérios e perceber que, tendo havido uma determinada estabilização pelo início deste século, o certo é que nos últimos anos se tem acentuado o problema.
Ora, diz o INE (Instituto Nacional de Estatística) que a partir de 2011 se tem assistido, no nosso País, a uma acentuada descida do número de nascimentos: em números redondos, de 101 300 em 2010, passou-se para 96 800 em 2011, 89 800 em 2012 e 83 500 em 2013. E acrescenta que a manter-se esta tendência — estima o INE — que a pouco mais do século XXI (por volta de 2060), a população portuguesa se situe aproximadamente nos 6 milhões de habitantes, podendo alcançar-se um rácio de 464 pessoas idosas por 100 pessoas jovens. Está aqui um absoluto problema, Sr.as e Srs. Deputados!
O que acho que é sério assumir é que as políticas que o Governo tem vindo a implementar ao longo do presente mandato têm acentuado o problema.
Sr.ª Deputada, certamente que há problemas estruturais e nós não podemos fechar os olhos àquela que é a realidade.
Sr.ª Deputada, um problema que se vai tornando absolutamente estrutural, foi-nos denunciado hoje mesmo ou ontem, se não estou em erro, por um casal de professores, com filhos. Ao que parece, é uma dor de cabeça. Porquê? Porque um dos progenitores está há não sei quantos anos colocado a mais de 100 km de distância. Portanto, a separação familiar, neste caso, é inevitável, o acompanhamento dos filhos é impossível. Estes são problemas estruturais para famílias que vivem anos a fio com este problema e que, naturalmente, não fazem outras opções de ter mais filhos porque, de facto, não dá, Sr.ª Deputada.
Depois, vimos aqui queixar-nos do problema da natalidade. Devemos queixar-nos, mas, simultaneamente, devemos olhar para outras políticas… Não é por estar a falar para o CDS-PP, mas, talvez, criar uma medida do tipo «visto da natalidade» — vejam lá se achariam bem!? — para perceber como as políticas setoriais podem ter repercussão naquilo que todos nós aqui estamos a dizer que deve ser o desígnio nacional.
Como diz o Sr. Deputado Jorge Machado não era para ser uma medida do tipo «visto familiar», era mesmo para cumprir.
Talvez na especialidade possamos falar sobre isto.
Gostava, ainda, de fazer uma observação ao PSD sobre a questão da meia jornada ou do trabalho a meio tempo — podemos dar-lhe todos os nomes para fingir que é uma ideia nova — com o paralelismo do salário reduzido. Sr.as e Srs. Deputados, não é uma coisa menor trabalhar a meio tempo com salário reduzido. A questão é que, no trabalho a meio tempo, é preciso resolver a situação das crianças durante o tempo em se está a trabalhar. Qual é a solução? Creche!
Pergunto às Sr.as e aos Srs. Deputados da maioria se vão também impor às creches que aceitem pagamentos a meio tempo! É porque nós temos de olhar as situações em função da realidade. Ou seja, os senhores propõem salários menores para pagamento de necessidades iguais. Há aqui um elemento que tem de entrar definitivamente no debate e que são as condições económicas das famílias. Não podemos fugir a isso.
O certo é que, Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, percebemos que, durante todo o debate, o PSD fugiu da discussão das formas de subsistência das famílias, das condições económicas das famílias, e o CDS, claro, «fugiu a sete pés» do «visto familiar».
No final deste debate e depois daquilo que aqui ouvi, dá-me a sensação de que há uma forte componente discursiva de preocupação em relação à matéria da natalidade, mas, por parte da maioria, não há uma preocupação que leve à tomada de medidas eficazes e que gere uma inversão da tendência para resolver o problema sério que constitui a baixa taxa de natalidade no País. Fiquei com esta nítida sensação. Não é só a remissão para a legislatura seguinte; é, de facto, uma falta de vontade de pegar no cerne da questão e atuar sobre ela.
Por isso, Sr.as e Srs. Deputados, no final deste debate, só tenho a lamentar esse facto. Mas, naturalmente, os Verdes aqui estarão para promover o debate na especialidade com a séria expetativa de que a maioria aprove também as propostas de Os Verdes para que possam passar a esse debate na especialidade.


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