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Intervenções na Ar (Escritas)
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03/06/2015
Apresentação do projeto de resolução n.º 1506/XII (4.ª) do PEV — Combater o desperdício alimentar para promover uma gestão eficiente dos alimentos
Intervenção da Deputada Heloísa Apolónia
Apresentação do projeto de resolução n.º 1506/XII (4.ª) do PEV — Combater o desperdício alimentar para promover uma gestão eficiente dos alimentos
- Assembleia da República, 3 de Junho de 2015 –

1ª Intervenção
Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Os Verdes trazem hoje a Plenário da Assembleia da República, como seu agendamento potestativo, uma matéria de grande relevância para a sustentabilidade: o combate ao desperdício alimentar.
Quando falamos de desperdício alimentar falamos de alimentos destinados ao consumo humano que acabaram por ser inutilizados em quantidade ou em qualidade. A questão é que esses alimentos, que foram inutilizados, foram efetivamente produzidos e com impactos muito significativos ao nível da utilização de recursos naturais, designadamente recursos marinhos, solos, água e energia.
Esses alimentos, que são inutilizados, arrastam, portanto, consigo o desperdício de relevantes recursos naturais. Isto para já não falar dos resíduos e das emissões de gases com efeito de estufa que deles resultaram. Ora, o que Os Verdes afirmam é que não estamos em condições de esbanjar assim recursos naturais, pelo que se torna um imperativo ambiental combater o desperdício alimentar.
É justamente esse o propósito do projeto de resolução que Os Verdes apresentam hoje à Assembleia da República. Primeiro, é preciso conhecer e ter consciência da dimensão do problema, bem como das suas causas, para que, depois, se possa atuar em conformidade e com eficácia.
Em Portugal, só existe um estudo realizado especificamente sobre a matéria do desperdício alimentar. Foi elaborado no âmbito do projeto PERDA (Projeto de Estudo e Reflexão sobre o Desperdício Alimentar) e consta da publicação Do campo ao garfo. Esse estudo conclui que são desperdiçados, anualmente, em Portugal, mais de 1 milhão de toneladas de alimentos e deixa também claro que as perdas alimentares se registam em todas as fases da cadeia de aprovisionamento: da produção, à transformação, ao embalamento, ao transporte, à distribuição ou ao ato de consumo. Verifica-se, entretanto, que as fases de produção e de consumo são aquelas onde se regista maior perda alimentar.
Mas há um registo relevante nesse estudo que merece ser tido em conta. É que o próprio reconhece a necessidade de se aprofundar conhecimento sobre a questão, reclamando, por isso, desenvolvimento de novos estudos que permitam conhecer melhor a dimensão do problema.
Entretanto, foi criado um guia, chamado Desperdício alimentar — Um compromisso de todos!, assinado entre o Governo e vários intervenientes do setor alimentar, que contém princípios importantes e interessantes, mas que não estão, na sua grande maioria, postos em prática.
Quando falamos de perdas alimentares, não podemos praticar uma política para a sua redução apenas com base em princípios que constam no papel e com atribuição de selos e prémios.
O que Os Verdes propõem com esta iniciativa legislativa que trazem hoje à Assembleia da República é levar o Parlamento a dar um impulso no combate ao desperdício alimentar em Portugal e a não ficar de fora deste desígnio nacional.
Assim, Sr.as e Srs. Deputados, propomos que, hoje, a Assembleia da República delibere declarar o ano de 2016 como o ano nacional do combate ao desperdício alimentar. Esta deliberação permitirá que, no próximo ano, se destaquem, se intensifiquem, se generalizem um conjunto de ações relativas a uma melhor gestão dos alimentos no nosso País.
Nesse sentido, Os Verdes adicionam já um conjunto de 15 propostas que não visam, nem de perto, nem de longe, esgotar tudo o que é possível fazer, mas que realçam pontos muito importantes de ação.
Recomendamos ao Governo que, no próximo ano, se envolva também num conjunto de iniciativas no âmbito do ano nacional do combate ao desperdício alimentar, declarado pela Assembleia da República.
Propomos que se promovam e se criem condições de investigação e de conhecimento rigoroso, mais detalhado e continuadamente atualizado sobre a realidade do desperdício alimentar, designadamente das suas causas.
Propomos a criação de um programa nacional de ação que fixe não apenas princípios mas também objetivos e metas anuais e plurianuais para reduzir o desperdício alimentar. Este programa deve, na perspetiva de Os Verdes, ser construído num processo de participação ativa e colaborativa da sociedade.
Propomos a compatibilização dos objetivos de redução do desperdício alimentar com a plena satisfação das necessidades da população, com particular urgência para crianças e jovens, tendo em conta, nomeadamente, o relatório do INE sobre pobreza, desigualdades e privação material em Portugal. A verdade é que temos de ter bem presente que as políticas de austeridade do Governo e da troica acentuaram muito os problemas estruturais de pobreza e de fome no nosso País, que urge combater por todas as vias, mas sempre num horizonte de garantia de formas dignas de subsistência das famílias.
A educação, a sensibilização, a informação são também processos fundamentais para cumprir objetivos que implicam alteração de hábitos de vida. Nesse sentido, e com vista ao combate ao desperdício alimentar, propomos o desenvolvimento de uma campanha de sensibilização de agentes económicos e dos consumidores.
Propomos que se integre nos programas escolares, no âmbito da educação ambiental ou da educação para a sustentabilidade, a matéria da gestão eficiente dos alimentos.
Propomos a criação de iniciativas criativas que envolvam os jovens em ideias e ações para combater as perdas alimentares. Propomos, também, a generalização do conhecimento pelos consumidores da diferença entre consumir «antes de» ou «data limite de consumo» e consumir «de preferência até» ou «data preferencial de consumo», na medida em que esta indiferenciação leva a que se deitem muitos produtos alimentares para o lixo, quando se encontram ainda dentro das datas de validade.
Propomos medidas que incidam sobre a melhoria dos processos produtivos e sobre o incentivo ao encurtamento dos circuitos de comercialização de produtos alimentares.
Com efeito, há aqui duas questões relevantes: primeiro, uma produção adequada às necessidades de consumo e não subjugada às lógicas do lucro pelo lucro permite uma quantidade produtiva mais ambientalmente suportável e menos esbanjadora; segundo, quanto mais longa é a cadeia de aprovisionamento mais desperdício se concretiza, designadamente nos produtos perecíveis. Nestes alimentos, o consumo de produtos locais e a aproximação da produção ao consumo garante também a entrega de produtos mais frescos ao consumidor e, portanto, com maior durabilidade de consumo.
Tendo estes fatores presentes, Sr.as e Srs. Deputados, Os Verdes propõem também criar um subprograma, no âmbito do programa de Desenvolvimento Rural, direcionado para cadeias de circuitos curtos de comercialização de produtos alimentares.
Propomos incentivar os atos de compra de bens alimentares em mercados de proximidade, nomeadamente no que respeita a produtos perecíveis e, como não poderia deixar de ser, atribuímos a necessidade de uma atitude responsável às instituições públicas, prevendo a importância de se estipular uma percentagem significativa de utilização de produtos alimentares locais, por parte do setor público, designadamente para abastecimento de cantinas públicas, como, por exemplo, em estabelecimentos escolares ou em hospitais.
Não esquecemos, naturalmente, também, a importância do contributo do setor da restauração para o objetivo do combate às perdas alimentares.
Os Verdes propõem ainda que nos consciencializemos todos de que as embalagens constituem, por diversos motivos, muitos dos quais já trouxemos várias vezes à Assembleia da República, um problema que é preciso regular no mercado.
Em relação à matéria que estamos a tratar, muitas vezes o mercado, em relação a determinados alimentos, só oferece embalagens hiperfamiliares, o que significa que sendo quantidades desajustadas das necessidades familiares sobra muita da comida contida na embalagem, sobras que geralmente têm o lixo como destino. Assim, propomos que se trabalhe para garantir que as embalagens de produtos alimentares sejam dimensionadas em função das necessidades dos consumidores.
Ainda sobre a oferta do mercado, denunciamos o facto de a União Europeia ter criado uma conceção de qualidade de certos produtos alimentares, como frutas e hortícolas, com base na sua dimensão e na sua aparência. A União Europeia faz da fruta bonita ou da fruta feia em aparência um critério de qualidade. Ora, este princípio está totalmente errado e concorre para a existência de mais desperdício alimentar, como é fácil de perceber. Assim, propomos que se desenvolvam ações ao nível da União Europeia sobre a ineficácia de regras estabelecidas em relação aos requisitos dos tamanhos e formas de produtos hortícolas e frutos.
Por fim, Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Os Verdes propõem que se divulgue anualmente o cálculo da quantidade de recursos naturais poupados por relação com os níveis de redução de perdas alimentares, por forma a estimular todos os intervenientes na cadeia alimentar para o sucesso ambiental das suas opções. É importante que os intervenientes no processo consigam ter a perceção dos resultados positivos das suas ações.
Em suma, ou talvez com algum detalhe, Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, são estas as propostas que Os Verdes hoje aqui trazem à Assembleia da República e aqui, desta tribuna, o que eu gostaria de realçar era a importância de que hoje a Assembleia da República aprovasse, por unanimidade, este projeto do Partido Ecologista «Os Verdes», na medida em que consideramos que ele constitui um impulso forte e determinante para que, em Portugal, se desenvolvam ações eficazes no combate ao desperdício alimentar. É um desígnio ambiental e social que nos chama e ao qual devemos dar resposta.

2ª Intervenção
Sr.ª Presidente, agradeço aos Srs. Deputados as questões que levantaram.
Começando por responder às questões colocadas pelo Sr. Deputado Miguel Freitas, quando Os Verdes propõem que se declare o ano de 2016 como um ano de combate ao desperdício alimentar não é para pôr o País todo enfeitado com cartazes e atribuir medalhas a toda a gente que participa na cadeia de aprovisionamento, por exemplo, e pormo-nos todos aqui a felicitarmo-nos uns aos outros.
Quando propomos que seja criado o Ano Nacional do Combate ao Desperdício Alimentar significa atribuir-se uma responsabilidade também às instituições e a todos os intervenientes no processo para atuarem sobre o problema, ou seja, no fundo, trata-se de despertar consciências, concentrando num determinado tempo, neste caso um ano, para que fossem chamadas a tomar ações, iniciativas, para pensar, refletir, debater a matéria do desperdício alimentar e, designadamente, do seu combate.
O Sr. Deputado lembra, e bem, que também o Parlamento Europeu declarou o ano de 2014 como o Ano Europeu do Combate ao Desperdício Alimentar, mas a reação da Comissão Europeia não foi forte, Sr. Deputado, e a reação ao nível europeu não foi forte.
Não é isso que queremos. Aqui, no nosso canto nacional, com a nossa soberania, façamos de outra forma. Concentremos ações num determinado ano sobre esta matéria, que depois se repercutirão também, naturalmente, nos anos seguintes. Ou seja, arranquemos fortemente, numa sociedade coligada para o efeito, com vista a esse objetivo.
Em relação aos estudos, consideramos que é extraordinariamente importante aprofundar estudos para conhecer a dimensão e as causas do problema. Pensando bem, havendo hoje em Portugal, especificamente, um único estudo detalhado sobre a questão e quando uma das conclusões que se retira é que é preciso aprofundar muito mais a matéria, é evidente que temos de dar passos nesse sentido. E só podemos atacar um problema quando conhecemos aquilo que está a montante de uma forma bastante rigorosa.
Sobre os currículos — agradeço a pergunta, de modo a poder especificá-la —, não queremos integrar a matéria num currículo com caráter disciplinar, digamos assim, mas gostaríamos que as escolas também se envolvessem, designadamente no âmbito dos seus programas de educação ambiental, de educação para a sustentabilidade, pois consideramos que são focos importantes onde estas questões podem ser abordadas.
No fundo, aquilo que estamos a pedir é que também a comunidade educativa não se esqueça da abordagem desta questão.
Sr. Deputado Pedro Pimentel, aquilo que é fundamental, o segredo da questão, digamos assim, é começar a ter uma produção adequada ao consumo. Essa é que é uma questão fundamental. E, para isso, a produção em pequena escala, a produção familiar e a sua aproximação ao consumidor — o produzir e o consumir localmente — é uma questão determinante para reduzir substancialmente o desperdício alimentar, quer porque a produção passa a ser mais adequada às necessidades do consumo, quer porque se perde uma longa cadeia de aprovisionamento, que contribui para sucessivas formas de desperdício alimentar. É evidente que, depois, aquilo que já não der para ser consumido puder ser reaproveitado de outras formas é uma questão que deve ser tida em conta, mas não devemos perder o foco central da questão, que é, de facto, outra forma de produzir e outra forma de consumir, e isso é extraordinariamente importante.
Sr.ª Deputada Rita Rato, também agradeço a sua questão e, mesmo para terminar, Sr.ª Presidente, queria dizer o seguinte: a injusta repartição da riqueza é uma forma de gerar também injusta forma de acesso aos alimentos. E quando falamos de alimentos falamos de questões fundamentais à sobrevivência de uma pessoa. Portanto, estamos a falar de coisas muito sérias.
Mas o que a Sr.ª Deputada diz é evidente: quando estamos aqui, na Assembleia da República, a discutir matérias salariais, a discutir matérias de subsistência das famílias, da dignificação das famílias, estamos, naturalmente, também a batalhar no sentido da segurança alimentar e isso, Sr.ª Deputada é algo que não podemos perder de vista.

3ª Intervenção
Sr.ª Presidente, quero agradecer aos Srs. Deputados as perguntas que me colocaram.
No fundo, ambos os Srs. Deputados acabam por fazer a mesma pergunta, ou seja, perguntam se o Governo não tem já feito maravilhas relativamente a esta matéria. Ora, julgo que, na minha intervenção inicial, já dei a minha opinião muito sincera: acho que não.
É de realçar que o guia que foi criado entre o Governo e os intervenientes na cadeia alimentar de aprovisionamento é extraordinariamente importante, mas desse guia constam princípios. E o que referi na minha intervenção foi que, na generalidade, a grande maioria dos princípios não está em prática. Ora, aquilo que propomos, por via deste projeto de resolução, para além de coisas que não constam desse guia, é dar um impulso à prática – é isso que nós queremos. Queremos não que conste apenas de um papel, mas que se impulsione a prática. E nisso, de facto, consideramos que não se tem andado depressa, Sr.as e Srs. Deputados. Com a maior sinceridade, para além da atribuição de selos e de prémios, que não acho que seja a matéria fundamental para o combate ao desperdício alimentar, o Governo não tem andado bem relativamente a essa matéria.
É interessante que o Sr. Deputado Bruno Coimbra tenha feito um paralelismo entre a importância do combate ao desperdício alimentar e o encerramento de serviços públicos.
Desculpe, Sr. Deputado, mas acho isso inacreditável! Deixe-me tentar dizer-lhe uma coisa para que todos nos consciencializemos da questão. Combater o desperdício alimentar não é tirar comida às pessoas, e isso foi o que os senhores fizeram com os serviços públicos: encerraram serviços públicos de proximidade, dificultando o acesso das populações a esses serviços. Portanto, vamos eliminar essa comparação, que não faz qualquer sentido nesta discussão, Sr. Deputado.
Já agora, quero dizer-lhe que a FAO reconhece que — veja bem, Sr. Deputado! — se se aproveitasse um terço de tudo o que é desperdiçado ao nível alimentar no mundo isso daria para alimentar toda a população do mundo. Bastaria «atacar» um terço desse desperdício alimentar. Isto faz-nos perceber a dimensão do problema e a dimensão das injustiças que temos de atacar.
O Sr. Deputado Manuel Isaac, cuja intervenção foi engraçada, porque foi muito prática, acaba por, sem o dizer ou reconhecer, pôr em causa o modelo de crescimento que se tem vindo a fazer. O Sr. Deputado dá grandes tacadas na globalização, nos processos de urbanização, de despovoamento do mundo rural, nas formas de vivência do mundo rural. É verdade, a urbanização faz com que a cadeia de aprovisionamento se alongue muito mais. O senhor vai fazendo essas críticas todas, só tenho pena que, no dia-a-dia, aqui, na Assembleia da República, em matérias também fundamentais, o Sr. Deputado não reconheça que estamos num processo de crescimento capitalista absolutamente infiel à necessidade da preservação e da valorização dos nossos recursos naturais e da dignificação das populações. Isso é que é extraordinariamente importante.
O Sr. Deputado diz: «Quanto mais se produz mais se desperdiça». Claro, porque se produz em função do lucro, não se produz em função das necessidades reais das populações. É que se a produção — designadamente, a aposta na produção familiar — fosse feita em conformidade com as necessidades alimentares, teríamos outros níveis de produção. E, de facto, para promover novos processos de desenvolvimento, precisamos, Sr. Deputado, de alterar substancialmente estes processos de produção e estes processos de consumo.
Mas tome nota disto, Sr. Deputado: o lucro pelo lucro é coisa para erradicar neste processo. São as necessidades que ditam as formas de produção e não o lucro pelo lucro.
Temos, de facto, necessidade de alterar conceções de crescimento e desenvolvimento. Julgo que este projeto de Os Verdes também clarifica muito sobre essa matéria.

4ª Intervenção
Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Ouvi com muita atenção as intervenções que foram produzidas pelas diversas bancadas e há uma questão que sinto necessidade de esclarecer. Quando estamos a falar de combate ao desperdício alimentar, é preciso que todos tenhamos consciência de que não estamos a falar da caridadezinha e do assistencialismo.
Vejo vários Sr.as e Srs. Deputados a acenar que sim, com a cabeça, e isto é importante. É que combater o desperdício alimentar não é dar as sobras aos pobres — é importante que isto fique muito claro! —, é fazer com que todas as pessoas tenham condições de acesso aos bens alimentares que já existem. E por isso é que é tão importante nós, na Assembleia da República, discutirmos o combate ao desemprego, as condições salariais dos portugueses ou o fornecimento das refeições escolares nas escolas, enfim, todo um conjunto de questões que se relacionam com esta matéria do desperdício alimentar e da segurança alimentar. E, portanto, gostava de deixar aqui vincado neste debate este pequeno ou grande esclarecimento.
Depois, Sr.as e Srs. Deputados, houve várias bancadas que salientaram a questão de, nesta Legislatura, a matéria do combate ao desperdício alimentar não ter entrado na agenda parlamentar. Pois foi justamente a essa questão que Os Verdes, hoje, procuraram também atalhar: trazer à agenda parlamentar uma matéria extraordinariamente importante para a questão da sustentabilidade.
Mas quero dizer que Os Verdes já têm apresentado vários projetos conexos com esta matéria, designadamente os projetos para a realização do inquérito alimentar nacional, para a regulação da publicidade a produtos alimentares dirigidos a crianças e jovens, para o fornecimento das cantinas públicas com produtos alimentares locais ou para o fornecimento de pequeno-almoço nos apoios alimentares escolares.
De qualquer modo, Sr.as e Srs. Deputados, considerámos que era importante estruturar um projeto no sentido de que esta matéria entrasse na agenda parlamentar.
Por outro lado, Sr. Deputado Miguel Freitas, tenho de me penalizar ou penitenciar, talvez, porque, entretanto, reparei que o Sr. Deputado Jorge Fão respondeu de uma forma muito mais objetiva e direta à primeira pergunta que me tinha feito, no sentido de saber porquê a criação de um Ano Nacional do Combate ao Desperdício Alimentar. É que, algures, na sua intervenção, o Sr. Deputado Jorge Fão disse: «Há muito para fazer nesta matéria». Eis a razão de ser desta proposta de Os Verdes!
Gostava também de dizer ao PSD o seguinte: falaram muito do plano de ação, que é o guia de que eu falei, que não omiti, neste debate, naturalmente, nem o poderia fazer, mas, atenção, porque isso, a que chamam «plano de ação», é, antes, um plano de princípios, uma vez que não estabelece metas concretas, nem anuais nem plurianuais, e é preciso dar esse passo. É aquilo que eu dizia há pouco, ou seja, temos de nos transportar do plano dos princípios para o plano da prática, e é isso que Os Verdes vêm propor à Assembleia da República.
Depois, Sr.as e Srs. Deputados, queria também dizer que foram aqui dados contributos que me parecem profundamente relevantes, como a questão da pesca, da necessidade de artes mais seletivas, da necessidade da aposta em melhores condições de conservação, entre outros conjuntos de questões que aqui foram referidos, e, sim, é importante termos a perceção de todas as dimensões da produção alimentar para os objetivos de combate ao desperdício alimentar que temos em mente.
Gostava de realçar apenas mais dois aspetos, um dos quais se prende com a afronta que precisamos de fazer à União Europeia relativamente às suas inconsistências e incongruências nesta matéria do desperdício alimentar, como já aqui foi referido. Também declararam um qualquer ano como Ano Europeu do Desperdício Alimentar e pouco ou nada foi feito nesta matéria.
Por outro lado ainda, tomam-no como objetivo, mas estipulam determinadas regras para a presença de determinados alimentos no mercado como frutas e hortícolas, onde associam a qualidade do produto à sua dimensão e calibragem, coisa que não tem rigorosamente nada a ver e que contribui extraordinariamente para grandes lógicas de desperdício alimentar. Isto é uma coisa que tem de ser combatida, na nossa perspetiva, Sr.as e Srs. Deputados,…
Como estava a dizer, Sr.as e Srs. Deputados, é importante apelar e, mais do que apelar, agir, no seio da União Europeia, no sentido de que estas normas, que, no fundo, vêm contribuir para o engrandecimento do desperdício alimentar, sejam arredadas, de modo a que possamos garantir alimentos com qualidade, fornecidos a toda a população, sem desperdício, naturalmente, ou combatendo ao máximo o desperdício.
Só mais uma questão para a qual gostava de chamar a atenção e que não foi aqui muito debatida, que é a que se prende com o problema das embalagens. As Sr.as e Srs. Deputados terão presente que Os Verdes já trouxeram, por diversas vezes, à Assembleia da República, a sua preocupação relativamente àquilo que o mercado oferece ao nível das embalagens.
Trouxemos aqui um projeto concreto que não tinha a ver com as embalagens relativas a produtos alimentares, mas, sim, a outros produtos, embalagens absolutamente desnecessárias que enchem o mercado de resíduos, daquilo que vai diretamente para o lixo.
Sobre a componente alimentar, aquilo que verificamos é uma coisa mais ou menos parecida, só que não diz respeito apenas à embalagem, em si, mas mesmo ao seu conteúdo. Formam-se aquelas embalagens de oferta ao consumidor, com uma enormíssima quantidade de produto, aquilo a que chamei «embalagens hiperfamiliares», não adequadas às várias dimensões familiares, e as pessoas, não tendo outra opção, compram aquela dimensão de produto embalado, mas, depois, acabam por se alimentar apenas da parte de que necessitam para a alimentação da sua família, da sua dimensão familiar, e acabam por deitar o resto fora.
Sr.as e Srs. Deputados, temos de regular o mercado naquilo que concerne às embalagens. Estamos a falar de coisas extraordinariamente relevantes do ponto de vista do seu impacto ambiental, quer a montante, quer a jusante, com a produção de resíduos. E julgo que, definitivamente, esta Câmara tem de olhar para esta matéria com grande seriedade.
Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Fiquei satisfeita, aliás, nós, Os Verdes ficámos satisfeitos com a discussão que aqui se produziu. Deu-me a sensação, mas, agora, seguir-se-á a votação, de que todos os grupos parlamentares irão votar favoravelmente este projeto de resolução de Os Verdes, ou, pelo menos, viabilizá-lo, e esta unanimidade será importante para que este projeto possa constituir um pontapé de arranque, de dinamização da matéria do combate ao desperdício alimentar em Portugal, que, como referi, é um desígnio social e ambiental que todos devemos acolher na nossa ação política.

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