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Intervenções na Ar (Escritas)
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16/03/2012
Debate de urgência, requerido por Os Verdes, sobre o incumprimento da Lei n.º 2/2011, de 9 de fevereiro — Remoção de amianto em edifícios, instalações e equipamentos públicos
Intervenção da Deputada Heloísa Apolónia
Debate de urgência, requerido por Os Verdes, sobre o incumprimento da Lei n.º 2/2011, de 9 de fevereiro — Remoção de amianto em edifícios, instalações e equipamentos públicos
- Assembleia da República, 16 de Março de 2012 –

1ª Intervenção

Sr.ª Presidente, Sr.ª Secretária de Estado dos Assuntos Parlamentares e da Igualdade, Sr. Secretário de Estado do Ambiente e do Ordenamento do Território, Sr.as e Srs. Deputados: Tal como Os Verdes tinham anunciado, justamente no Plenário da Assembleia da República, há umas semanas atrás, aquando da realização de uma declaração política sobre a matéria que hoje estamos a discutir, solicitámos a realização de um debate de urgência para que o Governo viesse responder à Assembleia da República sobre o incumprimento da Lei n.º 2/2011.
Trata-se de uma lei aprovada na Assembleia da República, que determina que compete ao Governo a realização de um levantamento dos edifícios públicos que contêm amianto na sua construção, que esse levantamento se torne público e que, num prazo também estabelecido na lei, se proceda ao levantamento das necessidades de intervenção nessas edificações em função do estado de conservação, ou não, desses materiais que contêm amianto, ou estabelecendo a sua manutenção (naturalmente, decorrente dessa monitorização) ou mesmo procedendo à sua remoção, caso o estado de degradação assim o exija.
Este não é um procedimento que se realize de um dia para o outro, leva tempo. E a lei, sabendo que leva tempo, determinava o prazo de um ano para a concretização do levantamento das edificações públicas que continham amianto. Significa isto que, nos temos da publicação da lei e da sua entrada em vigor, no dia 14 de janeiro de 2011, há cerca de um mês atrás, findou o prazo estabelecido para esse levantamento.
Os Verdes, que têm seguido este assunto com particular atenção e que têm sido o motor, nesta Casa, para a promoção de legislação sobre esta matéria, obviamente, decorrido o prazo, foram ver imediatamente se, nos termos da lei, estava publicada essa listagem. O que verificámos foi que essa listagem não estava em lado absolutamente nenhum.
O que é que pensámos fazer? Pensámos em contactar imediatamente as entidades que, segundo informação informal que tínhamos (reconheço-o, Sr. Secretário de Estado), estavam a trabalhar nessa listagem, designadamente o Laboratório Nacional de Engenharia Civil (LNEC) e o Instituto Nacional de Saúde Dr. Ricardo Jorge (INSA).
Começámos por este último. E qual não foi o nosso espanto quando, na reunião que tivemos com representantes do INSA, fomos informados que nenhuma entidade, designadamente governamental, tinha contactado este Instituto no sentido de dar cumprimento à Lei n.º 2/2011. Não era esta a resposta que esperávamos — já o referi aqui — e ficámos profundamente preocupados.
Contactámos então o LNEC, que nos respondeu exatamente a mesma coisa, ou seja, que nenhuma entidade governamental tinha contactado o Laboratório para efeitos de cumprimento de Lei n.º 2/2011.
Contudo, o LNEC informou-nos que já tinha havido um trabalho prévio de levantamento de um conjunto — não da totalidade — de edificações públicas contendo amianto, tendo designadamente avaliado a perigosidade de algumas situações que encontraram.
De qualquer modo, o que é perfeitamente visível é que esse trabalho não está feito, ou seja, que a Lei n.º 2/2011 não foi cumprida. Mas não devemos ater-nos ao ano de 2011, porque esta história já vem de há muito, muito mais tempo.
Em 2003, foi aprovada na Assembleia da República uma resolução que recomendava ao governo que procedesse ao levantamento das edificações públicas contendo amianto. Trabalhámos muito, como de resto outros grupos parlamentares (é justo reconhecê-lo), para a aprovação dessa resolução. Certo é que, desde então, nenhum governo primou, digamos assim, pelo cumprimento da resolução.
Então, era preciso algo mais vinculativo dado que uma recomendação não tem caráter vinculativo. Trabalhámos muito, no ano de 2010, para transformar o texto daquela resolução numa lei, para que tivesse um caráter obrigatório. O desconhecimento da lei não aproveita a ninguém. E neste caso considero que não se trata propriamente de desconhecimento, trata-se de uma irresponsabilidade que acho que deve ficar marcada.
Não me vou alongar muito mais, porque esta exposição é sobejamente conhecida pelas Sr.as e pelos Srs. Deputados, pois já por diversas vezes a trouxemos à Assembleia da República. Hoje, o propósito deste debate de urgência solicitado por Os Verdes é justamente o de ouvir o Governo, perceber o que é que o Governo tem para nos dizer.
Fundamentalmente, quero dizer aqui uma coisa, para a qual nos chamaram a atenção as pessoas que prontamente nos receberem no Instituto Nacional de Saúde Dr. Ricardo Jorge: a lei determina que é ao Governo que compete o levantamento de todos os edifícios. De facto, isto é extraordinariamente genérico, porque a própria lei não estabelece quem é que tem essa competência dentro do Governo.
Mas, Sr. Secretário de Estado, esta foi a forma de conseguirmos que esta lei fosse aprovada. O Sr. Secretário de Estado sabe que muitas vezes as maiorias parlamentares preferem que as coisas fiquem previstas de uma forma genérica, se calhar para que não sejam tão vinculativas. Mas isso não é uma desculpa aceitável para Os Verdes: se compete ao Governo, é o Governo que tem que orientar-se e organizar-se no sentido de dar cumprimento à lei.
De resto, essa dificuldade de perceber a quem é que competia esteve visível na marcação deste debate. Não responsabilizo o Governo, porque nós próprios, mesmo em conversa com o Governo, não conseguíamos dizer exatamente a quem é que competia a realização deste levantamento, porque poderia estar no âmbito do Ministério das Finanças, do Ministério da Economia e, parcialmente, no âmbito do Ministério da Saúde, do Ministério da Educação ou do Ministério do Ambiente.
Confesso que até disse ao Governo que, provavelmente, a responsabilidade não era da competência do Ministério do Ambiente. Porquê? Porque li declarações públicas, proferidas por responsáveis do Ministério do Ambiente, dizendo que não tinham feito nenhuma listagem, até porque isso não estava no âmbito das competências do seu Ministério.

O Sr. Paulo Sá (PCP): — O Governo esqueceu-se!

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Tudo isto é uma grande confusão, tudo isto é uma grande lacuna e tudo isto é um grande risco para a saúde pública, porque estamos a falar de amianto. Algum material é perfeitamente visível a olho nu, e em muitas escolas e centros de saúde do País o estado de degradação daquilo que é visível a olho nu é profundamente preocupante.
Mas temos ainda o amianto flocado, presente em determinadas canalizações ou condutas, que nem sequer é visível e conhecido, e muitas vezes é intervencionado sem que as pessoas tenham conhecimento do material com que estão a contactar. Estamos a falar de uma substância altamente cancerígena.
Portanto, Sr. Secretário de Estado, pergunto-lhe quem é que responsável, dentro do Governo, pelo cumprimento da Lei n.º 2/2011, que neste momento não está cumprida? Porque é que não está cumprida a lei? E, afinal, o que é que está a ser feito?

2ª Intervenção

Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Não sei se hei de ficar preocupada com a resposta que o Sr. Secretário de Estado deu, porque acaba por ser um bocado desilusão… Esse é, de facto, o sentimento decorrente da resposta que deu.
Será que posso interpretar das palavras do Sr. Secretário de Estado que vai começar tudo de novo? Em 2003 houve uma resolução da Assembleia da República, em 2011 uma lei e, agora, o Sr. Secretário de Estado fala de uma resolução do Conselho de Ministro, apontando alguns défices à lei, e eu pergunto: é para começar tudo de novo, Sr. Secretário de Estado? É para atribuir mais um ou dois anos para a realização da listagem?
Se é assim, Sr. Secretário de Estado, tem a total oposição de Os Verdes a essa metodologia. Não pode ser!
O Governo veio aqui reconhecer que está atrasado no cumprimento da lei: ela está incumprida! A lei não foi cumprida e é preciso recuperar o tempo. Vá lá!, o Governo já arranjou alguém para orientar a coordenação desta matéria, que é transversal, de facto, não há dúvidas sobre isso, e esse alguém será o Ministério do Ambiente — estamos perfeitamente de acordo. E mesmo que fosse outro ministério, Sr. Secretário de Estado, o que importa é que se faça, porque é isso que a lei determina. Compete ao Governo fazê-lo e, depois, o Governo que se oriente na sua organização, porque isso não tem qualquer importância nem relevância.
De facto, tem de proceder-se — é o que a lei determina — à realização desse levantamento, dessa listagem, tornando essa listagem pública, porque as pessoas têm o direito de saber até que ponto, onde e quando estão expostas a determinados perigos, designadamente pessoas que trabalham em edifícios que contêm estas substâncias, que lá estão diariamente e durante anos. É o que acontece, por exemplo, em muitas escolas e em muitos centros de saúde do nosso País.
A propósito de escolas, foi dito aqui que 50% das escolas — e não são 50%, mas, sim, 59% — avaliadas pelo Ministério da Educação continham amianto. Só que são 59% de escolas de um universo que o anterior Ministério da Educação nunca conseguiu dizer-nos qual era! Podem ser 59% de 100 escolas, como podem ser 59% de 5 escolas ou de 1000 escolas, o que dá um número completamente diferente!
Portanto, esse «bolo» global de escolas avaliadas nunca nos foi transmitido, apesar das insistências de Os Verdes. Ou seja, é tudo uma nebulosa, as coisas vão sendo conhecidas por acaso, pontualmente, e isso não pode ser.
O que se encontrou na Lei n.º 2/2011 foi uma metodologia para fazer uma avaliação global a nível nacional. Lamentamos, Sr. Secretário de Estado, mas a Assembleia da República determinou, por unanimidade, atribuir ao Governo a responsabilidade de realização desta listagem.
Sr. Secretário de Estado, como tenho um absoluto receio de que se vá começar tudo de novo, coisa de que Os Verdes discordam completamente, pergunto qual é o prazo que o Governo propõe para que a listagem determinada pela Lei n.º 2/2011 esteja concluída.

3ª Intervenção

Sr. Presidente, como vai haver um período de encerramento e nessa altura Os Verdes poderão ainda fazer uma leitura sobre esta matéria, gostava de ser muito objetiva nesta fase e perguntar ao Sr. Secretário de Estado algo que se impõe ainda compreender neste debate: quando é que vamos ter essa resolução do Conselho de Ministros? Não estou à espera que o Sr. Secretário de Estado me aponte o dia concreto, mas, em termos de estabelecimento de um prazo mais genérico, qual é o prazo que o Governo se propõe para que essa resolução do Conselho de Ministros esteja feita e qual o prazo que considera razoável para que a listagem, que deveria estar feita, decorrente de uma resolução de 2003 e depois de uma lei de 2011, seja concluída?
Julgo que não podemos sair daqui sem que estas matérias fiquem esclarecidas.

4ª Intervenção

Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: A primeira coisa que quero dizer, neste encerramento, é que foi importante Os Verdes terem denunciado o incumprimento da Lei n.º 2/2011. Foi importante termos colocado a questão ao Sr. Primeiro-Ministro, que, na altura, não respondeu; foi importante termos feito uma declaração política nesta Assembleia; foi importante termos contactado as entidades que contactámos; e foi muito importante termos realizado este debate de urgência, para percebermos, de facto, como é que o Governo pode organizar-se relativamente a esta matéria para dar cumprimento àquilo que é preciso cumprir, que é, designadamente, fazer um apanhado das edificações públicas que contêm amianto para proceder ao seu tratamento, seja ele qual for.
Tudo isto foi extraordinariamente relevante, Sr. Secretário de Estado. Mas, no decurso do debate, e embora o Sr. Secretário de Estado não o tenha designado assim, o que se percebeu é que o Governo quer deitar fora a Lei aprovada pela Assembleia da República.
Quando falava, há pouco, no receio de o Governo querer começar de novo, não é em relação a um trabalho parcial, genérico, que o LNEC já fez — pois claro, todo esse trabalho de terreno deve ser agarrado! Quando falava no receio de o Governo querer começar de novo é no sentido de o Governo querer «rasgar» a Lei da Assembleia da República e partir para uma metodologia completamente nova, com prazos completamente novos e com competências completamente novas — e aí, Sr. Secretário de Estado, desculpe, mas vai ter a total discordância de Os Verdes.
Na verdade, se estivemos bem atentos às palavras do Sr. Secretário de Estado, o Governo quer literalmente livrar-se de competências que a lei lhe atribui nesta matéria. Quer sim, Sr. Secretário de Estado!
É que o Sr. Secretário de Estado diz o seguinte: a lei é genérica — e eu concordo —, porque não atribui a responsabilidade ao Governo — mas atribui, em concreto, a um órgão de soberania!
O que a Lei da Assembleia da República diz, concordemos, ou não — e foi aprovada por unanimidade e, também é bom que se diga que foi perante estas condições que foi aprovada por unanimidade —, é que a Assembleia da República não quer saber quem é que, dentro do Governo, vai proceder àquilo que está estabelecido na lei. O Governo que se organize! Obviamente, tem total autonomia para o efeito. O Governo não pode é dizer «a lei não atribui». Então, as autarquias não têm responsabilidades? Os governos regionais não têm responsabilidades? A lei é clara: atribui a responsabilidade ao Governo, respeitando a autonomia das autarquias. Depois, quando houver intervenção nas edificações detetadas, tem de se envolver as autarquias nessa matéria. Agora, o levantamento, em concreto, compete ao Governo — é isso que a lei diz.
E o que me pareceu que o Governo agora quer fazer é «rasgar» esta Lei e fazer uma resolução do Conselho de Ministros, atribuindo competências às autarquias e aos governos regionais para fazer aquilo que a lei atribui ao Governo da República. Não, não pode ser, Sr. Secretário de Estado! A lei é clara, a lei é para cumprir. Não podemos, quando não gostamos de uma lei, fazer outra, porque não gostamos daquela! Não, não é assim! A lei é para cumprir e a lei determina obrigações para o Governo.
Não sejamos ingénuos: estas obrigações implicam encargos, como é evidente. E o que o Sr. Secretário de Estado aqui veio dizer foi isto: nos edifícios das autarquias, as autarquias que gastem o dinheirinho delas. E o Sr. Secretário de Estado sabe como é que isto está. E esta responsabilidade, já em tempo de crise, em 2011, a Assembleia da República atribuiu também os encargos, isto é, quando atribuiu a competência, atribuiu os encargos deste procedimento ao Governo da República. Portanto, é o Governo que tem de assumir isso.
E não é dinheiro esbanjado, Sr. Secretário de Estado, porque todo o dinheiro que é atribuído para a prevenção e a melhoria da saúde pública é sempre dinheiro bem empregue, Sr. Secretário de Estado. E, inclusivamente, vai ter repercussão, provavelmente décadas depois, numa poupança relativamente aos cuidados de saúde da população. Os senhores também têm de ver as coisas a longo prazo, não é só para quando vem o voto, dois, três ou quatro anos depois. Não! Este País precisa de começar a ser pensado também a médio e a longo prazos, porque as políticas são eficazes, se essa metodologia for encontrada.
Portanto, Sr. Secretário de Estado, quero dizer que fiquei relativamente preocupada com a sua resposta.
Já agora, relativamente ao grupo de trabalho, o Sr. Secretário de Estado, não quer pensar em incluir aí também o Ministério da Educação? Primeiro, porque a realidade no âmbito das edificações do Ministério da Educação é absolutamente elevada, ao nível da presença de amianto.
Depois, há outra coisa que este País também precisa de perceber e era bom que o Ministério da Educação também fosse envolvido nisso. É que precisamos de começar a transportar para as escolas a questão da educação para o risco, a questão da identificação de materiais, a questão da identificação de problemas e da identificação de riscos. E a presença do Ministério da Educação neste grupo de trabalho talvez não fosse de somenos importância.
Por último, Sr. Secretário de Estado, ficámos sem saber quando é que a listagem estaria pronta, mas julgo que, a curto prazo, vamos poder sabê-lo.
E já que o Sr. Secretário de Estado referiu tão detalhadamente o conteúdo da resolução, seria possível enviar-nos a documentação em concreto, mesmo antes de ela ser aprovada em Conselho de Ministros?
Refiro-me àquilo que o Sr. Secretário de Estado aqui enunciou, os princípios gerais. Julgo que era importante termos conhecimento desse documento em concreto. 

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