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Intervenções na Ar (Escritas)
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05/07/2013
Debate político, requerido pelo PSD, sobre parcerias público-privadas e transparência nos processos de privatização
Intervenção do deputado José Luís Ferreira
Debate político, requerido pelo PSD, sobre parcerias público-privadas e transparência nos processos de privatização
- Assembleia da República, 5 de Julho de 2013 –

1ª Intervenção

Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Nuno Encarnação, de facto, não é possível fazer uma reflexão séria sem olhar para trás — estou de acordo. E, quando olhamos para trás, temos de concluir que as parcerias público-privadas foram uma fórmula que os Governos arranjaram para hipotecar o futuro das contas do Estado, permitindo um negócio apenas para os privados, permitindo apenas um excelente negócio para os privados, que são os únicos, de resto, a ganhar com o negócio, já que para o Estado as parcerias público-privadas representam negócios verdadeiramente ruinosos, como, aliás, se continua a verificar e como ficou claro com o relatório do Tribunal de Contas que acabou por arrasar completamente todos esses negócios.
Recordava — o Sr. Deputado não o disse porque, se calhar, se esqueceu — que as parcerias público-privadas foram uma notável invenção dos Governos de Cavaco Silva, do PSD. E, depois de descoberta a fórmula, que permite apresentar obra hoje para que os outros paguem amanhã, é claro que os Governos que vieram a seguir, do PS ou do PSD, usaram e abusaram dessa notável invenção. Portanto, só coisas boas para os negócios do Estado vieram do PSD e do PS!…
Sobre a transparência nos negócios de privatização, Sr. Deputado, penso que basta atender à motivação e aos objetivos que têm levado às privatizações e, depois, confrontar com os resultados para se perceber que de transparente estes processos nada têm.
Como podemos falar de transparência nos processos de privatização quando os motivos que norteiam esses processos de privatização são a competitividade e a redução da dívida pública e, depois, percebemos que, afinal, não foi nada disso?
Olhemos para trás, Sr. Deputado.
Sobre a competitividade, pergunto: onde está a competitividade dos setores que foram objeto de privatização no passado? Onde está a competitividade dos setores como o setor financeiro, o setor elétrico ou o setor dos combustíveis?
No acesso ao crédito estamos muito pior — certamente, o Sr. Deputado concordará comigo. Quanto à eletricidade e aos combustíveis, as famílias e as pequenas e médias empresas pagam hoje muito mais do que o que pagavam antes das privatizações. Aliás, hoje até são quem mais paga em toda a Europa. Portanto, é justo perguntar: afinal, onde está a competitividade, que é um dos motivos que tem levado à privatização de muitas empresas?
O outro argumento que tem sido invocado pelos Governos para privatizar tem a ver com a redução das dívida pública e, aqui, parece que não se quer perceber que a dívida aumenta ao ritmo do volume das privatizações e que, quanto mais se privatiza, mais aumenta a dívida.
É preciso olhar para trás de facto, Sr. Deputado, porque se o Governo olhasse para trás, fizesse ou quisesse fazer contas, perceberia que os lucros das empresas que foram privatizadas no passado, como os casos da EDP, da Galp, da PT, da REN ou da Brisa, contribuíram, durante anos, com fortes e grandes receitas para o Orçamento do Estado. Mas é preciso olhar para trás, Sr. Deputado.
O mesmo se diga das empresas que o Governo agora quer privatizar.
Vejamos: os lucros da Empresa Geral de Fomento ascenderam a 21 milhões de euros no ano passado; a TAP, para além de nada receber do Orçamento do Estado, ainda contribui com receitas (para o Estado) de mais de 200 milhões de euros por ano; a ANA, nos últimos 10 anos, entregou ao Estado mais de 525 milhões de euros e, só no ano passado, fez entrar nos cofres do Estado cerca de 70 milhões de euros. Isto já para não falar dos CTT, que também continuam a dar dinheiro ao Estado.
Portanto, é justo perguntar onde está a transparência nestes processos, porque, de facto, acabamos por perceber que os motivos que levaram à privatização são falsos. E quando mentimos às pessoas não podemos falar de transparência.
Também não sei se aqui, quando falamos de transparência, estamos a referir o caso da ANA, que é sintomático em termos de transparência, porque foi um processo muito conturbado, que até envolveu um contrato de concessão de serviço público com a ANA, o que é estranho, porque a ANA já tinha esse serviço público e o Governo fez um contrato de concessão de serviço público para a ANA — foi para enganar o Eurostat, não foi Sr. Secretário de Estado? Certamente que sim!
Portanto, há contornos na privatização da ANA que ainda estão hoje por esclarecer. Aliás, o conteúdo do contrato tinha como pressuposto que se tratava de duas entidades públicas, mas o conteúdo pretendia definir as bases de concessão por 40 ou 50 anos a um grupo privado. Portanto, também aqui se vê o nível de transparência deste processo de privatização.

2ª Intervenção

Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado Sérgio Monteiro, deu o exemplo da ANA, que, pelos vistos, até foi elogiado pela Comissão Europeia, mas, no caso da ANA, sobretudo na concessão, tenho de dizer que o interesse público não foi, sequer, tido em conta. É que o contrato de concessão da ANA foi trabalhado tendo como pressuposto que se tratava de duas entidades públicas, quando o conteúdo desse contrato estabelecia as bases de concessão, de 40 ou 50 anos, a um grupo privado. A preocupação do Governo nesta concessão não foi, de maneira nenhuma, assegurar o interesse público, não foi saber se a concessão era ou não vantajosa para o País — não foi nada disso, Sr. Secretário de Estado! —, a única preocupação do Governo foi a de saber se a União Europeia e o Eurostat aceitavam integrar a receita da concessão, para efeitos de contabilização do défice das contas públicas. Esta foi a única preocupação do Governo, e o Sr. Secretário de Estado sabe bem que assim foi, o interesse público esteve completamente ausente deste processo, aquilo que o Governo quis fazer foi utilizar a ANA para se autofinanciar.
Depois, o Governo gosta muito de brincar com as palavras, porque diz que não quer privatizar a água, mas faz a concessão do saneamento e abastecimento de água por décadas, por 40 a 50 anos. Concessões destas o que são senão privatizar?!
O Sr. Secretário de Estado disse, há pouco, que não aceita ser dono dos CTT, não aceita ser dono dos Estaleiros Navais, não aceita ser dono da TAP, não aceita ser dono das empresas públicas. Ó Sr. Secretário de Estado, por que é que aceitou ser Secretário de Estado? Não lhe parece que teria sido muito mais sensato, quando foi convidado pelo Sr. Primeiro-Ministro, ter dito «Não, não aceito, porque não quero ser patrão das empresas públicas e, portanto, não vou ficar com a pasta dos transportes, das comunicações e das obras públicas»?! 
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