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Intervenções na Ar (Escritas)
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19/12/2014
Debate sobre a dívida pública
Intervenção da Deputada Heloísa Apolónia
Debate sobre a dívida pública
- Assembleia da República, 19 de Dezembro de 2014 -

1ª Intervenção

Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Todos nos lembramos de ouvir o Governo apregoar que um dos principais motivos para a austeridade era a dívida. O objetivo do Governo era diminuir a alta dívida e, por isso, carregava na austeridade e empobrecia os portugueses. É preciso, então, esclarecer que antes de o Governo PSD/CDS tomar posse, a dívida correspondia a cerca de 94% do PIB e que é hoje de mais de 132% do PIB. Ou seja, a dívida cresceu, nos últimos três anos, mais de 50 000 milhões de euros.
Para que todos tenham uma mais exata noção desse valor, importa, talvez, comparar com o empréstimo da troica, que foi de 78 000 milhões de euros. E a dívida aumentou mais de 50 000 milhões de euros.
Para 2015, o Governo prevê que a dívida pública aumente mais 7,7 mil milhões de euros. Conclusão: a dívida não diminuiu, como o Governo apregoou; os portugueses foram e são vítimas de uma brutal austeridade e a dívida aumenta continuadamente. Conclui-se daqui que a austeridade não paga dívida.
Mas, cuidado, porque nesta senda da propaganda do Governo até às próximas eleições tentarão fazer-nos crer que estão a pagar a dívida quando, afinal, ela aumenta. Um dos mais fortes motivos pelos quais a dívida cresce prende-se com o facto de os sucessivos governos e a União Europeia promoverem a liquidação da atividade produtiva. E sem atividade produtiva não há crescimento económico sólido e sem esse crescimento económico não há criação necessária de riqueza e há uma dependência absurda do exterior num País que tem um potencial ambiental e social extraordinário para gerar crescimento sustentável.
Outro forte motivo para o aumento da dívida é a inaceitável especulação financeira. Tudo gira em benefício dos bancos, tudo gira para acudir aos bancos e, depois, os bancos cobram juros agiotas e ainda revelam a verdadeira cara do sistema financeiro em casos como os do BPN ou do BES.
Importa, agora, dizer que o Governo não soube lidar com a dívida, fez com que a dívida gerasse austeridade, com que a austeridade gerasse uma economia mais débil, que esta fraca economia gerasse mais dívida, que esta gerasse mais austeridade e lançou-nos num ciclo vicioso que pode apresentar uns altos e uns baixos mas que é insustentável.
Os Verdes reafirmam que a dívida é insustentável, e noutra intervenção, que faremos mais à frente no debate, argumentaremos que a solução passa, inevitavelmente, pela renegociação da dívida.

2ª Intervenção

Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, tenho estado a reparar — já noutros debates foi possível reparar — que o Governo e a maioria, quando falam do pagamento da dívida, colocam sempre dois cenários: um, é o cenário do não pagamos; outro, é o cenário de pagamos tudo como os credores quiserem, quando quiserem. Com o cenário do não pagamos, diz a Sr.ª Ministra, não temos mais financiamento. No segundo cenário, a Sr.ª Ministra não diz — porque não lhe interessa — que ao pagar quando os credores e como os credores quiserem se gera o empobrecimento do País.
Queria pedir à Sr.ª Ministra que saísse desse radicalismo das duas posições extremas e colocasse a hipótese de discutir aquilo que tem aparecido como alternativa e que, designadamente, Os Verdes defendem, que é a renegociação da dívida, que significa pagar de uma forma diferente, tendo em conta as capacidades que o País tem para pagar e reganhando capacidade do País para pagar a dívida.
Mas esta alternativa a Sr.ª Ministra e a maioria nunca querem discutir. Julgo que nunca a querem discutir porque, lá no fundo, sabem que é uma alternativa séria e que traria outras condições ao País, mas o vosso radicalismo ideológico de submissão total à especulação financeira não permite que a discutam com seriedade.
Sr.ª Ministra, gostava de nos dissesse, para ajustarmos aqui os números, qual é o encargo anual decorrente dos juros da dívida e se considera que esse encargo anual é ou não especulativo.
Gostava de saber quanto pagámos até agora — e não vou mais longe, é só desde que o Governo tomou posse — ao nível de juros da dívida e quanto pagaremos nos próximos anos.
Gostava também de saber, para que os portugueses que nos estão a ouvir tenham uma ideia, se aquilo que vamos pagar de juros e encargos pelo serviço da dívida pública, previsto no Orçamento do Estado, é ou não superior ao orçamento do Serviço Nacional de Saúde e se é ou não muitíssimo superior ao investimento público anual.
Faço-lhe estas perguntas porque acho que é preciso, de facto, consciencializarmo-nos sobre aquilo que pagamos, sobre como pagamos e sobre as nossas capacidades ou incapacidades; é preciso consciencializarmo-nos de que não vale tudo para atingir fins e de que os portugueses, a peça «portugueses», contam muito para as soluções que têm de ser tomadas.
E quando pagar a dívida como o Governo quer significa o sucessivo empobrecimento do País e dos portugueses, quando aquilo que o Governo está a fazer é tentar habituar os portugueses à pobreza, para este nível de capitalismo absurdo, aí, então, está tudo estragado!… É uma ideologia que não serve, Sr.ª Ministra.

3ª Intervenção

Sr.ª Presidente, Sr.ª Ministra, Sr.as Secretárias de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: O Governo prometeu que a dívida diminuiria e não diminuiu — aumentou e não foi pouco.
Fica claro que não temos condições para pagar a dívida com a receita do Governo, com a receita da União Europeia e com a receita da troica. Impõe-se, por isso, trilhar um outro caminho. Em primeiro lugar, renegociar a dívida pública, alargando os prazos de pagamento, ajustando os seus montantes e reduzindo as taxas de juro.
Os juros da dívida custam-nos, este ano, cerca de 7 mil milhões de euros. O Orçamento do Estado para 2015 prevê que o montante anual de juros e de encargos a pagar pelo serviço da dívida pública será de 8,2 mil milhões de euros. Esta especulação resulta — e acho que é importante dizê-lo, Sr.ª Ministra — em mais do que o orçamento do Serviço Nacional de Saúde e em muito mais do que o investimento público anual. Sem esta renegociação da dívida, é a própria dívida que se manterá impagável e insustentável, e continuaremos a endividar-nos mais e mais.
Que não se tenha a menor dúvida: a dívida insustentável e crescente que temos é o argumento do Governo PSD/CDS, bem como de todos os que servem este modelo explorador em que nos encontramos, para manter as políticas de empobrecimento dos portugueses e para fragilizar o Estado.
Defenderão, então, a política dos baixos salários e das pensões diminutas, reduzirão os apoios sociais, desinvestirão na saúde, na educação, na cultura, na produção científica, liquidarão direitos laborais, privatizarão património do Estado em nome da dívida que não para de crescer. Mas continuarão a servir os que ganham com a dívida de uma forma absolutamente insuportável: a banca, os especuladores, os grandes grupos económicos e financeiros, que são os que tiram partido da situação e que lucram interminavelmente com ela. Nesta lógica, está também o tratado orçamental, adorado pelo PS, pelo PSD e pelo CDS, que fixa o limite de endividamento público até aos 60%.
Com a situação do País que o Governo procura a todo o custo tornar definitiva, com a taxa anémica do crescimento económico que se prevê para os próximos anos, com os juros absurdos que continuamos a pagar, o tratado orçamental traça-nos objetivos ilusórios com metas, quer de dívida, quer de défice, que só vão servir para que os governos pouco preocupados com o seu povo justifiquem a continuação da austeridade.
Os Verdes reafirmam que, depois de renegociada, a dívida deve ser paga em função da capacidade do resultado da dinamização da economia. Para dinamizar a economia é preciso relançar a atividade produtiva e também é importante recuperar poder de compra aos cidadãos, eliminando esta austeridade absurda que se revelou uma estratégia bem montada de um poder político subserviente a um grande poder económico e financeiro.
Termino, Sr.ª Presidente, dizendo que se pede aos portugueses que não considerem normal ou tolerável esta ânsia do Governo de habituar um povo à pobreza. É isso que o Governo inaceitavelmente tenta fazer e é com isso que urgentemente é preciso acabar.
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