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Intervenções na Ar (Escritas)
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22/06/2012
Debate sobre a situação na escola pública e o novo ano letivo — mega-agrupamento, reorganização curricular e despedimentos nas escolas
Intervenção da Deputada Heloísa Apolónia
Debate sobre a situação na escola pública e o novo ano letivo — mega-agrupamento, reorganização curricular e despedimentos nas escolas
- Assembleia da República, 22 de Junho de 2012 –
 
1ª Intervenção
 
Sr. Presidente, Sr. Ministro da Educação e Ciência, há uma pergunta que Os Verdes, e, de resto, outras bancadas, andam a fazer, recorrentemente, ao Ministério da Educação e para a qual não conseguimos obter resposta, pelo que peço ao Sr. Ministro que entenda a urgência de percebermos o resultado concreto das ações, das medidas e das decisões tomadas pelo Governo.
Com a questão dos mega-agrupamentos, da revisão curricular, do aumento do número de alunos por turma, entre outras coisas, é ou não verdade que podem ir diretamente para a rua mais de 20 000 professores?
Penso que o Sr. Ministro tem de assumir, concretamente, os resultados das políticas que implementa. E, se é este o resultado, o Sr. Ministro tem de o dizer, para que, depois, a comunidade possa avaliá-lo. O que o Sr. Ministro não pode é escamotear permanentemente aqueles que são os resultados concretos, e gravíssimos, na nossa perspetiva, daquelas que são as opções governativas do Governo.
Depois, gostava de perceber que saudade é esta, do passado, que o Governo tem para começar agora, de repente, a criar uma lógica de ensino que nos lembra muito tempos passados, que não gostávamos nada de recordar, quanto mais de viver, nas futuras gerações, Sr. Ministro.
O Sr. Ministro chega aqui e diz que «a escola não é só ler, escrever e contar», mas, depois, realça, sobremaneira, essa componente importante, de facto, de ler, escrever e contar. Porém, Sr. Ministro, tem de convir que, quando o Sr. Ministro desvaloriza, sobremaneira, por via da revisão curricular, o ensino artístico ou o ensino físico… É verdade, Sr. Ministro! Então, não dá uma valoração à carga horária?! Se retira horas destas áreas, então, naturalmente, desvaloriza-as. Com o fim do desdobramento, em Ciências, também desvaloriza o ensino prático. Toda a componente prática do ensino, de estímulo à criatividade e à aprendizagem prática do aluno, o Governo retira, o Ministério da Educação rouba!
Portanto, de facto, aquilo que o Governo está a criar é uma escola como antigamente, onde o professor chega e debita a matéria e, de duas uma, ou o aluno tem capacidade de encaixar ou não tem e, se não tem, azar. É um bocado esta a lógica, Sr. Ministro, e não era a esta lógica que gostávamos de regressar.
O mesmo se diga da introdução dos exames, que contam, sobremaneira, para a nota final, em detrimento da avaliação contínua, ou do Estatuto do Aluno, onde reina a punição e a penalização, descartando-se o Ministério da Educação de tomar nota sobre a verdadeira razão pela qual as coisas acontecem, numa lógica preventiva, ou de, no conselho pedagógico, desaparecer a presença dos pais e dos alunos. Qual é a lógica? Por que é que desaparece a lógica participativa de toda a comunidade escolar, já que pais e alunos são parte da comunidade escolar?
Depois, a lógica mais perversa do sistema é a de que estuda, de facto, quem pode, quem tem capacidade económica para o efeito. Esta é, talvez, a lógica mais perversa que o Governo procura escamotear, mas que, de facto, está a introduzir no nosso sistema.
Sr. Ministro, não gostávamos nada de voltar a tempos de antigamente, que nos trazem más memórias e deram más lógicas de aprendizagem.
 
2ª Intervenção
 
Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Ministro: Os Verdes não consideram sério aquilo que o Governo está a fazer relativamente ao número de professores que entende pôr na rua no próximo ano letivo. Os despedimentos são coisas muito sérias, Sr. Ministro! São pessoas que vão ficar sem trabalho! Ainda por cima, são pessoas que fazem falta nas escolas, das quais os alunos precisam, das quais o sistema de ensino precisa, mas porque o objetivo do Governo é um, e só um, e resume-se à tutela do Ministério das Finanças, o Governo entende que vai pôr professores na rua.
O Sr. Ministro parece que brinca um bocadinho com isto, porque todas as bancadas colocaram questões mas, quando chegou à pergunta do CDS, respondeu com aquilo que não ia acontecer. Garante aqui, hoje, o Sr. Ministro que 25 000 professores não vão para a rua, que é um número absolutamente exagerado. Mas se forem 20 000 também é absolutamente exagerado, Sr. Ministro!
Queremos respostas, queremos uma perspetiva do que será o próximo ano letivo e da consequência concreta das medidas que o Governo está a tomar. O Sr. Ministro, sabendo claramente a resposta, não a quer transmitir, e se a não quer transmitir é porque ela é gravosa, mas nós precisamos de perceber a dimensão da gravidade das consequências das políticas que o Governo está a tomar.
De facto, quando falamos com um Ministro que conseguiu reduzir num ano, única e exclusivamente num ano, cerca de 2500 milhões de euros na área da educação, porque não faziam falta… Não faziam falta, Sr. Ministro?! É preciso sobreviver com esta dimensão de corte? Não, não é! Não é, e as nossas crianças e os nossos jovens mereciam um cuidado muito mais especial por parte do Ministério da Educação para o seu futuro e para o futuro e o desenvolvimento do País.
O Sr. Ministro veio falar da autonomia das escolas. Sr. Ministro, até podemos chegar aqui e dizer que os portugueses, hoje, são todos livres, são donos e senhores de uma liberdade que todos conquistámos. Era muito bom que assim fosse, Sr. Ministro, mas há portugueses que vivem sem recursos e, portanto, há portugueses condicionados na sua própria liberdade, o mesmo é dizer que há portugueses que não têm liberdade no nosso País. O mesmo acontece nas escolas, ou seja, não há autonomia nenhuma, porque uma escola sem recursos não tem autonomia de decisão nem de gestão. Esta autonomia significa, pura e simplesmente, que o Ministério da Educação se desresponsabiliza do seu papel de assumir responsabilidades e as passa para as escolas.
E quando falhar — porque tem de falhar, uma escola sem recursos é uma escola que tem, necessariamente, de falhar —, o Ministério da Educação põe-se à parte e diz: «não, a responsabilidade não é minha, a responsabilidade é da escola». É um papel extraordinariamente fácil! Assim, é muito fácil ficar de consciência tranquila, não é, Sr. Ministro da Educação — sendo, de facto, Ministro da Educação, coisa que não me parece que aconteça na verdade…
Depois, o Sr. Ministro vem falar dos alunos, dizendo que quer os alunos com uma participação mais ativa. Não quer nada, Sr. Ministro, senão não os tirava dos conselhos pedagógicos, senão não aumentava o número de alunos por turma.
O aumento do número de alunos por turma pode ter lógica na conceção do Sr. Ministro, mas só naquela lógica de que falei na minha primeira intervenção, ou seja, quando os alunos são recetáculo daquilo que os professores debitam na escola, porque se os professores querem de facto fazer atividades pedagógicas interessantes e práticas com os alunos, o aumento do número de alunos por turma não serve. Não serve! Só serve, de facto, naquela lógica, aqui hoje já tão repetida, do ler, escrever e contar! É mesmo assim, Sr. Ministro!
Para além disto, reduz-se de uma forma absolutamente escandalosa a componente prática do ensino e o próprio ensino artístico. Já lhe referi esta questão uma vez, Sr. Ministro, mas parece que não consegue perceber. Sr. Ministro, será que não consegue encontrar alguma utilidade na educação visual, por exemplo, para a compreensão da matemática? Claro que tem de encontrar! Mas o senhor reduz a componente prática da educação visual, diminui os professores de educação visual, diminui a capacidade de aprendizagem dos alunos no ensino artístico, logo, está a prejudicar também o ensino da matemática. Nada disto é visto assim, nada é visto de uma forma global, nem a educação é vista por este Governo como uma componente necessária da formação integral do indivíduo.
Termino, Sr.ª Presidente, dizendo que reafirmo em absoluto tudo aquilo que disse relativamente ao retrocesso do ensino em Portugal.
Quando o estatuto do aluno se resume à punição, se resume à avaliação e aos exames com uma dimensão absoluta na avaliação final, quando temos uma revisão curricular da qual é arredada nitidamente a componente prática e em que os alunos, repito, são recetáculos de matérias debitadas, isto significa um retrocesso a um passado que não gostaríamos de viver. O Sr. Ministro pode chamar-lhe o que quiser mas, na prática, este País já conheceu essa situação e não quer voltar a conhecê-la, nem quer ter alunos arredados da escola pelo facto de não terem condições económicas.
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