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Intervenções na Ar (Escritas)
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29/11/2012
Declaração política da Deputada Heloísa Apolónia sobre a intenção do Governo de acabar com a Reserva Ecológica Nacional
Intervenção da Deputada Heloísa Apolónia
Declaração política sobre extinção da REN
- Assembleia da República, 29 de Novembro de 2012 –

1ª Intervenção

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Os Verdes, com esta declaração política, pretendem alertar todos os Deputados para uma questão gravíssima, confirmada pela Sr.ª Ministra da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território, que se prende com a extinção da Reserva Ecológica Nacional (REN).
Com efeito, este mês, em entrevista ao jornal Expresso, a Ministra do Ambiente declara que «A REN, por si, irá desaparecer». É a declaração expressa de morte da Reserva Ecológica Nacional.
A REN foi criada, em 1983, com vista à proteção dos recursos naturais, como a água e o solo, para favorecer a conservação da natureza e da biodiversidade e para melhorar a gestão do território. Esta reserva visa contribuir para um contínuo ecológico, para uma interação e para uma coerência ecológicas na rede de preservação e de valorização dos recursos ambientais.
Com efeito, a conservação da natureza não pode ser vista como uma coisa compartimentada, onde os espaços funcionariam com fronteiras estanques. É fundamental dar-lhes continuidade territorial, com diferentes modos de classificação e de proteção em função das características dos próprios espaços.
Ora, a Reserva Ecológica Nacional funciona, juntamente com a Reserva Agrícola Nacional, na base da identificação de locais de significativo valor ecológico e agrícola e atribui-lhes um estatuto de proteção que, pelo menos, não permita que sejam abafados por uma política de betão, sempre apetecível a tantos níveis. É, portanto, de salvaguarda de interesse coletivo que estamos a falar quando falamos da REN.
É bem verdade que o regime jurídico da REN inclui um conjunto de exceções a atividades interditas que tem levado à cedência a muitos interesses de construção e à sua descaraterização. O Partido Ecologista «Os Verdes» tem, ao longo dos tempos, denunciado muitos desses casos, alguns inclusivamente com rótulo de projeto de potencial interesse nacional (PIN) para procurar aligeirar o que não era sequer aceitável. Contudo, esse regime de exceção, aberto por autorizações com elevado grau de subjetividade e de cedências a lobbies, não levará ninguém a pedir que se acabe com a REN, porque se pusermos em dúvida o regime de exceção não estamos a pôr em causa a REN mas justamente os atentados que aquele pode abrir.
Ora, o Governo entende que tudo aquilo que não cabe no regime de exceção se torna, afinal, num impedimento chato, o mesmo é dizer que as restrições de construção, de entrave à fúria do betão e às alterações de uso de solo, que se apresentam com o rótulo de REN, são um obstáculo que deve terminar, o que é perfeitamente inaceitável.
Referiu ainda o Sr. Secretário de Estado do Ambiente e do Ordenamento do Território que não faz sentido haver REN quando outras classificações ambientais se sobrepõem no mesmo espaço. Mas, então, o Partido Ecologista «Os Verdes» chama a atenção para o seguinte: se a REN e a RAN correspondem acerca de 60% do território e a Rede Nacional de Áreas Protegidas a 20% do território, qual é a sobreposição que deixa de acontecer? Isto demonstra que o Governo está a procurar encontrar todos os pretextos sem sentido para justificar o fim de um regime de valorização do território.
Argumenta o Governo, por exemplo, que a REN tem uma carga burocrática inaceitável, designadamente por via da necessidade de solicitação de autorizações a entidades públicas, que deriva do regime jurídico da REN. Isto é gravíssimo, porque acabar com as burocracias não é acabar com os estatutos de proteção; acabar com as burocracias é criar serviços eficazes, é tornar os procedimentos mais rápidos, o que se consegue com uma componente de meios humanos e técnicos adequados à celeridade dos processos. Mas se o Governo esvazia a Administração Pública de trabalhadores, visando agora despedir 50% dos contratados e fazer muitas rescisões ditas amigáveis (leia-se: colocar as pessoas «entre a espada e a parede» para saírem da função púbica), como é que se pode acabar com as burocracias? O que se está a fazer é a promover uma Administração Pública incapaz de responder às necessidades dos cidadãos em todos os serviços públicos, com uma intolerável escassez de profissionais, para os quais será de todo impossível realizar o trabalho diário de dois, três ou quatro trabalhadores. Estas são implicações concretas das decisões do Governo e da troica.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, várias associações de ambiente já manifestaram a sua indignação em relação a esta intenção do Governo de aniquilar o regime da Reserva Ecológica Nacional. O Partido Ecologista «Os Verdes» assume, ao nível parlamentar, uma intervenção consequente e questionará, no próximo dia 11 de dezembro, a Sr.ª Ministra do Ambiente sobre esta matéria. Seremos oposição certeira e sem hesitações a qualquer intenção de matar a REN e contribuiremos para denunciar este atentado de um Governo que nitidamente, já sem qualquer dúvida, torna a proteção ambiental como um obstáculo a todos os interesses que pretende servir, e esses vão estando bem claros à medida que se conhece o âmbito de cada decisão governamental.
O apelo que fazemos é para que os Deputados à Assembleia da República tomem consciência do que está em causa e se juntem rapidamente a esta preocupação e a esta oposição que Os Verdes aqui hoje deixam expressa.

2ª Intervenção

Sr. Presidente, quero agradecer ao Sr. Deputado Paulo Sá, ao Sr. Deputado António Leitão Amaro e ao Sr. Deputado Pedro Farmhouse as considerações e as questões que colocaram.
Gostava de dizer que, de facto, não sei o que é que este Governo tem contra a legislação ambiental, mas percebe-se que quer espremê-la de tal forma de modo a caber tudo num suposto estatuto de proteção que depois se torna na coisa mais frágil do País.
A proposta que o Governo apresentou de Lei de Bases do Ambiente reflete isso mesmo. Ou seja, tornar os pilares do quadro legislativo ambiental tão gerais, tão gerais, que lá cabe tudo e lá não cabe nada, é perigoso.
Julgo que nós, por via dos diferentes setores e das diferentes intenções que os Srs. Membros do Governo vão manifestando, devemos estar muito atentos sobre, talvez, uma importância ainda mais relevante do que a que atribuímos no início relativamente ao processo de Lei de Bases do Ambiente.
Por outro lado, quero dizer o seguinte: choca alguma coisa que uma determinada parte do País esteja dentro de uma área protegida, seja REN e seja Rede Natura 2000 do País? Isto choca alguém? Ou seja, choca alguém ter diferentes estatutos de proteção? É porque inclui valores de tal ordem que há uma determinada área que congrega vários estatutos de proteção. Qual é o problema? É assim uma coisa tão dramática?
O problema é os senhores dizerem que se sobrepõe e depois há áreas que não se sobrepõem em absolutamente nada; há áreas que vão ficar completamente vazias, porque este é um estatuto de proteção que vai remeter para a Lei da Água, para a Lei dos Solos, havendo áreas do País que vão deixar de ter estatuto de proteção, em que entram os privados e constroem o que quiserem.
Sr. Deputado, aquilo que hoje, na REN, está sujeito a autorização, o Governo não quer que esteja sujeito a autorização e passa a estar sujeito a uma mera comunicação. Isto não é normal, porque, à partida, os valores da área não se deviam ter alterado, não é verdade? Ou seja, aquilo que queremos preservar continua lá, mas tudo vai ficar fragilizado.
Isto demonstra, claramente, uma nítida desresponsabilização do Estado. Primeiro, porque se trata de uma entrega e de uma cedência clara, também no quadro legislativo, a interesses privados, a quem este Governo quer dar de bandeja — e não há dúvida absolutamente nenhuma sobre os diferentes setores que tem anunciado — e uma clara desresponsabilização do Estado que se nota em tudo quanto é área do ambiente, designadamente numa coisa fulcral para os estatutos de proteção dos nossos espaços com grande valor ecológico, que tem a ver com a questão da fiscalização! É perfeitamente absurdo o desinvestimento que se tem feito nesta área, porque, afinal de contas, temos estatutos de proteção no papel, os quais ainda queremos diminuir mais e, na prática, não temos absolutamente nada. A política do Governo vai justamente contra qualquer estatuto de proteção, e é isto que não conseguimos aceitar.
Por outro lado, é uma coisa muito esquisita o não envolvimento dos interessados, daqueles que todos os dias trabalham no terreno nestes estatutos de proteção, na valorização destes mesmos estatutos, designadamente associações ambientais, que não são chamadas a pronunciarem-se sobre uma intenção de alteração de um regime desta natureza! Mas este Governo é esquisito!
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