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Intervenções na Ar (Escritas)
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24/01/2013
Declaração política da Deputada Heloísa Apolónia sobre intempéries e apoios decorrentes
Declaração política da Deputada Heloísa Apolónia sobre intempéries e apoios decorrentes
Assembleia da República, 24 de janeiro de 2013

Senhora Presidente,
Senhoras e Senhores Deputados,

O PEV tem chamado a atenção, aqui no Parlamento, por inúmeras vezes, para os efeitos já mais que visíveis e sentidos decorrentes das alterações climáticas, que perspetivam uma tendência para fenómenos intensos e de extremos climáticos. O país foi, nos últimos dias, fustigado por profundas intempéries, com um episódio climático extremo, ocorrido entre sexta e sábado, que pôs uma vasta extensão do território a viver de ventos fortes, que chegaram a atingir os 140 quilómetros por hora, e chuvas intensas.

Daqui decorreram consequências muito sérias e preocupantes, como a devastação de explorações agrícolas, o corte de eletricidade e de água a milhares de pessoas, algumas por dias seguidos, a degradação de equipamentos coletivos e de património cultural e natural (como aconteceu com escolas, piscinas municipais, monumentos, centros históricos, matas como a do Buçaco...), árvores arrancadas pela raiz, bloqueio da circulação de transportes, entre tantas outras consequências concretas, a maior das quais, sempre revoltante, que é a que se prende com a própria vida e com a integridade física.

A primeira nota que o PEV gostaria de deixar, a este propósito, é que Portugal precisa de promover uma adaptação mais eficaz (ainda que com óbvia impossibilidade de controlar tudo e todos) a estes fenómenos metereológicos extremos. A capacidade de adaptação tanto se refere a mecanismos de prevenção de consequências mais devastadoras, como a uma capacidade de dar resposta à regularização das situações de destruição.

A segunda nota prende-se com o facto de haver uma necessidade absoluta de que a dimensão do fenómeno natural não transporte consigo uma inevitável tragédia social. E é justamente isso que ameaça acontecer, designadamente no que diz respeito aos pequenos e médios agricultores.

Com efeito, a devastação de instalações, equipamentos e explorações agrícolas, decorrente da forte intempérie, pôs em risco imediato a capacidade de sobrevivência de agricultores e suas famílias, bem como uma parte importante da capacidade produtiva do pais. Estamos, portanto, a falar de pessoas que, de repente, se vêem sem nada do tanto que construíram com o seu trabalho. Os prejuízos são muito elevados, pese embora ainda não completamente contabilizados. A questão está em saber, quem assume esses prejuízos?

Veio a senhora Ministra da Agricultura anunciar que os agricultores prejudicados se podem candidatar a verbas do Programa de Desenvolvimento Rural (PRODER), com um financiamento garantido de 75%, sendo que os restantes 25% ficariam a cargo dos agricultores. A questão é que há pequenos agricultores que perderam tudo! Tudo, no presente e no futuro imediato, porque perdem o rendimento decorrente do potencial produtivo das suas explorações! Não têm como gerar o encargo de pagar 25% das verbas necessárias a um investimento de reparação ou cobertura dos prejuízos. Oferecer-lhes 75%, sabendo que não têm forma de pagar os restantes 25% é o mesmo que lhes dizer que perderam tudo e é sem nada que vão ficar! Ainda por cima, quando são estes pequenos agricultores que mais têm dificuldade de acesso ao crédito. Para os grandes proprietários agrícolas a conversa é bem diferente, porque podem pagar. Ora, face a esta situação, é preciso atribuir ajuda criteriosa e positivamente discriminada na medida das necessidades reais de cada um e há pequenos agricultores que precisarão de uma percentagem muito maior, ou até total, a fundo perdido. E, claro, se em Portugal existisse um seguro agrícola de gestão pública, muito seria diferente, no que respeita à reparação de danos. Não tenham dúvidas, Senhoras e Senhores Deputados, que se o PRODER for o único mecanismo de ajuda, tal como anunciado pela Senhora Ministra, são as grandes explorações que vão absorver praticamente tudo e há muitos pequenos agricultores que engrossarão os níveis de desemprego ou de maior pobreza. Essa situação tem que ser evitada, a todo o custo!

Senhora Presidente,
Senhoras e Senhores Deputados,

Em Portugal temos exemplos de gritante injustiça na disponibilização de apoios, ou na falta dessa disponibilização. O PEV esteve há pouco tempo em visita à costa norte da ilha da Madeira. Os concelhos do Porto Moniz e S. Vicente, fundamentalmente nas freguesias da Ribeira da Janela e do Seixal, foram completamente fustigados pela intempérie de Novembro de 2012. O cenário é, passado este tempo, dantesco: casas quase suspensas, pedregulhos praticamente soltos (em risco de se soltarem encosta abaixo), levadas obstruídas, terras e socalcos agrícolas literalmente destruídos. Neste cenário, as populações transmitiram aos Verdes o medo com que vivem dia a dia, decorrente da instabilidade daquele território, navegam em ausência de segurança, questão que até promove o afastamento de turistas, e perderam meios de subsistência, designadamente na agricultura – são fontes de empobrecimento económico, social e ambiental daquela área geográfica. Nada foi feito para reparação de danos, a não ser a desobstrução de estradas. Nada mais!

É território e são populações completamente abandonadas, quer pelo Governo Regional quer pelo Governo de Portugal, que não prestou meios de apoio e consequentemente nenhuma solidariedade com estas gentes desarmadas de segurança e de formas de subsistência em Novembro do ano passado. Se a Lei de meios dotou a Madeira de um financiamento destinado a cobrir e a reparar prejuízos causados pelo drama do 20 de Fevereiro, e se essas verbas estão a ser mal usadas, para intervenções duvidosas e até que podem comportar risco de segurança, então o que se requer é fiscalização e garantia de que os fundos são usados para destinos sustentáveis e positivos. Mas abandonar o princípio da solidariedade e do auxílio às populações não é solução!

O que os Verdes requerem com esta intervenção é responsabilidade, competência e pronta ação ao Governo de um país que conhece, já vezes de mais, os fenómenos climáticos extremos, as vulnerabilidades do território e as suas dramáticas consequências ambientais, económicas e sociais.

2ª intervenção

Sr.ª Presidente, queria agradecer aos Srs. Deputados Miguel Freitas e Pedro Lynce as considerações que fizeram e as questões que colocaram.

O Sr. Deputado Miguel Freitas disse que o Governo não convenceu. De facto, mais do que não convencer — e essa é que é a grande preocupação —, não promoveu uma solução para a situação em que se encontram uma série de pessoas, cujas vidas estão perfeitamente desgraçadas, e, fundamentalmente, era essa resposta que urgia obter da parte do Governo.

Disse o Sr. Deputado Pedro Lynce: «O Governo esteve muito bem, porque imediatamente se pôs no terreno». Sr. Deputado, acho isso muito bem, e seria criticável se o Governo não se tivesse posto no terreno, mas só a presença não resolve os problemas, pois as medidas restringiram-se a aconselhar os agricultores a candidatarem-se ao PRODER para obterem um financiamento de 75%, mas eles têm de pagar os restantes 25%.

Sr. Deputado, o que procurei dizer foi que há agricultores que não têm possibilidade de pagar esses 25%. Portanto, não tendo essa possibilidade, não terão direito a apoio, e há pequenos agricultores que precisam de 100% de apoio a fundo perdido!

É por isso que propomos que haja uma diferenciação de apoios, uma discriminação positiva, um apoio criterioso em função das verdadeiras necessidades e condições económicas dos agricultores, senão teremos ainda mais agricultores portugueses — que são aqueles que mais empobrecem na Europa — a empobrecerem e a largarem a agricultura. Sr. Deputado, de facto, esse não é o caminho!

Estes casos são extraordinários, não acontecem, felizmente, todos os dias e requerem também respostas extraordinárias. E o País tem de estar capacitado para dar essas respostas.

Os Srs. Deputados falaram também da questão dos seguros, se não estou em erro. Sobre isso, queria dizer o seguinte: de facto, Sr. Deputado Pedro Lynce, «esta coisa» dos seguros não funciona. Estamos a falar de um negócio. Os seguros cobrem o menos possível, dão o menos possível, e as pessoas pagam bem para terem os seguros! É por isso que, ao nível agrícola, precisamos de ponderar muito bem a criação de um seguro agrícola de gestão pública de modo a que as pessoas possam contribuir com a plena lógica de que não estão a criar lucros para ninguém, estão antes a garantir que, em caso de calamidade, têm o apoio necessário! É uma discussão à qual não podemos fugir e é uma proposta concreta que Os Verdes aqui fazem.

Por último, no que respeita às alterações climáticas, o Sr. Deputado Pedro Lynce disse que estamos no bom caminho. Isso é relativo, porque baixámos as emissões à custa da falta de produção e gostávamos mais que isso tivesse acontecido à custa da sustentabilidade, pois seria melhor.

Mas, agora, vamos falar da componente da adaptação. Aí é que nós andamos mal, Sr. Deputado. Precisamos, de facto, de medidas de adaptação ao fenómeno das alterações climáticas, o qual já nos garantiu que nos traz fenómenos climáticos extremos.

3ª intervenção

Sr.ª Presidente, queria começar por agradecer aos Srs. Deputados João Ramos e Abel Baptista as considerações que fizeram e as questões que colocaram.

Começo por responder à questão colocada pelo Sr. Deputado João Ramos sobre se julgo que os agricultores podem ficar descansados relativamente àquilo de que já tivemos conhecimento. A resposta direta que tenho de dar é não, não podem ficar descansados, Sr. Deputado. E julgo que os agricultores que tiveram a oportunidade de ouvir agora, em direto, a intervenção do Sr. Deputado Abel Baptista perceberam claramente que não podem ficar descansados.

Curiosamente, o Sr. Deputado Abel Baptista, para além daquilo que a Sr.ª Ministra da Agricultura já tinha dito relativamente ao PRODER, referiu o seguinte: «Mas há mais alguns fundos, algumas linhas de crédito que podem (…)» — atenção, podem! — «(…) ser usadas para isso».

Mas, depois, o Sr. Deputado disse: «75% já é muito bom, nem um ótimo seguro faria melhor». É a lei do mercado, não é verdade, Sr. Deputado?

Isto não pode ser encarado assim, Sr. Deputado. E o que lhe quero dizer hoje, no Plenário da Assembleia da República, é o seguinte: se o financiamento for exclusivamente de 75%, há agricultores que não conseguem pôr as suas explorações agrícolas a funcionar novamente, ou seja, desistem! Não têm outra hipótese.

Contudo, posso garantir-lhe outra coisa: há grandes explorações agrícolas que vão aproveitar os fundos do PRODER e das linhas de crédito. Ou seja, há realidades distintas, Sr. Deputado, e nós temos que ter aqui o sentido da discriminação positiva de definir apoios criteriosos em função da realidade concreta das pessoas. Isso dá trabalho? Dá, Sr. Deputado! Gasta-se dinheiro? Gasta-se, Sr. Deputado! Mas esse é o princípio da solidariedade. E, mais: é o princípio para a não perda de atividade produtiva do País, que é uma coisa fundamental, especialmente neste momento! Portanto, devemos ter isso em conta.

Por outro lado, voltamos à questão dos seguros, relativamente à qual cada um deu a sua opinião. Reafirmamos, aqui, a nossa proposta: esta Casa tem de se debruçar seriamente sobre a criação de um seguro agrícola de gestão pública, para que estes dinheiros, aquilo que os agricultores pagam ao nível dos seguros, não sirvam para pagar os lucros das seguradoras, que depois não pagam absolutamente nada quando há danos, que sirva, de facto, para a reparação e a cobertura de prejuízos, tal qual um seguro deve funcionar.

De facto, andamos aqui todos a dizer — todos o dissemos! — que os seguros não funcionam! Mas, das duas, uma: ou desabafamos e vamos para casa descansados, coisa que eu e o meu grupo parlamentar não fazemos, ou então tomamos medidas na Assembleia da República para que este seguro funcione a sério. E no atual sistema não funciona!
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