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Intervenções na Ar (Escritas)
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10/04/2013
Declaração política sobre a decisão do Tribunal Constitucional de considerar inconstitucionais algumas normas do Orçamento de Estado para 2013
Intervenção da Deputada Heloísa Apolónia
Declaração política sobre a decisão do Tribunal Constitucional de considerar inconstitucionais algumas normas do Orçamento de Estado para 2013
- Assembleia da República, 10 de Abril de 2013 –

1ª Intervenção

Sr. ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Depois da decisão do Tribunal Constitucional, a obrigação do Governo era pedir demissão. Um Governo que não conseguiu apresentar nenhum Orçamento do Estado que não fira a Constituição da República Portuguesa é um Governo perigoso, porque desafia recorrentemente a peça legislativa que mais suporta o regime democrático.
E um Governo que não tem alternativa ao cataclismo social e económico que provoca, porque as causas do cataclismo só consegue substituí-las por mais causas de cataclismo, é um Governo perigoso, porque demonstra uma obsessão com o caminho que insiste em percorrer, mesmo que mais que demonstrado que é de um insucesso atroz.
Enquanto se aguardava pela decisão do Tribunal Constitucional, a postura do Governo e da maioria parlamentar foi vergonhosa. A pressão exercida para que nada nem ninguém estragasse o caminho solitário do Governo e da troica foi inaudita.
O Primeiro-Ministro achava que o Tribunal tinha de decidir não em função das normas constitucionais, mas do impacto da sua decisão para a estratégia do Governo.
A bancada parlamentar do PSD achava que o Tribunal Constitucional tinha que decidir em função do contexto financeiro, do Memorando da troica, do direito europeu e, por último, do direito nacional, como se a Constituição não fosse para aqui chamada.
Já antes o Vice-Presidente do PSD achava que quem tinha pedido fiscalização da constitucionalidade é que tinha de apresentar alternativas em caso de chumbo pelo Tribunal Constitucional, só considerando alternativas, claro está, medidas de que o Governo gostasse.
Estas posturas desesperantes são bem demonstrativas da forma de agir desta maioria PSD/CDS, do profundo desrespeito que acarretam e da arrogância que transportam.
Como se isso não bastasse, depois da declaração de inconstitucionalidade de quatro normas do Orçamento do Estado para 2013, o Primeiro-Ministro reagiu com a abertura de uma crise institucional absolutamente incompreensível e inaceitável ao responsabilizar o Tribunal Constitucional por estragar as opções políticas do Governo.
O Governo tem todo o direito de discordar da decisão do Tribunal Constitucional, mas não tem o direito de responsabilizar o Tribunal Constitucional pelo falhanço das políticas, da desorientação e da incompetência do próprio Governo.
Entretanto, o espírito de vingança assolou o Governo. Primeiro, Passos Coelho garante que não larga o cargo, ou seja, estão nitidamente apegados ao poder! Depois, o Primeiro-Ministro reage, garantindo ao País que se não vai pela via chumbada pelo Tribunal Constitucional, ou seja, pelo corte nos subsídios de férias e pelo corte nos subsídios de doença e de desemprego, vai pelo corte, ainda mais radical, nas funções sociais do Estado, nas áreas da saúde, da educação, da segurança social e das empresas públicas.
Esta postura do Governo é dramática! Parece dizer que se os portugueses não são castigados de uma maneira serão de outra, mas que serão castigados, serão! Cortar o que o Primeiro-Ministro refere é ameaçar despedimentos maiores e diretos na função pública, o que, para além do drama que representa intensificar o número de portugueses em situação de desemprego, representa a criação de condições para desfigurar e aniquilar o funcionamento de serviços públicos e pode representar também o aumento dos custos desses serviços para as famílias, levando a que mais pessoas, por incapacidade económica, deixem de ter acesso aos cuidados de saúde, à educação ou a prestações sociais determinantes para aligeirar os índices de pobreza galopante.
O que o Primeiro-Ministro promete é mais pobreza para os portugueses, o mesmo Primeiro-Ministro que veio, no último debate quinzenal, insinuar a Os Verdes e ao País que não há fome em Portugal, que fome havia lá pelo ano de 1983. Trata-se de um Governo absoluta e dramaticamente divorciado da realidade!
Nesta sequência, Vítor Gaspar não perdeu tempo e já determinou para os serviços do setor público administrativo, da administração central e da segurança social a proibição de assumirem novos compromissos de despesa, incluindo coisas tão básicas e imprescindíveis ao funcionamento de qualquer serviço público como material técnico e de funcionamento dos serviços, material de higiene ou material de limpeza.
Dá a sensação que o Governo está numa postura mais ou menos deste género: «Não deixam fazer o que queremos?! Então, tomem lá com outra dose de mais algumas barbaridades, até caricatas!» Isto é revoltante!
A troica volta em breves dias a Portugal, numa deslocação a que chamam de intercalar. Chame-se-lhe o que se quiser, mas esta é a oportunidade para, sentados à mesa, perante a realidade concreta portuguesa, dizer a esses senhores que o País não tem condições de suportar as consequências das opções políticas traçadas e da brutal austeridade desenhada. É a oportunidade para afirmar a esses senhores que precisamos de renegociar os termos da nossa dívida e que, sem essa renegociação, Portugal continuará a afundar!
Numa altura em que a Alemanha, aquela que, em tempos, conseguiu renegociar pagamento de dívida em função de índices de exportação, consegue colocar dívida no mercado a uma taxa de juro de — imagine-se! — quase 0%, quando Portugal paga 3%, 4%, 5% e 6%, é tempo de denunciar a brutalidade do jogo de especulação financeira à custa da miséria dos povos!

Portugal gasta qualquer coisa como 7000 milhões de euros com juros por ano. Esse montante tem que diminuir significativamente para Portugal ganhar fôlego para a sua dinamização económica, o mesmo é dizer para ganhar capacidade de gerar riqueza e, logo, capacidade de pagamento da sua dívida.
Esta é a solução imediata de que o País precisa! Mas para a conseguir era determinante a demissão do Governo, porque o Governo provou ser o maior entrave à sustentabilidade do País, um País, ainda por cima, com ausência da determinação que se requeria a um Presidente da República. Um Presidente da República que pactua incondicionalmente com a incompetência do Governo.
Sr.as e Srs. Deputados, neste País acontece e vê-se de tudo.
Quero, em nome de Os Verdes, dizer que o ainda Sr. Ministro Miguel Relvas está para o Governo como o Governo está para os portugueses, ou seja, ainda lá está, mas sem qualquer legitimidade.

2ª Intervenção

Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Idália Salvador Serrão, agradeço as considerações que fez e as questões que colocou. E respondo-lhe muito diretamente: sim, acho muito estranho, e não devo ser só eu e a Sr.ª Deputada. Os portugueses devem achar muito estranho este silenciamento do CDS-PP.
Com efeito, já aqui foram produzidas três declarações políticas sobre uma matéria relevantíssima para o País neste momento e o CDS ainda não abriu a boca para questionar nada! E nem precisava de questionar, bastava fazer alguns comentários para que se pudesse perceber alguma coisa do seu raciocínio sobre esta matéria.
Há pouco, também tive a informação da Mesa que o CDS não está inscrito para uma declaração política, portanto, eventualmente, não falará nada. E, às vezes, os silêncios são de ouro, não é verdade, Srs. Deputados?
Os silêncios também podem ser sujeitos a interpretação política e o CDS, Sr.ª Deputada, está nitidamente a seguir a sua estratégia. Mas dá uma confirmação ao País, a de que isto não está nada bem, porque se estivesse bem o CDS levantaria a sua voz em defesa do Governo. Não está, e o CDS quer colocar-se a um cantinho para ver como é que vai beneficiar, depois, eleitoralmente nesta matéria. Mas deixemos essas estratégias e esses estratagemas para a coligação, pois o PSD não deve andar nada satisfeito.
Sobre a outra questão que a Sr.ª Deputada colocou, gostaria de dizer o seguinte: o pior que pode haver para um país é um governo obcecado, porque um governo obcecado, numa determinada estratégia, perde facilmente o rumo de orientação relativamente à realidade concreta do país.
Tal como referi na minha intervenção, fiquei absolutamente chocada quando o Sr. Primeiro-Ministro, no debate quinzenal — e, na altura, já não tinha tempo para retorquir —, veio insinuar ao Plenário da Assembleia da República que não há, praticamente, fome em Portugal. Ou seja, o Primeiro-Ministro perdeu completamente a consciência das consequências concretas das suas políticas sobre os portugueses, e isto é absolutamente dramático! Quando um governo perde a noção da realidade é dramático.
Em relação ao despacho do Sr. Ministro de Estado e das Finanças, a Sr.ª Deputada tem toda a razão. Aliás, já vieram uma série de instituições públicas reclamar e «pôr as mãos à cabeça» a tentar perceber o que vai acontecer daqui para a frente, nos próximos dias, não é nos próximos meses nem nos próximos anos.
Há universidades que podem deixar de ter capacidade de dar alimentação aos seus estudantes, podem deixar de ter capacidade de pôr os seus estudantes a praticar nos laboratórios; há unidades de saúde que podem ficar em risco e isto é «de levar as mãos à cabeça»!
Na verdade, o Sr. Ministro de Estado e das Finanças tinha obrigação de já ter vindo explicar ao País o que é que queria, de facto, com aquele miserável despacho.
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