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03/04/2009
Interpelação ao Governo - AVALIAÇÃO DE POLÍTICA DE EDUCAÇÃO E DEFESA DA ESCOLA PÚBLICA - Intervenção de Abertura
AVALIAÇÃO DE POLÍTICA DE EDUCAÇÃO E DEFESA DA ESCOLA PÚBLICA
Deputado Francisco Madeira Lopes
2 de Abril de 2009
 
 
 
 
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sras. e Srs. Deputados,
 
A Educação constitui um dos principais pilares da nossa Democracia social e um dos mais importantes objectivos sociais a prosseguir pelo Estado, configurada pela Constituição da República Portuguesa como condição essencial para prosseguir a igualdade de oportunidades, a superação das desigualdades económicas, sociais e culturais, o desenvolvimento da personalidade e do espírito de tolerância, de compreensão mútua, de solidariedade e de responsabilidade, para o progresso social e para a participação democrática na vida colectiva.

A Constituição prevê, por isso, que incumbe ao Estado assegurar o ensino básico universal, obrigatório, público, inclusivo e gratuito, garantindo a todos a igualdade no acesso e condições de sucesso nas aprendizagens que serão determinantes, a nível pessoal pelo pleno desenvolvimento das capacidades e potencialidades do indivíduo, e a nível colectivo, pelo progresso colectivo na construção de uma sociedade mais equilibrada, sustentável, justa e solidária.

O Partido Ecologista “Os Verdes”, enquanto força política de esquerda e como projecto de transformação progressista da sociedade, sempre considerou a Educação como fundamental. Aliás, a defesa da Escola Pública, a par de outros pilares do nosso Estado de Direito Social, sempre fez parte do património da Esquerda em Portugal.

Infelizmente, o Partido Socialista decidiu, ao longo da actual Legislatura, ao longo destes últimos 4 anos, hipotecar esse Património de Esquerda. Decidiu seguir o rumo da Direita, do Neoliberalismo, da obsessão pelo défice, implementando um conjunto de reformas na Educação que constituíram um verdadeiro atentado à Escola Pública. Em nome do economicismo, da tecnocracia e da governamentalização, munidos das armas da mentira, do embuste, da chantagem e da ameaça, investindo muito, sim, mas nas acções de propaganda e no foguetório, o PS escolheu o seu rumo. Semeou ventos e colheu tempestades. Continua a semear a instabilidade, o desinvestimento, o confronto, a falta de respeito nas Escolas para colher no futuro a privatização do ensino.
Sr. Presidente, Srs. Deputados,
Foi na primeira Maioria Absoluta da história do PS em Portugal que este bem demonstrou o seu verdadeiro rosto e as suas prioridades: governar respeitando e apoiando os grandes interesses económicos e financeiros instalados e atacando o papel Social do Estado de garante do interesse público, dos serviços públicos, das conquistas sociais de Abril e da Democracia.

Depois de 4 anos de políticas e reformas de direita do PS será que a Escola Pública está melhor, está mais forte, mais capaz, mais apta a responder à missão que lhe cabe? Infelizmente temos que dizer que não está.

À custa de muita propaganda o Governo quer fazer o país crer que sim. À custa das operações publicitárias de entregas de computadores e de quadros interactivos, anúncios de inaugurações e promessas de investimentos quer fazer crer que sim e quer, acima de tudo, fazer esquecer e desviar as atenções do que não fez, do que adiou e dos retrocessos que impôs.

Da forma como conduziram a, efectivamente necessária, há demasiados anos necessária, Requalificação do Parque Escolar, andando agora o Governo pelo país a anunciar a construção de Centros Escolares. Contudo, o que não dizem é que a construção dos Centros Escolares aparece agora anunciada depois de, primeiro, terem encerrado cerca de 2500 escolas do primeiro ciclo, roubando a escola como serviço público a muitas localidades do nosso país, com critérios de regra e esquadro, sem ter em conta as especificidades e contextos geográficos locais. Até 2010 serão 4500 escolas que encerram. Ou seja, primeiro o Governo encerra, sem que existissem, como ainda não existem, condições em grande parte das ditas escolas de acolhimento, em muitos casos muito pouco acolhedoras, e até em piores condições físicas do que as escolas encerradas, sem espaço nem condições, sem as prévias obras de adaptação necessárias, recorrendo-se à imaginação e desenrascanço onde faltam os meios e a pouca vergonha, dando aulas em cineteatros ou por cima de uma capela mortuária, encerrando os alunos como carga pronta metida em contentores de ferro, a fazerem as vezes de salas de aula ou cantinas.

Enchem a boca com as maravilhas da escola a tempo inteiro e das Actividades de Enriquecimento Curricular. E contudo, recusam-se a reconhecer que a retirada de direitos aos trabalhadores, a precarização dos vínculos laborais e a dita flexibilização ou desregulamentação dos tempos de trabalho promovida pelo Código de Trabalho Bagão Félix / Vieira da Silva, contribuiu decisivamente para tornar as famílias e os pais cada vez mais indisponíveis para passar tempo de qualidade com os seus filhos e para cumprir uma tarefa que a si só compete e escola nenhuma pode substituir; recusam-se a reconhecer que o crescimento e a aprendizagem são processos de descoberta que não prescindem da liberdade e de tempos verdadeiramente livres e são incompatíveis com a sua institucionalização, por vezes num mesmo espaço, num horário das nove às cinco; recusam-se a reconhecer que a educação física e o ensino das expressões artísticas há décadas que fazem parte dos curricula das escolas e que a sua implementação, conjuntamente com o inglês, em tempos supostamente extra-curriculares ou de dito enriquecimento curricular, constituiu uma menorização dessas actividades o que permitiu uma desqualificação a vários níveis dos profissionais que foram chamados a leccioná-las. O Governo recusa-se a perceber que, para responder a reais necessidades sociais das famílias está a exigir à escola sem lhe dar as condições e que o que os alunos precisam não é de mais escola mas sim de melhor escola. A escola pública não pode ser um armazém de crianças.

Gabam-se de promover maior autonomia para as escolas, e no entanto, o novo regime de Gestão e autonomia das escolas mais não veio fazer do que roubar a autonomia às escolas e tentar governamentalizá-las impondo-lhes o modelo do Director unipessoal e todo poderoso dentro da escola ou agrupamento, que designa os coordenadores pedagógicos intermédios, mas está hierárquica e directamente dependente da tutela, criando assim uma correia de transmissão directa e a obrigatoriedade de cumprir as suas instruções, vindo ainda a desvalorizar o Conselho Pedagógico tendo representado claramente um passo atrás e um retrocesso na vivência democrática das escolas com o fim da eleição directa dos órgãos de gestão.

Ufanam-se com um Novo Estatuto do Aluno que, para além de apresentar uma visão enviesada da escola tratando as faltas disciplinares dos alunos quase como se de ilícitos criminais se tratassem, se mostra vergonhosa e inexplicavelmente incapaz de distinguir entre as faltas dadas por motivo de doença das dadas sem qualquer justificação plausível, que recorre ao artifício duma prova para disfarçar o absentismo, produzindo até resultados estatísticos fantasiosos como aqueles de que o Sr. Primeiro-Ministro esta semana se vangloriava, invocando 22% de redução nas faltas no primeiro trimestre deste ano lectivo no 3º ciclo no básico e no secundário, atribuindo esse resultado às alterações do Estatuto do Aluno. Ignorará ou fingirá ignorar o Sr. Primeiro Ministro e a Sra. Ministra da Educação que para esses 22% concorre determinantemente o facto de, cada vez que um aluno ultrapassa as faltas admitidas e realiza a famigerada prova (havendo até casos de alunos que já o fizeram duas e três vezes), fica como se nunca tivesse dado qualquer falta, apagando-se e escondendo-se assim, por via administrativa, a verdadeira realidade do absentismo na Escola Pública?

Em boa verdade, nada disso interessa ou preocupa este Governo. Não lhes interessa, ou pelo menos não lhes parecem interessar, os reais problemas ou a real situação da qualidade do ensino na Escola Pública Nacional. O que lhes interessa, e é para isso que Governam, é o efeito estatístico, são os resultados a curto prazo para encher as parangonas dos jornais e cantar vitória antes que a derrota seja perceptível. Estão mais preocupados em distorcer a realidade em números para que esta pareça responder, obediente e previsível, às clarividentes reformas do Governo, do que em falar verdade e responder à realidade da Escola Pública que clama por outra política.

Uma política que reconheça que por mais tecnologia que se despeje dentro da sala de aula esta será inútil podendo até ser contraproducente se não for devidamente contextualizada e integrada nos projectos curriculares das turmas e educativos das escolas, se não for dada formação prévia aos professores e se não forem estabelecidas orientações. É legítimo questionar as prioridades de investimento na Escola Pública, a propósito dum processo em que os tristes episódios da entrega de computadores que a seguir se retiram das mãos e sob os olhares atónitos das crianças incapazes de alcançar os valores que falaram mais alto do que o respeito que lhes era devido, ou das insidiosas gralhas que foram descobertas, até agora, em quatro dos conteúdos informáticos dos Magalhães, foram apenas a espuma superficial de algo cujo balanço final ainda ficará por fazer.

Porque de facto as políticas de educação não produzem resultados, pelo menos resultados confiáveis, a curto prazo como o Governo pretende forçando tudo e todos pela obtenção desses resultados, exigindo-os mesmo que tal signifique sacrificar a estabilidade na Escola e o aproveitamento e sucesso escolares futuros. Antes requerem ponderação, bom senso, humildade e capacidade democrática de diálogo que é um dos défices mais graves deste Governo.

Um Governo, ainda por cima um Governo que se pretende de esquerda, que conduziu a quase totalidade das suas reformas acossando os docentes, atacando-os, diminuindo-os, desrespeitando-os, culpabilizando-os e ameaçando-os, fazendo dos processos negociais, designadamente no que toca ao Estatuto da Carreira Docente e à Avaliação de Desempenho Docente, uma farsa trágica, motivado no seu agir apenas por razões economicistas, para cortar nos empregos como faz com este novo concurso nacional, nos salários e direitos dos professores, afogando-os em legislação e burocracia, desviando-os da tarefa de ensinar, relegando para último plano as preocupações pedagógicas e a real qualidade do ensino é um Governo condenado a fracassar.

E o problema é que esse fracasso não se limitará a ficar com o Governo. Infelizmente, e o mais grave é que este fracasso vai-se reflectir no futuro do país, no futuro das nossas crianças e jovens, os cidadãos de amanhã, pelas deficiências, erros e malformações que induziu no sistema educativo pelo ataque que perpetrou à Escola Pública e que hoje, neste curtíssimo, francamente desolador e preocupante balanço que “Os Verdes” fazem destes 4 anos, tem que ser denunciado.

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