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Intervenções na Ar (Escritas)
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21/02/2013
Interpelação n.º 9/XII do PEV — Sobre funções sociais do Estado (intervenção do deputado José Luís Ferreira)
Intervenção do Deputado José Luís Ferreira
Interpelação n.º 9/XII (2.ª) do PEV — Sobre funções sociais do Estado
- Assembleia da República, 21 de Fevereiro de 2013 –

1ª Intervenção

Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Ministro da Educação, ouvi-o com toda a atenção, mas confesso que não percebi a que País se referia. Porém, de uma coisa sei: não se referia ao nosso Pais, porque aquilo que vemos e sentimos no dia-a-dia não tem nada ver com o que o Sr. Ministro disse da tribuna. O que vemos é um brutal desinvestimento na educação em Portugal por parte do Governo PSD/CDS. Portanto, aquilo que o Governo do qual o Sr. Ministro faz parte está a fazer é a destruir a escola pública, é a hipotecar o futuro dos portugueses e a hipotecar também a capacidade do País para crescer e para se desenvolver.
A despesa pública com a educação tem vindo a diminuir em Portugal de forma assustadora, enquanto a despesa privada das famílias tem vindo a aumentar, o que é grave sobretudo se tivermos em conta aquilo que o Governo está a fazer às famílias portuguesas, aquilo que o Governo está a fazer aos portugueses, porque levou-lhes o subsídio de férias, levou-lhes o 13.º mês, diminui-lhes os salários, aumentou-lhes os impostos e ainda estão a pagar mais com a educação.
Só nos anos de 2011 e de 2012, o Governo cortou na despesa pública com a educação quase 2000 milhões de euros, mais ou menos o orçamento de todo o ensino superior em 2010. Isto, naturalmente, coloca em causa o desenvolvimento do País. E o Orçamento do Estado para 2013 é ainda inferior ao de 2012 em quase 700 milhões de euros.
Naturalmente que estas verbas estão a comprometer a escola pública e a deixar-nos cada vez mais distantes da desejável democratização do conhecimento e do ensino, que não sei se dizem muito ao Sr. Ministro.
Quando olhamos para o programa do FMI que, no fundo, visa destruir a escola pública — mas também a encomenda foi feita à entidade competente para o efeito! — o que vemos como principais medidas desse relatório é um ataque cerrado aos professores e aos auxiliares de educação.
Segundo o FMI, o sistema educacional português tem excesso de pessoal e é relativamente ineficiente pelos padrões internacionais: 50 a 60 000 trabalhadores teriam de ser despedidos.
Sr. Ministro, considera que há excesso de pessoal na área da educação? Há excesso de professores? Há excesso de auxiliares de educação?
O FMI entende que devíamos ter um ensino mais flexível para limitar o papel do Estado como fornecedor de serviços de educação, ou seja, privatizar o ensino. Gostava de saber se o Sr. Ministro também concorda que o caminho, a solução, é privatizar o ensino.
Nós gostaríamos de sair daqui com algumas certezas e com algumas respostas do Sr. Ministro.
O Sr. Ministro está em condições de nos garantir que não vai haver despedimentos na área da educação? De que não vai haver pessoas da área da educação que vão passar para a mobilidade especial?
O Sr. Ministro das Finanças também disse que ia haver um aumento de horários para todos os funcionários públicos. Esse aumento também se vai aplicar aos professores?

2ª Intervenção

Sr.ª Presidente, antes de mais, quero dizer ao Sr. Deputado Duarte Filipe Marques que quem o ouvir falar até pensa que, certamente,… Não, não! É um comentário! Estão previstos!
Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: As políticas de austeridade do Governo PSD/CDS-PP estão a colocar em causa as funções sociais do Estado.
Depois de proceder a substanciais cortes nas prestações sociais, que colocam em causa a concretização plena dos direitos básicos da população, como a saúde ou a educação, o Governo pretende agora atacar diretamente esses bens essenciais, com o objetivo de os fragilizar ainda mais e de os entregar ao setor privado.
Quando todos sabemos que Portugal gasta menos que a generalidade dos países europeus com as políticas sociais e que as funções sociais do Estado não são responsáveis nem pela destruição da economia nem pela recessão do País, o Governo insiste no seu enfraquecimento.
A destruição e a privatização das funções sociais do Estado, os salários cada vez mais baixos e o aumento exponencial do desemprego levarão, inevitavelmente, à explosão das desigualdades sociais.
As funções sociais do Estado estão a bater no mínimo. Só o Governo, o PSD e o CDS é que não entendem! As funções sociais do Estado estão a bater no mínimo: há cortes nas prestações da segurança social, há um mais do que visível desinvestimento na educação e até há racionamento ao nível da saúde.
Em 30 anos, o Serviço Nacional de Saúde conseguiu aproximar os indicadores de saúde do nosso País aos dos países mais avançados do mundo em termos de saúde pública. A redução da mortalidade infantil e o aumento da esperança de vida foram apenas duas extraordinárias conquistas da criação do Serviço Nacional de Saúde.
Agora, 30 anos depois, o Governo PSD/CDS está a provocar grandes dificuldades no acesso aos cuidados de saúde e a degradar substancialmente a qualidade do tratamento dos doentes.
Mas é ainda necessário ter presente que, de dia para dia, o Governo PSD/CDS tem vindo a provocar o empobrecimento das famílias portuguesas.
O desemprego, a precariedade, os subsídios e o corte nos salários têm conduzido a uma redução sistemática do rendimento das famílias.
Ao aumento dos impostos soma-se, também, o aumento do custo de vida: subida do preço da luz, do gás, dos transportes, da alimentação, do ensino, etc.
Em 2012, as despesas de saúde, que, antes, já representavam mais de 10% das despesas familiares, tiveram um aumento sem precedentes, condicionando o acesso à saúde de milhares de portugueses.
Aumentam, assim, as dificuldades das famílias para fazerem face aos custos crescentes com a saúde, devido ao aumento das taxas moderadoras, ao custo das deslocações por motivos médicos, ao custo dos meios complementares de diagnóstico e ao preço dos medicamentos.
Cada vez mais pessoas deixam de ter acesso aos cuidados de saúde por razões de ordem económica. Assim se explica não só a quebra acentuada das consultas médicas presenciais nos centros de saúde, mas também a quebra nas urgências hospitalares e o silêncio do Sr. Ministro, quando questionado sobre esta matéria.
Segundo a OCDE, Portugal é precisamente um dos países da União Europeia em que a comparticipação pública na saúde é das mais baixas e a comparticipação paga pelos utentes é a mais elevada, o que, aliás, se agravou com este Governo.
O Governo fala das dificuldades financeiras do SNS, mas nada faz para impedir que as companhias de seguros continuem a ser financiadas pelo SNS e pela segurança social.
Todos os anos se verificam milhares e milhares de acidentes de trabalho e doenças profissionais, cujo tratamento é feito pelo SNS e cujos custos e dias de baixa são suportados pela segurança social, quando deveriam ser suportados pelas companhias de seguros, perante a passividade do Governo.
O Sr. Ministro falou das previsões falhadas, que, curiosamente, falham sempre para o mesmo lado, e argumenta: «Ou temos menos educação, menos saúde e menos segurança social, ou mais impostos». Mas esta afirmação não tem qualquer fundamento real e a sua credibilidade técnica é exatamente igual à credibilidade das suas previsões, porque todos sabemos que a sustentabilidade financeira das funções sociais do Estado não depende apenas da sua dimensão, mas, sobretudo, de outros fatores.
As políticas de austeridade, que levam ao que o Presidente da República chamou «espiral recessiva», provocaram uma enorme diminuição das receitas fiscais do Estado e das contribuições para a segurança social, o que veio fragilizar a sustentabilidade financeira das funções sociais do Estado. Mas as receitas do Estado podiam, ainda assim, ser bem mais gordas, se o Governo colocasse as empresas, sobretudo as grandes empresas, a pagar uma taxa efetiva de IRC exatamente igual à taxa nominal, ou se o Governo quisesse impedir a fuga de rendimentos para o estrangeiro, cujo propósito é apenas o de não pagar impostos em Portugal.
A eliminação destas injustiças aumentaria a justiça fiscal e contribuiria, certamente, para garantir as funções sociais do Estado.
A capacidade do Estado para financiar as suas funções sociais depende do crescimento económico. Uma política como a que está a ser imposta, que promove a recessão económica e a destruição da economia, põe inevitavelmente em causa o funcionamento do próprio Estado e das funções que o Estado deveria desempenhar.
Em vez de se falar em mais cortes nas funções sociais do Estado, o que se exige é o regresso ao social, o que se exige é o regresso às pessoas, o que se exige é que o Governo perceba definitivamente que a economia existe para servir as pessoas e não são as pessoas que existem para servir a economia.

3ª Intervenção

Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Os Verdes agendaram esta interpelação ao Governo sobre as funções sociais do Estado com um propósito muito claro. Esse propósito era procurar mostrar ao Governo, ao PSD e ao CDS que os caminhos, as opções, as políticas que o Governo está a seguir não estão a resultar. Pelo contrário, estão a afundar o País e a colocar os portugueses a pão e água.
O que Os Verdes pretendiam com esta interpelação era mostrar ao Governo que há mais mundo para além da austeridade, mas, como se viu durante o debate, nem o Governo, nem o PSD, nem o CDS estão para aí virados. Agarrados ao dogma da austeridade e aos ditames do FMI como se de ordens se tratasse, continuam dispostos a seguir religiosamente as instruções do exterior.
Ficámos sem saber se o fazem por devoção, se o fazem por teimosia ou se a agenda ideológica que carregam aos ombros não lhes permite ver os factos. O que ficámos a saber neste debate é que estão dispostos a fazê-lo com uma fidelidade que chega até a meter dó.
Impõem sacrifícios atrás de sacrifícios, cortam nos salários e nas pensões, levam os subsídios de férias e de Natal, generalizam a precariedade, promovem o despedimento, limitam o acesso às prestações sociais, facilitam os despejos, aumentam os impostos, e quando as pessoas precisam do Estado, o Estado não está presente — não está presente na educação, porque as pessoas voltam a pagar; não está presente quando as pessoas precisam de ser transportados para o hospital, porque o Governo virou as costas aos doentes; não está presente na justiça, porque o tribunal vai fechar.
A junta de freguesia? Agora é mais à frente, na outra localidade. O posto da GNR? É ir rápido, enquanto o Governo não o encerra. O marco de correio? Tem de ir à sede de freguesia. Centro de saúde? Isso era antes destes últimos Governos. O Ministro da Saúde diz que o encerrou para melhorar o nosso acesso aos cuidados de saúde.
E depois do cenário que criam ainda querem cortar mais nas funções sociais do Estado?! Tenham paciência!… Olhem para os resultados destas políticas! Vejam os resultados dos sacríficos que estão a impor aos portugueses: dívida pública, défice orçamental, desemprego, pobreza, exclusão social, miséria, recessão económica, falências de empresas e degradação dos serviços públicos.
Então, o Governo, o PSD e o CDS impõem tantos sacrifícios e o resultado é este? E depois estranham que as pessoas cantem a Grândola? Pois cantam! O Governo não consegue ver que, desde que a troica entrou nos nossos destinos, a nossa economia ficou de rastos e em queda livre.
As pessoas cantam porque não compreendem como é que o Governo diz que não há dinheiro para a saúde, para a educação, para aumentar o salário mínimo, para baixar os impostos, mas o dinheiro aparece sempre quando a banca precisa.

As pessoas estão indignadas porque não entendem como é que o Governo começou por procurar convencê-las de que iria eliminar as gorduras do Estado, os desperdícios e os custos excessivos das parceria público-privadas e, afinal, para o Governo, as gorduras estão nas funções sociais do Estado.
Para o Governo, as gorduras estão nas prestações sociais, nos reformados, nos funcionários públicos, nos hospitais, nos professores, nos tribunais, nas autarquias locais, nos desempregados, no complemento solidário para idosos, nos doentes, nas escolas, no transporte de doentes, nas taxas moderadoras, nas propinas, nas bolsas de estudo, no 13.º mês, no subsídio de férias, no salário mínimo, nos ferroviários, nos passes sociais, e por aí fora.
As pessoas manifestam-se porque começam a perceber que não se trata de uma questão meramente financeira mas, sim, de questões de natureza ideológica. As pessoas indignam-se porque sabem que Portugal gasta menos do que a generalidade dos países europeus com as políticas sociais.
As pessoas cantam a Grândola porque percebem que as funções sociais do Estado não são responsáveis nem pela destruição da nossa economia nem pela recessão do País. As funções sociais estão no mínimo, e as pessoas estão a sentir.
As pessoas agitam-se porque sabem que as políticas de austeridade provocaram uma enorme diminuição das receitas do Estado, o que veio colocar em causa a sustentabilidade financeira das suas funções sociais.
As receitas fiscais do Estado diminuíram mais de 3000 milhões de euros. E por que é que diminuíram? Porque não houve crescimento económico. E não houve crescimento económico porquê? Porque o caminho, as opções, as políticas do Governo falharam, e falharam redondamente.
As pessoas cantam a Grândola, porque sabem que a perda de enormes receitas fiscais do Estado também se deve aos benefícios fiscais de que gozam as grandes empresas em Portugal, que continuam a pagar uma taxa efetiva de IRC muito abaixo da taxa nominal.
As pessoas cantam, porque sabem que os rendimentos transferidos para o estrangeiro que não pagam impostos em Portugal causam elevados défices na nossa balança de rendimentos.
As pessoas manifestam-se, porque começam a sentir que, ao contrário do que diz o Sr. Ministro das previsões falhadas, começam a pagar mais ao Estado do que aquilo que dele recebem.
Se os portugueses ganham menos e pagam mais impostos, têm de ter mais segurança social, mais saúde, mais educação e mais apoios sociais. É o mínimo! Exige-se, por isso, uma mudança de políticas que assegure o crescimento e o desenvolvimento económico, aposte na produção nacional, crie emprego, promova uma justa distribuição da riqueza e garanta a defesa e a melhoria das funções sociais do Estado.
Para terminar, quero dizer apenas que se as pessoas cantam a Grândola é porque sabem que o Estado tem de conseguir recursos indispensáveis para efetivar políticas públicas, solidárias e universais, que assentem em direitos e não em cantinas sociais.
Hoje, neste debate que Os Verdes agendaram, ficou mais uma vez provado que este Governo não o consegue fazer. Este Governo não consegue assegurar as funções sociais do Estado. E se o Governo não consegue assegurar as funções sociais do Estado, se não se sente com forças para isso, só lhe resta uma saída: ir embora, porque os portugueses não fizeram mal a ninguém para continuar a levar com estas políticas que estão a afundar o País e a colocar os portugueses a pão e água.
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