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Intervenções na Ar (Escritas)
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26/10/2011
Interpelação sobre desemprego, precariedade e alterações às leis do trabalho
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Intervenção do Deputado José Luís Ferreira- Assembleia da República, 26 de Outubro de 2011

 1ª INTERVENÇÃO

Sr.ª Presidente, Sr. Ministro da Economia e do Emprego, ouvi-o com atenção dizer que mudámos de vida. Não, Sr. Ministro, não mudámos de vida; mudámos foi de Governo. Para o confirmar, basta atender ao número do desemprego que continua a aumentar.
O Instituto do Emprego e Formação Profissional registou, em Setembro, mais de 550 000 desempregados inscritos, tendo-se verificado um aumento de quase 4% relativamente a Agosto.
Face a este quadro, era de esperar que o Governo nos apresentasse medidas para combater o maior problema com que nos defrontamos, que é o do desemprego.
Contudo, o Governo insiste em facilitar os despedimentos e em torná-los mais baratos para que as entidades patronais possam despedir quando entenderem e sem grandes custos.
E, como o Sr. Ministro ainda não explicou, fica desde já o meu primeiro pedido de esclarecimento, porque creio que mesmo os portugueses que dominam muito bem a Matemática, mesmo esses, não conseguem compreender como é que o Governo explica que, facilitando o despedimento e tornando-o mais barato, se geram mais postos de trabalho! Como é possível combater o desemprego, despedindo?!
Outra questão, Sr. Ministro. O aumento do horário de trabalho, que o Governo quer impor aos trabalhadores do sector privado, vai naturalmente trazer mais desemprego. É óbvio! De facto, este vergonhoso aumento do horário de trabalho em 2,5 horas, passando das actuais 40 horas semanais para 42,5 horas semanais, constitui, todos o sabem, uma velha aspiração dos patrões e o Governo prepara-se agora para lhes fazer esse favor, o jeito, para lhes fazer a vontade.
Uma vez que esse trabalho não vai ser pago, este aumento do horário de trabalho vai provocar uma perda salarial da ordem dos 7%. Em termos práticos, o que o Governo pretende é proceder a uma transferência directa dos rendimentos de quem trabalha para os grandes accionistas, os quais ganham com este jeito cerca de 7% dos salários, que são retirados aos trabalhadores face ao novo horário de trabalho semanal. É o regresso do Robin dos Bosques, mas o «filme» é visto ao contrário.
Sr. Ministro, diga-nos qual é o contributo do aumento do horário semanal de trabalho para o combate ao défice? O que é que isto representa para a redução da dívida externa? É porque, Sr. Ministro, se não for claro na resposta, fica claro para os portugueses que o défice é apenas um pretexto para fazer mais um jeito aos patrões. Mais um!
Sr. Ministro, uma vez que se diz tão preocupado com as pessoas, deixe-me lembrar-lhe que há mais mundo, há mais pessoas para além dos patrões.

2ª INTERVENÇÃO

Sr. Presidente, Srs. Deputados: Infelizmente, o desemprego continua a subir de forma muito preocupante, mas o Governo, ao invés de procurar criar mecanismos para combater este grave problema, insiste em estimular os despedimentos e promove o desemprego, como se as pessoas fossem meras mercadorias; facilita os despedimentos; esvazia completamente o conceito de justa causa no despedimento; permite, através da atribuição de critérios subjectivos, que a entidade patronal possa despedir quando entenda; torna o despedimento mais barato, para não custar tanto à entidade patronal; reduz o valor das indemnizações por despedimento; reduz os 30 dias de retribuição por cada ano de antiguidade para 20 dias; elimina a garantia de pagamento de um mínimo de três meses de retribuição e cria limites máximos de indemnização em caso de despedimento; pretende impor um vergonhoso aumento da duração do trabalho em duas horas e meia por semana.
O Governo rouba 7% dos salários a quem trabalha para os entregar aos grandes accionistas, provavelmente para engrossarem o caudal de capitais que todos os anos fogem do País. Feitas as contas, serão menos uns bons milhões de euros a circular na nossa economia, no pagamento de impostos, nomeadamente no IVA, porque se os trabalhadores não vão receber os 7% correspondentes ao aumento da carga horária menos podem consumir e, portanto, menos receitas vão para o Estado. Mais: este empobrecimento dos trabalhadores é ainda pouco saudável para a nossa economia, porque a sucessiva perda do poder de compra está a ter efeitos devastadores no mercado interno, levando ao encerramento de empresas e à inevitável perda de postos de trabalho.
Assim, e para além de ser socialmente injusto e intolerável, este monumental roubo da transferência directa da massa salarial para os patrões não representa qualquer contributo para resolver a crise, pelo contrário, constitui um factor de agravamento da situação. Mas a injustiça é ainda mais gritante se tivermos em conta que, afinal, são os trabalhadores, os desempregados, os reformados e os pensionistas que estão a pagar a factura da crise que não provocaram e sobre a qual não têm qualquer responsabilidade.
Estamos, de facto, perante um Governo com muita coragem. É verdade, muita coragem!… De facto, só um Governo com muita coragem carregava tanto sobre quem trabalha; só um Governo com muita coragem fazia tantos jeitos aos patrões.
De facto, só um Governo com muita coragem fazia o que faz e continuava a ter um ministério com o bonito nome de Ministério da Economia e do Emprego. Falta apenas propor que o 1º de Maio deixe de ser feriado, porque, em vez do dia do trabalhador, passou a ser o dia dos patrões e estes prescindem, naturalmente, do feriado; falta apenas dizer que o dia 10 de Junho deixa de ser feriado, porque, afinal, quem manda é a tróica, e esta também prescinde; falta apenas alterar a designação do Ministério da Economia e do Trabalho para «ministério dos patrões e do desemprego». E falta, mas está agendada, uma forte resposta dos trabalhadores a todas estas políticas que nos levaram a esta situação e às políticas que se anunciam e que colocam aqueles que, não tendo responsabilidade nenhuma na situação que está criada, são agora chamados a suportar os custos da irresponsabilidade dos outros.
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