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30/01/2009
Lei Orgânica da Autoridade Florestal Nacional
Intervenção do Deputado Francisco Madeira Lopes
Reunião plenária de 2009-01-30
 
 
 
 
Sr. Presidente, Srs. Deputados,
 
Todos temos bem ciente a importância da floresta para a sustentabilidade económica, ambiental e social do nosso País. De facto, os seus benefícios são enormes, o seu potencial económico é fundamental e a sua capacidade de combater a desertificação e despovoamento de zonas do País e, simultaneamente, o problema dos incêndios florestais é elementar.
Para tanto, é necessário uma floresta viva, um mundo rural vivo e habitado, uma floresta diversificada, forte e resistente aos incêndios e que possa permitir uma multiplicidade de usos e usufrutos da sua existência.
Infelizmente, através de uma Lei Orgânica, o Decreto-Lei n.º 159/2008, o Governo pretendeu dar mais um passo para alterar esta lógica de gestão florestal e de cuidar desta riqueza milenar no nosso País.
Infelizmente, este Decreto-Lei vai muito além das questões meramente orgânicas e, inclusivamente, chega a dar destaque a determinadas fileiras florestais, designadamente o eucalipto, que, aliás, no último inventário florestal, a única espécie que aguenta o embate e aumenta»
Como estava a dizer, o eucalipto é a única espécie que aguenta o embate e aumenta, em termos de volume, de 37 milhões de metros cúbicos para quase 39 milhões de metros cúbicos, quando todas as espécies restantes, para além do sobreiro, que é, naturalmente, uma espécie protegida, descem. O azinho, por exemplo, Sr. Secretário de Estado, desce 16%, o carvalho desce 10%, o castanheiro desce 30%.
Na estratégia florestal nacional, os senhores são incapazes de dar um destaque, uma protecção às folhosas, antes, pelo contrário, o que os senhores se estão a preparar para fazer, em conjunto com os planos regionais de ordenamento florestal, é, no mínimo, para aumentar a área e o volume do eucalipto e mudá-lo, das zonas onde já contribuiu para a desertificação, para novos solos de potencialidade agrícola, onde vão, então, criar a mesma desertificação agrícola e de agricultores no nosso País.
A realidade, Srs. Deputados, é que as políticas deste Governo, também com este Decreto-Lei, podem servir para despedir trabalhadores ou mandá-los para a mobilidade, pode servir para arranjar bodes expiatórios, como fizeram com o anterior Director-Geral dos Recursos Florestais, em relação ao problema do nemátodo, que foi tão mal acompanhado por este Ministério.
Mas, sem dúvida, aquilo que não pode deixar de ser denunciado é esta política e esta visão economicista, tecnocrata, mercantilista, privatizadora e de lucro que têm em relação à floresta portuguesa e à função pública, quando produzem uma sangria de capacidade técnica dos serviços para justificar a concessão da gestão a privados, inclusivamente das matas nacionais.
Ignoram a função de protecção e recuperação de solos, regularização do regime hídrico, protecção dos sistemas costeiros e ribeirinhos, melhoria da qualidade do ar, estabilização climatérica, salvaguarda dos habitats, de espécies e da biodiversidade, que só são possíveis numa floresta de usos múltiplos, com povoamentos mistos, que inclua espécies autóctones e que não se quantifique numa lógica pura de lucro. Esta floresta diversificada é a única que permite o pastoreio, a apicultura, o recreio e o lazer, a recolecção de aromáticas, frutos e cogumelos, resinas, lenha e biomassa e madeira de alta qualidade.
E é esta floresta que este Ministério não consegue consagrar nem defender nas políticas que implementa.
Esta lógica de concessão a privados não se fica, aliás, pela floresta, pelas matas nacionais. Esta nova vaga começou com a Lei da Água e a concessão a privados de bens do domínio público hídrico, deixando o Estado de agir como um terceiro imparcial na gestão de multiplicidades de usos num único bem, entregando apenas a um ente privado que vai, ele mesmo, fiscalizar e licenciar os outros usos desse bem, o que é algo verdadeiramente vergonhoso! Agora, avançam com os outros bens do domínio público, inclusivamente os monumentos nacionais! Também estão disponíveis para privatizar a sua gestão, hipotecando séculos de história e de património que pertence a todos e, como tal, apesar de não ter estado durante todos estes séculos e anos no mercado com um valor, um preço à disponibilidade do lucro, a realidade é que contribuiu (e continuará a contribuir) para a riqueza e para a satisfação das necessidades públicas do País.
É também contra esta visão que apelamos à revogação deste Decreto-Lei e à revisão das políticas florestais deste Governo.
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