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02/04/2014 |
Novo regime jurídico das assembleias distritais |
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Intervenção do Deputado José Luís Ferreira
Proposta de lei n.º 212/XII (3.ª) — Aprova um novo regime jurídico das assembleias distritais (DAR-I-68/3ª)
- Assembleia da República, 2 de Abril de 2014 -
1ª Intervenção
Sr.ª Presidente, Sr. Vice-Primeiro-Ministro, ouvi-o com atenção, fui ouvindo, ouvindo… E ouvi-o falar de exportações, ouvi-o falar de sucessos, ouvi-o falar de indicadores de confiança, enfim, o costume.
Mas, tendo presente o tema desta interpelação, era suposto ouvir mais do Governo, muito mais. Era suposto ouvir o Sr. Vice-Primeiro-Ministro falar-nos, por exemplo: dos números do desemprego e da sua evolução, desde a entrada da troica em Portugal até hoje; dos números da pobreza e da exclusão social; do valor das pensões de há três anos e do valor das pensões que hoje os reformados recebem; da bandeira do CDS, que passaria a ter uma «linha vermelha» que não seria ultrapassada; do valor dos salários de há três anos e do valor de hoje; da carga fiscal antes e depois da tomada de posse deste Governo; da qualidade dos serviços públicos; dos desempregados que, antes da chegada da troica, tinham direito ao subsídio de desemprego, que, entretanto, o Governo tratou de reduzir drasticamente; do abono de família que o Governo retirou a 650 000 crianças e jovens; dos 200 000 beneficiários que ficaram sem o rendimento social de inserção; e até da dívida pública que, em 2011, estava em 94% do PIB, mas que este Governo «engordou» para 130% do PIB.
Mas, sobre estas matérias, nada! Nem um comentário, nem uma palavra, nada!
Mas descanse, Sr. Vice-Primeiro-Ministro, nós sabemos porquê! Nós sabemos por que é que o Governo foge destes assuntos «como o diabo da cruz». E também pode estar descansado que não vou perguntar-lhe nada sobre o tal guião da reforma do Estado, até porque certamente pouco ou nada teria a acrescentar ao que já disse sobre este assunto.
Também não lhe vou perguntar qual a tese que partilha relativamente aos futuros eventuais cortes: se da tese do Sr. Primeiro-Ministro e da Sr.ª Ministra das Finanças, que dizem que o anúncio dos cortes será feito mais lá para a frente, quando o seu relógio já estiver mais perto do fim; ou se da tese do líder parlamentar do PSD, que diz que não vai haver mais cortes nos salários e nas pensões.
O que gostaria que nos dissesse tem a ver com o seguinte: Sr. Vice-Primeiro-Ministro, o seu relógio indica-nos que o protetorado está a chegar ao fim. Ainda por cima, com o otimismo que hoje aqui nos trouxe, significa certamente que, depois de 17 de maio, o Governo vai começar a repor tudo aquilo que foi retirado aos portugueses, nomeadamente, salários, reformas, pensões, subsídios, direitos, prestações sociais, empregos e tudo o resto que o Governo levou provisoriamente.
Sr. Vice-Primeiro-Ministro, quando é que vai começar a reposição?
2ª Intervenção
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Quase três anos depois da tomada de posse do Governo PSD/CDS e quase três anos depois da entrada da troica nos nossos destinos coletivos é tempo de fazer um balanço.
Três anos de penosa e cruel austeridade; três anos de empobrecimento gradual do País e da generalidade das famílias portuguesas; três anos de aumento de impostos absolutamente brutais sobre quem trabalha, sobre os reformados e sobre os pensionistas; três anos a poupar os rendimentos do capital, com os grandes grupos económicos e com as grandes fortunas a engordar de dia para dia; três anos a delapidar o nosso património coletivo com privatizações de empresas públicas que todos os anos contribuíam para as receitas do Estado; três anos a levar milhares e milhares de pequenas e médias empresas à falência, enquanto baixam os impostos das grandes empresas e dos grandes grupos económicos; três anos a degradar serviços públicos, a encerrar serviços de saúde, escolas, postos de correio, tribunais, repartições de finanças, postos da GNR e até as freguesias — que faziam confusão ao FMI — que este Governo, qual moço de recados, acabou obedientemente por extinguir; três anos de Túnel do Marão, de Estaleiros Navais de Viana do Castelo e de transporte aéreo de Lisboa para Bragança e para Vila Real; três anos a semear desemprego, a generalizar a pobreza e a exclusão social; três anos a transformar o despedimento numa espécie de totonegócio para os patrões, porque despedir é fácil, é barato e não dá chatices; três anos a remeter os jovens para a emigração; três anos a abrir cantinas sociais para dar comida às pessoas porque as políticas do Governo as remeteram para a pobreza; três anos de baixos salários, sem atualizar o salário mínimo nacional e a generalizar a precariedade; três anos a cortar nos salários, nas pensões e nas reformas; três anos de miséria para milhares de famílias e de fome para outras tantas; três anos de sinais positivos, de luzes ao fundo do túnel, de milagres económicos, de relógios em contagem decrescente, de decisões irrevogáveis, de exportações, de linhas vermelhas e de previsões otimistas; três anos a engordar a dívida pública, a aumentar o défice e a fazer cair o PIB; três anos a pedir às pessoas para cumprirem a lei; e três anos a tentar governar à margem da Constituição.
É este, e só este, o balanço que pode ser feito de três anos com a troica a comandar e com o Governo PSD/CDS a dar o devido e cego seguimento. Mas são três anos, como diz o Governo, de medidas extraordinárias, de cortes transitórios e, agora, que o relógio que anda para trás começa a chegar ao seu destino, é tempo de pensar no destino que aí vem.
Vai-se a troica, fica o Governo! Fica o Governo mas, agora, sem protetorado, aparentemente liberto de pressões e, portanto, sem pretexto para não repor o que teve sempre natureza provisória.
É certo que não sabemos quando é começam as devidas reposições, mas sabemos que com este Governo e com estas políticas o PIB vai continua a cair, a dívida pública vai continuar a crescer, a economia vai continuar em banho-maria, o desemprego e a emigração vão continuar a crescer e o País e os portugueses vão continuar a empobrecer.
Com a teimosia do Governo em não pretender renegociar a dívida, temos este triste resultado: Portugal termina o período da troica com uma dívida que não é sustentável nem possível de ser paga e que continua a ser um verdadeiro entrave a uma política de desenvolvimento.
Soluções? Vão se embora, para que os portugueses possam decidir sobre outro caminho que resolva os nossos problemas, porque os senhores já deram mostras de não estarem para aí virados.