|
27/11/2008 |
OE 2009 - Votação na Especialidade |
|
Intervenção do Deputado FRANCISCO MADEIRA LOPES
Reunião plenária 2008-11-27
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo,
Como é óbvio, este Orçamento do Estado é apresentado num contexto difícil de uma crise que atravessamos e que, mais do que financeira e bancária, afecta fundamentos económicos e sociais da nossa sociedade.
Temos um abrandamento a caminhar para a recessão económica, um desemprego galopante. As últimas previsões da OCDE são francamente preocupantes, apontando para 8,5% de desemprego em 2009 e para 8,8% em 2010, que, a verificar-se, será, de facto, o mais elevado desde 1986. Ou seja, 74 000 postos de trabalho desaparecerão, como desapareceu a ilusão da criação dos 150 000 novos postos de trabalho, criados, supostamente, por uma lâmpada de Aladino.
Estes são os números atrás dos quais se esconde a realidade dos portugueses que suportam essas dificuldades no dia-a-dia. E para esta situação o Conselho Económico e Social, que a reconheceu, apelou precisamente para que o Orçamento do Estado em 2009 operasse um crescimento real a nível de salários, de pensões e de rendimento disponível para as famílias, também para estimular a procura interna. Reconhece, inclusivamente, que as medidas que este Orçamento do Estado para 2009 apresenta são poucas e insuficientes no que diz respeito ao apoio às famílias para esta situação de crise.
Penso que a pergunta que os portugueses podem e devem fazer neste momento, Sr. Ministro das Finanças, é se, com o Orçamento do Estado para 2009, o Governo está a fazer tudo o que é possível para aliviar a situação dos portugueses, para os ajudar a suportar e a ultrapassar este difícil período.
A pergunta que se coloca é esta: se o Governo tem margem, por que é que não a utiliza, designadamente no que diz respeito ao défice? É esse o desafio que Os Verdes fazem, em concreto, com algumas propostas que apresentam, designadamente na área do IRS, que, como sabemos, tem uma responsabilidade importante não apenas no financiamento do Orçamento do Estado mas também na redistribuição da riqueza.
E, por isso, gostaríamos de relembrar aqui a proposta que apresentamos em sede do artigo 53.º, a proposta 828-P, que prevê a possibilidade de aumentar o rendimento disponível para mais pensionistas, designadamente para aqueles que têm as mais baixas pensões.
Mas referimos outra proposta, a 1032-P, que diz respeito à actualização dos escalões do IRS à luz da inflação. Porque, Sr. Ministro, VV. Ex.as, no ano passado, actualizaram os escalões do IRS à luz de uma inflação de 2,1%, mas a inflação ficará perto dos 3% este ano; para 2009 fazem a actualização dos escalões do IRS com base em 2,5%, que é a inflação que prevêem, mas não fazem a correcção daquilo que aconteceu no ano de 2008. Ou seja, pelo menos 0,8% a mais de inflação deveria ser tido em conta porque senão, por essa via, vamos estar a penalizar injustamente os portugueses em sede de IRS.
Já agora, queria relembrar aqui outra proposta que apresentámos e que, infelizmente, já foi chumbada, a 790-P, relativa ao artigo 7.º, sobre as transferências do Orçamento, em que propúnhamos muito concretamente que nenhum salário da Função Pública fosse valorizado num valor nominal inferior a 50 €.
Penso que isso era, pelo menos, uma garantia que se podia dar ao nível de alguns rendimentos, era uma forma de o Governo garantir aos funcionários públicos — e, como sabemos, os salários da Função Pública servem, depois, de bitola para o resto da sociedade — que esses salários não baixariam e que não haveria uma perda real e nominal de valor. E a realidade é que, do ano passado para este ano, apesar do que tinha sido prometido, houve essa quebra. Aliás, essa quebra acontece desde 2000, desde essa altura que se tem vindo a perder poder de compra, aliás, num somatório que atinge 7,2% de perda.
Sr. Ministro, não acha que seria fundamental dar um sinal e apoiar mais as famílias nesta altura de crise, em vez de continuar a ficcionar com os valores de inflação que prevêem e que sempre ficam abaixo daquilo que, depois, se vem a verificar realmente?
Sr. Presidente, Os Verdes têm uma proposta para este artigo 54.º, que é precisamente um aditamento ao Código do IRS, designadamente, no que diz respeito à dedução colecta.
Antes de mais, gostaria de dizer que esta proposta que estamos a referir vem no âmbito de um outro conjunto de propostas, todas elas referentes ao apoio e ao estímulo do uso do transporte público colectivo, fundamental, aliás, para ajudar a resolver os problemas energéticos e de dependência energética, mas também os problemas ambientais e emissões de gases com efeito estufa que temos no nosso País.
Como sabemos, o sector dos transportes é um dos mais problemáticos nesta área e é, por isso mesmo, um daqueles em que se deve agir não por intermédio do automóvel particular, tornando-o menos poluente, mas, principalmente, por via do transporte público colectivo, como temos vindo a dizer há muito tempo. Isto é, não se pretende apenas garantir o direito à mobilidade mas atacar uma questão que é responsável por boa parte da fatia das despesas que as famílias têm todos os meses com os transportes.
Por isso, propomos a dedução à colecta dos gastos que as famílias operem não apenas com os passes sociais mas com outros títulos de transportes colectivos do sujeito passivo e do seu agregado familiar, porque sabemos que há famílias que têm despesas com transportes e que não estão incluídas em zonas onde existe o passe social. Seria, pois, fundamental operar este alargamento. Igual proposta de alargamento fazemos, em termos de IRC, em relação às empresas.
Gostava de perguntar ao Sr. Ministro — aliás, coloquei esta questão no debate na generalidade, mas não obtive resposta — por que razão o Governo concebe apoiar as empresas que paguem as despesas de transporte aos seus trabalhadores, permitindo-lhes deduzir essa despesa em sede de IRC, e não permite aos trabalhadores, cujos patrões não lhes pagam essa despesa, fazerem a dedução à colecta em termos da sua declaração de rendimentos. No fim de contas, são despesas que se destinam à mesma situação, que é suportar os custos do uso de transporte colectivo, em muitos casos para irem trabalhar e para estudarem. Não são despesas supérfluas; pelo contrário, são despesas essenciais. Por que razão dar esse apoio apenas aos trabalhadores por via das empresas e não dar directamente às famílias e aos trabalhadores?
Fazemos outra proposta, não em sede de IRS — mas aproveito e falo já dela — mas em sede de ISP, sobre a consignação de parte da receita de imposto sobre produtos petrolíferos que venha a gerar para o incentivo e o estímulo dos transportes públicos. Apresentamos esta proposta desde há vários anos e gostaríamos de vê-la fazer caminho, tal como acontece com esta proposta de dedução à colecta, que, aparentemente, já o fez em sede do Governo, mas, infelizmente, apenas em sede de IRC e gostaríamos que o fizesse também em sede de IRS. Talvez ainda seja possível este ano» Senão, talvez para o ano!» De qualquer maneira, Sr. Ministro, esta questão da consignação de verba de imposto sobre os produtos petrolíferos para estímulo e incentivo aos transportes colectivos seria fundamental para alavancar este passo sério e urgente que precisamos de dar em relação ao combate às alterações climáticas e à poupança energética.
Sr. Presidente, de facto, a intervenção do Sr. Deputado Afonso Candal não podia deixar de suscitar uma reacção. O Sr. Deputado Afonso Candal compara as propostas que fazemos em sede de Orçamento do Estado a bolas ou a estrelas em árvores de Natal.
Essa comparação fica com quem a faz. Não quero entrar por aí em termos de seriedade. Aliás, nem quero relembrar aquilo que aqui hoje foi referido em termos daquilo que entende o Partido Socialista ou o Governo ser a seriedade do Orçamento do Estado ou das peças que o compõem, designadamente o PIDDAC, como já tivemos ocasião de discutir em sede de Comissão, se é para cumprir ou não, se é para enganar os portugueses ou se é para explicar quais são as prioridades do Estado para 2009.
Mas não deixa de ser enternecedora a preocupação do Sr. Deputado Afonso Candal com a simplificação fiscal, designadamente a nível do IRS.
A simplificação fiscal é um objectivo importante, Sr. Deputado. Aliás, a simplificação a nível legislativo e burocrático é sempre interessante e traz sempre inputs positivos. Porém, não podemos pôr o objectivo da simplificação fiscal à frente de tudo o mais, porque senão vamos já propor só dois escalões de IRS. Fica simplificado: em vez dos quatro ou cinco, ficam dois, e está simplificado. E será por essa via que vamos ter mais justiça fiscal?! Será por essa via que vamos resolver os problemas dos portugueses?! Certamente que não! Então, Sr. Deputado Afonso Candal, se V. Ex.ª quer criticar as propostas feitas em sede de Orçamento do Estado, critique-as em concreto; diga por que é que elas não servem ou diga por que é que elas ficam aquém do que seria preciso. Mas não, V. Ex.ª limita-se a dizer: «Os senhores fazem muitas propostas, mas, em nome da simplificação fiscal, não podemos atender a tudo». Sr. Deputado, isso parece-me francamente insuficiente,»
» porque a máquina e a legislação fiscal têm objectivos muito concretos. Não é apenas, como já tive ocasião de dizer, prover, em termos de receitas, o Orçamento do Estado, o cofre público, mas é também condicionar, sempre que é possível, as condutas das empresas e dos cidadãos, procurando que estas sejam positivas em termos do bem colectivo.
Apresentámos uma proposta que dizia respeito ao incentivo aos transportes colectivos. Ou V. Ex.ª considera que este é um objectivo a prosseguir pelo Estado e quer os cidadãos devem ter um estimulo para aderir a este objectivo ou não considera. Portanto, aceito que critique a proposta em concreto, mas limitar o discurso à simplificação fiscal parece francamente pobre para a discussão que estamos a ter.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados, nesta matéria do IVA, Os Verdes também apresentam um conjunto de propostas para promover as energias renováveis e a poupança energética. Refiro-me, concretamente, à proposta 1077-P, que diz respeito à aquisição de equipamentos de energias renováveis, ou à proposta 1092-P, sobre materiais de construção que favorecem a poupança e a eficiência energética, ou à proposta 1083-P, relativamente a electrodomésticos mais eficientes.
São propostas que defendem um IVA mais reduzido para estes equipamentos, pois todos já sabemos que as duas áreas fundamentais na questão energética são a poupança energética e o aumento da produção através de energias renováveis.
Quero ainda relembrar que, em sede de IRS, apresentámos uma proposta que previa o aumento da dedução à colecta para a aquisição de equipamentos de energias renováveis para as habitações. É que o actual montante — aliás, estagnado há vários anos — tem-se mostrado insuficiente para promover a aquisição destes equipamentos.
A questão é que estas propostas vêm no sentido daquilo que têm vindo a ser as recomendações a nível europeu e recordo que, no debate travado no ano passado, o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais relembrava que era preciso unanimidade em termos europeus.
Na realidade, tenho aqui uma proposta de resolução que diz precisamente que se deve instar a Comissão e o Conselho Ecofin a privilegiar medidas estruturais, como a taxa reduzida de IVA para produtos e serviços que permitam poupar energia, propostas, aliás, por outros países, designadamente a Grã-Bretanha. Assim sendo, penso que é altura de também Portugal dar passos nesse sentido.