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02/03/2012
Projecto de Lei n.º 193/XII - Altera o código da publicidade, no sentido da regulação da publicidade a produtos alimentares dirigida a crianças e jovens
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Nota justificativa

A obesidade é uma doença crónica, da nossa civilização, que, atingindo boa parte da população, tornou-se uma epidemia que rouba qualidade de vida, auto-estima, capacidade de ser e fazer, contribuindo decisivamente para uma diminuição da esperança de vida a quem da mesma padece.

Consequência de modos de vida pouco saudáveis, sedentários e sem actividade física, aliados a uma alimentação pouco racional e equilibrada (com excesso de gorduras, sal e açúcar e deficiente em hidratos de carbono, fibras, vitaminas, minerais e água), este gravíssimo problema de saúde pública contribui decisivamente para o aumento de dificuldades respiratórias, dificuldades de locomoção, diabetes, hipertensão, doenças cardiovasculares entre outras patologias.

A situação económica das famílias, não sendo determinante para este flagelo, pode influir no mesmo, designadamente pelo recurso a alimentos de pior qualidade (ou seja, os que mais quilocalorias têm, apresentando menos nutrientes importantes) que são, muitas vezes, dos mais baratos e acessíveis.

Por outro lado, a diminuição do tempo de qualidade passado em família, imposto por um sistema e políticas desumanas, desregulamentadoras dos direitos laborais e sociais, aumentando a precariedade, a carga horária laboral e a flexibilidade da disponibilidade para o trabalho, impede cada vez mais as famílias de conviverem, de adoptarem em casa hábitos alimentares mais saudáveis como uma refeição caseira cozinhada com ingredientes frescos, contribuindo assim para a educação dos filhos para hábitos de vida e de alimentação saudáveis.

Vários são os estudos, a nível nacional e internacional, que assinalam, preocupantemente, o crescimento da obesidade infantil, pré-adolescente e adolescente para números chocantes – ca. de 30% obesas ou com excesso de peso. Não só pelo impacto que isto tem nas nossas crianças e jovens, roubando-lhes oportunidades de futuro, pela relação extremamente próxima entre a ocorrência de obesidade em idade pediátrica e a sua persistência na idade adulta, cientificamente demonstrada, mas pelo que estes números representarão no futuro em termos de custos sociais e humanos e também para o Serviço Nacional de Saúde, esta é uma questão que merece todo o nosso esforço e empenhamento, em diferentes frentes.

É sabido que a alimentação e a aprendizagem alimentar das crianças em idade escolar e pré-escolar é determinante na saúde dos mesmos e na prevenção da obesidade. Alguns passos foram dados nessa área com a aprovação de manuais de educação, principalmente dirigidos a professores e educadores ou com o Regime da Fruta Escolar.

Contudo, muito ainda está por fazer, no sentido de remeter para um consumo marginal e pouco significativo os “alimentos” fritos, associando hidratos de carbono e gorduras, aperitivos hipersalinos, doces, açucares ou com excesso de proteínas, com todas as graves consequências que acarretam: diabetes, cáries, problemas renais e obesidade entre outros.

A ocorrência de diabetes de tipo 2 (anteriormente conhecida como a diabete dos adultos), de dislipidemia, hipertensão arterial e de problemas de ordem psico-comportamental, já se tornaram vulgares nas crianças e jovens não se podendo descurar o papel que uma dieta alimentar desadequada desempenha deste contexto.

O direito a uma alimentação suficiente, segura, saborosa e saudável, deve ser considerado uma componente fundamental dos chamados direitos de personalidade, designadamente do direito à vida e à saúde.

A obesidade, como problema multifatorial, só será contrariada através de medidas integradas visando, por um lado, incrementar os níveis de exercício físico, ainda insuficientes a nível escolar e extra-escolar, em alternativa a estilos de vida sedentários, e, por outro, corrigir hábitos alimentares errados e altamente prejudiciais.

A este nível, a educação e formação dos jovens desempenha um papel crucial sendo inegável o papel, cada vez mais preponderante que os meios de multimédia (televisão e internet) desempenham enquanto transmissores de informação e de conteúdos às crianças e jovens, com um poder e eficácia tremendos.

Com efeito, não se pode menosprezar o papel informativo, educativo e formativo que desempenha a televisão nos nossos dias, para o bem e para o mal, bem como o enorme poder que têm as mensagens veiculadas nesse meio de comunicação de massas, designadamente as publicitárias. Assumindo-se como portadora da inovação, lançando modas e fornecendo modelos de ação e de imagem, a publicidade, mormente a audiovisual, determinam e influenciam as opiniões, as opções e as condutas dos telespectadores, principalmente dos mais jovens.

As crianças são ávidas consumidoras de televisão e internet, estimando-se que passem, várias horas por dia sentados à frente dum ecrã consumindo passiva e acriticamente vários conteúdos, incluindo publicidade, muitas vezes feita com crianças e jovens, preferencialmente dirigida aos mesmos, designadamente pelos horários (na televisão) ou conteúdos a que são associados (na televisão e internet), tem um impacto muito forte sobre a população infantil e juvenil, constituindo “alvos fáceis” e desprotegidos face à forte mensagem publicitária.

Os spot e filmes publicitários que apelam ao consumo de alimentos pobres em nutrientes e muito ricos em gordura, açúcar, sal e aditivos químicos, designadamente aperitivos, fritos, refrigerantes, bolos, chocolates, pré-cozinhados, “fast-food” ou “junk-food”, e que são, na mensagem publicitária, particular ou preferencialmente dirigidos a crianças e jovens, apresentando-se muitos deles, inclusivamente, como pretensas opções alimentares correctas e saudáveis para refeições tão importantes como o pequeno-almoço ou o lanche, ou até mesmo para as refeições principais, constituem parte de um problema mais vasto que é o da falta de educação para uma alimentação saudável.

Não podemos deixar de reconhecer que as escolhas de alimentos menos saudáveis e as práticas alimentares erradas seguidos pelas crianças e jovens são, de facto, em muitas situações, amplamente influenciadas, não só pela escassez de informação objectivamente precisa e correctamente veiculada acerca das características nutricionais e calóricas dos alimentos publicitados, mas principalmente pelo apelo feito pelo marketing sustentado na imagem do produto, mensagens subliminares, e nos brindes, brinquedos, ofertas e promoções que o acompanham e não na sua qualidade, valor ou importância dietética real ou pelo preço ao consumidor.

O reconhecimento, por um lado, de que os hábitos alimentares errados constituem parte destacada no deflagrar de doenças como a obesidade na infância e juventude e, por outro, que a publicidade dirigida a crianças e jovens visando fazer reclamo a produtos alimentares leva muitas vezes a práticas alimentares erradas, justificaram que o PEV apresentasse em 2006 um projecto de lei que abordava esta questão, visando alterar o Código da Publicidade com vista a regular a publicidade a produtos alimentares na televisão dirigida a crianças e jovens.

As mesmas razões, continuam válidas, no nosso entender, hoje em dia por maioria de razão.

Quando confrontamos o direito à protecção das crianças face a conteúdos publicitários com influência na sua saúde pelas escolhas que induzem com o direito à livre publicidade não temos dúvidas que devemos privilegiar o primeiro. Decidir entregar a questão à boa consciência da indústria ou à ética dos mercados não é, na nossa opinião, a melhor decisão. A demonstrá-lo está o apelidado “Código de Boas Práticas na Comunicação Comercial para Menores” datado de 2005, elaborado pela Associação Portuguesa de Anunciantes e subscrito por várias empresas, federações e associações industriais e comerciais, mas que se revela, pouco exigente, permissivo, fracamente vinculativo e com sanções pouco expressivas, incapaz de salvaguardar os interesses dos menores.

Assim os Deputados do Grupo Parlamentar "Os Verdes", abaixo assinados, apresentam o seguinte Projecto de Lei sobre a regulação da publicidade a produtos alimentares na televisão dirigida a crianças e jovens:

Artigo 1º

Alteração ao Código da Publicidade

 

Os artigos 20º, 34º e 40º do Código da Publicidade, aprovado pelo Decreto-Lei nº330/90, de 23 de Outubro, e alterado pelos Decretos-Leis nºs 74/93, de 10 de Março, 6/95, de 17 de Janeiro, 61/97, de 25 de Março, 275/98, de 9 de Setembro, 51/2001, de 15 de Fevereiro, 332/2001, de 24 de Dezembro, 81/2002, de 4 de Abril, e 224/2004, de 4 de Dezembro, 57/2008, de 26 de Março e pelas Leis nºs 31-A/98, de 14 de Julho, 32/2003, de 22 de Agosto, 37/2007, de 14 de Agosto e 8/2011, de 11 de Abril, passam a ter a seguinte redacção:

«Artigo 20º

(…)

 

1.      (anterior corpo do artigo)

2.      É proibida a publicidade a produtos alimentares:

a.        em publicações destinadas ao público infantil e juvenil;

b.       na televisão:

                                                              i.       nos períodos destinados a programação infantil e juvenil;

                                                            ii.       em spots ou filmes publicitários filmados com crianças ou jovens ou a eles em particular dirigidos, independentemente do período em que sejam emitidos.

c.   na internet em sítios ou páginas com conteúdos destinados ao público infantil e juvenil.

3.      Excepcionam-se do número anterior as actividades publicitárias e de divulgação destinadas a promover hábitos de alimentação saudável.

 

Artigo 34º

(…)

 

1 – (…)

a) De €1.750,00 a €3.750,00 ou de €3.500,00 a €45.000,00, consoante o infractor seja pessoa singular ou colectiva, por violação do preceituado nos artigos 7º, 8º, 9º, 10º, 11º, 12º, 13º, 14º, 16º, 20º, 22º-B, 23º, 24º, 25º e 25º-A;

b) De €1.000,00 a €3.500,00 ou de €2.500,00 a €25.000,00, consoante o infractor seja pessoa singular ou colectiva, por violação do preceituado nos artigos 17º, 18º e 19º;

c) De €375,00 a €2.500,00 ou de €1.500,00 a €8.000,00, consoante o infractor seja pessoa singular ou colectiva, por violação do preceituado nos artigos 15º, 21º, 22º e 22º-A.

2 – (…)

Artigo 40º

(…)

 

1.      (…)

2.      A fiscalização do cumprimento do disposto no artigo 20º nºs 2 e 3, bem como a instrução dos respectivos processos e a aplicação das respectivas coimas e sanções acessórias, competem à Direcção-Geral da Saúde.

3.      (anterior nº 2)»

 

Artigo 2º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor 30 dias após a sua publicação.

 

Assembleia da República, Palácio de S. Bento, 2 de Março de 2012.

Os Deputados

Heloísa Apolónia

José Luís Ferreira                                                                           

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