Pesquisa avançada
 
 
Projectos de Lei
Partilhar

|

Imprimir página
06/06/2005
Projecto de Lei Nº. 110/X Altera a Lei n.º 170/99, de 18 de Setembro, que adopta medidas de combate à propagação de doenças infecto-contagiosas em meio prisional
Ver progresso deste iniciativa carregue aqui
 

Exposição de Motivos

O relatório, da Provedoria de Justiça, sobre o sistema prisional, publicado em 1996, dava conta da situação profundamente preocupante relativa à incidência de doenças infecto-contagiosas entre os reclusos nos estabelecimentos prisionais em Portugal.

Entre outras questões abordadas, este relatório dava bem conta da relação causa/efeito entre o consumo de drogas por via intravenosa e o alastramento de doenças como a SIDA entre os reclusos, devido à prática comum de partilha de seringas.
 
Com vista à tomada de medidas urgentes e certeiras para fazer face à situação dramática detectada nas prisões, o Sr Provedor de Justiça recomendava no relatório de 1996 “que a Direcção Geral dos Serviços Prisionais proceda à realização de estudos de viabilidade de introdução nos estabelecimentos prisionais de sistemas de troca de seringas que reduzam os riscos de infecção em meio prisional”.
Passaram quase 10 anos e esse programa de troca de seringas em meio prisional não foi estudado e consequentemente não foi implementado, apesar de o Plano de Acção Nacional de Luta Contra a Droga e a Toxicodependência – horizonte 2004, publicado em 2001, ter previsto “promover o estudo para a possível instalação, a título experimental, de programas de troca de seringas ou de consumo asséptico em alguns estabelecimentos prisionais”.
 
Desde então, os sucessivos relatórios da Provedoria de Justiça sobre o estado das nossas prisões têm insistido naquela recomendação. No último relatório disponível, de 2003, a mesma é retomada, já sob a forma de apelo: “Nestes termos, apelo a Vossa Excelência para que, num mínimo que me parece ser efectivamente exigível, promova a realização participada de estudos sobre a introdução de programas de troca de seringas ou de salas de injecção assistida em meio prisional”.
Entretanto, houve outros estudos que foram dando conta de mais detalhes sobre o consumo de drogas em meio prisional, concluindo da larga percentagem de população reclusa que se droga nas prisões e, em grande número, por via intravenosa, assumindo, muitos dos reclusos que fizeram parte dos estudos que partilham seringas. Assim concluí um estudo de Anália Torres e Maria do Carmo Gomes, sobre Drogas e Prisões em Portugal, publicado em 2002.
 
Também o Estudo de Avaliação do Programa de Seringas – diz não a uma seringa em segunda mão”, encomendado pela Comissão Nacional de Luta Contra a SIDA, afirma que se este programa de troca de seringas tivesse sido implementado nas prisões ter-se-iam evitado, entre 1993 e 2001 pelo menos 638 contaminações.
Entretanto, é sabido que a experiência de troca de seringas em meio prisional já foi implementada noutros países, com resultados positivos.
 
Há uma questão que é recorrentemente levantada, quando se discute esta matéria, que tem que ver com a perigosidade da presença de seringas nas prisões, as quais se podem tornar em verdadeiras “armas”. A este argumento há que contrapor que a nossa proposta não é a de que andem a circular livremente seringas nas prisões, mas sim que elas sejam distribuídas de forma segura, em compartimento próprio e imediatamente restituídas após a sua utilização. Aliás, o problema é que actualmente há reclusos que se injectam nas prisões, o que significa que aí há circulação, troca e uso de seringas. Significa que estas estão clandestinamente na posse dos reclusos e da situação actual, dessa sim, as seringas podem tornar-se uma ameaça à segurança.
Será então legítimo perguntar: do que é que estamos à espera? Temos ou não responsabilidade de intervir sobre situações dramáticas e de procurar dar-lhes respostas adequadas por forma a minimizar ao máximo todos os riscos?
 
Para evitar mais demoras, que necessariamente se traduzirão em mais dramas, “Os Verdes” propõem uma alteração à lei nº 170/99, de 18 de Setembro, que adopta medidas de combate à propagação de doenças infecto-contagiosas em meio prisional (esta lei surgiu de uma iniciativa legislativa de “Os Verdes” e que tinha como objectivo justamente implementar um conjunto de medidas preventivas e minimizadoras de riscos para a saúde nas prisões).
Agora, pela terceira vez, em três legislaturas distintas (VIII, IX e X), o Grupo Parlamentar “Os Verdes” apresenta um projecto de lei que visa implementar a troca de seringas em meio prisional.
É nestes termos que, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, os Deputados do Grupo Parlamentar “Os Verdes” apresentam o seguinte:


PROJECTO DE LEI

Artigo Único

É aditado um artigo 5º A à lei nº 170/99, de 18 de Setembro, que adopta medidas de combate à propagação de doenças infecto contagiosas em meio prisional, com a seguinte redacção:

«Artigo 5º A
Programa específico de troca de seringas

1. No âmbito dos programas de redução de riscos e de prevenção de doenças infecto contagiosas, previstos no artigo anterior, o Ministério que tutela a saúde em conjunto com o Ministério que tutela a justiça criam um programa específico de troca de seringas em meio prisional.

2. O programa específico de troca de seringas será experimentado num número limitado de estabelecimentos prisionais, a definir por despacho conjunto dos Ministros com a tutela da saúde e da justiça, a publicar no prazo máximo de 3 meses após a entrada em vigor do presente diploma, e será gradualmente, e com as adaptações necessárias, alargado aos demais estabelecimentos prisionais do país.

3. Com vista à definição e à implementação do programa de troca de seringas os Ministérios referido nos números anteriores definem o enquadramento da sua aplicação por despacho conjunto, a publicar no prazo máximo de 3 meses após a entrada em vigor do presente diploma, no qual garantem designadamente os seguintes princípios:

a) O fornecimento de seringas aos reclusos toxicodependentes, que consomem estupefacientes por via intravenosa, tem como objectivo a não partilha de seringas entre a população reclusa, por forma a evitar a contaminação de doenças infecto-contagiosas.

b) O fornecimento de seringas é feito aos reclusos toxicodependentes que solicitem o consumo protegido, e com autorização dos serviços de saúde.

c) O consumo de estupefacientes por via intravenosa é feito em compartimentos especificamente preparados nos estabelecimentos prisionais, garantindo condições de privacidade, higiene e segurança.

d) Os compartimentos referidos na alínea anterior devem dispor de material esterilizado e devem ser apoiados por técnicos de saúde.

e) O fornecimento de seringa ao recluso toxicodependente é feita à entrada do compartimento referido na alínea c), sendo restituída pelo toxicodependente à saída do mesmo.
f) Ao recluso toxicodependente que requeira o consumo protegido são garantidas assistência médica e, havendo consentimento do toxicodependente, a sua inclusão num programa de recuperação de drogas.»


Palácio de S. Bento, 6 de Junho de 2005

Os Deputados Heloísa Apolónia e Francisco Madeira Lopes

Voltar