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14/07/2006
Projecto de Lei Nº. 300/X Alteração ao Código da Publicidadde no sentido da regulação da publicidade a produtos alimentares dirigida a crianças e jovens
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Exposição de Motivos


A obesidade é uma doença crónica que afecta hoje em dia grande parte da população mundial, principalmente nos chamados países desenvolvidos, como consequência dos modos de vida e hábitos menos saudáveis existentes na nossa sociedade actual.

Esta doença encontra-se associada a uma elevada comorbilidade, constituindo, assim, um gravíssimo problema de saúde pública, já que se apresenta como factor de aumento do risco no aparecimento e agravamento de grande número de outras doenças, com implicações económicas elevadas. Estima-se, através de dados da OMS, que já considerou a obesidade a epidemia do século XXI, que entre 2% e 8% da despesa total de saúde realizada nos países ocidentais são imputados a problemas decorrentes da obesidade, designadamente dificuldades respiratórias, dificuldades de locomoção, diabetes, hipertensão e doenças cardiovasculares.

Vários factores concorrem para o aparecimento da obesidade, por isso se diz que é uma doença multifactorial. Dentre as variadas causas que desempenham o seu papel no deflagrar desta doença, as principais responsáveis pelo excesso de peso e pela obesidade residem no estilo de vida sedentário e na falta de exercício físico por um lado e numa alimentação errada, com base numa dieta desequilibrada (com excesso de gordura, sal e açúcar e deficiente em hidratos de carbono, fibras, vitaminas, minerais e água), por outro.

Infelizmente, também neste campo, as desigualdades sociais se fazem sentir de forma determinante: são cada vez mais os cidadãos mais pobres e com mais baixos níveis educacionais e de escolaridade que apresentam maiores índices de excesso de peso e de obesidade. O facto dos alimentos de pior qualidade (entendidos como aqueles que mais quilocalorias têm e que mais pobres noutros nutrientes são) serem simultaneamente dos mais baratos e acessíveis, contribui fortemente para esta tendência.

O próprio acto de comer em casa, em convívio familiar, uma refeição caseira, isto é preparada no momento, com ingredientes frescos, é cada vez mais raro. O actual ritmo e estilos de vida, tantas vezes impostos pelas precárias situações e condicionantes laborais e salariais em que vive grande parte dos trabalhadores, não propicia condições nem permite tempo para cozinhar e para estar em família, não contribuindo, assim, para a criação de hábitos de vida e de alimentação saudáveis.

Além disso verifica-se que a educação física e o desporto escolar, muitas vezes por falta de condições e de equipamentos de que carecem as escolas, mas também devido à subvalorização curricular de que padece, apresenta manifestas insuficiências nos seus resultados práticos e tem-se mostrado incapaz de incutir hábitos desportivos nas crianças e jovens para a vida.

A obesidade infantil e adolescente, pelas graves dimensões que assume (de acordo com o estudo intitulado “Prevalência do Excesso de Peso e Obesidade em Crianças Portuguesas de 7 a 9 anos” levado a cabo por cinco investigadores portugueses e publicado em Novembro de 2004, 31,5% das crianças portuguesas naquela faixa etária sofre de obesidade) e pelas pesadas e irreversíveis consequências na saúde das gerações futuras dela derivadas (a existência de forte estabilidade entre a ocorrência de obesidade em idade pediátrica e a sua persistência na idade adulta está cientificamente demonstrada), representa, não só uma dimensão importante do problema, mas certamente a parte mais urgente a atender.

Não será demais lembrar que as consequências desta doença, que não se reduzem ao plano da saúde física, são enormes afectando muitas vezes os que dela padecem a nível psicológico (má relação com o seu corpo e a sua imagem, baixa auto-estima) e de relacionamento social.

A alimentação e aprendizagem alimentar das crianças em idade escolar e pré-escolar é determinante na saúde dos mesmos e na prevenção da obesidade.

Os consumos em excesso de fritos, de misturas de hidratos de carbono e gorduras, aperitivos excessivamente condimentados, exagero de sal, doces, açucares e proteínas têm consequências graves: diabetes, cáries, problemas renais, obesidade e outros problemas de saúde.

A diabetes de tipo 2, doença intimamente relacionada com a obesidade, já que o excesso de peso, uma nutrição desequilibrada e a falta de exercício físico reduzem a acção da insulina, até há pouco tempo conhecida como a diabetes dos adultos, porque praticamente dela apenas padeciam adultos, tem aumentado de forma significativa entre crianças e adolescentes em todo o mundo nos últimos 15 anos devido à obesidade infantil. Neste momento, cerca de 45% dos casos de diabetes diagnosticados em crianças e adolescentes é diabetes de tipo 2.

A ocorrência desse tipo de diabetes, de dislipidemia, hipertensão arterial bem como graves problemas de ordem psico-comportamental, começam a ser uma constante em crianças cada vez mais pequenas e entre cujas causas se pode encontrar, na maior parte das vezes, dietas alimentares desadequadas.

O direito a uma alimentação suficiente, segura, saborosa e saudável, deve ser considerado uma componente fundamental dos chamados direitos de personalidade, designadamente do direito à vida e à saúde.

Sendo conhecida a importância de uma alimentação saudável, equilibrada e adequada a cada fase de desenvolvimento do ser humano, mormente durante a sua formação e crescimento, condição fulcral para o pleno desenvolvimento das suas capacidades físicas e psicológicas e determinante até do próprio sucesso escolar, para além das implicações negativas na saúde que decorrem de uma dieta alimentar errada, forçoso é que se reconheça o interesse público de agir no sentido de promover entre a população mais jovem, e desde cedo, hábitos alimentares mais correctos, preferindo-se assim a prevenção e a promoção da saúde que é sempre mais eficaz e mais barata do que combater a doença depois de instalada.

A obesidade, sendo um problema multifactorial, só pode ser combatida com sucesso através de medidas integradas visando, por um lado, incrementar os níveis de exercício físico (calcula-se que entre 65% a 85% da população mundial pratique menos exercício físico do que o desejável) e combater os estilos de vida sedentários, e, por outro, corrigir hábitos alimentares errados e altamente prejudiciais, o que passa, necessariamente, por uma actuação a nível da educação e formação dos jovens bem como da informação que lhes é veiculada.

O importante papel que a televisão desempenha enquanto transmissor de informação e de conteúdos às crianças e jovens, não pode ser ignorado nem menorizado, designadamente a nível da publicidade.

Com efeito, não se pode menosprezar o papel informativo, educativo e formativo que desempenha a televisão nos nossos dias, para o bem e para o mal, bem como o enorme poder que têm as mensagens veiculadas nesse meio de comunicação de massas, designadamente as publicitárias. Assumindo-se como portadora da inovação, lançando modas e fornecendo modelos de acção e de imagem, a televisão e a publicidade televisiva determinam e influenciam as opiniões, as opções e as condutas dos telespectadores, principalmente dos mais jovens.

As crianças são ávidas consumidoras de televisão, estimando-se que passem, em média por dia, entre 2 a 3 horas sentados à frente do écran da televisão ou do computador.

A publicidade feita com crianças e jovens, e preferencialmente dirigida aos mesmos, designadamente pelos horários escolhidos para a sua transmissão televisiva, tem um impacto muito forte sobre a população infantil e juvenil que os consome, desde logo por serem consumidores frágeis e relativamente acríticos, constituindo “alvos fáceis” e desprotegidos face à forte mensagem publicitária que passa na televisão.

Os spots e filmes publicitários que apelam ao consumo de alimentos pobres em nutrientes e muito ricos em gordura, açúcar, sal e aditivos químicos, designadamente aperitivos, fritos, refrigerantes, bolos, pré-cozinhados, fast-food, etc. e que são, na mensagem publicitária, particular ou preferencialmente dirigidos a crianças e jovens, apresentando-se muitos deles, inclusivamente, como pretensas opções alimentares correctas e saudáveis para refeições tão importantes como o pequeno-almoço ou o lanche, ou até mesmo para as refeições principais, constituem parte de um problema mais vasto que é o da falta de educação para uma alimentação saudável.

Com efeito, não podemos deixar de reconhecer que as escolhas de alimentos menos saudáveis e as práticas alimentares erradas seguidos pelas crianças e jovens são, de facto, em muitas situações, muito influenciadas, não só pela escassez de informação objectivamente precisa e correctamente veiculada acerca das características nutricionais e calóricas dos alimentos publicitados, mas principalmente pelo apelo feito pelo marketing sustentado na imagem do produto e nos brindes, brinquedos, ofertas e promoções que o acompanham e não na sua qualidade, valor ou importância dietética real ou pelo preço ao consumidor.

O reconhecimento, por um lado, de que os hábitos alimentares errados constituem parte destacada no deflagrar de doenças como a obesidade na infância e juventude e, por outro, que a publicidade dirigida a crianças e jovens visando fazer reclamo a produtos alimentares leva muitas vezes a práticas alimentares erradas, justificam que apresentemos o presente projecto de lei que visa, muito sumariamente, introduzir uma alteração ao Código da Publicidade com vista a regular a publicidade a produtos alimentares na televisão dirigida a crianças e jovens.

Assim os Deputados do Grupo Parlamentar "Os Verdes", abaixo assinados, apresentam o seguinte Projecto de Lei sobre a regulação da publicidade a produtos alimentares na televisão dirigida a crianças e jovens:

Artigo 1º

Os artigos 20º e 40º do Código da Publicidade, aprovado pelo Decreto-Lei nº330/90, de 23 de Outubro, e alterado pelos Decretos-Leis nºs 74/93, de 10 de Março, 6/95, de 17 de Janeiro, 61/97, de 25 de Março, 275/98, de 9 de Setembro, 51/2001, de 15 de Fevereiro, 332/2001, de 24 de Dezembro, 81/2002, de 4 de Abril, e 224/2004, de 4 de Dezembro, e pelas Leis nºs 31-A/98, de 14 de Julho, e 32/2003, de 22 de Agosto, passa a ter a seguinte redacção:

«Artigo 20º

1.(anterior corpo do artigo)
2.É proibida a publicidade a produtos alimentares:
a. em publicações destinadas ao público infantil e juvenil;
b. na televisão:
i. nos períodos destinados a programação infantil e juvenil;
ii. em spots ou filmes publicitários filmados com crianças ou jovens ou a eles em particular dirigidos, independentemente do período em que sejam emitidos.
3.Excepcionam-se do número anterior as actividades publicitárias e de divulgação destinadas a promover hábitos de alimentação saudável.


Artigo 40º


1.(…)
2.A fiscalização do cumprimento do disposto no artigo 20º nºs 2 e 3, bem como a instrução dos respectivos processos e a aplicação das respectivas coimas e sanções acessórias, competem à Direcção-Geral da Saúde.
3.(anterior nº 2)»


Palácio de S. Bento, 14 de Julho de 2006.

Os Deputados, Francisco Madeira Lopes e Heloísa Apolónia

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