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12/11/2003 |
Projecto de Lei Nº. 378/IX Alteração da imagem feminina nos manuais escolares |
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Exposição de motivos
A igualdade entre mulheres e homens é um princípio fundamental da democracia, um direito constitucionalmente consagrado, cuja vivência, porém, não obstante os imensos progressos verificados nas últimas décadas na sociedade portuguesa, prevalece em vários domínios longe de ser plenamente assegurada.
Um facto presente nas mais variadas esferas da vida social, quer no espaço público, quer no privado, através de sinais muito diversificados. Sinais traduzidos na limitação de direitos sexuais e reprodutivos, na desigualdade no acesso e progresso da carreira profissional, na menor participação das mulheres na vida pública e no exercício de cargos de representação, na desequilibrada partilha de responsabilidade no espaço familiar, no desempenho dos diferentes papéis. Ainda, na percepção da imagem construída e veiculada designadamente pelos media sobre as mulheres. Imagens essas, que confirmam, todos elas, de diferentes formas, a enorme distância que prevalece entre a lei e a sua aplicação, bem como a prevalência de inúmeros interditos culturais.
A realidade cuja alteração, requer a definição de uma estratégia clara para a igualdade de oportunidades que permita, de acordo com o estabelecido na Convenção das Nações Unidas sobre:” Todas as Formas de Discriminação em Relação às Mulheres”, abolir, através de uma acção continuada, todas as formas de discriminação que prevalecem na nossa sociedade e que representam um entrave ao desenvolvimento e à democracia.
É pois neste contexto que se situa a presente iniciativa política dos Verdes e a proposta nela contida, de alterar a imagem feminina nos manuais escolares.
Um projecto de lei, no qual se propõe a despistagem de conteúdos sexistas e discriminatórios que ainda subsistem nos manuais e na linguagem visual por eles veiculada.
Mensagens anti pedagógicos, que prevalecem de modo descuidado, em muitos dos manuais que são utilizados pelos nossos alunos nas escolas e que, em nosso entendimento, devem passar a ser despistados, para tal passando as comissões de avaliação que procedem à sua escolha e para o efeito constituídas passam a integrar as (os)representantes das organizações não governamentais que integram o Conselho Consultivo da Comissão para a Igualdade e para os Direitos das Mulheres.
Uma proposta que contribuirá, é nossa convicção, para a própria valorização dos manuais escolares, cujos critérios de avaliação da qualidade pedagógica, entendemos, não podem ignorar o respeito pelos direitos humanos, nas suas múltiplas dimensões consideradas, nem influenciar negativamente a apreensão de normas sociais pelas crianças e jovens.
Um projecto de lei cujo sentido se aproxima de muitas das recomendações internacionais, feitas neste capítulo muito específico, o da educação e do seu contributo para a eliminação de todas as formas de discriminação em relação às mulheres, quer no âmbito da Convenção da ONU, quer no quadro das sucessivas Resoluções e Recomendações adoptadas respectivamente pelo Parlamento Europeu e da Assembleia Parlamentar do Conselho da Europa.
Uma proposta que corresponde à necessidade de intervir nos sistemas educativos e de mobilizar toda uma vasta gama de meios, nomeadamente, com recurso a disposições legais e regulamentares, que permitam, gradualmente a eliminação nos conteúdos de ideias dominantes instaladas, transmitidas pela tradição ou reproduzidas pela cultura dominante, fundadas sobre a ideia de inferioridade ou superioridade de um sobre o outro sexo ou sobre o papel estereotipado de homens e mulheres.
A intervenção que naturalmente não se deve esgotar neste domínio, o dos livros escolares e do seu conteúdo, eliminando concepções sexistas e estereótipos baseados numa divisão tradicional de papéis entre mulheres e homens, antes deve ser alargada a outros domínios e orientações programáticas e pedagógicas, capazes de fazer despertar para os direitos humanos e educar para a cidadania.
Um projecto de lei, por fim, que reconhece a importância dos manuais escolares no processo de socialização das crianças, e partindo do papel, positivo ou negativo, que podem desempenhar na formação de crianças e na mudança de atitudes, procura adequar o seu conteúdo ao objectivo socialmente aceite, o da igualdade de direitos entre mulheres e homens.
Nestes termos, as deputadas do Partido Ecologista OS Verdes, apresentam nos termos regimentais e constitucionais aplicáveis, o seguinte projecto de lei.
ARTIGO ÚNICO
É aditado ao Decreto-Lei nº 369/90 de 26 de Novembro, alterado pela Declaração de Rectificação nº. 33/91, de 30 de Março, um artigo novo com a seguinte redacção:
ARTIGO 6º A
(Despistagem de conteúdo discriminatório)
1. Sempre que for criada uma Comissão Científico-Pedagógica, para apreciação da qualidade dos manuais escolares, prevista no artigo 6º, esta deverá obrigatoriamente integrar:
a) Duas representantes das Organizações Não Governamentais que integram o Conselho Consultivo da Comissão para a Igualdade e para os Direitos das Mulheres;
b) Um representante do Conselho Nacional de Educação.
2. À Comissão anteriormente referida caberá emitir pareceres sobre o conteúdo dos manuais, na óptica do respeito pelos direitos humanos, da eliminação de todas as formas de discriminação, nomeadamente em relação às mulheres e da promoção da igualdade entre mulheres e homens.
3. A apreciação do conteúdo dos manuais escolares, na óptica do respeito pelos direitos humanos, da eliminação de todas as formas de discriminação em relação às mulheres e da promoção da igualdade entre mulheres e homens, poderá ainda ser solicitada por entidades da sociedade civil ou pelos órgãos pedagógicos das escolas.
4. Para efeitos do disposto no número dois do presente artigo, os encargos decorrentes da apreciação são imputados ao Ministério da tutela.
Palácio de São Bento, 12 de Novembro de 2003.
As Deputadas de Os Verdes: Heloísa Apolónia e Isabel Castro.