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Projectos de Lei
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26/06/2002
Projecto de Lei Nº. 87/IX Altera o Estatuto dos alunos dos estabelecimentos públicos do ensino básico e secundário
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A questão da disciplina é sistematicamente suscitada sempre que se debate a instituição escolar, tendo por isso vindo a ganhar uma visibilidade junto da opinião pública que não corresponde nem à importância, nem à dimensão, nem ao papel determinante que, artificialmente, ao problema se pretende atribuir.

Com efeito, não obstante o facto da indisciplina (aqui dispensando uma discussão em torno do conceito) ou, dito de outro modo, dos comportamentos violentos e incivilizados, serem um fenómeno complexo e crescentemente preocupante para a comunidade escolar, que reclama uma reflexão atenta e a ponderação de medidas tendentes a ajudar a resolver o problema, a verdade é que ela é o produto, a resultante, a consequência última do sistema de ensino, nas condições em que, em muitos casos, está a funcionar.

Razões estas que nos obrigam a recusar frontalmente qualquer tentação de deriva autoritária, que além do mais seria redutora, que a pretexto da indisciplina se pretenda hoje impor nas escolas.

Motivos que nos levam, igualmente, a considerar como pouco fecundas, todas as soluções que escamoteiem o diagnóstico e a natureza do mal que atinge a nossa escola.

Convicções que nos conduzem na perspectiva da ponderação do problema e das medidas passíveis de adoptar, a privilegiar a elaboração de um código de conduta na comunidade escolar, a optar pela construção participada de um bom ambiente educativo, a defender medidas práticas que privilegiem a prevenção das situações de indisciplina na escola.

A escola pública, que é bom não esquecer, nas últimas três décadas, de forma particularmente marcante no nosso país, sofreu modificações muito profundas, à semelhança aliás das modificações ocorridas na sociedade, cujos valores reproduz e de que é parte integrante.

Uma escola que, mau grado obstáculos que ainda persistem, se generalizou, de modo súbito, no acesso a um universo cada vez mais alargado e diversificado no plano social, cultural, económico, étnico, de jovens estudantes.

Uma escola de massas que gera expectativas, não raro goradas, que enfrenta desfasamentos, nomeadamente culturais, nos saberes transmitidos a muitos daqueles que os apreendem, que semeia entre os que a frequentam sentimentos de incerteza em relação ao futuro.

Factores múltiplos de tensão numa instituição que não pode deixar de ser influenciada pela sociedade, de que é parte integrante. Uma sociedade que vive mutações profundas nas estruturas familiares e também nas redes de suporte afectivas. Que se confronta com uma organização do trabalho cada vez mais desumana e exigente, que pouco tempo e espaço deixa para mães e pais se dedicarem aos seus filhos. Uma sociedade na qual o território tem sido ocupado de forma caótica e as actividades de modo absurdo, obrigando diariamente as famílias a desperdiçar horas e horas da sua vida em deslocações que são retiradas ao apoio e ao convívio familiar.

Uma sociedade ainda que gera e acolhe cada vez mais fluxos migratórios, sem políticas de integração que respeitem a diversidade cultural, étnica e que a saibam com vantagem valorizar, concretamente em meio escolar.

Uma sociedade, por fim, que mergulha e convive quotidianamente com a violência, veiculada pelos média, pelo consumismo exacerbado, pela exclusão e pela pobreza, factores, que todos eles somados, atingem o já frágil tecido social, ampliando fenómenos de intolerância, de xenofobia, de violência que a escola, dentro de si própria não pode deixar de reflectir, de reproduzir, de ampliar.

É pois para essa escola em concreto que o nosso projecto de lei, como um contributo, ainda que pontual, se dirige.

Do que se trata para “Os Verdes” é de tentar, de modo muito específico, tendo em conta a rigidez dos horizontes fixados (que lamentavelmente excluem do contributo fundamental os parceiros sociais), no espaço finito da escola e daquilo que na sua relatividade ela pode fazer, de explicitar o sentido de alguns dos princípios, hoje já contemplados no Decreto-Lei n.º 270/98.

Igualmente de tentar, no plano processual, agilizar, simplificar e acelerar, procedimentos já previstos no regime em vigor.

Propostas orientadas no fundamental, na vertente humanista que “Os Verdes” privilegiam, para precisar o conteúdo prático de normas vigentes, e meios para exercer direitos consagrados.

Meios para os operacionalizar, concretamente no tocante à responsabilidade dos pais, dos professores e da restante comunidade educativa, sem os quais é totalmente irrealista reclamar o cumprimento de responsabilidades que a todos cabem.

Nestes termos, ao abrigo da alínea g) do n.º 2 do artigo 180.º da Constituição da República Portuguesa e da alínea g) do n.º 1 do artigo 11.º do Regimento da Assembleia da República, o Grupo Parlamentar de “Os Verdes” apresenta o seguinte projecto de lei:

 

Artigo 1.º

Disposições Alteradas

Os artigos 8.º, 9.º, 10.º, 21.º, 23.º, 24.º, 26.º, 27.º, 29.º e 34.º, do Decreto-Lei n.º 270/98, de 1 de Setembro de 1998, passam a ter a seguinte redacção:

 

“Artigo 8.º
Intervenção dos pais

1- O direito e o dever de educação dos filhos compreende a capacidade de intervenção dos pais no exercício dos direitos e o dever do Estado de criar condições, nomeadamente ao nível da legislação laboral, que permitam assumir a sua responsabilidade de fazer cumprir os deveres dos seus educandos na escola (...)

2- Sem prejuízo dos direitos e deveres dos pais e encarregados de educação estabelecidos no regime de autonomia, administração e gestão, o poder-responsabilidade de educação dos filhos (...)

 

Artigo 9.º
Intervenção do pessoal docente e não docente

1- Aos professores, enquanto principais responsáveis pela condução do processo de ensino aprendizagem dos alunos, devem ser garantidas condições, nomeadamente ao nível da valorização da carreira docente, da formação profissional específica, da estabilidade na colocação de professores, da diminuição do número de alunos por turma, da valorização dos espaços escolares, para promover medidas de carácter pedagógico que estimulem o harmonioso desenvolvimento da educação das crianças e dos jovens (...)

2- O professor titular ou o director de turma, a quem deve ser dado apoio específico, enquanto coordenador do plano de trabalho da turma, é particularmente responsável pela adopção de medidas tendentes à melhoria das condições (...)

3- Aos auxiliares de acção educativa, aos técnicos dos serviços especializados de apoio educativo e aos demais elementos do pessoal não docente em serviço na escola é preciso garantir preparação adequada para colaborar no acompanhamento(...)

 

Artigo 10.º
Intervenção da escola

1- À escola devem ser criadas condições necessárias ao desenvolvimento do processo educativo e a uma organização pedagógica que promova um bom ambiente educativo, zelando pelo pleno exercício dos direitos dos alunos e assegurando o respeito pelos respectivos deveres.

2- À escola cabe também a adopção de medidas que promovam a assiduidade e o efectivo cumprimento da escolaridade obrigatória e previnam situações de insucesso e de abandono, nomeadamente através de respostas educativas ajustadas às necessidades de cada um, à criação de equipas educativas, à institucionalização de actividades extra escolares, devendo ser assegurada (...)

 

Artigo 21.º
Competência do professor

1- (...)

2- (...)

3- (...)

4- (...)

5- Caso o professor entenda que o comportamento é passível de ser qualificado de grave ou muito grave haverá lugar a imediata participação ao director de turma, para efeitos de averiguação ou eventual procedimento disciplinar.

 

Artigo 23º.
Competência do professor titular ou director de turma
(...)

1- (...)

2- (...)

3- Caso o professor titular ou o director de turma entenda que o comportamento presenciado ou participado é passível de ser qualificado de grave ou muito greve, haverá lugar a imediata participação ao presidente do conselho executivo ou director, para efeitos de averiguação ou de instauração de procedimento disciplinar.

 

Artigo 24.º
Competência do presidente do conselho executivo ou director

1- (...)

2- (Eliminado)

 

Artigo 26.º
Tramitação do procedimento disciplinar

1- (...)

2- A instrução do procedimento deve ser reduzida a escrito e concluída no prazo de cinco dias úteis contados da data (...)

3- (...)

4- (...)

 

Artigo 27.º
Suspensão preventiva

1- Durante a instrução do procedimento disciplinar o aluno poderá, excepcionalmente, ser suspenso preventivamente da frequência da escola pelo presidente do conselho executivo ou director, por período correspondente ao da instrução se a sua presença na escola perturbar a instrução do processo ou o regular desenvolvimento das actividades escolares.

2- (...)

 

Artigo 29.º
Decisão

1- (...)

a) (...)

b) Cinco dias úteis, contados da data (...)

2- (...)

3- (...)

 

Artigo 34.º
Recurso hierárquico

1- O recurso hierárquico é interposto pelo encarregado de educação ou pelo aluno, sendo maior, no prazo de cinco dias (...)

2- (...)

3- (...)

4- (...)

5- (...)

 

Artigo 2º.
Entrada em vigor

O presente diploma entra em vigor no início do ano lectivo ulterior à data da sua publicação.

 

Palácio de São Bento, 26 de Junho de 2002
As Deputadas heloísa Apolónia e Isabel Castro

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