Pesquisa avançada
 
 
Projectos de Resolução
Partilhar

|

Imprimir página
05/06/2006
Projecto de Resolução Nº. 133/X Estabelece um conjunto de recomendações ao Governo relativas ao tratamento de resíduos industriais perigosos
Ver progresso deste iniciativa carregue aqui
 

Nota justificativa

O Governo tem demonstrado que pretende fazer da co-incineração de resíduos industriais perigosos (RIP) o pilar estruturante do tratamento deste tipo de resíduos.

Esta lógica subverte a importância dos Centros Integrados de Recuperação, Valorização e Eliminação de Resíduos Industriais Perigosos (CIRVER), quando estes deveriam ser potenciados para dar o máximo de resposta ao tratamento de RIP.

Tendo em conta as múltiplas declarações já produzidas por membros do Governo, e até as contradições que revelam, mas sempre com o objectivo de centralizar a co-incineração de RIP, torna-se perceptível que há resíduos perigosos susceptíveis de outras formas de tratamento que vão ser encaminhados para a queima.

Deste princípio só há um beneficiário: as cimenteiras, que vão poder substituir os seus combustíveis tradicionais por resíduos perigosos, ainda por cima, recebendo dinheiro por cada tonelada de RIP. Perde, entretanto, o país com a ausência de uma lógica assente no encaminhamento de RIP para as formas de tratamento mais sustentáveis do ponto de vista de garantia ambiental e de preservação da saúde pública.

É tendo em conta todo este processo conturbado e pouco esclarecido, que “Os Verdes” chamam a Assembleia da República a intervir, por forma a estabelecer um conjunto de recomendações ao Governo.

Assim, propomos que o Governo garanta em tempo útil a concretização de dois projectos imprescindíveis para o regular funcionamento dos CIRVER, a funcionar no concelho da Chamusca, tendo em conta o transporte de RIP. Esses projectos consubstanciam-se na construção do IC3 (ligação Almeirim – Chamusca), fundamental para evitar a circulação de transporte pesado de RIP por dentro de aglomerados urbanos nos concelhos de Almeirim, Alpiarça e Chamusca; e na construção da nova travessia do rio Tejo (ligação A23-N118) em Constância, por forma a evitar a utilização, por parte dos transportes pesados de RIP, da velha ponte rodo-ferroviária, que está num estado de insegurança evidente devido à extracção de inertes e que permite a circulação rodoviária apenas num sentido de cada vez, e não em simultâneo.

Estas infra-estruturas são determinantes para garantir o acesso rodoviário aos CIRVER e em simultâneo a própria segurança rodoviária e das populações.

Mais, “Os Verdes” propõem que se suspendam todos os projectos, licenciamentos e testes de co-incineração de RIP, até que estejam garantidos um conjunto de pressupostos (para além dos que estipulámos no Projecto de Lei nº 228/X).

O primeiro desses pressupostos é que os CIRVER estejam em pleno funcionamento, porque são estes que devem constituir o pilar estruturante do tratamento de resíduos industriais perigosos.

O segundo é que se proceda a um registo da real capacidade de tratamento de RIP pelos CIRVER e pelas empresas instaladas em Portugal que já actuam no tratamento destes resíduos, para avaliar com rigor e isenção a quantificação e tipificação de resíduos perigosos que ficam de fora em termos de tratamento.

O terceiro pressuposto é que seja implementada em Portugal uma fileira específica para o tratamento adequado de óleos usados e solventes, garantindo que estes resíduos serão sujeitos a tratamento adequado, e de resto em expansão por toda a Europa, e não sujeitos ao interesse da sua queima pelas cimenteiras, garantindo assim que o interesse ambiental se sobreporá aos interesses económicos em causa.

No caso dos solventes é até paradigmático que uma empresa que se dedica a tratar solventes produzidos no país esteja a aguardar para saber se os solventes terão, na estratégia do Governo, encaminhamento para co-incineração ou se a empresa pode alargar a sua capacidade de tratamento.

O quarto prende-se com as próprias declarações do Governo, relativas à hipótese de se começar a co-incineração de RIP nas cimenteiras de Souselas e Arrábida, questão já profundamente preocupante, mas com a intenção de futuramente se poder alargar essa prática às outras cimenteiras do país. Esta intenção também demonstra bem como o Governo pretende que a queima de RIP seja o pilar estruturante de pseudo-tratamento destes resíduos. Mas importa desde já exigir que se proceda, com rigor e exactidão, a estudos epidemiológicos abrangendo as populações que residem e trabalham nas localidades afectadas pela laboração das actuais cimenteiras.

Nos casos em que esse estudo já tenha sido produzido e se se verificarem discrepâncias na detecção de certas patologias em relação à média nacional, como é o caso de Souselas, importa identificar e actuar sobre os focos causadores desse resultado.

O último pressuposto, mas não menos importante, antes pelo contrário, é aferir em que medida as estratégias apontadas pelo Governo para a redução de resíduos industriais estão ou não a ter resultados práticos e visíveis, para poder até aferir se essas estratégias se consubstanciam apenas no papel (designadamente no Plano tecnológico de forma extremamente abstracta, e no Plano Nacional de Prevenção de Resíduos Industriais) ou se estão nalguma medida a ser implementadas.

Assim, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis a Assembleia da República delibera recomendar ao Governo:

1. Que se assegure em tempo útil a construção do IC 3 (ligação Almeirim – Chamusca), com vista ao funcionamento dos CIRVER.
2. Que se assegure em tempo útil a construção da nova travessia do Tejo (ligação A-23 – N118) em Constância, com vista ao funcionamento dos CIRVER.
3. Que se suspendam os projectos e testes de co-incineração de resíduos industriais perigosos até que:

a) os CIRVER estejam em pleno funcionamento;
b) seja produzido um registo da real capacidade de tratamento de resíduos industriais perigosos pelos CIRVER e de todas as empresas que actuem nessa área em Portugal;
c) esteja garantido o processo de recolha, encaminhamento e tratamento por regeneração dos óleos e solventes passíveis dessa forma de tratamento;
d) seja realizado um estudo epidemiológico nas localidades abrangidas por todas as unidades cimenteiras em laboração no país, identificando as causas das incidências patológicas, quando detectadas, e actuando sobre essas mesmas causas;
e) seja avaliado o resultado da estratégia de redução de resíduos industriais perigosos em Portugal tendo em conta, designadamente, o Plano Tecnológico e o Plano Nacional de Prevenção de Resíduos Industriais (PNAPRI).


Assembleia da República, 5 de Junho de 2006


Os Deputados Heloísa Apolónia e Francisco Madeira Lopes

Voltar