|
05/12/2014 |
Projeto de Resolução n.º 1176/XII - Pela anulação das disposições fiscais, sobre os pequenos e médios agricultores, que decorrem do Orçamento do Estado para 2013 |
|
A pequena agricultura familiar, tem desempenhado um papel muitíssimo importante no desenvolvimento rural, não só do ponto de vista económico e social, como também ambiental e cultural. Este tipo de agricultura é responsável por três quartos da produção alimentar a nível mundial.
A agricultura familiar é de tal forma fundamental que a Organização das Nações Unidas declarou 2014 como o Ano Internacional da Agricultura Familiar com o objetivo de colocá-la no centro das políticas agrícolas e alimentares das agendas nacionais, identificando lacunas e oportunidades para promover uma mudança rumo a um desenvolvimento mais equitativo e equilibrado.
A nível nacional, a agricultura de pequena e média dimensão, aliada à mão de obra familiar, representa não só um pilar fundamental da nossa alimentação, mas também o suporte basilar da evolução da sociedade portuguesa ao nível económico, ambiental e cultural, base de emprego e de ocupação do território.
A agricultura familiar tem um papel de extrema importância nas economias rurais, pese embora as violentas ofensivas por parte dos sucessivos governos que têm conduzido à delapidação da nossa atividade produtiva, sobretudo desta pequena agricultura, tornando o país mais permeável ao endividamento e à dependência do exterior.
Os pequenos e médios agricultores excluídos dos grandes circuitos da distribuição agro-alimentar têm sobrevivido e dinamizado as economias locais, através de formas de comércio tradicional ou de proximidade como são os mercados e vendas diretas, permitindo perpetuar o saber ancestral e valorizar os recursos naturais e o território na produção de alimentos, garantes da segurança alimentar.
As medidas fiscais que o governo tem vindo a implementar, refletidas no Orçamento do Estado (OE) para 2013, constituem uma enorme ofensiva contra esta pequena e média agricultura.
Entre as alterações fiscais mencionadas estão: a revogação do n.º 33 do artigo 9º do Código do IVA (CIVA), deixando de existir isenção de IVA aplicável aos agricultores ou produtores agrícolas (atividades de produção e prestações de serviços agrícolas), a obrigatoriedade da declaração de início ou reinício de atividade, junto da Autoridade Tributária e Aduaneira, a emissão de faturas independentemente do volume de vendas ou prestação de serviços agrícolas e a obrigatoriedade de declaração de início de atividade, para os agricultores, que embora fora do circuito comercial, acedam a apoios comunitários.
Estas medidas fiscais são desproporcionais e desajustadas face à agricultura familiar e ao tipo de atividade desenvolvida por muitos pequenos agricultores, em que a venda de produtos, corresponde por vezes ao escoamento do excedente da produção alimentar para auto consumo e/ou consumo familiar. Noutras situações, a pequena agricultura serve de complemento aos baixos salários e às baixas reformas.
As medidas fiscais impostas pelo governo, com a justificação da União Europeia, têm conduzido a uma enorme onda de indignação e protesto por parte dos pequenos agricultores e das associações da área, o que se relaciona com o facto de estas opções políticas não terem em consideração as especificidades do sector agrícola nacional nomeadamente: a dimensão da propriedade; a dimensão e o carácter familiar da exploração; a idade e o tempo despendido pelo agricultor; a produtividade dos solos; os elevados custos dos fatores de produção; as dificuldades de venda dos produtos; o esmagamento dos preços pelos grandes sectores de distribuição; entre outros fatores.
A profunda alteração fiscal está a obrigar os agricultores a pagar mais IRS e mais contribuições para a segurança social, a despender de mais tempo e dinheiro com burocracias, nomeadamente ao nível da contabilidade, tornando-se num incentivo evidente para o abandono da lavoura.
Neste sentido, estas alterações fiscais não vão proporcionar mais receita para o Estado, bem pelo contrário, vão fomentar as injustiças no acesso aos fundos comunitários, assim como o abandono da pequena agricultura conduzirá do ponto de vista fiscal a uma perda indireta de impostos associados à dinamização das economias locais, nomeadamente no que concerne à aquisição dos fatores de produção pelos agricultores, que por vezes são adquiridos recorrendo aos parcos salários e reformas.
Não deixa de ser curioso, que a acrescentar ao aumento de impostos, contribuições e outras despesas associadas, os agricultores que iniciem a atividade, fiquem também obrigados ao “relacionamento” desmaterializado com Autoridade Tributária, por exemplo ao nível das notificações eletrónicas, mesmo que essas não estejam associadas diretamente à atividade agrícola como é o caso do Imposto Municipal sobre Imóveis.
A fiscalidade negra que o governo está a implementar no setor agrícola, é extremamente prejudicial para os pequenos e médios agricultores e conduzirá não só ao abandono de muitas explorações agroalimentares familiares, como também ao definhamento económico e social do mundo rural e ao subsequente desequilíbrio ambiental, por exemplo com a proliferação de infestantes e espécies de crescimento rápido propicias à ocorrência de incêndios no verão.
Assim, o Grupo Parlamentar “Os Verdes” propõe, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, que a Assembleia da República recomende ao Governo:
Que proceda à revogação das imposições fiscais sobre os pequenos e médios agricultores que decorrem da aprovação da Lei do Orçamento de Estado para 2013.
Assembleia da República, Palácio de S. Bento, 05 de Dezembro de 2014.Os DeputadosJosé Luís FerreiraHeloísa Apolónia