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Intervenções na Ar (Escritas)
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20/06/2012
Reforma do licenciamento industrial
Intervenção do Deputado José Luís Ferreira
Reforma do licenciamento industrial
- Assembleia da República, 20 de Junho de 2012 –

Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Há uns anos vieram os projetos de potencial interesse nacional (PIN), depois vieram os projetos de potencial interesse nacional com importância estratégica (PIN+). Uns e outros viriam dinamizar a economia, sobretudo aligeirando procedimentos que continuam a colocar em causa valores que o Governo também deveria salvaguardar.
Criou-se, assim, um regime de exceção sobre normas ambientais e de ordenamento do território que, a nosso ver, é completamente incompreensível, sobretudo se atendermos aos resultados, porque o que estes projetos de interesse nacional vieram trazer foram apenas grandes atentados ambientais, e o interesse nacional continua sem se ver.
Os ditos PIN, na sua maioria, ou faliram ou estão por concretizar. E, agora, vem o Governo anunciar o grande Licenciamento zero, a reforma das reformas, a revolução do sistema das indústrias que tudo vai resolver, mas, pelo menos em termos ambientais, o que o Governo está a fazer é a completa generalização dos projetos de potencial interesse nacional. Pior: está a generalizar os PIN dispensando a necessidade de invocar o interesse nacional — deixou de ser necessário — e apenas 2% das indústrias ficam sujeitas ao procedimento da autorização prévia da administração central. Até a conversão dos atuais parques em zonas empresariais responsáveis terão procedimento simplificado, dispensando-se os estudos de impacte ambiental.
A orientação geral é a responsabilização do industrial, reduzindo ao mínimo as autorizações prévias e reforçando a fiscalização a posteriori. É bonito dizer-se isso — o Governo quer reforçar a fiscalização a posteriori —, mas nós perguntamos como, sobretudo se tivermos em conta a falta de recursos humanos que atualmente se vive na Administração Pública com as limitações que o Governo tem vindo a impor no acesso à mesma.
Por falar em fiscalização a posteriori, seria bom que olhássemos para os PIN e para o acompanhamento que o Governo está a fazer, seria bom que olhássemos, por exemplo, para o Projeto de Interesse Nacional das Pedras Salgadas, que nem anda nem desanda, com graves prejuízos para as populações, que viram a piscina do Parque transformar-se num verdadeiro tanque e que ficaram privadas do acesso ao Parque durante dois longos e penosos anos.
Impõe-se aqui uma pergunta, e lamentamos que o Governo não esteja presente neste debate, porque seria bom que nos dissesse hoje alguma coisa sobre a matéria: em que pé está o PIN de Pedras Salgadas? Ninguém sabe. A isto chama o Governo fiscalização a posteriori. Estamos bem entregues a este nível!…
Depois, no Licenciamento zero, o Governo estabelece três níveis de perigosidade: na perigosidade reduzida, os licenciamentos ficam dispensados de estudos de impacte ambiental; na perigosidade média, exige-se a comunicação à administração central mas a aprovação pode até ocorrer por via de deferimento tácito. E, como se isto fosse pouco, o Governo procede a um alargamento dos critérios de perigosidade para que cerca de 12% das indústrias transitem administrativamente para o nível de perigosidade mais reduzida, permitindo-se desta forma que 60% das empresas possam recorrer ao Licenciamento zero, que nada tenham de dizer à administração central e que estejam libertas de qualquer estudo de impacte ambiental.
O Governo já pôs em saldo os direitos de quem trabalha, agora põe em saldo os valores ambientais, que também lhe compete proteger. Convém lembrar, porque, pelos vistos, parece que esta matéria não interessa nada, que ao Governo também compete proteger os interesses ambientais. O Governo renuncia, assim, à proteção dos nossos valores naturais.
Bem pode o Sr. Ministro da Economia dizer, como disse, que o novo sistema vai fazer de Portugal um País mais amigo dos negócios, mas o que não disse, e devia ter dito, é que o faz à custa da delapidação dos nossos recursos naturais e distorcendo as regras de proteção ambiental.
Voltando à perigosidade — e é pena que o Governo não esteja presente, volto a dizê-lo —, não sabemos que fundamentação técnica ou científica está na base do alargamento dos critérios de perigosidade para que cerca de 12% das indústrias transitem assim, sem mais, para o nível de perigosidade mais reduzida. Então, o que era perigoso ontem deixou hoje de o ser, como por um passe de magia, sem estudos, sem suporte científico, só porque é bom para os negócios?
Esta é a questão. De facto, não estranhamos que o Programa da Indústria Responsável inclua, na sua equipa, o Ministério da Economia, porque já todos percebemos a sensibilidade do Ministério da Economia para as questões ambientais.
Mas ver o Ministério do Ambiente envolvido neste processo, é «de bradar aos céus», porque isto significa que o próprio Ministério do Ambiente está a ser cúmplice na decisão do Ministério da Economia de pôr os valores ambientais em saldo.
Não tarda, o Ministério do Ambiente estará transformado numa mera secretaria de Estado do Ministério da Economia.

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