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06/11/2008
Regime Jurídico Divórcio
Intervenção do Deputado FRANCISCO MADEIRA LOPES
Reunião plenária 2008-11-06
 
 
 
 
Sr. Presidente, Srs. Deputados,
 
As concepções de casamento e de divórcio não são estáticas e têm evoluído socialmente ao longo dos tempos, devendo o ordenamento jurídico acompanhar esta evolução.

Tempos houve – infelizmente, não foi assim há tanto tempo – em que o casamento por força de convicções morais e religiosas era considerado eterno e cindível, e nele a mulher era vista como um menor, saindo com o casamento debaixo da alçada do pai para a alçada do marido, o pater familias, não dispondo sequer de autonomia jurídica para gerir a sua esfera pessoal. Esse tempo, felizmente, acabou, tendo-se consagrado o direito ao divórcio e a igualdade entre os cônjuges.

Este ano, o Parlamento deu outro passo e encetou uma reforma do regime do divórcio, cujo trato principal foi acabar com a necessidade de culpa para operar a dissolução do casamento que só deve continuar enquanto persistir a vontade de ambas as partes em partilhar uma vida em comum.

Depois de confirmado o diploma, o Sr. Presidente da República decidiu promulgá-lo, mas voltando a reafirmar, na mensagem que ora apreciamos, as suas opiniões e dúvidas relativamente ao novo regime.

Opiniões essas que respeitamos, que escutamos, mas que não acompanhamos nos mesmos termos. Conceitos indeterminados e dúvidas de interpretação existirão possivelmente, como já existiam no anterior regime do Código Civil. E sem dúvida que da boa, responsável e sensata aplicação que os magistrados fizerem deste regime dependerá o seu sucesso! É claro que, quando mudamos o ordenamento jurídico, conceitos e institutos que sejam vagos e indeterminados levam sempre algum tempo até se consolidarem mediante a mediação (passo a repetição) dos intérpretes doutrinais e jurisprudenciais, o que também agora acontecerá, como é normal. O uso de conceitos indeterminados responde, aliás, precisamente à necessidade de atender a uma multiplicidade de situações concretas distintas, às quais a lei geral e abstracta se tem que subsumir.

Também não acompanhamos a análise de prognose de crescente «litigiosidade». O que se fez foi separar os conceitos de culpa e divórcio, deixando que as faltas em relação aos deveres conjugais relevem apenas para as situações em que existam, de facto, conflitos, prejuízos ou interesses a acautelar e que justifiquem o recurso aos tribunais para dirimir esses mesmos conflitos. Por isso falará o Sr. Presidente da República em conflitualidade pós-conjugal, pois, com efeito, o que se faz é tentar deslocar essa eventual conflitualidade para momento posterior ao do divórcio. Pensamos, e esperamos, que essa eventual conflitualidade decorrente do fim do casamento não aumentará, antes pelo contrário, apenas por se ter deslocado o momento do divórcio para um momento pós-divórcio.

Esse facto, de per si, tem desde logo um efeito positivo que é o de acabar com todas aquelas situações de «litigiosidade» artificial, de conflitualidade forçada, em tribunal só para justificar e fundamentar um divórcio que não se conseguiria obter de outra forma! Isto não quer dizer que tenhamos uma confiança ilimitada no novo regime. Não há regimes perfeitos, desde logo porque são feitos apenas por homens e mulheres, que são por natureza limitados e imperfeitos.
Por isso, entendemos, independentemente da sugestão do Sr. Presidente da República, que é dever do Parlamento estar atento e acompanhar o efeito das normas que produz na sociedade e, se for caso disso, se vier a demonstrar-se necessário, introduzir correcções e melhoramentos ao regime que entretanto aprovámos.

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