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25/04/2006 |
Sessão comemorativa do 25 de Abril |
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Intervenção da Deputada Heloísa Apolónia Sessão comemorativa do 32º aniversário do 25 de Abril
Assembleia da República, 25 de Abril de 2006
Sr Presidente da República, Sr Presidente da Assembleia da República, Sr Primeiro-Ministro e demais membros do Governo, Srs Presidentes do Tribunal Constitucional e do Supremo Tribunal de Justiça, Srs Deputados, Srs Capitães de Abril, que aqui particularmente saúdo em nome de “Os Verdes”, Sras e Srs Convidados:
Há 32 anos a revolução de Abril libertou o povo português da ditadura fascista. Sei que não digo nada de novo, mas tenho a certeza do quão importante é dizê-lo, das mais diferentes formas e nas mais diversas circunstâncias, às mais novas gerações, que não tendo vivido o 25 de Abril de 1974 mantêm o privilégio de poder ser ouvintes directos dos que fizeram parte de um dos momentos mais estimulantes, de maior encanto e desejo de se ser um povo por inteiro. Digo isto garantindo-vos que eu também fui das que ouvi, e depois confirmei.
O fascismo representou o que de pior ofende a dignidade de um povo – da guerra, à censura, à prisão política, à tortura de tantos homens e mulheres, todos com rosto e nome, os 48 anos de ditadura quiseram calar o povo, oprimindo, explorando… o povo vivia encarcerado num país que era seu e que os fascistas roubavam para si.
Em 25 de Abril de 1974 o Movimento das Forças Armadas devolveu ao povo esse país.
A consciência, tão presente, da necessidade de amar a liberdade e a democracia e de a preservar com tanta força quanto a que o povo unido pode encontrar, terá levado a que, um ano depois, 92% dos eleitores tenham votado para eleger a Assembleia Constituinte.
E o povo escolheu pluralidade – eram sete os partidos representados na Assembleia Constituinte, que ao fim de mais um ano votaram a Constituição da República Portuguesa, a qual entrou em vigor há exactamente trinta anos.
Esta nossa Constituição, querendo garantir um sistema político plural, fortemente representativo, num país que não toleraria diminuir a democracia conquistada a uma representação de um ou dois partidos, garantiu o sistema proporcional na eleição para a Assembleia da República.
E hoje, passados que são trinta anos, “Os Verdes” querem aqui deixar expressa uma preocupação em relação a ideias e a propostas que têm surgido, que sob a capa de aperfeiçoamento do sistema eleitoral e do funcionamento dos órgãos, não representam mais do que a diminuição da representatividade do povo na Assembleia da República – falo de intenções como a de criação de círculos uninominais ou da diminuição do número de deputados. Se alguém se propõe imaginar o que significaria o Parlamento reduzido à representação dos dois actuais maiores partidos, tendência que resultaria daquelas propostas, depressa concluirá, com seriedade, que uma parte significativa dos cidadãos não se encontraria representada na Assembleia da República, e que, ao contrário do que se quer fazer crer, a proximidade eleito/eleitor seria muito fragilizada. Com isto a democracia seria objecto de um empobrecimento grave. O que “Os Verdes” querem dizer é que, assim como a diversidade na Natureza é a base da riqueza de um ecossistema, também a pluralidade, a representação pluripartidária, é a base da riqueza do nosso sistema político. O apelo é para que não a deixemos, jamais, perder.
E se há coisa que o 25 de Abril conquistou, e que a Constituição consagrou de forma clara e inequívoca, foi a igualdade – não apenas o direito à igualdade, mas também a igualdade de direitos de todos os cidadãos. Determinou-se que este país não era só para alguns, era para todos em tudo aquilo em que se pode suportar a dignidade da pessoa humana – haverá valor que represente maior sentido de justiça social?
Ora, ultrapassadas que estão três décadas, questionemo-nos porque é que estamos ainda longe de garantir essa igualdade! Portugal é dos países da União Europeia onde o fosso é mais distante entre os 20% mais ricos e os 20% mais pobres; são 200.000 os nossos concidadãos que vivem em estado de pobreza extrema; somos dos países com maior taxa de pobreza entre trabalhadores, para já não falar dos cerca de 500.000 desempregados. Mas é neste quadro que a banca e alguns grupos económicos vão, contudo, angariando lucros que para a generalidade dos cidadãos chegam a números inimagináveis. O apelo é para que não deixemos que se banalize o que é insuportável de aceitar.
A igualdade só se pode realizar quando o objectivo político estiver aí centrado, e o caso é que esse tem sido um objectivo subsidiário das políticas prosseguidas. Enquanto o objectivo político estiver centrado em questões como o défice e no endeusamento de interesses economicistas, mantendo privilégios para alguns e criando condições de vida tão difíceis para a generalidade dos cidadãos, ao ponto de se lhes negar serem até parte activa da necessária dinamização económica interna, por via do seu poder de compra e de investimento, a promoção da igualdade continuará por cumprir.
Enquanto mantivermos um sistema fiscal não solidário que acaba por beneficiar os que mais podem contribuir e que sacrifica os outros, daí resultará um acentuar de desigualdades. E medidas tomadas, como as propinas na educação e a não aposta na rede pública de ensino ou as taxas moderadoras na saúde e a falta de reforço na resposta do serviço nacional de saúde, não promovem igualdade nenhuma, pelo contrário discriminam cidadãos com poucos recursos que são também os que sentem a desigualdade no acesso à justiça, a dificuldade de acesso à habitação e por aí fora.
Sr Presidente
Srs Deputados
Sras e Srs Convidados
Se há momento, neste país, que se pode associar à abertura de portas para o progresso, para o desenvolvimento, para a modernidade, esse momento é sem dúvida o 25 de Abril de 1974. Abriram-se escolas, abriram-se unidades de saúde, criaram-se serviços próximos das populações, serviram-se as populações com equipamentos indispensáveis como o abastecimento de água, para o qual o poder autárquico democrático foi determinante.
32 anos depois encerram-se escolas, maternidades e outros serviços de saúde (e não é a pedido nem em proveito das populações) e até se fixa como objectivo a entrega de um bem tão essencial à vida, e que por isso deveria necessariamente ser concebido como um património colectivo, que é a água, ao sector privado, que terá inevitavelmente como consequência o encarecimento do acesso das populações a este recurso natural e vital, encarecimento não destinado a reinvestir na melhoria dos sistemas de abastecimento e saneamento, mas sim destinado a ser repartido pelos accionistas das empresas.
Abril serviu inequivocamente o interesse colectivo. Era para o bem estar, para a qualidade de vida das populações, que emergia fazer e trazer à vida colectiva o desenvolvimento. Hoje verificamos que os interesses colectivos dão lugar aos interesses económicos com a maior facilidade e que estes, tanto pior, representando ameaças evidentes em muitas esferas são sempre apresentados em nome de um futuro proveito colectivo que se fica sempre pelo futuro, mas que se traduz em ganhos, esses imediatos, para o poder económico.
Quando há 30 anos atrás Portugal recusou a construção de uma central nuclear em Ferrel, no concelho de Peniche, os portugueses ganharam na sua segurança e na opção ambiental, o interesse colectivo venceu (e será importante recordar a importância que teve a voz e a luta colectivas nessa vitória). Hoje o poder económico não pára de fazer pressão para retomar o projecto de construção de uma central nuclear em Portugal (impõe-se então também retomar a voz e a luta colectivas). Resta saber que interesses vai o poder político, em concreto o Governo, servir!
Sr Presidente
Srs Deputados
Estimados convidados
Abril abriu horizontes de engrandecimento da sociedade, e isso significa também construir uma sociedade de inclusão. É por isso que “Os Verdes” gostariam, ainda, nesta intervenção de realçar que nesta sessão comemorativa do 25 de Abril, pela primeira vez, se comunica com todos os cidadãos – a língua gestual passa a partir de hoje a fazer parte das transmissões dos trabalhos desenvolvidos no Parlamento. E ao mesmo tempo que é de assinalar este passo extremamente positivo aqui na Assembleia da República, também há que condenar factos extremamente negativos como os que visam calar as comemorações de Abril na Assembleia Legislativa da Madeira.
E mesmo para terminar, o 25 de Abril fez-se e viveu-se de uma forma muito intensa, todos o garantem, mas há quem tente reduzir essa vivência à geração de Abril, há quem queira reduzir Abril a um facto histórico e passado.
Pois o que nós Verdes queremos dizer é que aquela revolução foi muito mais profunda, e que os valores, os ideais, os projectos não se estancam no tempo, os sonhos não se amarram e que nestas novas gerações crescidas ou nascidas depois de 1974 também há um desejo profundo de construir um país de justiça e de desenvolvimento. Aos que viveram Abril a garantia está dada – nestas novas gerações também há muitos, muitos mil que lutarão para construir o nosso Abril ainda inacabado.
Viva o 25 de Abril