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25/04/2007
Sessão Comemorativa do 25 de Abril
Intervenção da Sessão Comemorativa do 33º Aniversário do 25 de Abril
Deputado Francisco Madeira Lopes
25 de Abril de 2007
 

 

 

 





Sr. Presidente da República, Sr. Presidente da Assembleia da República, Sr. Primeiro-Ministro, Sras. e Srs. Membros do Governo, Srs. Presidentes do Supremo Tribunal de Justiça e do Tribunal Constitucional, Sras. e Srs. Deputados, Valorosos Capitães de Abril, Sras. e Srs. Convidados, Caros Concidadãos,

Lembrar Abril, comemorar Abril, não é uma obrigação que nos imponha um qualquer calendário institucional, nem o fazemos por mera tradição. Não comemoramos Abril apenas por que sim, por que tem que ser, ou por que assim alguém o determinou. Comemoramos porque acreditamos, porque sentimos, porque é urgente.

Comemorar Abril é dizer presente, é renovar a afirmação, é reafirmar valores, princípios, ideais e conquistas que nos foram oferecidos, a mim, como às gerações nascidas depois de 74, como a mais preciosa dádiva que alguém pode receber.

É, por isso, com muito orgulho, com muita honra e com a noção da devida responsabilidade, que volto a dirigir-me ao Plenário da Assembleia da República na data da fundação da nossa liberdade. Porque é esta, de facto, a data da fundação do nosso Estado de Direito, um Estado Democrático, alicerçado na fundamental dignidade da pessoa humana, um Estado que nos garantiu a todos a possibilidade de, em liberdade, escolher e traçar o nosso destino, enquanto povo e enquanto cidadãos de uma nação autónoma e soberana.

Mas o 25 de Abril de 1974, e a Revolução que teve lugar nesse dia, foi mais do que um marco histórico para encher páginas de livros de história, como então encheu páginas de jornais por todo o mundo. A Revolução dos cravos foi mais do que um momento original de viragem ou de reviravolta na história recente de Portugal, muito mais do que o facto mais significativo do Século XX.

Foi um momento de promessa, de esperança, de renascimento dum país que asfixiava sob o manto bafiento de um regime opressor e criminoso, que proibiu a liberdade de pensamento, censurou a criação e a comunicação, condenou todo um país ao atraso e ao isolamento internacional, todo um povo, ou a sua grande maioria, à exclusão cívica e social, que semeou a miséria, a ignorância e o medo, que, perseguiu, prendeu, torturou e assassinou mulheres e homens apenas porque via o pensamento livre e crítico, a opinião esclarecida, a vontade de mudar, o sonho e a utopia como ameaças mortais.

Mas nem com os seus algozes, nem com o mais brutal e feroz jugo, o regime fascista do velho e senil “Estado – dito - Novo”, a ditadura de Salazar e Caetano, conseguiu arrastar-se por mais tempo, num tempo que já não era seu. E “naquela leda madrugada” de primavera, um grupo de jovens capitães, como alguém escreveu, devolveu àquele povo de pessoas tristes o tesouro que lhes tinha sido roubado: a liberdade.

Assim como o sol de primavera rasga a longa noite invernal de trevas, assim o Movimento das Forças Armadas, rompeu a cortina obscurantista do passado, pondo ponto final a 48 anos de fascismo e a uma odiosa e insana guerra colonial que ceifou milhares de vidas roubando ao país a sua juventude.

Foi o movimento dos capitães que, interpretando e respondendo aos justos anseios do povo português, coroando, como diz o prólogo da nossa Constituição, a resistência levada a cabo pelo povo e por muitos antifascistas, ao longo de décadas, na clandestinidade ou no exílio, deu o peito, logo abraçado pelas centenas, pelos milhares que espontaneamente, e apesar dos apelos feitos pela rádio para que as pessoas se mantivessem em casa, ainda assim invadiram as ruas fazendo a festa tão ansiada.

Nunca é demais relembrá-lo. É importante, é fundamental para a subsistência e qualidade da nossa Democracia passar a mensagem, conhecer a história do 25 de Abril, contar a quem nunca conheceu e a quem já esqueceu como era antes. Não podemos pactuar com tentativas de branqueamento, de omissão, de esquecimento ou de neutralização dos factos históricos, como algumas a que assistimos recentemente.

Hoje, encontrando-nos na sessão solene de comemoração do 33º Aniversário da Revolução de Abril, permitam-me lembrar que a Revolução do 25 de Abril não teve nada de solene, nem de protocolo, nem de cortesia. Foi um acontecimento genuíno, verdadeiro e puro na sua essência libertadora, rebelde e indomável na alegria contagiante a que deu origem, pelo fim do pesadelo da ditadura. Não teve muito de solene, mas teve muito de comemoração. Os portugueses tinham muitos e bons motivos para comemorar, para sair à rua, para sair de dentro das suas casas, de dentro de si, para sair pelo mundo fora, gritando na avenida: já não temos medo de nada, cantando pelas praças: vamos mudar o mundo, não voltaremos atrás!

E houve de facto um progresso formidável! Não nos cansamos de enumerar as conquistas que Abril nos trouxe, desde o salário mínimo, a segurança social e o direito a férias, ao Serviço Nacional de Saúde e à democratização no ensino obrigatório e universal, desde a liberdade de imprensa, de associação e de participação cívica e política à igualdade jurídica entre homens e mulheres.

E contudo, mais de trinta anos volvidos sobre a esperança, sobre a promessa de um mundo melhor, pleno de igualdade e justiça social, de fraternidade e solidariedade, de desenvolvimento e democracia, verificamos, e é imperativo que o façamos, que tanto se encontra ainda por fazer. Tantas promessas, tantos objectivos, tantas esperanças, tanto de Abril por cumprir.

Tanto de Abril por cumprir no plano da Igualdade a diferentes níveis: na igualdade de género, porventura a mais antiga discriminação existente e a que maior número de pessoas atinge, com uma dimensão, profundidade e reflexos verdadeiramente preocupantes a nível familiar, salarial e no acesso a cargos de chefia ou de liderança pública; mas também na lamentável persistência de manifestações discriminatórias irracionais e sem sentido fundadas na raça, no território de origem ou até mesmo na orientação sexual; ou ainda em relação a cidadãos portadores de deficiência a quem nem sempre é garantido um lugar na sua/nossa sociedade.

Tanto de Abril por cumprir no plano do Desenvolvimento sustentável, do ordenamento do território e da correcção das assimetrias regionais, agravando-se permanentemente a desertificação e o despovoamento do interior do país aumentando a pressão sobre a costa e o litoral. Tanto por cumprir no plano da garantia do direito à mobilidade das populações e do combate ao desperdício e dependência energética pela falta de aposta nos transportes públicos colectivos e na ferrovia.

Tanto de Abril por cumprir na garantia do direito à qualidade de vida e a um ambiente sadio e ecologicamente equilibrado, com o péssimo estado a que chegaram tantos dos nossos rios maltratados e poluídos, ou os níveis de poluição que atingem os centros urbanos.

Tanto de Abril por cumprir em tantos outros domínios o que encaramos não de forma derrotista, mas antes como um estímulo para uma acção e intervenção que se querem cada vez mais plurais, partilhadas e participadas.

Mas, para o Partido Ecologista “Os Verdes”, mais grave do que o que ainda não se cumpriu é o que estamos a perder num verdadeiro retrocesso a que actualmente assistimos relativamente às conquistas do Estado de Direito Social que Abril nos deu e que agora nos querem roubar.

Não é possível assistir passivamente a um processo contínuo de degradação de serviços públicos e de emagrecimento forçado da Administração Pública, mormente nos sectores da educação e da saúde, cumprindo um plano de encerramentos progressivos e de desresponsabilização do Estado de uma forma cega em relação àquela que é sua única razão de existir: servir as populações e responder às suas necessidades.

São cada vez mais os casos e em cada vez maior número em que assistimos a uma demissão do Estado entregando de forma mais ou menos declarada ao sector privado aquilo que deveria ser sua tarefa indeclinável. Privatizam-se ou concessionam-se serviços públicos tão importantes como o abastecimento de água e tratamento de águas residuais, ou o domínio público hídrico, ou até mesmo, quem sabe num futuro muito próximo, as áreas protegidas e a conservação da natureza, em tudo colocando um preço, de tudo fazendo um negócio.

Não é assim, no entender de “Os Verdes” que se cumpre Abril. nem é assim que se respeita a sua herança inscrita no texto constitucional.

Num momento em que o desemprego alastra, os trabalhadores, no sector público e no privado, vêem crescer as ameaças aos seus direitos e à segurança no emprego, assistindo à diminuição dos salários reais e a perda de poder de compra, acompanhados do aumento do custo de vida e das comparticipações Sociais, enquanto a banca e outros poucos grupos económicos apresentam lucros astronómicos, o fosso da desigualdade aprofunda-se vergonhosamente e a sociedade vai dando sinais claros, como o da manifestação que reuniu 150 mil trabalhadores do passado dia 2 de Março, para quem quiser e souber ler, que não estamos no caminho certo.

A Democracia tem inimigos, entre eles o descrédito e a desconfiança nas instituições e nos órgãos. A Democracia não é um dado adquirido: pode-se ganhar, deve-se construir e fortalecer mas também se pode perder. Obriga-nos por isso a ser atentos, vigilantes, diligentes e responsáveis.

Não se deve procurar em Reformas do sistema político nacional que conduzam à redução da representatividade, do pluralismo e da capacidade real de intervenção e de escrutínio dos executivos pela oposição aquilo que só pode ser encontrado no respeito por compromissos eleitorais e na prestação de contas aos eleitores.

Da mesma forma, não se procure em reformas institucionais na União Europeia ou em Tratados constitucionais a solução para males que radicam essencialmente no afastamento dessas mesmas instituições das preocupações do cidadão comum que será agravado com a eventual redução da sua capacidade de intervenção, de decisão ou de voto em matérias como a adopção de um futuro tratado.

Procure-se sim no respeito pelos princípios sólidos fundadores da nossa Democracia Plural, os Princípios da Igualdade, Liberdade e Solidariedade, que são a herança que recebemos e o legado que queremos deixar às gerações futuras.

VIVA O 25 DE ABRIL!

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